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Estado de Minas LEMBRAN�A AFETIVA

Movimento 'comfort food' busca despertar emo��es por meio do paladar

Pratos remetem a momentos especiais e afloram sensa��es ligadas ao conforto, ao bem-estar e � mem�ria


postado em 17/06/2019 14:00 / atualizado em 17/06/2019 14:12

A personal organizer Mariana Faria conta que, ao se alimentar, busca justamente um conforto, principalmente quando é uma comida especial, de família, que traz um acolhimento(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
A personal organizer Mariana Faria conta que, ao se alimentar, busca justamente um conforto, principalmente quando � uma comida especial, de fam�lia, que traz um acolhimento (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

“Salta a cerveja estupidamente gelada pr’um batalh�o e vamos botar �gua no feij�o. Mulher, n�o v� se afobar; n�o tem que p�r a mesa, nem d� lugar. Ponha os pratos no ch�o e o ch�o t� posto e prepare as lingui�as pro tira-gosto. Uca, a��car, cumbuca de gelo, lim�o e vamos botar �gua no feij�o. Mulher, voc� vai fritar um mont�o de torresmo pra acompanhar: arroz branco, farofa e a malagueta; a laranja-ba�a ou da seleta”, com as b�n��os do mestre Chico Buarque, a feijoada � o prato que embala a alegria de muitos. E pode muito bem ser apontado como comfort food. Est� por dentro dessa onda?

Sabe aquele cheiro especial vindo da cozinha, que invade os outros c�modos da casa e fica para sempre na mem�ria das pessoas? Aquele sabor que remete � inf�ncia, uma receita da m�e, da av�, da madrinha ou de algu�m especial, seja um simples arroz com feij�o, uma macarronada, um bolo de cenoura ou aquele pudim... Esse tipo de comida, que mexe com as mem�rias e traz a sensa��o de bem-estar, de ser cuidado, ganha cada vez mais adeptos no mundo. E ela tem o poder de aflorar lembran�as e momentos �nicos, que podem ser um jantar com o namorado, um piquenique com os amigos, o almo�o de domingo em fam�lia ou mesmo aquele caf� da manh� que, definitivamente, marcou o sabor de uma viagem. Tudo isso integra o movimento comfort food, ou “comida confort�vel”, que � uma esp�cie de rever�ncia �s coisas mais simples da vida. E n�o significa que ela tem de ser saud�vel. A �nica obriga��o � de se emocionar.

E voc�, qual � o seu prato, a comida que lhe permite voltar no tempo? Aquele que s� de imaginar a boca enche de �gua e as papilas gustativas se alvoro�am? O Bem Viver hoje decidiu discutir o quanto o prazer de comer marca e � importante para a constru��o, n�o s� do paladar, mas da alegria de viver. Descobrir o poder da comida que faz voc� feliz contrapondo esse tempo de dietas, de todo tipo de restri��es, fast food, gourmetiza��o, culto � magreza, enfim, anos em que o ato de ser alimentar � cheio de regras e patrulhas.

O comfort food surgiu em contrapartida � mecaniza��o no preparo e � forma de consumir alimentos. Comer r�pido demais pode n�o ser saud�vel e trazer desconfortos, assim como n�o prestar aten��o na comida e no pr�prio ato de se alimentar. O prazer de comer requer tempo, experi�ncia apraz�vel e car�ter sensorial.

A personal organizer Mariana Oliveira de Faria revela que sua rela��o com a comida nem sempre foi muito saud�vel. “Lembro-me de ser insatisfeita com o meu corpo/peso desde o in�cio da adolesc�ncia (mesmo n�o estando acima do peso nessa �poca) e de fazer dietas desde ent�o. Nos �ltimos 10 anos, tive um ganho de peso consider�vel e identifiquei que ele est� muito ligado a uma ‘fome emocional’, que acredito ter seu gatilho em situa��es de estresse, cansa�o, t�dio e tristeza para preencher algum vazio emocional. Mas gosto sim de comer, � uma fonte de prazer. Vivi muito tempo entre a restri��o (provocada pelas dietas) e impulsos alimentares e hoje busco o equil�brio. Tenho buscado comer de maneira mais saud�vel, focando na qualidade dos alimentos.”

