
A arte do di�logo nunca foi t�o rara e necess�ria em tempos de polariza��o extrema. A pandemia do novo coronav�rus, em vez de unir as pessoas em prol de falas para o bem comum e proporcionar alinhamento de discursos – seja das autoridades e da sociedade para a seguran�a de todos –, acirra o desencontro de narrativas que levam o Brasil, novamente, para uma onda de desentendimentos e choques como se n�o falasse a mesma l�ngua. A ang�stia, para al�m do isolamento social e da quarentena imposta pela COVID-19, � perceber que parte dos brasileiros n�o tem essa percep��o. N�o enxergam o perigo de uma estrada sem di�logo.
A aus�ncia do di�logo � fatal para a conviv�ncia social. O incr�vel � que tudo partiu da seara pol�tica, espantosamente n�cleo fundado sob a �gide da fala e da escuta. Como entender? No entanto, � fato que al�m da falta de fala e da escuta no ambiente p�blico, a conversa e o ouvir tamb�m sofrem abalos que interferem no seio privado ao minar rela��es familiares, la�os pessoais e eliminar a empatia com o outro num momento crucial para o mundo, com milh�es de mortos diante de um inimigo invis�vel, desafiador e ainda sem controle. Sem di�logo, o conflito parece inevit�vel.
Padre M�rcio Paiva, professor e chefe do Departamento de Filosofia da Pontif�cia Universidade Cat�lica de Minas Gerais (PUC Minas) e p�roco da Par�quia Nossa Senhora Rainha, no Bairro Belvedere, ensina que, do ponto de vista da filosofia, ser � comunicar. “Tudo aquilo que �, tende a se deixar conhecer; tudo aquilo que � se deixa iluminar pela intelig�ncia humana e se torna algo comunic�vel. Portanto, na cultura atual, n�s vivemos um misto de progresso pelas tecnologias e, sobretudo, novas tecnologias da comunica��o. Elas potencializam tudo aquilo que � da vida humana. Diz�amos que o diz que me diz, a fofoca, a maledic�ncia, a cal�nia, tudo que n�o era, podia ser comunicado e ganhar ares de realidade. Com as novas tecnologias, as fake news fazem isso. Elas partem de um pressuposto que � para comunicar algo que n�o �.”
M�rcio Paiva chama a aten��o para algo perverso das fake news. Segundo o professor, elas fazem uso dos avan�os da neuroci�ncia e das t�cnicas da neurolingu�stica de tal forma que nem sempre o fato de n�o ser preparado, n�o ser inteligente leva a pessoa a aderir ou cair em uma fake news. Muitas vezes, at� um professor universit�rio se deixa conduzir por uma not�cia falsa. Por qu�? “Porque ela n�o tem interesse de tocar na verdade daquilo que �, mas ela desperta a emo��o do sujeito, sobretudo a indigna��o, e arrebata com o sentimento dele. Uma vez tocada na emo��o, �s vezes, a emo��o negativa, se d� a divis�o e a polariza��o que a sociedade atual vive. Neste sentido, a fake news faz um mal tremendo”, afirma.
Assim, padre M�rcio Paiva explica que a filosofia tem o papel de, como guardadora de lugares (do bem comum, da paz, da verdade), ter o discurso cr�tico para trazer � tona aquilo que �. N�o � por acaso que Arist�teles a chamava de “ci�ncia da verdade”. “Verdade em grego � aleteia, que significa n�o ocultamento. Portanto, a verdade � um processo constante de desocultamento, de desvelamento.” Agora, na sociedade em que vivemos, as comunica��es s�o t�o r�pidas a ponto de anular o lugar do di�logo. Ele costuma dizer que dialogar n�o � tanto buscar a raz�o, argumentar, ouvir o outro. � mais do que isso. “O exerc�cio mais origin�rio do di�logo � tentar entrar no horizonte do outro. E quando compreendemos o lugar de fala do outro, o horizonte do outro, n�s valorizamos o outro como o outro.”

"O mundo de hoje � de m�ltiplas linguagens, de tal modo que � preciso, � urgente, reaprender a dialogar, reaprender a reconhecer o outro”
Padre M�rcio Paiva,
professor e chefe do Departamento de Filosofia da PUC Minas
DESINTELIG�NCIA
Infelizmente, de fato, enfatiza M�rcio Paiva, na sociedade de hoje reina o que ele denomina de uma “esp�cie de desintelig�ncia”. Bastou ver algo nas redes sociais que � verdade, j� se toma uma posi��o e aquilo se multiplica: “Esta desintelig�ncia da rapidez dos bytes faz com que as pessoas n�o se entendam mais. O mundo de hoje � de m�ltiplas linguagens, de tal modo que � preciso, � urgente, reaprender a dialogar, reaprender a reconhecer o outro”.
