
Passar fome, dormir sobre pregos e vidros, crucifica��o, perfura��o do rosto e do corpo e deitar-se com cobras s�o algumas das modalidades de uma performance c�nica origin�ria do circo, o faquirismo.
A diretora e atriz Helena Ignez nunca se esqueceu da primeira vez em que teve contato com um faquir. Ela tinha apenas 10 anos e ainda morava em Salvador, sua cidade natal. “Meu pai me levou para ver o Silki, um dos representantes mais famosos do faquirismo. Fiquei muito impressionada com aquilo. Ele era uma atra��o e estava h� dias jejuando. Aquilo ficou na minha imagina��o para sempre”, conta.
H� tr�s anos, a curiosidade de Helena sobre o assunto foi novamente agu�ada. O cantor e compositor Ney Matogrosso, protagonista de Ral�, filme da diretora, a presenteou com o livro Cravo na carne, de Alberto de Oliveira e Alberto Camarero, sobre o faquirismo feminino no Brasil.
“O livro � bel�ssimo, e eu fiquei bem interessada, ainda mais em se tratando de mulheres. Achei que era um tema que deveria ser conhecido por mais pessoas, porque, apesar de essas artistas terem sido verdadeiras estrelas nas d�cadas de 1940 e 1950, � um assunto quase esquecido no Brasil”, observa.
Fakir, rec�m-conclu�do document�rio com roteiro e dire��o de Helena Ignez, ser� exibido nesta ter�a (1º) no MIS Cine Santa Tereza, em Belo Horizonte, com a presen�a da diretora. Ap�s a sess�o, haver� um debate com o p�blico. O filme abriu a 14ª edi��o do Festival de Cinema Latino-Americano de S�o Paulo, em julho passado, e retrata o sucesso do faquirismo no Brasil, na Am�rica Latina e na Fran�a.

A pr�tica � apresentada e analisada por meio de um acervo que inclui recortes de jornais e revistas, al�m de v�deos que mostram o sucesso dessas apresenta��es, com seus campeonatos de resist�ncia e dor, e massiva presen�a de p�blico, incluindo pol�ticos e autoridades do governo.
“Se, um dia, as exibi��es de jejum forem proibidas, o que eu n�o acredito, todos n�s faremos jejum em casa, porque, para n�s, isso � esporte. E como somos pobres, vivemos disso”, declarou, em certa ocasi�o, um dos faquires mais not�rios do pa�s, Lookan, que chegou a ficar 126 dias sem comer e bateu o recorde mundial.
“A imprensa era muito forte naquela �poca e fazia quest�o de fazer uma cobertura quase di�ria das atividades dos faquires, com a expectativa da quebra de recordes. � uma coisa muito bizarra, mas que tinha um grande interesse das pessoas. O Brasil chegou a ganhar v�rias vezes o campeonato mundial de jejum. Esses artistas tiveram os seus 15 minutos de fama e tamb�m o seu lugar de fala”, afirma a cineasta, que pretende filmar tamb�m uma fic��o sobre o tema. “O roteiro j� est� at� aprovado, mas, com a mudan�a de governo, ainda n�o fomos contemplados. As coisas est�o meio paradas. Ent�o, vamos ver como vai ser.”
''Com exce��o de Luz Del Fuego, a grande maioria (dos praticantes de faquirismo) tinha origem humilde. Ali�s, faquir em �rabe quer dizer pobre. Essas figuras queriam superar os pr�prios limites. Tinham uma for�a enorme de supera��o, de satisfa��o. O curioso � que passavam fome para n�o passar fome. Acho que tamb�m havia uma coisa meio m�tica. O pr�prio Silki falava que n�o se considerava um masoquista, mas um paranormal''
Helena Ignez, roteirista e diretora de 'Fakir'
Lookan se casou com a faquiresa Yone, a quem acabou assassinando na frente dos filhos, em meio a uma crise de ci�mes. As mulheres s�o um cap�tulo � parte no document�rio. Elas tamb�m se submetiam a provas duras de resist�ncia. Caso de Verinha, Sandra, Malba, Rossana, Suzy King e Mara, que se casou com o faquir Urbano, “para passar fome juntos como profiss�o”.
“A quest�o do machismo era muito forte tamb�m, e algumas dessas artistas eram tratadas como prostitutas. Mas elas conseguiam se sobressair. N�o ficavam tanto tempo em jejum como os homens, mas tinham um desempenho extraordin�rio”, diz Helena Ignez.
A dan�a com cobras � uma das modalidades do faquirismo, que ganhou adeptas famosas, como a atriz, naturista e ativista feminina Luz Del Fuego, que costumava dizer que, “quanto mais conhecia as mulheres, mais admirava as cobras”.

“Com exce��o de Luz Del Fuego, a grande maioria (dos praticantes de faquirismo) tinha origem humilde. Ali�s, faquir em �rabe quer dizer pobre. Essas figuras queriam superar os pr�prios limites. Tinham uma for�a enorme de supera��o, de satisfa��o. O curioso � que passavam fome para n�o passar fome. Acho que tamb�m havia uma coisa meio m�tica. O pr�prio Silki falava que n�o se considerava um masoquista, mas um paranormal”, analisa a diretora.
DI�LOGOS MIS COM HELENA IGNEZ
Nesta ter�a (1º), �s 19h30, no MIS Cine Santa Tereza (Estrela do Sul, 89, Pra�a Duque de Caxias, Santa Tereza. (31) 3277-4699). Ap�s a exibi��o, haver� bate-papo da atriz e cineasta com o p�blico. Entrada franca. Os ingressos ser�o distribu�dos meia hora antes da sess�o.