Mariana diz que agora, ao se alimentar, busca justamente um conforto, principalmente quando � uma comida especial, de fam�lia, que traz um acolhimento. “A comida traz conforto, mas � preciso dosar e estou aprendendo.” A personal organizer tem bem vivos na mem�ria os pratos que a emocionam: “O p�o de queijo e o bolo de cenoura feitos pela minha m�e. Como boa mineira, adoro p�o de queijo e para mim n�o existe no mundo um melhor do que o dela. Tem aquela sensa��o de estar em casa, sabe? Morei alguns anos fora de Minas e longe da minha fam�lia e esse p�o de queijo era como ter um pedacinho de casa (pois muitas vezes ela fazia e congelava e, quando me visitava, levava para eu poder comer depois). J� o bolo de cenoura tem gosto de inf�ncia. At� hoje, quando ela faz me remete ao tempo em que eu era crian�a”.

ACOLHIMENTO

Essa comida que acolhe � t�o importante que, muitas vezes, quando encontramos algu�m chateado, triste, pensativo, � comum oferecermos um ch� quente, um p�o de queijo com cafezinho, uma bela fatia de bolo de chocolate... Oferta que significa o cuidado com o outro no sentido de acarinhar, de tornar o dia melhor. Para Mariana, “essa oferta � sim um cuidado, um acolhimento. Prova disso � que, geralmente, as melhores lembran�as das nossas av�s est�o relacionadas � comida. Aquele carinho de sempre fazerem o que mais gostamos, de ficarem felizes e satisfeitas de nos ver comendo algo que prepararam com tanto amor”.

Por isso, muitas vezes, as regras atuais e a “ditadura” da alimenta��o baseada no que pode e n�o pode tira o prazer de comer. H� quem tenha, realmente, uma alimenta��o ruim, desregrada, mas tamb�m quem ficou ref�m de exageros ditos “saud�veis” e esquecendo de se agradar, de ter alegria, de sentir o gosto: “Acho que est� tudo muito radical. As pessoas s� est�o enxergando a fun��o de nutrir da comida e se esquecendo de todas as outras (social, conforto etc.). A cada hora surge algum alimento milagroso ao mesmo tempo em que outro � demonizado e o mundo passou a ser dividido em alimentos bons e ruins, nos deixando cada vez mais confusos e nos obrigando a abrir m�o do prazer de comer. Como se comer focando s� no prazer em certos momentos fosse totalmente errado. Acho que precisa haver um equil�brio”.

Consciente de que ter prazer na vida � fundamental, Marina revela o prato que cativa e cria mem�ria: “N�o sou de cozinhar, n�o tenho muita pr�tica, mas me saio melhor com os doces. O meu brigadeiro faz sucesso em casa e o petit gateau � certeiro nos jantares preparados com os amigos. At� tento inovar (geralmente, fico respons�vel pela sobremesa), mas ele � o mais pedido... E n�o � dif�cil de fazer, como todo mundo pensa!”.

Resgatar o real sentido da vida
O que determina a escolha dos seus pratos? Quem segue o movimento comfort food privilegia a comida que, de alguma forma, o conecte a um plano emocional que gere afeto e conforto


Juliana Nakabayashi, nutricionista, lembra que apreciar uma refeiçãotranquila nos devolve a simplicidade da vida(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Juliana Nakabayashi, nutricionista, lembra que apreciar uma refei��otranquila nos devolve a simplicidade da vida (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

“O comfort food surgiu desde que o homem � homem e que comida � comida. Apenas ganhou um nome chique nos �ltimos anos. N�o � oposi��o a nada. Est� presente em n�s, j� que � medida que crescemos alguns alimentos passam a representar algo muito especial e forte. Pode ser o cheiro, o sabor, o ambiente, quem prepara ou tudo isso junto. E isso gera emo��es e sensa��es agrad�veis. Sabe quando voc� sente aquele cheiro de arroz refogando ou bife passando e imediatamente volta no t�nel do tempo e recorda a comida da sua m�e?”, assim Juliana Nakabayashi, nutricionista e nutricoach, define a comfort food e procura, em seu trabalho, agir ajudando as pessoas a comer seus comfort food sem medo, por�m, com aten��o. Ela destaca que o alimento funciona como um fixador psicol�gico no plano emocional e, dessa forma, comer certos alimentos nos conecta a determinado local ou a quem os preparou. Ou seja, o ato de comer cristaliza estados emocionais, gerando afeto e conforto.

