(none) || (none)
Publicidade

Estado de Minas SEXUALIDADE FEMININA

Quem foi Marie Bonaparte, a princesa francesa pioneira em estudos sobre o orgasmo feminino

Ela pertencia � realeza e era extremamente rica, mas sua curiosidade e frustra��es a levaram a ser pioneira na pesquisa da sexualidade feminina %u2014 e disc�pula de Freud.


24/08/2021 12:00 - atualizado 24/08/2021 12:32

Marie Bonaparte nasceu em berço real, mas também foi uma mulher revolucionária(foto: Getty Images)
Marie Bonaparte nasceu em ber�o real, mas tamb�m foi uma mulher revolucion�ria (foto: Getty Images)

Para alguns, ela foi uma pioneira na sexualidade feminina; outros apenas a veem como uma mulher rica, com conex�es influentes.

O fato � que Marie Bonaparte (1882-1962), sobrinha-neta de Napole�o 1º, imperador da Fran�a, n�o passou despercebida na hist�ria do s�culo 20.

Ela era uma princesa interessada no orgasmo feminino e apaixonada pela psican�lise — se tornou aluna, amiga e at� salvadora de Sigmund Freud.

Mas, acima de tudo, Bonaparte era uma mulher "livre", dizem aqueles que estudaram sua vida.

Mas, afinal, quem foi esta mulher fascinante que se destacava no campo da ci�ncia, no mundo da realeza e que procurava respostas para o prazer sexual feminino?

A princesa

Marie Bonaparte nasceu em Paris em uma fam�lia rica e de renome.

Ela era filha de Marie-F�lix Blanc e do pr�ncipe franc�s Roland Napole�o Bonaparte, e neta do empres�rio e fundador do Cassino de Monte Carlo, Fran�ois Blanc, com uma grande fortuna.


Marie Bonaparte teve uma infância solitária e uma juventude rebelde(foto: Getty Images)
Marie Bonaparte teve uma inf�ncia solit�ria e uma juventude rebelde (foto: Getty Images)

Sua vida come�ou marcada pela trag�dia: ela quase morreu ao nascer e sua m�e faleceu um m�s ap�s o parto.

Sua inf�ncia foi complicada e solit�ria, sem a companhia de outras crian�as, com extrema devo��o ao pai, que era ge�grafo e antrop�logo, e um medo enorme da av� paterna.

Desde pequena, demonstrou curiosidade, tanto pela ci�ncia, quanto pela literatura, pela escrita e tamb�m pelo pr�prio corpo.

Um dia, "Mimau", uma das muitas mulheres que cuidavam dela, encontrou Marie se masturbando.

"� pecado! � um v�cio! Se voc� fizer isso, vai morrer!", disse ela, segundo a pr�pria Marie registrou em seu di�rio em 1952.

"Bonaparte afirma que abandonou a masturba��o clitoriana por volta dos 8 ou 9 anos por medo da advert�ncia de 'Mimau' de que a morte era o pre�o do prazer er�tico", escreveu Nellie Thomson em seu ensaio "A Teoria da Sexualidade Feminina de Marie Bonaparte: fantasia e biologia".


Seu papel de princesa não a impediu de realizar pesquisas sobre a sexualidade feminina(foto: Getty Images)
Seu papel de princesa n�o a impediu de realizar pesquisas sobre a sexualidade feminina (foto: Getty Images)

Desde muito jovem, ela se rebelou em aceitar um papel de submiss�o feminina.

Na adolesc�ncia, come�ou a estudar idiomas, como ingl�s e alem�o, e se saiu muito bem nos exames. Mas, de repente, sua av� e seu pai a proibiram de realizar as provas.

"Ela e Roland alegaram que os inimigos republicanos dos Bonaparte poderiam sabotar o exame em um esfor�o para humilhar a fam�lia. Marie exclamou: 'Malditos sejam meu nome, minha posi��o, minha fortuna! Droga, especialmente meu sexo! Porque se eu fosse um menino, n�o me impediriam de tentar!'", resgata Thomson do di�rio de Bonaparte.

Antes de completar 20 anos e em pleno despertar sexual, Marie Bonaparte teve um caso com um dos assistentes de seu pai, que era casado. Tudo terminou em esc�ndalo, chantagem e humilha��o para Marie.

