Can��es de Aldir Blanc e Maur�cio Tapaj�s inspiram s�rie de TV

“S� lamento que ele n�o possa ver. Ent�o, que veja pelos olhos dos filhos e netos. Vou fazer 73 anos daqui a pouquinho, mas vou ver tamb�m com as minhas filhas, netos e meu bisneto.” Foi dessa maneira que Aldir Blanc (1946-2020) encerrou o longo depoimento que deu a Frederico Cardoso. O realizador carioca finalizava, na �poca, a s�rie Imagem vinil, baseada no LP Aldir Blanc e Maur�cio Tapaj�s (1984).

Morto em 4 de maio, v�tima da COVID-19, Aldir chegou a ver algo da produ��o, que estreia nesta quinta (4), �s 21h, no canal pago Prime Box Brazil. A conversa com Cardoso, de dois anos atr�s, est� dispon�vel no YouTube (procure por Maur�cio, por Aldir, no canal da produtora da s�rie, Cinema Petisco). Naquele depoimento, ele falou muito do parceiro Maur�cio Tapaj�s (1943-1995), com quem lan�ou um �lbum duplo – cultuado, mas ausente das m�dias digitais.

A s�rie, em 10 epis�dios, recupera tal trabalho. O disco de sambas e choros re�ne um time exemplar. O maestro Radam�s Gnattali foi um dos arranjadores, o Quinteto Violado participou de uma faixa. O encarte � quase um livro, com textos e ilustra��es que dialogavam com cada can��o. Entre os autores, Paulo C�sar Pinheiro, T�rik de Souza, Chico Caruso, Jaguar e Herm�nio Bello de Carvalho.

A s�rie promove tal costura. Os epis�dios s�o independentes, mas t�m personagens comuns que circulam pela Tijuca, reduto de Aldir, tradicional bairro da Zona Norte no Rio, nos anos 1980. No epis�dio de estreia, Saudades, Maur�cio (Roberto Rodrigues) � um advogado com escrit�rio na Pra�a Saens Pe�a, cuja noiva (Clarisse Zarvos) insiste na mudan�a para a Barra da Tijuca. O reencontro do personagem com o av� morto o leva para uma viagem pela Tijuca de outrora, ao som das can��es Perder um amigo e O bonde. Trechos dessa cr�nica cotidiana s�o apresentados atrav�s de anima��es.

Cada epis�dio foi inspirado em duas m�sicas do �lbum. “A gente sempre partia das letras e da sensa��o que a melodia nos trazia. Como o encarte do disco tem sempre uma charge, artigo ou poesia acompanhando a letra, procuramos aproveitar tudo que o LP tem. Sou tijucano, assim como meus s�cios na produtora, e foi na Tijuca que Aldir morou por quase toda a vida. Ent�o, aproveitamos as hist�rias que conhec�amos”, comenta Frederico Cardoso, que desde 2019 mora em Lima Duarte, na Zona da Mata mineira.

O diretor era um adolescente que s� ouvia punk quando Aldir Blanc e Maur�cio Tapaj�s foi lan�ado. “Certo dia, meus pais chegaram em casa com o LP autografado pelos dois. N�o dei muita bola, mas nos intervalos entre uma m�sica punk e outra, escutava o disco deles. Acabou sendo o primeiro LP fora do punk que me chamou a aten��o. Quando abri e vi o material que tinha no encarte, passei a criar imagens na minha cabe�a e tamb�m a gostar de outros estilos musicais.”

O projeto come�ou a sair do papel quando Cardoso conheceu Patr�cia, uma das filhas de Aldir. Ela, de acordo com o diretor, foi a primeira a abrir os caminhos, seguida de Mary, a mulher do compositor. Mas at� os dois se encontrarem pessoalmente houve v�rias conversas por e-mail e WhatsApp.

No depoimento, Aldir fala da honestidade de Maur�cio Tapaj�s e de sua luta pelos direitos autorais dos compositores. “Ele n�o guardou um centavo do dinheiro para a produ��o. Tem faixa no disco com uma orquestra que n�o cabia no est�dio. Pagou os m�sicos com aquilo que recebeu. Voc� pode gostar das m�sicas ou n�o, mas no aspecto pol�tico, do direito autoral no Brasil, � um dos nossos raros her�is”, arrematou Aldir.

IMAGEM VINIL

S�rie

10 epis�dios de meia hora

Nesta quinta (4), �s 21h, no Prime Box Brazil

Digitalmente, o disco Aldir Blanc e Maur�cio Tapaj�s n�o existe. N�o teve edi��o em CD, tampouco est� dispon�vel em plataformas de streaming. Em uma pesquisa r�pida na internet, o LP pode ser comprado em sebos por R$ 200 a R$ 390. Para a produ��o da s�rie Imagem vinil, os filhos de Maur�cio, L�cio e M�rcio, cederam as fitas m�steres do �lbum.

“O Ricardo Mansur, que fez a mixagem do som da s�rie, se empolgou e fez uma remixagem e remasteriza��o das m�sicas. Com isso, a fam�lia deles pode fazer bom uso (nas plataformas digitais) sem precisar entrar novamente em est�dio”, conta o diretor Frederico Cardoso.

Morto em abril de 1995, aos 51 anos, em decorr�ncia de uma parada card�aca, Tapaj�s, em parcerias com Aldir, Herm�nio Bello de Carvalho e Paulo Cesar Pinheiro, foi o autor de sucessos como Mudando de conversa, T� voltando e Pesadelo. Foi gravado por Elis Regina, D�ris Monteiro e MPB-4, entre outros.

Era reconhecido pela milit�ncia, pois lutava para moralizar o pagamento dos direitos autorais dos compositores. Foi um dos fundadores da Sombr�s (sociedade arrecadadora de direitos) e da Associa��o de M�sicos, Arranjadores e Regentes (Amar). Um ano antes de morrer, fundou a gravadora independente Saci.

Desde 2004 os filhos de Maur�cio iniciaram o projeto de digitaliza��o do acervo. Nesse processo de recupera��o da obra do pai, foi lan�ado, em 2006, Sobras repletas, que re�ne 14 can��es em registros in�ditos – interpretadas por Clara Nunes, Chico Buarque, Guinga, M�nica Salmaso.

Esse disco est� dispon�vel nas plataformas digitais. Os demais (como o de estreia, Olha a�, de 1980), n�o. “(Com a morte) Fechamos a Saci e hoje as plataformas exigem uma editora. Estamos tentando fazer, mas � meio problem�tico”, comenta M�rcio.

Os herdeiros criaram um site com parte do acervo do pai, mas o projeto saiu do ar. Em abril, foi aberta uma conta no Instagram (@mauriciotapajosoficial) que traz parte dessa mem�ria. M�rcio tamb�m montou duas listas no Spotify com can��es de autoria do pai. L�cio diz que o movimento nas redes sociais mostra que h� interesse pela obra de Tapaj�s, 25 anos depois da morte dele.

LP antol�gico virou raridade nos sebos