Por outro lado, a nutricionista enfatiza que comida que conforta n�o � sin�nimo de comida de verdade. O comfort food pode ser um alimento natural/caseiro ou n�o. O bombom Sonho de Valsa pode ser especial para algu�m. Qualquer comida. Esse termo n�o foi usado para separar os alimentos entre saud�veis dos n�o saud�veis. Ele � usado mais para dizer sobre o afeto, o bem-estar e a sensa��o que a comida gera na pessoa.

Hoje, com um ritmo de vida alucinado, fica mais evidente a busca por acolhimento por toda parte e acaba sendo natural procur�-lo tamb�m na comida: “Num mundo em que a vida anda no piloto autom�tico e repleta de exig�ncias, apreciar uma refei��o simples, em que o card�pio � uma comida mineira feita no fog�o a lenha, nos devolve a simplicidade da vida. O mesmo serve para aquela broa de milho acompanhada de um caf� rec�m-coado e feito com tanto mimo pela vozinha querida. Ent�o, diria que a busca � pelo resgate do real sentido da vida por meio dos sabores e aromas”, enfatiza Juliana Nakabayashi.

Nesse universo, imagina-se que h� uma liga��o entre o comfort food e o mindful eating. Para Juliana Nakabayashi, “n�o h� uma rela��o direta, mas est�o interligados e levam ao mesmo prop�sito que � comer apreciando o alimento sem julg�-lo (gordo, fit, light) e respeitando as vontades e necessidades do corpo. O mindful eating (comer consciente) � um estilo de vida em que a pessoa est� atenta e presente enquanto se alimenta. J� o comfort food (comida que conforta) � o alimento que propicia bons sentimentos, boas recorda��es. � uma comida que faz voc� se sentir viva e bem”.

BUDISMO

Juliana Nakabayashi alerta que n�o existe card�pio comfort food. “O termo comfort food � apenas para dizer que existem comidas que confortam e aconchegam. E tem um fato importante. Muitas dessas comidas s�o cal�ricas e, por isso, h� pessoas que est�o deixando de comer. Isso � um problema, j� que elas deixam de apreciar o que faz bem ao cora��o e � alma delas.” A nutricionista lembra que, caso a pessoa seja exagerada ou compulsiva, ela n�o precisa cortar esses alimentos e, sim, aprender a consumi-los de forma consciente. “� a� que o mindufl eating pode ajudar, evitando que a pessoa saia comendo no autom�tico. Ela ter� o apoio e aprender� a comer com mais calma, sentindo o sabor, observando se est� satisfeita ou n�o. Gosto muito da frase da nutricionista Sophie Deram: ‘Coma de tudo, n�o tudo’”.

Para Juliana Nakabayashi, h� alimentos espec�ficos que carregam a caracter�stica de ser “confort�vel”: “Normalmente, s�o os doces, quitandas e comidas t�picas: como frango com quiabo ou tutu de feij�o com lombo de porco. Mas pode ser qualquer outra comida e bebida. At� o chazinho que a av� fazia quando algu�m estava doente � um comfort food. Assim como a goiaba apanhada no p�”. E a nutricionista revela qual � a sua lista comfort food: “S�o muitos! Amo pipoca desde antes de nascer, assim como milho cozido, arroz, bife, batata frita, bolo com caf� � uma paix�o e, claro, tem o brigadeiro tamb�m. Minha m�e � doceira profissional e eu comia muitos doces na inf�ncia e adolesc�ncia”.

A nutricionista destaca que o comfort food n�o � o advers�rio da comida gourmet e nem da comida fitness, apesar de as pessoas radicais e r�gidas na alimenta��o acharem isso. “Ele � apenas um termo para dizer que tem comidas que confortam e que est� tudo bem eu comer com equil�brio. Importante dizer que num mundo em que comer est� com tantas regras, as pessoas que seguem uma alimenta��o baixa em calorias ou que retiram algum nutriente (como gorduras ou carboidratos) acabam n�o se permitindo comer seus comfort food. E, quando o fazem, sentem culpa, raiva, frustra��o. H� estudos que mostram que dietas restritivas engordam em vez de emagrecer. E que apenas 5% das pessoas que fazem dieta mant�m o peso eliminado. Ent�o, baseada na alimenta��o intuitiva e consciente, ela deve ser variada e pode, sim, conter tanto os naturais (hortali�as, legumes e frutas) quanto doce, massa ou quitanda. � achar o equil�brio entre eles. Criar terrorismo nutricional n�o � o caminho para uma nutri��o saud�vel. O melhor caminho � o do meio, assim como ensina a filosofia budista.”

