
Enviada Especial
Barcelona - Durante d�cadas, n�o houve evolu��o no tratamento do c�ncer de ov�rio, o mais letal do sistema reprodutivo feminino. At� hoje, a interven��o-padr�o consiste em uma cirurgia de grande porte, combinada com quimioterapia. Por�m, um novo cen�rio surge para beneficiar pacientes de uma doen�a que, no Brasil, afeta seis em cada 100 mil mulheres e que, por n�o ter diagn�stico precoce, costuma ser identificada em est�gios avan�ados.
Durante o congresso anual da Sociedade Europeia de Oncologia Medica (Esmo), tr�s estudos mostraram que mirar em uma enzima chamada Parp representa uma nova era no tratamento desse tipo de c�ncer. Embora a quimioterapia e a cirurgia continuem necess�rias, medicamentos que inibem a a��o da subst�ncia aumentam a sobrevida sem progress�o da doen�a para um grupo expressivo de pacientes. Na avalia��o de especialistas, essas drogas t�m potencial para mudar a pr�tica cl�nica.
No ano passado, tamb�m no Esmo, um estudo indicou que, conclu�do o ciclo de quimioterapia, o uso da subst�ncia olaparibe combinada com a droga bevacizumabe aumentou significativamente o tempo de remiss�o do c�ncer de ov�rio em pacientes com muta��es BRCA. O medicamento reduziu em 70% o risco de progress�o da doen�a ou de morte, comparado ao grupo placebo, que recebeu a terapia-padr�o, sem a adi��o da subst�ncia.
O resultado dessa pesquisa fez com que muitos pa�ses aprovassem o olaparibe como tratamento de primeira linha para mulheres com as variantes BRCA. O Brasil foi o primeiro, em fevereiro passado. Agora, um dos estudos apresentados no Esmo demonstrou que esse tratamento pode beneficiar um grupo ainda maior de mulheres.
A pesquisa internacional teve participa��o de 806 pacientes, inclusive brasileiras, nos est�gios III e IV de c�ncer de ov�rio e incluiu pessoas com e sem a muta��o, com resposta parcial ou total � quimioterapia. No fim, todos os grupos que receberam o olaparibe combinado ao bevacizumabe tiveram uma remiss�o maior do que aqueles em que o tratamento seguido foi o padr�o.
“A sele��o de pacientes n�o se restringiu ao sucesso ou n�o da cirurgia ou ao fato de se ter ou n�o a muta��o BRCA. Ent�o, as participantes representam a popula��o geral das mulheres com c�ncer de ov�rio avan�ado”, afirmou Isabelle Ray-Coquard, principal autora do estudo e pesquisadora da Universidade Claude Bernard, de Lyon.
Em uma coletiva de imprensa, a cientista destacou que, embora todas as participantes tenham sido beneficiadas, o olaparibe foi mais eficaz, comparado ao placebo, nos subgrupos de mulheres com a muta��o BRCA e naquelas com um defeito no DNA chamado defici�ncia de recombina��o hom�loga (HRD, sigla em ingl�s). “� a primeira vez que vemos esses resultados em pacientes HRD sem a muta��o BRCA. Ent�o, um n�mero muito maior de pacientes ser� beneficiado”, frisa.
Para Ana Oaknin, pesquisadora do Instituto de Oncologia Vall d’Hebron de Barcelona, que n�o participou do estudo, esses resultados s�o um “significativo passo � frente” no tratamento. “O principal objetivo no c�ncer de ov�rio � evitar a volta da doen�a depois da terapia de primeira linha porque, de outra forma, a probabilidade de cura � bem baixa. A combina��o do bevacizumbe e do olaparibe como terapia de manuten��o deve se tornar o novo padr�o de tratamento de pacientes com c�ncer ovariano avan�ado.” Ela observa que uma limita��o do estudo foi n�o incluir mulheres sem qualquer resposta � quimioterapia, um grupo que, segundo Oaknin, por�m, e pequeno.
Tamb�m tendo a enzima Parp como alvo, um estudo que testou a efic�cia da subst�ncia niraparib em 733 mulheres com c�ncer de ov�rio avan�ado concluiu que a droga beneficiou pacientes com e sem as muta��es BRCA, al�m daquelas com defici�ncia de recombina��o hom�loga (HRD). Essas �ltimas foram as que apresentaram melhores resultados, com 57% menos risco de progress�o da doen�a, comparadas ao grupo placebo.
“Essas descobertas sugerem que os m�dicos devem considerar o niraparib como op��o de tratamento para pacientes com c�ncer de ov�rio avan�ado, depois de completarem a quimioterapia de primeira linha”, disse Antonio Gonz�les Mart�n, da Universidade Cl�nica de Navarra, presidente do Grupo Espanhol de Pesquisa de c�ncer ovariano e principal autor do artigo, apresentado no Esmo e publicado no New England Journal of Medicine.
