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Estado de Minas LIVRO E FILME

Por que autor de 'Tubar�o' passou o resto da vida tentando recuperar 'reputa��o' dos animais

Em entrevista � BBC, vi�va de Peter Benchley conta como a imagem negativa dos tubar�es gerada pelo sucesso do filme atormentou o marido.


04/03/2021 17:37 - atualizado 05/03/2021 08:34


O filme 'Tubarão', baseado no livro de mesmo nome de Peter Benchley, teve um efeito desastroso na forma como as pessoas veem os tubarões(foto: Getty Images)
O filme 'Tubar�o', baseado no livro de mesmo nome de Peter Benchley, teve um efeito desastroso na forma como as pessoas veem os tubar�es (foto: Getty Images)

Os cientistas dizem que tubar�es e arraias est�o desaparecendo dos oceanos a uma taxa "alarmante" em todo o mundo.

Sua popula��o reduziu 71% ao longo de meio s�culo, de acordo com um estudo recente, e tr�s quartos das esp�cies estudadas est�o amea�adas de extin��o.

A BBC conversou com a vi�va de Peter Benchley, autor do livro que inspirou o enorme sucesso do filme Tubar�o, de 1975, sobre como a imagem negativa dos tubar�es gerada por seu trabalho atormentou Benchley ao longo da vida e o levou a fazer campanha pela preserva��o desses animais.

Poderia ter sido um final tr�gico e ir�nico para Peter Benchley naquele dia ensolarado de 1974.

Ap�s o imenso sucesso de seu livro Tubar�o, lan�ado no mesmo ano, o escritor americano participava de um document�rio para a TV sobre tubar�es na Austr�lia.

Durante um mergulho em gaiola, Benchley quase foi morto por um tubar�o-branco — acidentalmente.

"Peter estava na gaiola e a tripula��o do barco jogou carne de cavalo na �gua como isca para os tubar�es", contou Wendy Benchley, vi�va do escritor, � BBC.

"Este belo tubar�o-branco veio dar uma mordida, mas n�o acertou a carne e ficou com a corda que segurava a gaiola presa em sua boca."

"Enquanto as pessoas continuavam a filmar, a gaiola foi virada de cabe�a para baixo, para frente e para tr�s. Eu agarrei a corda e a arranquei dos dentes do tubar�o."

"Acho que salvei a vida de Peter naquele dia", acrescenta ela com uma risada.

Wendy, que � conservacionista marinha e ativista ambiental, diz que o tubar�o passou mais de meia hora nadando casualmente nas proximidades.


Peter e Wendy Benchley se tornaram defensores fervorosos da conservação dos tubarões(foto: Arquivo pessoal/Wendy Benchley)
Peter e Wendy Benchley se tornaram defensores fervorosos da conserva��o dos tubar�es (foto: Arquivo pessoal/Wendy Benchley)

Fen�meno cultural

O livro de Benchley vendeu cerca de 20 milh�es de c�pias em todo o mundo, mas o filme de mesmo nome, lan�ado mundialmente em 1975, se tornou a primeira produ��o a arrecadar US$ 100 milh�es de bilheteria.

Dirigido pelo ent�o iniciante Steven Spielberg com roteiro coescrito por Benchley, Tubar�o ainda � um dos filmes de maior bilheteria de todos os tempos.

Mas esse sucesso viria a atormentar a consci�ncia de Benchley at� sua morte em 2006.

"Sabendo o que sei agora, eu nunca poderia escrever aquele livro hoje", afirmou o autor em uma entrevista para promover uma edi��o comemorativa de Tubar�o em 2005.

Sua hist�ria sobre um tubar�o-branco assassino que aterroriza a ilha fict�cia de Amity nos Estados Unidos teve um efeito profundo na reputa��o do animal — e s�rias consequ�ncias.

Podemos v�-los como um predador perigoso, mas na verdade s�o os tubar�es que t�m muito mais a temer em rela��o � atividade humana. Uma combina��o da intensa pesca comercial, da ca�a desportiva e das mudan�as clim�ticas amea�a suas popula��es em todo o mundo.

Sua sobreviv�ncia est� se tornando cada vez mais prec�ria.