O professor instiga: por que reconhecer o diferente � t�o dif�cil assim? “Em meio � diferen�a h� algo que nos une, que � a pr�pria humanidade, que � o fato de viver, de estar na mesma na��o, no mesmo pa�s, no mesmo ch�o, no mesmo tempo, numa mesma �poca. Ser� que isso n�o basta para nos unir?”
Para M�rcio Paiva, a desintelig�ncia leva as pessoas a tomarem atitudes muito r�pidas e precipitadas. E, por vezes, violentas. Segundo ele, a filosofia questiona e tem de questionar constantemente sobre a verdade dos fatos e das coisas. Com a diferen�a que n�o est� buscando poder ou manuten��o do status quo, mas ela � cr�tica. E com outra diferen�a, a filosofia n�o se fecha em um discurso ideol�gico.
Para o conv�vio saud�vel existir harmonicamente, � preciso que todos saibam n�o s� conversar, mas aceitar argumentos contr�rios, ouvir, mudar de opini�o, concordar ou discordar e seguir em frente, n�o evitando o conflito, mas sem perder a perspectiva de que opini�es diferentes, divergentes s�o salutares, ne- cess�rias. No entanto, diante do caos mundial causado pela COVID-19, a perversidade das not�cias falsas, a comunica��o violenta e falas carregadas de impaci�ncia, desconhecimento, aus�ncia de bagagem intelectual e cultural, somados � intoler�ncia e ao descaso ao direito do outro, fazem do di�logo na sociedade brasileira uma torre de babel, ningu�m se entende. Todos t�m perdido. Como sair deste imbr�glio?
� preciso aprender a ouvir de quem voc� discorda, n�o gosta ou desconfia. Marshall Rosenberg, psic�logo norte-americano e criador da comunica��o n�o violenta, disse que toda agress�o � uma express�o tr�gica de uma necessidade n�o atendida. Centrada no pr�prio umbigo, as pessoas decidiram se aconchegar perto de quem tem opini�es semelhantes e n�o se aproximar daquelas que pensam de forma contr�ria. A maioria n�o aceita ser contrariada na percep��o de suas vontades, desejos, quereres, ideias e ideais. Assim, com olhos e ouvidos fechados, todos caminham para o lugar da intransig�ncia, empacados em si mesmos. Pior para todo mundo. Um cabo de guerra sem vencedores e com v�rios feridos.
A fil�sofa, professora e escritora Marcia Tiburi, em seu livro Como conversar com um fascista – Reflex�es sobre o cotidiano autorit�rio brasileiro, de 2015, em um dos cap�tulos alerta: “(...) falamos muito e pensamos pouco no que dizemos. (...) Seguimos deixando de lado a potencialidade de compreender (...)”. E continua: “(...) Entre uma ilha e outra onde deveria haver pontes, h� todo tipo de escombros. (...) Como n�o conseguimos falar com o outro, falamos apenas para n�s mesmos, aumentando a tagarelice e a produ��o de lixo lingu�stico. Falamos para nossos pares. Conversamos o mais do mesmo com quem pensa como n�s. Isso acontece quando n�o somos contrariados, quando confirmamos o que j� sab�amos. Sa�mos felizes de uma conversa em que somos contemplados narcisisticamente porque o outro, com se espelho opaco, nunca nos apareceu”.
Neste cen�rio, com poder viral e de persuas�o, as not�cias falsas (fake news) s�o um dos grandes obst�culos e desafios para a atual sociedade. N�o h� uma comunica��o assertiva, principalmente, para lidar com a pandemia. A produ��o de not�cia falsa se transformou em um mercado alimentado por pessoas influentes, poderosas e de interesses escusos. Com grande dom�nio da tecnologia, este crime � protegido pela dificuldade de rastreamento de quem contrata o servi�o e de quem o executa. A legisla��o brasileira ainda n�o tem puni��o exclusiva. Est� no Senado o projeto de lei contra as fake news (PL 2.630/2020), mas o texto encontra diversas resist�ncias e ainda n�o foi votado.
