
Conhecida como "gripe espanhola", esta doen�a causou cerca de 25 milh�es de mortes — mas o n�mero real, segundo algumas estimativas, pode se de 40 a 50 milh�es.
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Ele diz que enquanto a guerra terminou em novembro de 1918, a gripe continuou a matar e causou mais mortes em todo o mundo do que o pr�prio conflito. "A vida parou completamente nos Estados Unidos e em muitos outros lugares ao redor do mundo. As pessoas n�o podiam ir � igreja ou se movimentar livremente, tinham que usar m�scaras, etc. Todas as coisas que associamos hoje � atual pandemia aconteceu em 1918, embora em escala diferente porque o pa�s era muito menos urbanizado na �poca."
A sociedade reagiu, ent�o, com um desejo tremendo de "voltar � normalidade", ideia que foi o slogan de campanha de Warren Harding, que venceu as elei��es presidenciais nos EUA em 1920.
"As pessoas queriam esquecer a guerra, a pandemia e suas terr�veis perdas, mas tamb�m queriam se divertir", diz Davis, que v� uma liga��o clara entre esses traumas e o surgimento dos m�ticos "20 anos", �poca associada ao jazz e � agitada vida noturna.
Pandemia e guerra provocaram uma mudan�a nas mulheres e na forma como a sociedade as percebia, pois para lidar com esses acontecimentos elas agora participavam de atividades produtivas, trabalhando em f�bricas, escrit�rios e hospitais. "N�o � por acaso que foi nessa �poca que a emenda que deu direito ao voto �s mulheres foi aprovada nos Estados Unidos", diz o historiador.

No caso dos EUA, esse duplo trauma trouxe consigo outras mudan�as pol�micas: o crescimento de adeptos do isolacionismo perante o mundo e o ressurgimento da Ku Klux Klan. "As pessoas achavam que as ideias perigosas, assim como a pandemia, vinham do exterior, por isso muitos queriam fechar o pa�s. Na verdade, havia pessoas que acreditavam que os alem�es causaram a pandemia como uma t�tica de guerra. Essa atitude se refletiu posteriormente em uma dura reforma imigrat�ria que restringiu a imigra��o europeia. Eles viam os imigrantes como perigosos, sujos e doentes ", diz Davis.
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Quanto � Ku Klux Klan, ele explica que sua ascens�o se deveu ao medo da popula��o de que os soldados afro-americanos que foram lutar na guerra na Europa voltassem ao pa�s exigindo mais direitos.
"O crescimento da Ku Klux Klan tamb�m foi impulsionado pela rejei��o de estrangeiros e imigrantes, pois havia um forte movimento nativista no pa�s que refletia a tend�ncia isolacionista", acrescenta.
Mas quais foram as principais mudan�as de sa�de que a pandemia de 1918 trouxe na vida das pessoas? Confira cinco h�bitos de sa�de que mudaram desde ent�o.
1. O uso de copos descart�veis
Antes da pandemia de gripe de 1918, era comum que pr�dios p�blicos nos EUA e esta��es de trem tivessem uma esp�cie de copo de metal conhecido como "concha de lata" que era usado para servir e beber �gua. Era o mesmo copo para todos, ent�o dezenas ou centenas de pessoas o usavam todos os dias.

Esse h�bito anti-higi�nico s� foi erradicado com a chegada da pandemia quando esses copos de metal foram substitu�dos pelos copos descart�veis %u200B%u200BDixie, que se tornaram onipresentes desde ent�o.
Embora tenham sido criados em 1907 e promovidos como forma de proteger a sa�de contra germes sob o nome de Health Kup, esses copos descart�veis n�o conquistaram os consumidores.
Com a pandemia eles foram renomeados como Dixie e promovidos agressivamente em propagandas como medida necess�ria para prote��o contra a doen�a. Desde ent�o, tornaram-se um sucesso que seria exportado para todo o mundo.
2. Cobrir a boca ao tossir e espirrar
O h�bito de cobrir a boca ou o nariz com len�o ao tossir e/ou espirrar foi outro h�bito de sa�de que se generalizou durante a pandemia de influenza.

"Tosses e espirros espalham doen�as" era um dos slogans adotado pelas autoridades de sa�de dos EUA durante a pandemia.
A mensagem foi impressa em cartazes alertando que tosses e espirros eram "t�o perigosos quanto uma bomba envenenada".
3. Evitar cuspir em locais p�blicos
At� a chegada da pandemia de gripe de 1918, cuspir em locais p�blicos era visto como um h�bito socialmente aceit�vel.

