
Dias atr�s, ouvindo o testemunho do pai de um rapaz que foi atropelado e morto por um motorista b�bado em Belo Horizonte, senti um misto de pena e, n�o sei dizer ao certo, mas algo como raiva (sinceramente, n�o creio ser a palavra mais adequada, mas foi a que me ocorreu agora), pelas palavras dele.
O senhor, profundamente emocionado e abalado, disse que perdoava o assassino, e que ele (o b�bado) iria se entender com a justi�a divina. Este mesmo pai disse estar conformado, pois o filho fora escolhido por Deus - dentre os outros tr�s ciclistas que o acompanhavam -, j� que pronto para subir ao C�u.
Naquela hora, s� me ocorreu - pois j� vi e ouvi dezenas, talvez centenas de depoimentos assim - que ter f�, muita f�, e verdadeiramente ser religioso (pouco importa a religi�o), �s vezes � o �nico caminho, a �nica maneira de seguir adiante e disposto a viver ap�s eventos assim. Do contr�rio, a puls�o de morte nos consome.
Quem sou eu para julgar o que sente ou acredita qualquer um de n�s? Quem sou eu para criticar os sentimentos de algu�m diante da perda de um filho? Quem sou para me meter na dor (t�o inimaginavelmente profunda) de pais destru�dos? N�o, n�o estou no papel de nada nem de ningu�m. Apenas tento decifrar o estranho “mecanismo” que nos move.
O mesmo Deus que escolheu o filho para ser atropelado, ser� o juiz do assassino, na cren�a daquele senhor. Por�m, me parece que o julgamento ser� favor�vel ao criminoso, j� que um mero instrumento da vontade divina. Nessa hora, sinto raiva do pensamento, entendem? Pois n�o faz sentido. Mas quem disse que � preciso?
A f� e a religiosidade confortam quem sofre, e talvez seja essa a maior contribui��o da religi�o ao ser humano. Ao ver a imagem dos pais a caminho dos filhos mortos - meu Deus! - s� consegui desejar que tenham muita f�, muita espiritualidade, muita cren�a, enfim, que tenham algo, para al�m dessa cruel realidade, que os mantenha em p�. Eu n�o teria.