Uma série de espécies, incluindo o tubarão-branco que ficou famoso no filme, estão ameaçadas(foto: Getty Images)
Uma s�rie de esp�cies, incluindo o tubar�o-branco que ficou famoso no filme, est�o amea�adas (foto: Getty Images)

A ONG Uni�o Internacional para a Conserva��o da Natureza (IUCN, na sigla em ingl�s) diz que atualmente cerca de 80 das mais de 480 esp�cies de tubar�o s�o classificadas como "amea�adas" — incluindo os tubar�es-brancos t�o difamados na obra.

Em julho deste ano, uma rede de bi�logos marinhos de todo o mundo publicou os resultados de um estudo de cinco anos que mostrou que os tubar�es estavam "funcionalmente extintos" em cerca de 20% dos recifes de coral do mundo, que s�o ecossistemas marinhos essenciais.

Os tubar�es desempenham um papel importante na vida do oceano como predadores, controlando as esp�cies abaixo deles na cadeia alimentar, algo que os Benchley conheciam bem.

"Peter e eu aprendemos muito sobre tubar�es e tamb�m tivemos a chance, em todos esses anos, de falar sobre sua import�ncia para o oceano", diz Wendy.

Ca�ados e amea�ados

Os arrependimentos do seu falecido marido come�aram apenas alguns meses ap�s o lan�amento do filme em 1975. O sucesso do longa gerou um frenesi de ca�a aos tubar�es nos Estados Unidos.

"Milhares de pescadores come�aram a capturar tubar�es como trof�u depois de ver Tubar�o", escreveu George Burgess, renomado especialista em tubar�es, em 2015.

Para piorar a situa��o, a pesca comercial em grande escala se tornou o terror das popula��es de tubar�es a partir da d�cada de 1980.


Os especialistas estimam que cerca de 100 milhões de tubarões são mortos em todo o mundo a cada ano %u2014 há uma demanda específica por suas barbatanas(foto: Getty Images)
Os especialistas estimam que cerca de 100 milh�es de tubar�es s�o mortos em todo o mundo a cada ano %u2014 h� uma demanda espec�fica por suas barbatanas (foto: Getty Images)

Em 2013, um estudo publicado na revista cient�fica Marine Policy estimou que o n�mero m�dio de tubar�es mortos a cada ano em todo o mundo era de cerca de 100 milh�es.

Os tubar�es s�o cobi�ados principalmente por causa de suas barbatanas, usadas para fazer sopa em v�rios pa�ses, mas tamb�m s�o um efeito colateral da pesca em larga escala.

E, diferentemente do que � retratado em Tubar�o, esses animais raramente s�o uma amea�a para os humanos.

O International Shark Attack File, um banco de dados administrado pela Universidade da Fl�rida, nos EUA, registrou apenas cinco mortes em 64 casos de ataques de tubar�o sem provoca��o em todo o mundo em 2019.

Wendy diz que seu falecido marido se sentia especificamente culpado pela representa��o dos tubar�es como uma criatura que guardava rancor dos humanos.

"Era a d�cada de 1970 e as pessoas realmente n�o sabiam muito sobre tubar�es. No mundo ocidental, o que as pessoas pensavam era que tubar�o bom, era tubar�o morto", explica.

"Peter colocou o conhecimento que tinha no livro e, � claro, o tornou o mais emocionante que p�de."

"Mas depois Spielberg levou as coisas para outro patamar e fez um �timo filme de a��o."


Peter Benchley (ao centro, com a esposa Wendy e o ator Roy Scheider de 'Tubarão') coescreveu o roteiro do filme, mas tinha reservas quanto ao produto final(foto: Getty Images)
Peter Benchley (ao centro, com a esposa Wendy e o ator Roy Scheider de 'Tubar�o') coescreveu o roteiro do filme, mas tinha reservas quanto ao produto final (foto: Getty Images)

As ressalvas de Benchley

Benchley, de acordo com sua vi�va, gostou da adapta��o do livro para o cinema, mas mais tarde expressaria publicamente suas ressalvas sobre as mudan�as feitas na hist�ria original.

"Havia elementos do filme que Peter gostaria de ver minimizados."

"O mais importante � que ele sentiu que Steven deu ao tubar�o muita (�ndole de) vingan�a e alguma intelig�ncia."

Wendy conta que, acima de tudo, o casal ficou "horrorizado" com algumas rea��es do p�blico a Tubar�o.