Rela��o ancestral
A comida afeta o emocional de diversas formas, para o bem e para o mal. � poss�vel comer e se sentir culpado, como tamb�m (re)viver momentos felizes, de prazer, uma experi�ncia inesquec�vel


"De prefer�ncia, o comfort food n�o precisaria ser nomeado nem criado como uma pe�a de mercado, mas algo que faz parte do conv�vio social e familiar, que nos leva � cozinha, traz boas lembran�as e promove bons encontros" - Adriano Sim�es Coelho - psiquiatra (foto: Euler J�nior/EM/D.A Press)

Qual a import�ncia em ter uma boa rela��o com a comida? O psiquiatra Adriano Sim�es Coelho afirma que � fundamental porque ela � ancestral, uma rela��o da qual n�o podemos fugir e que a cada dia est� mais cercada de mitos e medos. “Durante s�culos, a humanidade come�ava o dia pensando o que conseguiria para comer e se teria comida dispon�vel. Hoje, boa parte da popula��o mundial acorda pensando no que deve evitar comer ou o que sup�e que n�o deveria comer. Em determinada fase, principalmente em fam�lias que tinham disponibilidade de alimentos e viviam ao redor de um n�cleo familiar, reuniam-se ao redor da mesa para compartilhar suas vidas, o cotidiano e outras quest�es. Os alimentos faziam parte daquele processo de comunh�o, o tempo que as pessoas usavam para se nutrir era tamb�m o tempo em que a fam�lia se reunia.”

Isso ocorreu em grande parte do s�culo 20 e mais significativamente a partir dos anos 50, principalmente, nas fam�lias mais abastadas dos grandes centros, com o uso de produtos mais frescos, encontrados nas feiras e menos industrializados. No entanto, explica Adriano Sim�es Coelho, nessa mesma �poca verifica-se uma grande evolu��o na tecnologia alimentar e aumento progressivo na disponibilidade de alimentos, cada vez mais processados e ultraprocessados. Ocorre tamb�m uma demoniza��o do uso da gordura animal e o aumento da disponibilidade de alimentos ricos em a��cares e carboidratos em geral. Nos anos posteriores, percebe-se uma explos�o de obesidade pelo mundo, tornando-se um problema de sa�de p�blica mais s�rio do que a subnutri��o e a desnutri��o, essas mais relegadas a pa�ses e regi�es com grandes n�veis de pobreza e crises pol�ticas e econ�micas graves.

Sem falar, destaca o psiquiatra, da acelera��o da urbaniza��o surgindo uma vida mais ca�tica e mudan�as nos processos de trabalho. “Surge ent�o uma nova rela��o com o alimento, muito menos org�nica e natural. Agora, � preciso se preocupar com o que se come, como se come, quanto se come. De uma rela��o natural com o h�bito de se alimentar passa-se a viver uma rela��o artificial. O alimento � visto como amea�a e como um risco � sa�de. As dietas e seus modismos tornam-se cada vez mais frequentes e, paradoxalmente, quanto mais a popula��o se preocupa com o que come e como come, mais aumenta a incid�ncia de transtornos alimentares e obesidade.”

O alerta de Adriano Sim�es Coelho � para quando essa rela��o se torna preocupante e at� mesmo uma doen�a. Isso ocorre “quando passamos a n�o comer com naturalidade, quando o alimento deixa de ser fonte de prazer e torna-se uma amea�a, no momento em que a pessoa passa a comer n�o porque est� com fome, mas quando a comida serve para aliviar a raiva, frustra��es ou trazer conforto para ang�stia e tristeza. Tudo isso s�o sinais de alerta”. Para ele, na hora em que se pensa em uma primeira dieta h� uma boa chance de que isso se torne um mau h�bito para toda a vida. “Comer depressa, n�o saborear o alimento, n�o prestar aten��o ao que se come, sentir-se mal ap�s comer, classificar e estar sempre preocupado com o que se come podem ser avisos de que algo n�o vai bem.”