Em pouco tempo, seu pai a apresentou a seu pretendente favorito para o casamento, o pr�ncipe Jorge (1869-1957) da Gr�cia e Dinamarca, que era 13 anos mais velho que Marie.

Eles se casaram em 12 de dezembro de 1907 em Atenas e tiveram dois filhos: Pedro e Eugenia.

Mas eles n�o viveram felizes para sempre.

Embora o casamento tenha durado 50 anos, Marie rapidamente percebeu que o verdadeiro v�nculo emocional de seu marido era com seu tio, Valdemar.


Marie Bonaparte se casou com o príncipe Jorge da Grécia e Dinamarca(foto: Getty Images)
Marie Bonaparte se casou com o pr�ncipe Jorge da Gr�cia e Dinamarca (foto: Getty Images)

Enquanto isso, ela procurava seus pr�prios amantes e vivia atormentada por sua frigidez.

Seus estudos proporcionaram a ela um ref�gio das dificuldades de sua vida.

A sexualidade feminina

O interesse de Marie Bonaparte pela sexualidade e pelo prazer feminino surgiu nesta �poca de apetite intelectual.

Em 1924, ela publicou o trabalho Notas sobre as causas anat�micas da frigidez nas mulheres sob o pseud�nimo de A. E. Narjani.

"Ela ficava frustrada com o fato de nunca ter tido um orgasmo durante a rela��o sexual", ou seja, por penetra��o, explica Kim Wallen, professor de neuroendocrinologia comportamental da Universidade Emory, na Ge�rgia, nos EUA.

"Ela n�o aceitava que o orgasmo nas mulheres pudesse ocorrer diretamente pela estimula��o do clit�ris", acrescenta o especialista � BBC News Mundo, servi�o de not�cias em espanhol da BBC.

Para Marie, o fato de uma mulher n�o conseguir ter orgasmo enquanto era penetrada era um problema de anatomia.

E por isso ela desenvolveu a seguinte teoria: uma dist�ncia menor entre o clit�ris de uma mulher e sua vagina aumenta a probabilidade de ter um orgasmo durante rela��es sexuais com penetra��o.

Para provar sua hip�tese, ela passou a compilar as medidas de mais de 240 mulheres na d�cada de 1920 em Paris.

Segundo o trabalho publicado sob o nome de Narjani, "os dados n�o foram compilados de forma sistem�tica, mas casualmente, quando uma mulher ia ao m�dico. Esta amostra foi divida em tr�s grupos de acordo com a dist�ncia entre o meato e o clit�ris, embora n�o descreva como foi feita essa divis�o", detalha Wallen, que junto a Elisabeth Lloyd estudou a obra de Bonaparte.

"Bonaparte tinha uma hip�tese interessante. Ela foi pioneira na teoria de que as mulheres s�o feitas de maneira diferente, e � por isso que elas tamb�m respondem de maneiras diferentes durante a rela��o sexual", diz Lloyd � BBC News Mundo.

Mas "sua teoria colocava todo o peso na anatomia da mulher, n�o dizia nada sobre maturidade psicol�gica, se ela era uma mulher plena, neur�tica, fr�gida, todos esses termos desagrad�veis que se usava para as mulheres naquela �poca", acrescenta a especialista.


Marie Bonaparte se tornou discípula de Sigmund Freud(foto: Getty Images)
Marie Bonaparte se tornou disc�pula de Sigmund Freud (foto: Getty Images)

Marie Bonaparte acreditava que se as mulheres fossem submetidas a uma opera��o para fechar essa separa��o em sua �rea genital, poderiam ter um orgasmo durante a rela��o sexual com penetra��o.

Mas n�o poderia estar mais equivocada.

"A cirurgia foi um desastre. Algumas mulheres perderam toda a sensibilidade. Marie Bonaparte acreditava fortemente em suas descobertas e se submeteu � cirurgia sem sucesso", conta Wallen.

E n�o apenas uma, mas tr�s vezes.

"Quando voc� corta muitos nervos ao redor do clit�ris, n�o vai ter mais resposta (sensorial), vai ter menos, porque est� cortando nervos muito importantes", explica Lloyd, que � professora de Hist�ria e Filosofia da Ci�ncia no departamento de biologia da Universidade de Indiana, nos EUA.

