
Na d�cada de 1950, o nutricionista norte-americano Ancel Keys, da Universidade de Minnesota, ficou intrigado com um fato para o qual, no come�o, n�o encontrava explica��o. Ele descobriu que os mais pobres cidad�os de vilarejos do Sul italiano eram muito mais saud�veis que os mais ricos nova-iorquinos. Keys desconfiou que a comida estava por tr�s disso, e desenhou um estudo com quase 13 mil homens de sete pa�ses – a ent�o Iugosl�via, Finl�ndia, It�lia, Holanda, Gr�cia, Jap�o e Estados Unidos – para descobrir a rela��o entre estilo de vida, nutri��o e doen�a cardiovascular. Pela primeira vez, falou-se, no meio cient�fico sobre a dieta mediterr�nea.
Desde ent�o, esse regime alimentar – que n�o � uma dieta no sentido popular – j� foi alvo de milhares de publica��es, que descobriram seus benef�cios hol�sticos. O consumo eventual de carne vermelha e o reduzido de outras prote�nas animais, aliado � abund�ncia de vegetais, gr�os integrais, azeite e, moderadamente, do vinho, est�o associados a ganhos que v�o do aumento da longevidade � sa�de mental. Mas a combina��o pode ser ainda mais saud�vel, mostram dois estudos recentes conduzidos por pesquisadores da Universidade de Ben-Gurion, em Israel.
A ideia � tornar a dieta ainda mais verde, cortando de vez a carne vermelha e reduzindo as outras prote�nas animais. Os pesquisadores cunharam o termo green-Med – mediterr�nea verde – para descrever a vers�o do regime alimentar e j� publicaram tr�s artigos comparativos sobre ele, sendo dois h� poucas semanas. Em todos os casos, a intensifica��o do consumo vegetal em detrimento dos produtos de origem animal mostrou-se ainda mais ben�fica que a dieta mediterr�nea tradicional.
ESTRAT�GIAS BEM-SUCEDIDAS Um dos principais pesquisadores do estudo, a professora de nutri��o e epidemiologia da Universidade de Ben Gurion Iris Shai, tamb�m docente da Faculdade de Medicina T. H. Chan, de Harvard, nos EUA, conta que os resultados de levantamentos anteriores do grupo estimularam o interesse pela green-Med. Estudos de longo prazo – como o Cascade, que investigou a dem�ncia avan�ada em idosos moradores de abrigos, o Direct, sobre remiss�o de diabetes 2, e o Central, que pesquisou a obesidade central (corpo em formato ma��) em uma grande amostra de adolescentes – apontaram para uma mesma dire��o. “Conclu�mos, com esses ensaios anteriores, que os polifen�is poderiam ser um dos denominadores comuns de estrat�gias diet�ticas bem-sucedidas”, conta.
Polifen�is s�o micronutrientes que s� existem nas plantas. Eles reduzem o estresse oxidativo e as inflama��es – que, por sua vez, s�o aumentados pelo consumo de carne vermelha. Ao diminuir a oxida��o e a inflama��o das c�lulas, essas subst�ncias est�o associadas a uma s�rie de benef�cios � sa�de: menor risco de obesidade, c�ncer, doen�as cardiovasculares e neurodegenerativas, entre outros. Por isso, a equipe resolveu testar se o aumento do consumo de vegetais e a elimina��o da carne vermelha do card�pio poderiam ser ainda mais saud�veis que a vers�o tradicional da dieta mediterr�nea.
Exerc�cios f�sicos Em um estudo publicado na revista Heart, a equipe relatou que a vers�o verde da dieta protege mais contra doen�as cardiovasculares e s�ndrome metab�lica que a tradicional. Os pesquisadores distribu�ram, aleatoriamente, em tr�s grupos diet�ticos 294 pessoas sedent�rias e moderadamente obesas (IMC de 31) com idade m�dia de 51 anos.
O primeiro grupo recebeu orienta��es sobre como aumentar a atividade f�sica e dicas b�sicas sobre alimenta��o saud�vel. O segundo aprendeu o mesmo sobre os exerc�cios, al�m de receber conselhos sobre como seguir uma dieta mediterr�nea tradicional com restri��o cal�rica (de 1.500 a 1.800kcal/dia para homens e de 1.200 a 1.400kcal/dia para mulheres). Esse regime era pobre em carboidratos simples, rico em vegetais, com aves e peixes substituindo a carne vermelha. Inclu�a tamb�m 28g/dia de nozes.
O terceiro grupo foi orientado a se exercitar e aprendeu a seguir a green-Med: consumo de 28g/dia de nozes, cortar carne vermelha/processada e aumentar as quantidades de vegetais. A dieta tamb�m incluiu de tr�s a quatro x�caras por dia de ch�-verde e 100g de mankai, cubos congelados de Wolffia globosa, planta aqu�tica rica em prote�na, tomada como um shake. Depois de seis meses, avaliou-se o efeito de cada uma das dietas na perda de peso e nos fatores de risco cardiovascular e metab�lico.