EMOCIONAL x MERECIMENTO


Adriano Sim�es Coelho afirma que a comida afeta o emocional das pessoas de diversas formas, para o bem e para o mal: “Podemos comer e nos sentir culpados, a comida pode nos remeter a momentos felizes e de conforto, pode ser s� uma fonte moment�nea de prazer, pode fazer parte de um momento cultural ou de uma grande experi�ncia inesquec�vel. A verdade � que da comida n�o escapamos, sem ela n�o existimos e, por isso, temos que ter com ela a rela��o mais saud�vel e prazerosa poss�vel”.

Na an�lise do psiquiatra, vale questionar por que o comfort food ganhou relev�ncia nos dias de hoje: “Talvez o mais triste � ele ter tanta import�ncia. O que demonstra certo distanciamento das origens e que, de certa forma, algo que poderia ser natural retorna muitas vezes para preencher vazios. E da� j� se criam categorias que remetem ora a tempos bem vividos, que parecem falar de algo que j� n�o se vive mais, ou que � preciso uma certa mudan�a de rota, de h�bitos e at� da promo��o de facilidades, em busca de um suposto prazer e conforto, um merecimento”.

Na concep��o de Adriano Sim�es Coelho, quando se fala em comfort food, relaciona-se com comida nost�lgica, em que h� um desejo de manter identidade e v�nculos com aquele alimento de sua origem. As comidas de indulg�ncia remetem a algo que conforta e que significa um certo “p� na jaca”, no qual o prazer � o objetivo principal. As comidas de conveni�ncia facilitam a vida pelo seu preparo e obten��o f�ceis, e as comidas que causam conforto f�sico, que a sua composi��o traz sensa��es prazerosas e de bem-estar. No final, todos esses par�metros se misturam e fica dif�cil fazer uma identifica��o clara entre eles. Para o psiquiatra, se o comfort food vem para ocupar o espa�o de emo��es negativas pode ser um sinal n�o favor�vel, mas se � usado para remeter a momentos de prazer, para trazer boas lembran�as, aconchego, encontros e inserida em contextos sociais positivos tem uma grande possibilidade de ser algo bom e recomend�vel. “De prefer�ncia, o comfort food n�o precisaria ser nomeado nem criado como uma pe�a de mercado, mas algo que faz parte do conv�vio social e familiar, que nos leva � cozinha, traz boas lembran�as e promove bons encontros.”

 

Conforme Adriano Sim�es, de tanta regra, o prazer de comer tem ficado em segundo plano para milhares de pessoas: “E algumas apresenta��es desses padr�es alimentares remetem a uma certa contemporaneidade do transtorno obsessivo-compulsivo, em que a sa�de excessiva e a beleza passam a ser doen�a. A preocupa��o patol�gica com o corpo e com a imagem, a obsess�o com alimentos saud�veis, s� que em sua maioria sem embasamento algum e muitas vezes orientado por profissionais pouco habilitados ou que atuam de maneira pouco �tica. Atitudes que, quando se tornam uma preocupa��o excessiva, s�o sinais sugestivos de transtornos ps�quicos”.

LUGAR DE AFETO

Para Adriano Sim�es, entre v�rios outros problemas, um pa�s e um mundo em que o culto � imagem tomou dimens�es patol�gicas fica cada vez mais dif�cil perceber equil�brio e par�metros saud�veis nos h�bitos alimentares e nas preocupa��es est�ticas de parte da popula��o que tem esses valores como parte intr�nseca de suas vidas. “Na maioria dos casos, percebem-se exageros, cren�as infundadas e equ�vocos na procura por padr�es, em sua maioria, inating�veis. Em muitos casos com danos significativos para sa�de f�sica e mental.”