Assim, a sociedade fica jogada � pr�pria sorte, com n�veis discrepantes de entendimento e percep��o do que � fato real e fato inventado. Determinado o caos, salve-se quem puder. O lado bom � que sempre h� um caminho, um desvio, uma esquina, um ponto de parada que jogar� luz sobre a verdade. Basta querer buscar, se dar ao trabalho de pesquisar, informar-se em fontes comprometidas com o direito � fala de todos e para todos.
Aus�ncia de debates entre amigos e familiares
Narrativas em desarmonia. � importante estar atento � confus�o entre conversar, dialogar, enfrentar as cr�ticas necess�rias e o ato de brigar ou destilar �dio ao outro quando se discorda. � preciso cuidar da palavra e da fala

O fracasso na comunica��o, a dificuldade de as pessoas engendrarem uma conversa saud�vel e profunda surge do desencontro entre as palavras. � a interpreta��o da psicanalista e escritora Inez Lemos ao apontar que vivemos uma guerra de discursos, falas dissonantes, narrativas em desarmonia. Talvez esse desastre ao nos expressar possa ser explicado, segundo ela, pela aus�ncia de debate entre amigos e familiares. H� uma confus�o entre conversar, dialogar, enfrentar as cr�ticas necess�rias, e o ato de brigar ou destilar �dio ao outro quando ele discorda ou nos critica.
Para Inez Lemos, o ato de as pessoas estarem sempre priorizando conversar no lugar de atacar precisa ser mais cultivado nos lares brasileiros. “Muitos jovens n�o suportam ser criticados, ficam ressentidos, magoados. O que revela a falta de treino, h�bito da boa arte de conversar. Versar sobre um assunto ou receber cr�ticas a uma atitude inadequada. O conflito � salutar, � ele que propicia o avan�o da reflex�o, sem ele ficamos estagnados, cristalizados na falsa cren�a de que estamos sempre certos.”
Conforme a psicanalista, a educa��o dom�stica que n�o exercita o debate na l�gica dial�tica – quando parte do princ�pio de que h� uma tese, uma ideia que deva ser checada, questionada, para, somente depois, a mesma se tornar verdadeira –, momento em que se faz a s�ntese, peca na consist�ncia de argumentos. Ela ressalta que, embora a verdade n�o deva ser vista como algo absoluto, uma vez que ela depende de v�rios fatores, o importante � criar, entre os filhos, o h�bito da boa conversa, o mecanismo de se questionar, como tamb�m ensin�-los a questionar o que leem. Principalmente em �poca de fake news.
Inez Lemos ensina que, quando a crian�a cresce num ambiente favor�vel �s cr�ticas, sem medo de debater, errar ou acertar, quando a perspectiva � a forma��o do pensamento cr�tico e consistente, haver� seres humanos mais seguros: “Gente que ter� mais facilidade em se defender dos falsos profetas, os impostores da p�s-modernidade”.
Contudo, para que essa pr�tica ocorra, ela recomenda aos pais inserirem os filhos no ato de ler desde cedo. O amor aos livros surge do h�bito da leitura. E esse acontece, geralmente, quando a crian�a presencia os pais envolvidos, cultuando litera- turas. Como, tamb�m, quando esses leem para os filhos desde crian�as. “O amor �s letras, ao contar hist�rias, � um aprendizado. Diz da cultura familiar. Como testemunhou Jorge M. Borges: ‘O maior acontecimento de minha vida foi quando descobri a biblioteca de meu av�’.”
A psicanalista enfatiza que muita coisa interessante pode-se fazer com as pa- lavras. Desenvolver o gosto em comentar as leituras, filmes, enfim, fam�lias que cultuam o ambiente das letras, da boa leitura com certeza estar�o educando futuros bons cidad�os e bons profissionais. Lendo, aprendemos a pensar, a escrever e a falar. Livros, filmes e teatros de qualidade s�o eternos ant�dotos ao obscurantismo, � ignor�ncia e � pr�tica do pensamento fraco, falso, equivocado. E que tanto tem feito mal ao Brasil. Ela sugere aproveitar o isolamento social e desenvolver nos filhos o h�bito de nutrir a alma com o simb�lico, abandonar a linguagem t�cnica e mergulhar nas met�foras liter�rias.

