Sob a vertigem dos acontecimentos e n�o acontecimentos que invadem, pelas m�dias, nossa vida cotidiana, � f�cil perdermos a vis�o de conjunto, a que nos permite compreender, ou pelo menos intuir, a verdadeira Hist�ria que estamos vivendo. Nosso passado e as nossas experi�ncias s�o hoje de pouca valia para entendermos o presente e sondar o futuro. Com a atual velocidade das mudan�as, as incertezas, que sempre nublaram a vida das sociedades, tornaram-se muito maiores e temos muito menos controle sobre o que pode nos acontecer.
Essa falta de controle sobre nosso destino j� deveria ser suficiente para que a sociedade procurasse agir com muita prud�ncia e humildade, abstendo-se de lan�ar-se em aventuras pol�ticas que s� ampliam as incertezas. Se os riscos da imprevisibilidade sobre o futuro fossem percebidos como uma amea�a real � pr�pria integridade da na��o, certamente as pessoas se moveriam em dire��o a uma maior unidade e a uma maior disposi��o para a compreens�o e a coopera��o. Essa percep��o, no entanto, n�o existe para a maioria.
Em todo o mundo estamos presenciando uma redu��o do crescimento econ�mico, um grande aumento das desigualdades e a incapacidade dos governos de servir a todos os seus cidad�os. Os minguados frutos do crescimento das �ltimas d�cadas foram quase que exclusivamente para a parcela m�nima dos muito ricos, mantendo-se quase toda a popula��o num estado de estagna��o ou de empobrecimento. Como hoje quase tudo � transparente, as maiorias sociais tornaram-se descrentes das institui��es que produzem a injusti�a, ou pelo menos, n�o s�o capazes de evit�-la. O resultado da desilus�o � a ascens�o, pelas pr�prias vias da democracia, de governos autorit�rios e sect�rios, ou at� mesmo de lideres absurdos como Donald Trump ou Boris Johnson, todos frutos do desespero e n�o da esperan�a.
Se isso se passa no mundo, no Brasil as coisas andam muito piores. Nossa economia n�o cresce pouco. Ela n�o cresce nada. A renda por habitante que t�nhamos em 2012 diminuiu e s� voltar� ao mesmo n�vel a partir de 2020, se tudo correr bem. Dez anos perdidos e com eles vidas que se frustraram, fam�lias que se desorganizaram, destinos que se perderam. E tudo isso obra de n�s mesmos. Temos todas as riquezas poss�veis, mas seus benef�cios foram capturados por uma parcela m�nima da popula��o: as corpora��es do servi�o p�blico, que fizeram do Estado um fim em si mesmo, e uns poucos grupos de interesses que se organizam em redor do Estado, para desfrutar de seus recursos, suas leis e seu poder.
Nossa carga de impostos atingiu no �ltimo ano 35% de toda a renda nacional e 80% de tudo isso � gasto com sal�rios de funcion�rios p�blicos e aposentadorias e pens�es. N�o temos infraestrutura, n�o temos boa educa��o, n�o temos boa assist�ncia de sa�de, n�o temos nem sequer seguran�a. Se n�o bastasse isso, mais de 25 milh�es de brasileiros n�o t�m emprego e n�o h� crescimento econ�mico no horizonte.
� muito dif�cil que tudo permane�a assim sem que conflitos e dist�rbios passem a amea�ar a nossa prec�ria paz social. Os problemas que temos pela frente s�o desafios espetaculares que exigiriam, no m�nimo, uma grande mobiliza��o da sociedade, liderada por um governo que pregasse a unidade, a fraternidade e a toler�ncia, para nos guiar para um destino comum. Um governo que se orgulhasse de nossas diversidades e compreendesse com serenidade as vicissitudes de nossa hist�ria.
O que estamos vendo n�o � nada disso. Vemos um desejo inconsequente de nos dividir, de vingar a hist�ria, de fazer uma parte prevalecer sobre o todo e de combater a diversidade. J� vivemos grandes dramas pol�ticos, v�rios momentos de ditadura e autoritarismo, outros momentos de mediocridade e de incompet�ncia, mas hoje o sentimento que tenho � que a nossa pr�pria ideia de na��o esteja sob risco.
Os governos passam, mas alguns deixam cicatrizes que o tempo demora muito a curar. Algumas n�o se curam nunca! A hist�ria nos lembra que h� na��es e sociedades que se perdem para sempre!