O alerta de Adriano Sim�es � que as pessoas precisam usar mais o c�rebro para se alimentar melhor. Investir na chamada comida de raiz, aquela que � encontrada na feira: frutas, verduras, vegetais, prote�na animal, arroz, feij�o, ovos, l�cteos etc. “Evitem alimentos muito processados. E n�o � conveniente posi��es r�gidas, evitar algo pouco saud�vel, mas que se deseja, n�o significa n�o poder comer. Na verdade, a restri��o costuma ser o primeiro passo para o desequil�brio. O equil�brio no h�bito alimentar � o melhor caminho. Mas � preciso saber que, quando o perdemos, o caminho para reencontr�-lo e �rduo e frequentemente malsucedido. Por isso, � preciso desde cedo cuidar da alimenta��o, nunca com uma abordagem excessivamente neur�tica e restritiva. A comida jamais deve ser uma amea�a, mas um lugar de afeto, encontro, prazer e equil�brio.”

 

Para a nutricionistae chef Pâmela Archibusacci Sarkis, a comida confortável é aquela feita com cuidado, carinho, que seja gostosa e que dê saciedade(foto: Túlio Santos/EM/D.A Press - 1/2/18)
Para a nutricionistae chef P�mela Archibusacci Sarkis, a comida confort�vel � aquela feita com cuidado, carinho, que seja gostosa e que d� saciedade (foto: T�lio Santos/EM/D.A Press - 1/2/18)
Momento de comunh�o

 

Para a nutricionista P�mela Archibusacci Sarkis, cada pessoa com certeza vai associar ao que mais gosta hoje ou ao que mais gostava antigamente ao definir o comfort food. “Eu, particularmente, lembro-me bem do macarr�o com molho de tomates com frango e salsicha da minha bisav� quando ela era viva. �amos a fam�lia todos os domingos lanchar l� e sempre tinha a famosa macarronada. Hoje, o que � confort�vel para mim? Uma comida �s vezes nem t�o leve, mas saud�vel, feita com cuidado, carinho, que seja gostosa e que me d� saciedade, aguce sentidos, traga conforto primeiramente na boca, sensa��o de prazer, e depois saciedade sem peso, prostra��o. Toda comida que remete a esse conceito, normalmente, tem alto valor cal�rico, ent�o o segredo � moderar na quantidade.”

Para P�mela, “as papilas gustativas s�o c�lulas muito sens�veis e quando degustamos algum alimento assim, com calma, traz a sensa��o de conforto e felicidade. A digest�o do carboidrato come�a na boca, e quando liberamos a saliva que cont�m a enzima amilase salivar, ativamos a digest�o. Quanto mais mastigamos, mais doce o carboidrato fica, pois o amido se quebra em mol�culas menores e o produto final � a glicose, que � doce. A gordura preenche os espa�os entre as papilas gustativas, formando um veludo dentro da boca. Qual o alimento perfeito para essa sensa��o? Nem preciso falar que � o chocolate...”.

(foto: Arquivo Pessoal)
(foto: Arquivo Pessoal)
RECEITA

Alm�ndegas de salm�o com ab�bora


P�mela Archibusacci Sarkis escolheu compartilhar uma receita vers�til para despertar seu paladar. “O salm�o � um peixe bastante gorduroso que provoca a sensa��o de saciedade, � f�cil de encontrar, saud�vel e pode ser servido sozinho assado para quem quer um petisco, s� com molho de tomates ou espaguete de pupunha, para quem quer a vers�o low carb, ou com espaguete comum para quem quer uma boa macarronada! .

Ingredientes:


500g de salm�o processado sem pele (processar no processador), 1 colher de sopa de semente de chia (para dar liga), 1 x�cara de ch� de ab�bora-moranga ralada (para dar volume e fibras), 1 colher de sopa de aveia em flocos finos (para dar liga), 1 cebola picada 1 colher de ch� de azeite 1 colher de ch� de sal 2 dentes de alho amassados cheiro verde e pimenta-do-reino a gosto .

Preparo:

Coloque o azeite na frigideira antiaderente e refogue a cebola com alho e sal. Quando esfriar, coloque em uma tigela grande. Misture o salm�o processado, ab�bora, chia, aveia, cheiro-verde e pimenta-do-reino. Fa�a bolinhas m�dias e leve para assar em tabuleiro antiaderente ou tabuleiro forrado com papel-alum�nio at� corar. Quando corar, sirva como quiser: bolinhas quentes ou frias, com molho de tomates, com pur� de batatas... da maneira mais confort�vel para voc� e sua fam�lia.

