O diretor sul-coreano Bong Joon-ho (foto: Loic Venance/AFP)
Bong Joon-ho, diretor de Parasita, diz que a Palma de Ouro para o filme, em Cannes, em maio, veio num momento especial, quando se comemora o centen�rio do cinema coreano. Ele assume o car�ter social da obra com a discuss�o sobre a luta de classes na Coreia e no mundo, ainda marcado por profundas desigualdades.
Parasita � uma mistura de O hospedeiro com Okja e tamb�m marca seu retorno � Coreia ap�s experi�ncias no cinema internacional. O novo filme nasceu do seu desejo de comentar a situa��o no pa�s?
Nunca foi minha inten��o criar uma trilogia de classes. N�o tenho um projeto de carreira, conto as hist�rias dos personagens que me fascinam no momento. A ideia surgiu em 2013, portanto, � anterior a Expresso do amanh� e Okja, que foram produ��es internacionais porque as hist�rias exigiam. Os �ltimos sobreviventes da humanidade num trem e a busca que leva uma garota das montanhas da Coreia a Manhattan para salvar seu animal de estima��o. Gostei, claro, de trabalhar com uma equipe toda coreana em outra hist�ria que se passa na Coreia, mas n�o creio que seja um retorno, n�o nesse sentido. O retorno � a outra escala de produ��o, mais pr�xima de filmes anteriores. Gostei de trabalhar com uma produ��o menor, mais focado nos problemas da narrativa e dos personagens.
No come�o, a gente pensa que os pobres s�o os parasitas da hist�ria, mas, na verdade, os ricos precisam deles e talvez sejam parasitas tamb�m. Ou mais ainda. Faz sentido para voc�?
em d�vida. Como a hist�ria segue o processo como a fam�lia pobre se infiltra na casa dos ricos, parece �bvio que sejam os parasitas. Mas a fam�lia rica vive numa situa��o de depend�ncia para sobreviver. Precisa de quem dirija, cozinhe e, do ponto de vista do trabalho, tamb�m � constitu�da por parasitas.
A ideia surgiu de alguma observa��o sua ou foi baseada em informa��es, algo que voc� tenha visto na TV, na internet ou lido nos jornais?
O argumento e o roteiro s�o originais, mas, quando jovem e ainda estava na faculdade, trabalhei como tutor na casa de uma fam�lia rica. Dava aulas particulares e, quando os pais n�o estavam, meu estudante me levava para conhecer os ambientes. Mostrou-me a sauna privativa, e aquilo me passou uma ideia de invas�o de privacidade, como se eu fosse um voyeur, fantasiando sobre a vida daqueles estranhos. A ideia ficou comigo e, de alguma forma, germinou no que virou Parasita.
Diferen�as sociais s�o um tema importante no cinema coreano. Estou pensando em A empregada, de Kim Ki-young, e Em chamas, de Lee Chang-dong. Foram refer�ncias? E O criado, o cl�ssico de Joseph Losey com roteiro de Harold Pinter?
A empregada foi muito importante. � um dos meus filmes favoritos. Kim � meu mentor. O criado foi outra refer�ncia e revi o filme de Losey enquanto preparava o meu. Mas a verdade � que, nos �ltimos tempos, h� um n�mero significativo de filmes que tamb�m abordam problemas de classes – Em chamas, Assunto de fam�lia, de Hirokazu Kore-eda, N�s, de Jordan Peele. Em nenhum momento houve a preocupa��o de transformar Parasita num comp�ndio de outros filmes, mas era claro o entendimento de que o tema � relevante no cinema mundial, face a tanta desigualdade no mundo.
Cena de 'Parasita', vencedor da Palma de Ouro em Cannes (foto: Pandora Filmes/Divulga��o)
O marido rico, Mr. Park, tem tudo, mas precisa de est�mulo para sua rela��o �ntima com a mulher. Da� a quest�o do cheiro, por exemplo. Como voc� explica?
Socialmente, ele detesta que algu�m tente cruzar a linha que delimita seu mundo. Mas pessoal e sexualmente, ele cruza a linha, pois precisa desse est�mulo. Park carrega esse sentimento contradit�rio e vira um homem fragilizado, dividido, a despeito de sua for�a social. Isso acelera o desenlace.
O que representou a Palma de Ouro para voc�? Tem chances no Oscar?
A coincid�ncia � que se comemora neste ano o centen�rio do cinema coreano. A Palma de Ouro veio num momento especial, todo mundo ficou feliz, mas nada mudou s� porque ganhei. J� estava escrevendo meu pr�ximo filme no voo de volta, com a Palma na bagagem. O importante � continuar o trabalho que sempre fiz. Quanto ao Oscar, � a primeira vez que participo de uma campanha t�o extensa e complicada, com tantos votantes. � imposs�vel fazer previs�es, mas estou adorando conhecer tantos artistas importantes de Hollywood.