"O conflito � salutar, � ele que propicia o avan�o da reflex�o, sem ele ficamos estagnados, cristalizados na falsa cren�a de que estamos sempre certos”
Inez Lemos,
psicanalista
DESAFIOS DA SOCIEDADE
Por outro lado, Inez Lemos lembra que a comunica��o com a sociedade, em qualquer regime pol�tico, sempre foi um desafio por se tratar de mat�ria que envolve interesses divergentes. “Dif�cil haver uma hegemonia, mas sempre teremos que descobrir formas de questionar, pesquisar e refletir sobre as narrativas, os discursos que tentam nos dirigir. A �nica estrat�gia de nos defender de discursos manipulados, desonestos, sem �tica e carregados de interesses privados, que fogem dos interesses da comunidade envolvendo aspectos p�blicos, � por meio de estudos.”
A psicanalista alerta que a sa�da � estudar, educar, questionar, refletir, pensar, repensar e elaborar. “Eis o caminho seguro contra as fake news, contra teorias conspirat�rias, falas equivocadas.” Ela refor�a a import�ncia n�o s� de combater as fake news, como tamb�m despriorizar uma educa��o politizada, ampla, questionadora, democr�tica e comprometida com os interesses da maioria. “Palavra, escrita, linguagem, mensagem – s�o elas que nos fazem, nos formam e nos marcam desde pequenos. O que refor�a a import�ncia de os pais cuidarem das palavras, do que vai dizer ao filho, do que o deixa ouvir, ver, sentir. Somos um pouco disso tudo, s�o essas impress�es que nos comp�em. Se queremos educar bem um filho, uma na��o, devemos cuidar das palavras, das escritas e das falas.”
Guia pr�tico
Como conversar com quem pensa muito diferente de voc�?
1 – Escute atentamente, sem interromper: O que nem de longe significa concordar com a opini�o do outro. Escutar � uma habilidade essencial para bons di�logos. Treine olhando nos olhos, sem mexer no celular ou fazer express�es de desd�m. Caso seja interrompido em sua vez, pe�a com gentileza e firmeza para que o outro aguarde voc� finalizar seu ponto
2 – Rebobine a fita: Ap�s escutar a outra pessoa, experimente dizer o que interpretou ter sido a fala dela e cheque se � isso mesmo que ela quis expressar, antes de avan�ar com sua resposta. Assim, evitamos assumir o que o outro quis dizer e eliminamos ru�dos desnecess�rios. Isso mostra que prestamos aten��o e que h� real interesse numa conversa de qualidade.
3 – Elogie seu opositor quando fizer sentido: Valorize os pontos nos quais concorda com a outra pessoa. Um territ�rio em comum, por menor que seja, enfraquece a no��o de que s�o inimigos mortais. Mas evite elogios excessivos. Isso pode criar a impress�o de que est� tentando manipular a outra pessoa.
4 – Tente compreender e validar as necessidades centrais da outra pessoa: Fazer perguntas � um �timo jeito de fazer isso. Segue um exemplo pr�tico: “Ent�o, voc� est� tentando dizer que igualdade salarial entre homens e mulheres � o ponto central de nossa conversa para voc�?”
5 – Antes de responder, respire: Di�logos construtivos s�o mais como cerim�nias de ch� e menos como uma partida de t�nis. � normal respirarmos de modo mais curto e tenso em conversas duras. Respirar oxigena seu corpo e oferece tempo para escolher as palavras.
6 – Evite ironias, sarcasmo e linguagem corporal fechada: Quanto mais fechado e agressivo voc� fica, mais a outra pessoa tende a acompanhar esse comportamento.
7 – Assuma responsabilidade por suas emo��es: “Eu me sinto assim quando voc� age de certa maneira” � bem melhor do que “voc� fez que com que eu me sentisse assim”. Na primeira frase, voc� assume que a emo��o � sua. Na segunda, voc� culpa e acusa o outro.
8 – N�o tenha vergonha de falar n�o sei: Voltar atr�s quando necess�rio e fazer perguntas bobas: quando temos coragem de nos colocar vulner�veis, a tend�ncia da outra pessoa a agir parecido � maior.
9 – As pausas s�bias: Caso o di�logo se torne agressivo demais ou pouco construtivo, considere seguir a conversa em outro momento. Assuma que n�o est� bem, pe�a desculpa e diga que seria melhor dialogarem em outras condi��es. Sugerir uma nova data, se daqui a uma hora ou daqui alguns dias.
