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Estado de Minas Mais leve

Minutos de paz

N�s nos torn�vamos c�mplices ao trocar aquele gesto, enquanto durasse a m�sica, que marcava o tempo destinado a nos confraternizar


20/02/2022 04:00 - atualizado 16/02/2022 17:37

ilustração


Dizem que, ao entrar pela primeira vez em uma igreja, a pessoa tem o direito de fazer um pedido. No meu caso, sempre soube o que eu queria pedir, desde crian�a. Ao colocar o p� no adro, fa�o o sinal da cruz e vou logo dizendo a Deus: PAZ.

Talvez seja algo mec�nico, que n�o exige pensar muito. � uma esp�cie de desejo universal, objetivo, expresso em tr�s letras. Algu�m a� discorda da import�ncia de se ter paz na vida?
 
Sempre quis levantar a bandeira branca. Talvez tivesse motivos pessoais ou simplesmente incorporei o cumprimento da ‘paz de Cristo’, previsto no rito cat�lico.  � um momento leve da missa. A um sinal do padre, os participantes se levantam, enxergam-se uns aos outros e entregam a paz de Cristo, com um aperto de m�os.
 
N�s nos torn�vamos c�mplices ao trocar aquele gesto, enquanto durasse a m�sica, que marcava o tempo destinado a nos confraternizar. “Paz, paz que vem do amor, lhe desejo irm�o”, cant�vamos alegremente, �s vezes at� batendo palmas.
 
A can��o continuava, lembrando que o mundo d� voltas e que a gente pode se encontrar um dia, precisando da ajuda do vizinho. Eu confesso. N�o fa�o ideia se esse costume sobreviveu � pandemia, diante do risco de contamina��o pelo v�rus.
 
Naquela �poca, com a inoc�ncia das crian�as, eu fazia quest�o de entregar uma part�cula de paz ao m�ximo poss�vel de pessoas. Chegava a correr at� os bancos laterais para estender o meu armist�cio. Os adultos nunca recusavam um aperto de m�o infantil.
 
Era uma esp�cie de tr�gua do mundo real, mas que dependia da boa vontade do padre. Se ele arrastasse muito o serm�o, era obrigado a pular a parte da Paz de Cristo. Eu achava ruim quando isso acontecia, mas nunca reclamei com a minha av�.
 
Gostava tanto de ir � missa com ela que deixava passar o t�dio das leituras infinitas de trechos da “B�blia”. Era bonito o modo como vov� ficava focada, muito s�ria, prestando aten��o em cada uma das palavras do folheto, impresso em papel jornal.
 
Eu ainda nem sabia ler, mas adorava a vov�. Para tentar agradar a ela, imitava tudo o que os outros faziam. Sentava e levantava, todas as vezes, acompanhando o p�blico. J� idosa, ela permanecia quietinha no banco, na maior parte do tempo. Depois se justificava, reclamando da artrose nos joelhos.
 
Do�a mesmo, mas eu fingia ignorar.  Nenhuma dor do mundo poderia impedir aquele momento de paz, que era s� meu e dela. No in�cio, eu a acompanhava aos domingos por obriga��o, como neta mais velha. Mais tarde, passei a gostar de ir � igreja. Eu me sentia bem rezando.
 
Admito minha culpa, minha grande culpa, mas eu morria de inveja quando vov� finalmente se levantava para a comunh�o. Ela entrava na fila para receber a h�stia no altar. S� os adultos podiam comungar, ou mesmo os jovens, ap�s conclu�rem o catecismo. Eu ficava para tr�s, esperando por s�culos at� a vov� voltar, meio mancando da perna.
 
Foi assim at� eu fazer a primeira comunh�o. Fiquei emocionada, quase chorei. Usei um vestido todo branco e, na cintura, uma fita de cetim azul-celeste. Trazia um corte de cabelo estranho, com a franja no meio da testa e o volume desgovernado, puro frizz.  Quase joguei fora a foto.
 
Ou ser� que joguei? Guardo na mem�ria cada minuto da celebra��o. Eu estava de joelhos, olhinhos fechados, com as m�os em posi��o de ora��o. Fiquei conversando com Deus, esperando at� que a h�stia, com todo o respeito, desgrudasse do c�u da boca.  Ganhei uma vela decorada, certificado e missal com capa de madrep�rola.
 
Lembrei-me de tudo isso porque preciso matricular meu ca�ula na catequese, com atraso de dois anos devido ao confinamento social. O prazo termina esta semana. Ser� que consigo retomar o h�bito de ir � missa aos domingos? Quero dar ao meu filho a chance de buscar a paz, seja aonde for.

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