"Ela acreditava que a cirurgia era a �nica maneira de as mulheres terem orgasmo durante a rela��o sexual", acrescenta.

A rela��o com Freud

Maria Bonaparte n�o se deu por vencida e continuou buscando respostas para suas frustra��es sexuais e as dificuldades em sua vida.

Em 1925, ela viajou a Viena para se consultar com um psicanalista cujo nome estava apenas come�ando a circular nas rodas m�dicas parisienses: Sigmund Freud.

"Ela encontrou em Freud o que precisava desesperadamente, um novo 'pai' para amar e servir", diz Thompson em seu ensaio.


Marie Bonaparte foi paciente, aluna e amiga de Freud(foto: Getty Images)
Marie Bonaparte foi paciente, aluna e amiga de Freud (foto: Getty Images)

Marie Bonaparte virou sua paciente e logo depois sua amiga. Ela come�ou a se interessar pela psican�lise e tamb�m se tornou pupila de Freud.

"Ela foi uma das primeiras mulheres na Fran�a a estudar psican�lise, sobretudo com Freud", diz R�my Amouroux, professor de psicologia da Universidade de Lausanne, na Su��a, � BBC News Mundo.

"Freud gostava de sua companhia porque ela n�o era uma mulher perigosa nem uma acad�mica. Quando se conheceram, ele tinha quase 70 anos. E ela era uma mulher interessante, inteligente e rica, e discutia com ele", acrescenta Amouroux.

Marie Bonaparte se tornou uma figura importante na psican�lise em Paris e teve v�rios pacientes, em paralelo a suas atividades protocolares como princesa.

Com o passar dos anos, ela tamb�m salvou Freud das m�os e das armas dos nazistas, gra�as a suas manobras pol�ticas e financeiras, ajudando ele e sua fam�lia a escapar de Viena para Londres, onde ele terminaria seus dias.


Marie Bonaparte ajudou Freud e sua família a escapar dos nazistas(foto: Getty Images)
Marie Bonaparte ajudou Freud e sua fam�lia a escapar dos nazistas (foto: Getty Images)

"Aos 82 anos, deixei minha casa em Viena como resultado da invas�o alem� e vim para a Inglaterra, onde espero terminar minha vida em liberdade", disse Freud � BBC em uma entrevista em 1938.

Uma mulher livre

A maturidade profissional acabou levando Marie Bonaparte a contradizer seu estudo sobre a sexualidade feminina.

"Marie Bonaparte rejeitou por completo suas ideias originais. Publicou um livro em 1950, Sexualidade Feminina, em que se retratava de tudo sobre o estudo. L� ela diz que a anatomia n�o tem nada a ver e que tudo � psicol�gico. Naquela �poca, ela j� fazia psican�lise havia quase 25 anos", detalha Wallen.

Apesar da mudan�a de opini�o, o professor acredita que Bonaparte foi uma mulher revolucion�ria.

"Acho que seu estudo original foi not�vel", diz ele.

Para Lloyd, ela foi uma "figura fascinante".

"� uma das minhas hero�nas", mas n�o deixa de ser "um personagem tr�gico", avalia.

"Estava muito � frente de seu tempo em termos de teoria e compreens�o" sobre a sexualidade feminina, "mas era infeliz com seu pr�prio corpo", destaca.


Bonaparte era uma princesa extremamente rica, mas também foi uma mulher pioneira e livre(foto: Getty Images)
Bonaparte era uma princesa extremamente rica, mas tamb�m foi uma mulher pioneira e livre (foto: Getty Images)

O professor Amouroux, que durante v�rios anos se dedicou a classificar o arquivo de Marie Bonaparte em Paris, acha que ela foi "uma mulher incr�vel", ligada a todos os c�rculos liter�rios, pol�ticos e da realeza — e que conheceu todas as pessoas famosas do mundo da primeira metade do s�culo 20.

"Ela tamb�m foi uma figura interessante para questionar o feminismo. A forma de ver a sexualidade era muito patriarcal, porque estava convencida de que s� havia uma maneira de ter orgasmo", diz.

"Mas, ao mesmo tempo, ela era muito livre, desafiava Freud e era uma mulher complexa", conclui.

J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)