Habilidades e atitudes
que todos podem treinar
1 – Desenvolver mais equil�brio emocional
2 – Comunicar de modo menos violento
3 – Cultivar empatia pelo outro
4 – Evitar posturas radicais
5 – Pedir desculpas quando for agressivo
6 – Estudar e melhorar os seus argumentos
7 – N�o ter vergonha de admitir que n�o sabe algo e fazer perguntas
FONTE: Pesquisa feita pelo Instituto Avon e o site Papo de Homem em todas regi�es do pa�s para diagnosticar os maiores obst�culos dos brasileiros na hora de interagir com outras pessoas quando o assunto � g�nero. No entanto, as pondera��es s�o v�lidas para qualquer conversa, sobre qualquer assunto.
Argumenta��o propositiva
Not�cias falsas sempre foram produzidas pela sociedade. A distor��o de fatos e a desinforma��o s�o, historicamente, uma postura dos seres humanos para desestabilizar e desorganizar a vida coletiva

O debate sobre a responsabiliza��o dos que criam e propagam not�cias falsas est� em pauta no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no Supremo Tribunal Federal e no Congresso. Enquanto o Brasil aguarda a decis�o final, a sociedade tem de lidar com as fake news assustadoramente quando se trata da sa�de, das informa��es reais e mentirosas a respeito do novo coronav�rus. Ricardo Castro, psic�logo e professor do curso de servi�o social da Est�cio, antes de mais nada, lembra que sem uma comunica��o assertiva, s�ria, compromissada e com argumentos embasados nas inst�ncias refer�ncias para o combate � pandemia, tenderemos a fracassar no enfrentamento � COVID-19. “A comunica��o deve ser clara, precisa, transparente e embasada t�cnico-humano-cientificamente para que possamos garantir o fim dessa experi�ncia terr�vel para toda a sociedade, garantindo um maior n�mero de sobreviventes.”
Ricardo Castro refor�a que a possibilidade de falar e ser ouvido e, consequentemente, construir uma rela��o de troca com as outras pessoas � constituinte da condi��o humana. Somos seres de linguagens e, dessa forma, o di�logo, compreendido enquanto troca de ideias, conversa��o e intera��o, � fundamental para que possamos manejar conflitos, antagonismos, diferen�as e, tamb�m, conex�es, aproxima��es e consensos. “O di�logo � um dispositivo central na solidifica��o de uma sociedade democr�tica, uma vez que ele potencializa o movimento dos pensamentos, das ideias, das reflex�es, das cr�ticas e das autocr�ticas.”
Em momentos de crise t�o severos, como esse da COVID-19, o di�logo, sobretudo, informacional, � de extrema import�ncia porque ele ganha, neste contexto, um status preventivo e educador. “Em casos emergenciais, com a amea�a do novo coronav�rus, as divulga��es informacionais das condi��es da vida real das popula��es s�o importantes para que os �rg�os respons�veis tomem medidas mais eficazes de preven��o e combate e para a conscientiza��o da popula��o.”
Longe de ser, apenas, conversas casuais, as trocas humanas, diante de uma pandemia, ganham um car�ter de produ��o da vida. Ele lembra que o caos j� est� instalado no mundo. N�o h� como fugir. A fala, o di�logo e as conversas devem servir para que todos encarem a realidade, evitando o negacionismo, mas, atentando-se para como � poss�vel ultrapassar essa hist�ria seguindo todos os cuidados individuais e coletivos necess�rios.

Para viver em coletivo n�o � preciso que n�s pensemos iguais, mas � preciso que possamos encontrar eixos comuns respeit�veis para que possamos exercer a nossa diferen�a na mesma sociedade”
Ricardo Castro,
psic�logo social, professor da Est�cio
FATOS HIST�RICOS
Na an�lise do psic�logo e professor, as narrativas negacionistas, revisionistas e relativistas de quest�es, problemas e situa��es humanas graves, importantes e marcantes s�o uma caracter�stica hist�rica da sociedade. Ele destaca que h� v�rios exemplos de fatos hist�ricos e contextos que tiveram as suas trag�dias diminu�das e/ou desconsideradas, sobretudo, por grupos e setores pol�ticos, econ�micos e religiosos que, por diversos motivos, tentam relativizar uma quest�o a ponto de banaliz�-la enquanto um problema da sociedade.