EFEITOS COLATERAIS
Com 1.100 pacientes em est�gio avan�ado que foram submetidos � quimioterapia, o terceiro estudo divulgado no congresso europeu tamb�m encontrou benef�cios no tratamento com uma subst�ncia inibidora da enzima Parp, o veliparibe. Na pesquisa, as participantes foram divididas em tr�s grupos: veliparibe junto da quimioterapia e sozinho como manuten��o, a subst�ncia com qu�mio seguida por placebo, e controle, que s� recebeu a qu�mio.
Com 1.100 pacientes em est�gio avan�ado que foram submetidos � quimioterapia, o terceiro estudo divulgado no congresso europeu tamb�m encontrou benef�cios no tratamento com uma subst�ncia inibidora da enzima Parp, o veliparibe. Na pesquisa, as participantes foram divididas em tr�s grupos: veliparibe junto da quimioterapia e sozinho como manuten��o, a subst�ncia com qu�mio seguida por placebo, e controle, que s� recebeu a qu�mio.
No primeiro caso, houve “benef�cios significativos”, segundo Robert L. Coleman, da Universidade de Houston e principal pesquisador do estudo. Ele alertou, por�m, que usar apenas o veliparibe com a qu�mio n�o trouxe resultados positivos, al�m de aumentar efeitos colaterais, como fadiga e anemia.
Convidada pela organiza��o do congresso a comentar os tr�s estudos, Anna Oaknin, do Instituto de Oncologia Vall d’Hebron, disse que a indica��o da classe de medicamentos inibidores da enzima Parp como tratamento de primeira linha � um “marco hist�rico” para os pacientes. “Depois de d�cadas estudando diferentes abordagens de quimioterapia, � a primeira vez que temos remiss�o prolongada. Esperamos que continuemos a melhorar os resultados em longo prazo.” Embora os resultados tenham sido semelhantes, ela observa que h� diferen�as entre os tr�s estudos e que cabe aos m�dicos e aos pacientes escolherem a melhor op��o, dependendo de cada caso.
* A rep�rter viajou a convite da AstraZeneca
Tr�s perguntas para...
Ang�lica Nogueira, presidente do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecol�gicos
Ang�lica Nogueira, presidente do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecol�gicos
1) Por que � t�o dif�cil diagnosticar o c�ncer de ov�rio precocemente?
Esse � um grande desafio, a maioria das pacientes com c�ncer de ov�rio chega ao diagn�stico com a doen�a avan�ada, j� disseminada dentro do abd�men. Isso porque o c�ncer de ov�rio n�o tem sintomas espec�ficos da pr�pria doen�a, e a evolu��o � muito r�pida. Ent�o, por exemplo, a paciente pode apresentar barriga distendida, altera��o na digest�o, queixas urin�rias ou intestinais. S�o queixas mais ligadas a outros �rg�os, e isso atrasa o diagn�stico porque, muitas vezes, at� para m�dicos, � dif�cil a associa��o. E � um tumor mais raro que outros, como o de mama, por exemplo.
2) Hoje, qual � a realidade do tratamento?
O tratamento cl�ssico do c�ncer de ov�rio nas �ltimas d�cadas mudou muito pouco. Ele se baseia em uma cirurgia bastante extensa, combinada com quimioterapia. Em 2011, foram apresentados alguns estudos que mostraram que usar uma classe de medica��es chamadas inibidores de angiog�nese melhora o controle da doen�a na paciente em est�gio mais avan�ado. E no ano passado, tamb�m no congresso Esmo, foi apresentado o inibidor de Parp olaparibe para o subgrupo de pacientes com muta��es BRCA, com um ganho muito significativo de sobrevida livre de progress�o. A grande mudan�a que aconteceu agora no Esmo 2019 � que os tr�s subgrupos de paciente – com muta��es BRCA, com defici�ncia de recombina��o hom�loga e sem defici�ncia de recombina��o hom�loga – foram beneficiados com inibidores de Parp.
3) Quais os maiores avan�os da �rea no congresso Esmo?
Em rela��o ao c�ncer de ov�rio, sa�mos do Esmo 2019 com significativos avan�os. Os estudos refor�am o inibidor de Parp como tratamento de primeira linha, expandem a coorte de pacientes n�o s� para as mutadas em BRCA, a combina��o com o inibidor de angiog�nese foi eficaz e segura, com um ganho robusto, independentemente de muta��o. Vivemos uma mudan�a de paradigma com ganho significativo de sobrevida livre de progress�o.