Colesterol Os que seguiram ambos os tipos de dieta mediterr�nea perderam mais peso: green-Med 6,2kg, mediterr�nea 5,4kg, e dieta saud�vel 1,5kg. A circunfer�ncia da cintura – um indicador de risco cardiovascular – encolheu em m�dia 8,6cm entre aqueles da dieta verde, em compara��o com 6,8cm nos da mediterr�nea tradicional, e 4,3cm nos seguidores da dieta saud�vel.
O grupo da vers�o verde tamb�m teve redu��o maior do “colesterol ruim”: 4%, contra 1% e 0%, respectivamente. Outros marcadores de doen�as card�acas e derrame, como press�o arterial, resist�ncia � insulina e prote�na C reativa (indicador de inflama��o) tamb�m foram menores nos seguidores do regime que cortou a carne vermelha e reduziu ainda mais o consumo de aves.
“Nossas descobertas sugerem que a restri��o adicional da ingest�o de carne com um aumento paralelo em alimentos ricos em prote�nas e polifen�is, � base de plantas, como nozes, ch�-verde e mankai, pode beneficiar ainda mais o estado cardiometab�lico e reduzir o risco cardiovascular, al�m dos benef�cios conhecidos da dieta mediterr�nea tradicional”, diz Gal Tsaban, coautor do estudo.
Menos gordura no f�gado Em outro estudo conduzido pela Universidade Ben-Gurion, os cientistas descobriram que a dieta mediterr�nea verde reduz a gordura intra-hep�tica mais do que outros regimes saud�veis e reduz a doen�a hep�tica gordurosa n�o alco�lica pela metade. O artigo foi publicado na revista Gut h� duas semanas.
Embora pequenas quantidades de gordura no f�gado seja algo normal, o excesso (5% ou mais) leva a resist�ncia � insulina, diabetes tipo 2, risco cardiovascular, diminui��o da diversidade do microbioma intestinal e desequil�brio microbiano. “Abordar essa doen�a hep�tica comum por meio de interven��o direcionada ao estilo de vida pode promover uma estrat�gia nutricional mais eficaz”, diz Anat Yaskolka-Meir, primeiro autor do artigo e professor da Faculdade de Sa�de P�blica da universidade israelense.
O estudo, com dura��o de 18 meses e envolvendo 294 trabalhadores com idade m�dia de 50 anos e obesidade abdominal, seguiu a mesma metodologia da pesquisa sobre sa�de cardiovascular e nutri��o. Os participantes foram divididos em tr�s grupos, sendo que, em todos, houve orienta��o sobre a pr�tica de atividades f�sicas. No primeiro, foi passada uma dieta considerada saud�vel; no segundo, a mediterr�nea tradicional; e no terceiro, a vers�o verde.
Os resultados mostraram que todas as dietas levaram � redu��o da gordura do f�gado. No entanto, a mediterr�nea verde resultou na maior diminui��o (-39%) em compara��o com a mediterr�nea tradicional (-20%) e as orienta��es diet�ticas saud�veis (-12%).
A preval�ncia da doen�a hep�tica caiu de 62% no in�cio do estudo para 31,5% no grupo mediterr�neo verde, 47,9% no grupo mediterr�neo, e 54,8% no grupo de regime alimentar saud�vel. Segundo os pesquisadores, a maior ingest�o de mankai e de nozes e a menor ingest�o de carne vermelha/processada foram significativamente associadas � extens�o da perda da gordura no f�gado.
duas perguntas para...
Juliana Moraco, m�dica pela Faculdade de Medicina de Teres�polis, p�s-graduada em nutrologia e endocrinologia
1 - A dieta mediterr�nea tradicional e a vers�o verde mant�m o peixe, as aves e os latic�nios, embora esses dois �ltimos em quantidades reduzidas. Esses alimentos de origem animal s�o indispens�veis a uma dieta saud�vel?
Da mesma forma que as carnes cont�m gordura saturada, o leite e os ovos tamb�m, e, por consequ�ncia, t�m os mesmos riscos que a carne. Voc� pode estar pensando que poderia faltar prote�na ou c�lcio caso eliminasse a carne branca e o leite, mas a prote�na � facilmente encontrada em um alimento presente todos os dias na nossa mesa: o feij�o. As leguminosas s�o as principais fontes de prote�na em uma dieta � base de plantas e incluem todos os tipos de feij�es, gr�o-de-bico, lentilha e soja. J� o c�lcio pode ser encontrado principalmente na couve, no gergelim, no tahine (pasta de gergelim) e nos leites vegetais enriquecidos.
2 - Acredita que teria uma grande ades�o da dieta mediterr�nea no Brasil?
Mudar h�bitos pode ser desafiador, mas � sempre poss�vel adaptar-se dentro do poss�vel. Um estilo de vida que prega alimentos mais frescos, vegetais em abund�ncia, estar presente no momento da refei��o, entre outros, traz in�meros benef�cios para a sa�de e a qualidade de vida e nos impulsiona a adot�-lo. A dica � come�ar com medidas simples, como se programar para ir � feira, saber quais s�o as frutas da esta��o, preparar marmitas para levar e n�o depender do self-service, desligar o telefone e o computador na hora do almo�o e, aos poucos, ao sentir os benef�cios para o seu bem-estar e sa�de, adicionar novos h�bitos.