
Em 1981, quando morava em Sintra, nos arredores de Lisboa, Glauber Rocha planejava a mostra Kynoperzpektyva81, que ficaria em cartaz na Cinemateca Portuguesa. Sua obra seria organizada de acordo com a afinidade tem�tica dos filmes. Em agosto, ele morreu, aos 42 anos. O projeto foi cancelado, mas a filmografia do baiano se tornou cultuada, reconhecida como uma das mais importantes e originais do mundo. Quase quatro d�cadas depois, o Cine Humberto Mauro resgata essa ideia. At� 23 de dezembro, ser�o exibidos todos os 17 document�rios, longas e curtas-metragens dirigidos pelo baiano de Vit�ria da Conquista.
Glauber – Kynoperzpektyva18 ser� aberta nesta sexta-feira (7). A partir das 16h, ser�o exibidos os curtas P�tio (1959), Maranh�o 66 (1966), Beato (1968), Amazonas, Amazonas (1966) e Jorjamado no cinema (1977). �s 19h, ser� a vez do longa Barravento (1961), dentro do eixo Afryka, um dos quatro que comp�em o projeto. Tudo de acordo com o que Glauber faria em 1981.
Os outros eixos s�o Brazil Arkayko – que compreende os cl�ssicos Deus e o diabo na terra do sol e O drag�o da maldade contra o santo guerreiro –, Amerika Yberyka (Terra em transe e Cabe�as cortadas) e Brazil Unyverzal (A idade da Terra). A grafia particular e o exagero nas letras k e y s�o uma cr�tica de Glauber ao estrangeirismo presente no cinema brasileiro nos anos 1950.
“A programa��o busca tornar acess�vel n�o s� a frui��o, mas a reflex�o sobre a obra de Glauber Rocha. Nossa ideia � oferecer o que o Cine Humberto Mauro faz de melhor: a imers�o est�tica e acad�mica, com cr�tica, refinamento e aprofundamento em torno da obra, que por si s� j� atrai grande quantidade de gente para o cinema”, explica Bruno Hil�rio, gerente do espa�o e um dos curadores do projeto. “Pensamos em realizar essa mostra h� um bom tempo, s� agora reunimos os elementos que possibilitaram isso. Pensamos a programa��o em conjunto com todos os colaboradores”, observa.
DI�LOGOS Professor de cinema na Escola de Comunica��o e Artes da Universidade de S�o Paulo (USP) e pesquisador da obra de Glauber Rocha, o belo-horizontino Matheus Ara�jo � um dos curadores de Kynoperzpektyva18. Ele vai ministrar o curso Di�logos glauberianos. A proposta � exibir longas de cineastas estrangeiros que t�m rela��o com a obra do brasileiro. Entre eles est�o Jean-Luc Godard, Luis Bu�uel, Mario Schifano, Rainer Werner Fassbinder, Jean-Marie Straub, Dani�l Huillet e Jean Rouch.
“Glauber � dos cineastas mais porosos, mais dialogantes que conhecemos. Desenvolveu atividade cr�tica constante e importante ao longo de toda sua vida. Conhecia muitos diretores, travava di�logos importantes com eles, porque prestou muita aten��o ao cinema mundial. Tinha enorme originalidade, nunca tentou imitar ou se pautar pelos outros, mas estava muito informado a respeito do trabalho dos outros. Acho muito importante pensar o cinema comparado, pois ganhamos muita compreens�o do trabalho dele fazendo isso � luz da compara��o com trabalhos de outros”, argumenta Matheus Ara�jo.
O ciclo de sete palestras come�a no dia 17. Ser�o exibidos Que viva M�xico! (URSS, 1979), de Sergei M. Eisenstein, e A idade da Terra, com a palestra Glauber e Eisenstein: Reexame de paternidade, a cargo de Matheus Ara�jo. De acordo com o professor, a curadoria da mostra possibilita a compara��o em dois n�veis: o externo, com outros cineastas, e o interno, ao agrupar os filmes por afinidade tem�tica.
“Isso cria, por contraste, uma porta de entrada muito interessante para medir a originalidade do Glauber no cinema mundial. Quando se comparam cineastas de tem�ticas parecidas, gestos estil�sticos parecidos, voc� percebe o quanto cada um � original ao ver como as solu��es utilizadas n�o s�o iguais. Esse ser� o esp�rito da retrospectiva”, explica Matheus Ara�jo.
De acordo com ele, a proposta comparativa oferecida pelo Cine Humberto Mauro � in�dita. “Em 2005, no CCBB do Rio, houve uma mostra de Glauber com o Pasolini, sugerindo afinidades dos dois. Mas esta agora generaliza mais, s�o outros cineastas. Das mostras que conhe�o, nenhuma levou t�o longe as ideias de comparatismo”, revela.
“O Cine Humberto Mauro � um cinema atemporal, que vai viver muitos anos e j� foi adotado pela cidade. A popula��o faz este lugar ainda mais democr�tico. Escolhemos o Glauber Rocha justamente por isso”, observa Bruno Hil�rio. “Uma das grandes cr�ticas dele ao cinema brasileiro se d� justamente pelo fato de nossa cultura ser pautada pelo regime comercial norte-americano. Por isso, comemoraremos nossos 40 anos com o cineasta, pois ele � um norte para a nossa programa��o. Sempre nos propomos a revisitar diversos diretores, com foco principal no cinema de autor, al�m de pesquisas e debates”, conclui o gerente do Cine Humberto Mauro.
GLAUBER – KYNOPERZPEKTYVA18
SEXTA (7)
Curtas 1, 16h. Curtas 2, 17h. Barravento, 19h. Sess�o comentada pela professora Claudia Mesquita.
S�BADO (8)
Terra em transe, 15h. Cabe�as cortadas, 17h. O le�o de sete cabe�as, 19h. Sess�o comentada pelo cr�tico Heitor Augusto.
DOMINGO (9)
C�ncer, 16h. Deus e o diabo na terra do sol, 18h.
Sess�o comentada pelo ator Ney Piacentini.
>> At� 23 de dezembro, no Cine Humberto Mauro do Pal�cio das Artes. Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro,
(31) 3236-7400. Entrada franca.
Programa��o completa: www.fcs.mg.gov.br
OBRA
Longas
» 1962 – Barravento
» 1964 – Deus e o diabo na terra do sol
» 1967 – Terra em transe
» 1968 – O drag�o da maldade contra o santo guerreiro
» 1970 – Cabe�as cortadas
» 1971 – O le�o de sete cabe�as
» 1972 – C�ncer
» 1975 – Claro
» 1980 – A idade da Terra
Curtas e document�rios
» 1959 – P�tio
» 1959 – Cruz na pra�a
» 1965 – Amazonas, Amazonas
» 1966 – Maranh�o 66 B
» 1974 – Hist�ria do Brasil
» 1974 – As armas e o povo
» 1977 – Di-Glauber
» 1979 – Jorjamado no cinema