Ricardo Castro enfatiza que as not�cias falsas sempre foram produzidas pela sociedade. O fato � que agora, em fun��o dos processos da evolu��o da pr�pria l�gica comunicacional, que, ao longo dos anos, tem facilitado o acesso, o consumo, a divulga��o, a cria��o e compartilhamento de informa��es por meio das m�dias virtuais, temos que lidar com a prolifera��o em n�vel global. “E � certo que, em um pa�s desigual como o Brasil e com um letramento digital ainda muito problem�tico, as pessoas consomem e divulgam not�cias falsas sem cr�tica e sem checar a qualidade das informa��es. No entanto, h� aqueles que sabem bem desse potencial desinformativo, mas, ainda assim, criam e divulgam com fins perversos de confundir e desinformar a sociedade, visando obter algum tipo de vantagem”, afirma.
O professor lembra que o conflito e o antagonismo s�o constituintes de qualquer sociedade onde se defenda a pluralidade de ideias e posi��es. O problema, em se tratando de Brasil, foi quando a diferen�a de posi��o come�ou a ser utilizada para a impossibilidade da conversa e n�o para fomentar uma disputa argumentativa em torno das distintas vis�es de mundo que existem.
Se pensamos, radicalmente, diferente, devemos ter a capacidade cr�tica de apresentar vis�es distintas e argumentar sobre elas. “Nos �ltimos anos no Brasil, o que houve n�o foi um aumento do conflito – que � constituinte da nossa hist�ria – mas uma naturaliza��o de polos opostos. Isto �, uma polariza��o pouco aberta ao crivo do argumento. Veja bem: para viver em coletivo n�o � preciso que n�s pensemos iguais, mas � preciso que possamos encontrar eixos comuns respeit�veis para que possamos exercer a nossa diferen�a na mesma sociedade.”
Para Ricardo Castro, a trag�dia brasileira atual � que temos negado o potencial transformador do argumento e da cr�tica para sustentar uma posi��o b�lica acusat�ria e pouco propositiva. “Acredito que o grande balizador de um bom posicionamento � a possibilidade de esse posicionamento estar aberto � cr�tica e � sua pot�ncia argumentativa. E para que uma comunica��o, de fato, ocorra, devemos partir do pressuposto de que o conflito e a diverg�ncia n�o s�o um problema por si s�.”
Como saber se uma not�cia � falsa?
1 – Fique com um p� atr�s com as tais correntes de WhatsApp, principalmente aquelas que n�o citam fontes.
2 – Checar informa��es em meios de comunica��o tradicionais. Use o Google. Se uma corrente de WhatsApp faz uma revela��o bomb�stica que n�o se encontra em nenhum ve�culo de comunica��o (jornais, sites ou revistas), talvez seja a hora de come�ar a desconfiar da veracidade da not�cia, n�o � mesmo? O mesmo vale para not�cia em blog ou site. Pesquise.
3 – Ficar atento � identidade do autor da postagem ou do texto que se est� lendo. Quem � essa pessoa? Para quem ela trabalha? O que � esse site ou blog para quem essa pessoa escreve? Ser� que esse ve�culo (blog, site) tem credibilidade?
4 – Fique atento �s datas. � comum not�cias que n�o s�o fakes, mas s�o antigas. Conv�m abrir a not�cia e verificar a data em que ela foi escrita. Isso pode evitar s�rios equ�vocos.
5 – Antes de compartilhar, checar. Voc� � respons�vel por aquilo que compartilha.
6 – Felizmente, h� gente disposta a combat�-las. H� ag�ncias que checam a veracidade das informa��es veiculadas na internet. Algumas delas:
» Fake Check: nilc-fakenews.herokuapp.com
» Ag�ncia Lupa: piaui.folha.uol.com.br/lupa
» Fato ou fake: g1.globo.com/fato-ou-fake
» Ag�ncia P�blica – Truco: apublica.org
» E-Farsas: www.e-farsas.com
Consequ�ncias das fake news
1 – Linchamento de inocentes (justi�a com as pr�prias m�os)
2 –Prejudica a sa�de p�blica (Ex: movimentos antivacina��o. Pessoas contr�rias disseminam not�cias falsas de que a vacina faz mal e criam resist�ncia, colocando a popula��o em perigo)
3 – Homofobia
4 – Preconceito
5 – Xenofobia
6 – Legitima��o da viol�ncia
7 – Propaga��o de mentiras difamat�rias
8 – No campo pol�tico, risco � democracia