"Grande parte da rea��o ao livro e ao filme foi dizer que tubar�es s�o monstros."

Motivados pela repercuss�o, os Benchley embarcariam em uma campanha para defender os tubar�es nas d�cadas seguintes.

Eles se envolveram com uma s�rie de organiza��es ambientais, ajudaram a produzir document�rios sobre a vida selvagem e viajaram pelo mundo dando palestras.

O casal tamb�m fez parte de uma campanha na China no in�cio dos anos 2000 que destacou o impacto da ca�a de tubar�o — Wendy Benchley afirma que isso ajudou a reduzir drasticamente o consumo de sopa de barbatana de tubar�o no pa�s.


No início dos anos 2000, Benchley viajou para a China e Hong Kong para fazer campanha contra o consumo de sopa de barbatana de tubarão(foto: Getty Images)
No in�cio dos anos 2000, Benchley viajou para a China e Hong Kong para fazer campanha contra o consumo de sopa de barbatana de tubar�o (foto: Getty Images)

Um legado esquecido

Mas a ambientalista acredita que o livro e o filme tamb�m tiveram um efeito positivo, ao despertar o interesse de mais gente pelos tubar�es e pelo ambiente marinho em geral.

"Peter recebeu milhares de cartas de pessoas dizendo que, se n�o fosse por Tubar�o, elas nunca saberiam que o oceano era um lugar t�o emocionante."

"Ele se sentiu bem no final", diz ela.

Os Benchley nunca perderam o fasc�nio pelos superpredadores do oceano e continuaram a buscar intera��es com eles.

Peter e Wendy at� comemoraram seu 40º anivers�rio de casamento em 2005 nadando com tubar�es-brancos perto da Ilha de Guadalupe, no M�xico, um ano antes de Peter morrer de doen�a pulmonar.

"Alguns deles chegaram t�o perto que pod�amos toc�-los", lembra Wendy.

"Sempre � uma experi�ncia incr�vel ver essas belas criaturas."

Para promover a conserva��o dos oceanos, Peter Benchley tamb�m publicou obras de n�o-fic��o sobre tubar�es, mas alguns de seus outros trabalhos atra�ram cr�ticas.

Depois de Tubar�o, ele escreveu mais livros sobre amea�as n�uticas, particularmente um sobre uma lula gigante que amea�ava as ilhas Bermudas no Caribe (A Besta, 1991) e a hist�ria de um h�brido humano/tubar�o geneticamente criado pelos nazistas, que � acidentalmente solto no Atl�ntico (White Shark, 1994).

Ambos foram adaptados para as telas, para TV e cinema respectivamente, mas nenhum alcan�ou o sucesso de Tubar�o.

'Tubar�o' e lockdown

Wendy defende o legado do livro Tubar�o como uma hist�ria de como os humanos se comportam diante dos desafios apresentados pela natureza.

"O livro era muito mais sobre como as pessoas reagem a uma amea�a que n�o conhecem e contra a qual n�o sabem como se defender", ressalta.


No filme Tubarão, o prefeito Larry Vaughn (à esquerda) se recusa irresponsavelmente a fechar as praias da ilha(foto: Getty Images)
No filme Tubar�o, o prefeito Larry Vaughn (� esquerda) se recusa irresponsavelmente a fechar as praias da ilha (foto: Getty Images)

Ela acredita que Peter Benchley teria ficado muito lisonjeado com a men��o de seu livro mais famoso em reportagens de jornais americanos e europeus durante a pandemia de covid-19. Alguns artigos tra�aram paralelos entre como as autoridades da fic��o e do mundo real lidam com uma grande crise.

Wendy Benchley menciona especificamente a hist�ria de Larry Vaughn, o prefeito da ilha fict�cia de Amity, que insiste em manter as praias abertas apesar dos incidentes com tubar�es. Ele n�o quer assustar os turistas durante as f�rias de ver�o, o que prejudicaria a economia local.

"(A covid-19) � uma amea�a invis�vel que voc� n�o pode controlar e que est� em todo o mundo", diz ela.

"E como as pessoas se comportam? No meu pa�s, alguns — como o presidente (Donald Trump) — decidiram ignorar."

"Eles v�o manter os neg�cios abertos e deixar as pessoas morrerem, assim como o prefeito de Amity", conclui.


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