Viagem ao paladar
O ato de comer pode ser uma experi�ncia mais rica, principalmente ao compartilhar afetos e a companhia de familiares e amigos, resgatando h�bitos de saborear o alimento

Na m�sica N�o � proibido, Marisa Monte solta a voz enumerando del�cias que fazem parte do imagin�rio e do paladar de muitos: “Jujuba, bananada, pipoca. Cocada, queijadinha, sorvete. Chiclete, sundae de chocolate. Pa�oca, mariola, quindim, Frumelo, doce de ab�bora com coco, bala Juquinha, algod�o-doce, manjar”. Guloseimas que podem ser apontadas como comfort food, ainda que, como destaca a psic�loga Fernanda Berni, ela entenda o termo “como um novo nome para algo que j� existe, ou existiu e que deixou saudade: comida caseira, comida de m�e, de av�, aquela comida simples que cheirava pela casa, numa �poca em que a rotina era almo�ar em casa com a fam�lia... e com tempo suficiente. Tudo muito diferente do que se observa hoje no dia a dia das pessoas. Sem falar do excesso de ‘gourmetiza��o’ dos pratos, que est� na moda. No entanto, o que se v� durante a semana � a pressa determinar a escolha dos pratos. Quanto mais r�pido o preparo e o consumo, melhor! Mais adequado � correria em que temos vivido”.

Para a psicóloga Fernanda Berni, o ato de se alimentar, enquanto rotina, foi desprezando algumas qualidades sensoriais e tornando-se um ato mecânico(foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
Para a psic�loga Fernanda Berni, o ato de se alimentar, enquanto rotina, foi desprezando algumas qualidades sensoriais e tornando-se um ato mec�nico (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.A Press)

Por isso, para Fernanda Berni, o ato de se alimentar, enquanto rotina, foi desprezando algumas qualidades sensoriais e tornando-se um ato mec�nico, algo que simplesmente atende a uma necessidade fisiol�gica. “E assim foi perdendo, literalmente, o gosto! N�o s� o gosto, mas tamb�m o cheiro, o prazer. E tornando-se uma experi�ncia pobre de significados.”

Ent�o, destaca a psic�loga, vem o comfort food para tentar nos lembrar que o ato de comer pode ser uma experi�ncia mais rica, com mais conte�dos agrad�veis, com mais emo��o, com mais “sentido”. N�o estamos falando de produtos empacotados com prazo de validade. Estamos falando de resgate de mem�rias sensoriais e emocionais, de um tempo em que, apesar de menos acesso � informa��o, havia mais cuidado consigo mesmo. “Parece contradit�rio, n�o �? Hoje temos tantos recursos novos, tanta facilidade, e t�o pouco tempo para vivenciar as pr�prias experi�ncias. Quase n�o temos tempo nem para comer.”

GATILHOS

E se o comfort food est� ligado a mem�ria, enfatiza Fernanda Berni, ele fala de algo extremamente individual. “Fala da viv�ncia de cada pessoa e com todos os elementos que podem estar associados �quela experi�ncia passada, al�m da degusta��o em si. O gosto ou o cheiro da comida podem ser apenas gatilhos para recorda��es de momentos inteiros, incluindo ambientes, pessoas, afetos e tudo o que a recorda��o daquela cena possa representar para cada um. Enfim, o comfort food, assim como o slow living e outros movimentos do mesmo tipo que t�m surgido recentemente, parece expor que alguma coisa no nosso ritmo de vida precisa ser repensada. Ali�s, precisa e pode ser repensada.”

Categorias de comfort food e seus principais conceitos

» Comidas nost�lgicas:
aquelas identificadas a um per�odo e/ou lugar significativo na hist�ria individual do sujeito

» Comidas de indulg�ncia: aquelas capazes de despertar um sentimento de indulg�ncia no sujeito

» Comidas de conveni�ncia: aquelas f�ceis de ser obtidas ou preparadas

» Comidas de conforto f�sico: aquelas cuja composi��o f�sico-qu�mica � capaz de gerar uma sensa��o de bem-estar

* Fonte: Baseado em Locher et al (2005)/Maria Henriqueta Sperandio Garcia Gimenes-Minasse


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