
O diretor Fellipe Barbosa acha gra�a na disposi��o das pessoas em apontar o ‘erro’ em seu filme Domingo, que estreia nesta quinta-feira (17), no Cine Belas Artes, em Belo Horizonte. � que o ano-novo de 2003 ocorreu numa quarta-feira, e n�o num domingo, como se passa na hist�ria do longa. “Agem como se estivessem me pegando no pulo, como se dissessem: ‘Viu? Ele n�o fez pesquisa nenhuma’. O filme se passa no s�bado, na expectativa do domingo.”
O s�bado � especial. Marca a reuni�o de uma grande fam�lia na fazenda da matriarca para festejar o ano-novo. No ar, o medo produzido pela posse de Luiz In�cio Lula da Silva como presidente da Rep�blica (o que se deu numa quarta-feira).
Por que a confus�o de datas? Tem a ver com uma sutil proposta de intersec��o temporal que d� o tom do filme todo. “Foi uma coisa que percebemos que havia no roteiro do Lucas (Paraizo) e que ressaltamos na rodagem, Clara e eu.” Fellipe Barbosa refere-se � codiretora Clara Linhart.
Um exemplo: a queda da for�a, a falta de luz. � uma s�, mas com pequenos lapsos de tempo, o ato e o fato s�o vistos de diferentes pontos de vista. Essa intersec��o temporal, transformada em conceito, � o pr�prio tema. A burguesia teme o que est� por vir com a posse de Lula. A matriarca guarda dinheiro numa conta no exterior. A nora observa que a terra � improdutiva e que a fazenda tem mais � de ser invadida.
Mais uma vez, depois de Casa grande e Gabriel e a montanha, Fellipe Barbosa coloca em cena a estrutura social brasileira. Casa-grande e senzala, patr�es e empregados. Casa grande era sobre um garoto criado numa redoma e que descobria a exist�ncia do mundo al�m dos limites da sua casa. Gabriel e a montanha, em homenagem ao amigo Gabriel Buchmann (morto em 2009, no Malaui), era sobre um jovem que investiga a pobreza na �frica e encontra a morte no alto de uma montanha m�tica.
CULPA
O cinema de Fellipe Barbosa n�o exala m� consci�ncia, mas carrega a culpa de uma classe m�dia alta que tem suficiente clareza para saber que a concentra��o de renda � um problema muito s�rio do Brasil. Em clima de festa, Domingo exp�e a brutalidade das rela��es de classes. � uma com�dia �cida de costumes. “Pedro Sotero (o grande fot�grafo) viu e fez uma observa��o muito interessante”, conta Barbosa. “Disse que � um filme sobre o corpo do ator. Como a gente filma em plano-sequ�ncia, os atores t�m tempo de elaborar o humor com seu corpo.” �tala Nandi e Camila Morgado s�o mestras. “Camila � um monstro em cena, e a �tala tem toda uma hist�ria. Foi a melhor amiga da m�e da Clara, que dirige comigo. A m�e dela, Ana Maria Galano, foi a �ltima mulher do Joaquim Pedro, que dirigiu a �tala, e o filho do Joaquim produziu meu primeiro curta. Tudo se encaixa.”
Como projeto, Domingo � muito anterior a Casa grande. “O roteiro tem mais de 10 anos, mas as circunst�ncias fizeram com que os outros filmes sa�ssem antes. Tanto que, �s vezes, no set, o roteiro parecia datado, e era um privil�gio a gente ter o Lucas junto para atualizar cenas e di�logos.” Domingo j� expressa algo que s� se acentuou depois, com o tempo. O �dio representado pelo antipetismo. “N�o foi outra coisa que nos trouxe ao atual estado do Brasil. Fiquei um tempo sem rever o filme porque n�o aguentava mais, mas o revi outro dia e me dei conta de que j� estamos conseguindo rir dessa m... toda. Talvez a pr�xima etapa seja fazer o luto para zerar e tentar come�ar de novo.”
Barbosa filmou numa charqueada em Pelotas, no Rio Grande do Sul. “Era como se o local fosse habitado por fantasmas e eles assombrassem nossos personagens. Isso ajudou muito no clima.” O diretor grava atualmente cenas da pr�xima novela das 9, Amor de m�e. O n�cleo � de Jos� Luiz Villamarim, a autora � Manuela Dias. “Tenho gravado muito com as tr�s m�es da trama – Regina Cas�, Adriana Esteves e Ta�s Ara�jo.” E a Isis Valverde, que tamb�m est� na novela? “Isis � fant�stica, e anota o que eu digo. A personagem vai crescer quando a novela for ao ar.”