Embora por algumas d�cadas, gra�as �s campanhas contra a tuberculose, houvesse movimentos a favor de proibir essa pr�tica e mesmo em algumas cidades tenham sido aprovadas san��es, n�o foi poss�vel erradic�-la.
"Voc� era multado em US$ 1 se cuspisse no metr� de Nova York e tinha que comparecer a um tribunal. Em todo o pa�s, especialmente em lugares como Filad�lfia, onde a pandemia havia sido forte, havia cartazes em todos os lugares alertando que cuspir mata", diz Kenneth Davis.
O historiador lembra que naquela �poca muitas pessoas tinham o h�bito de mascar tabaco, por isso costumavam cuspir com frequ�ncia, mas que ap�s a pandemia muitas pessoas se conscientizaram de que cuspir em p�blico n�o era recomendado nem aceit�vel do ponto de vista da sa�de.
4. Ventilar os espa�os
Embora em 1918 os m�dicos come�assem a entender que havia certas doen�as que eram transmitidas pelo ar, Davis explica que ainda havia alguma confus�o sobre como isso acontecia.

"Se voc� estivesse em um bonde em uma cidade como Filad�lfia ou Nova York e estivesse frio, n�o ia querer abrir as janelas e, al�m disso, havia alguns m�dicos que recomendavam mant�-las fechadas porque temiam que os v�rus se espalhavam pelo ar [circulando]. E realmente era assim que acontecia, mas por causa da respira��o pr�xima dos outros, e n�o por causa do vento", diz Davis.
"A quest�o de manter as janelas abertas ou fechadas foi um tema controverso de debate entre os m�dicos. Com o tempo, foi entendido que o ar fresco e a luz do sol eram realmente bons para os pacientes, mas por muito tempo a pr�tica era fechar as janelas. Quando havia um pessoa doente, ela ficava trancada em um quarto, coberta com cobertores e muitas vezes acabava desidratada por causa da febre. �s vezes, a cura era pior do que a doen�a", diz.
Mas em 1918 e 1919, a ideia de manter as janelas abertas para evitar o cont�gio ganhou grande for�a. "Mantenha as janelas do seu quarto abertas! Evite gripe, pneumonia e tuberculose", diziam cartazes que foram colocados nos transportes p�blicos.
5. Um aquecedor sob a janela
A pr�tica de abrir as janelas para manter os quartos arejados levou a outra pr�tica que transformou o design da casa americana: colocar um aquecedor de a�o sob as janelas.

Como as autoridades sanit�rias recomendavam manter as janelas abertas mesmo nos dias mais frios do inverno, os engenheiros buscaram formas de manter os c�modos aquecidos mesmo nessas circunst�ncias. O resultado foi colocar o radiador naquele local. Uma pr�tica que continua at� hoje.
"O aquecedor foi colocado sob a janela porque eles pensavam que seria a maneira mais eficaz de aquecer o ar frio que entra pela janela", diz Davis.
Um �ltimo h�bito de sa�de que surgiu durante a pandemia de gripe foi o uso de m�scaras, embora isso n�o tenha continuado ao longo do tempo.
O historiador aponta que elas eram um pouco "primitivas" em compara��o com as de hoje. Esperava-se que as pessoas as usassem em casa com camadas de gaze ou pano e as lavassem ap�s o uso antes de coloc�-las novamente.
"Claramente elas n�o eram t�o eficazes quanto uma N95 e poucas pessoas se preocupavam em faz�-las e lav�-las adequadamente", diz Davis.

No entanto, houve casos de muito sucesso, como em S�o Francisco, onde as autoridades aplicaram regulamenta��es r�gidas sobre o uso de m�scaras e conseguiram manter um baixo �ndice de infec��es e mortes.
"Depois eles relaxaram a regra e tiveram um grande aumento nas mortes porque as pessoas n�o queriam colocar suas m�scaras de volta depois de pararem de us�-las. Elas se recusaram usando muitos dos mesmos argumentos que ouvimos agora. Ficou muito claro que as m�scaras eram muito eficazes em locais onde seu uso era necess�rio", diz ele.
Embora esses h�bitos de sa�de p�blica tenham sido incorporados ao cotidiano a partir do aprendizado obtido durante a pandemia de 1918, Davis ressalta que o trauma causado por ela foi t�o grande que, pelo menos nos EUA, esse epis�dio foi ignorado por d�cadas e que s� meio s�culo depois � que a comunidade cient�fica quis revisitar o assunto.
"A sociedade americana passou por algo terr�vel que n�o queria repetir, mas tamb�m n�o queria pensar nisso, e acho que � por isso que essa pandemia foi esquecida h� muito tempo". diz Davis.
"Enquanto escrevia meu livro, conheci muitas fam�lias que me disseram que sabiam que sua av� havia morrido de gripe, mas que ningu�m sabia muito sobre isso porque era algo que n�o se falava. perigoso segredo de fam�lia que voc� queria esconder. E foi assim que a gripe espanhola foi tratada por quase meio s�culo", conclui.
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