Marisa Monte desafia 2021 a ser um tempo de delicadeza

 

Dez anos sem lan�ar um disco de in�ditas e a aus�ncia nas redes sociais fizeram de Marisa Monte uma das artistas mais enigm�ticas da m�sica brasileira. Com a aura de inc�gnita que a cerca, qualquer novidade sobre Marisa � tratada com grande expectativa. 

Tanto � assim que, no in�cio de junho passado, o an�ncio do lan�amento de seu novo trabalho "quebrou'' a internet – ou seja, viralizou e ficou entre os assuntos mais comentados daquele dia. O burburinho voltou a ocorrer na noite da �ltima quinta-feira (1º/07), quando o esperado disco "Portas" chegou �s plataformas digitais, no mesmo dia do anivers�rio de 54 anos da artista carioca.

A cantora e compositora planejava gravar em maio de 2020 esse trabalho, que somente agora p�de ser lan�ado. Com a chegada da pandemia ao Brasil, em mar�o, ela adiou a entrada em est�dio. "As portas se fecharam, a vida de todo mundo se encheu de incertezas. Ficou dif�cil fazer planos, mas a vida tem seu pr�prio GPS. E toda vez que a gente perde uma oportunidade come�a logo a recalcular a rota em busca da pr�xima sa�da", declara Marisa no encarte do disco.

No texto, ela conta que passou meses estudando qual seria a forma mais segura de entrar em est�dio. "Foi quando um amigo meu me disse: 'Se organiza com toda a seguran�a poss�vel, com uma equipe enxuta e comprometida, entra no est�dio e grava. Eu tenho certeza de que vai ser bom pra voc�s e vai fazer bem pra todos n�s'. M�sica � rem�dio. Foi a� que a gente abriu as portas e reencontrou nosso caminho", completa.

 

A grava��o do repert�rio come�ou em novembro de 2020, no Rio de Janeiro. A essa altura, Marisa Monte desistiu da ideia de viajar para gravar parte do disco nos Estados Unidos. A partir da�, experimentou o formato de grava��o remota via Zoom com m�sicos em Nova York, Los Angeles, Madri e Barcelona.

O primeiro e �nico single, "Calma", foi lan�ado em 10 de junho �ltimo e sintetiza muito do que o disco "Portas" �. Leve e com pegada pop, a m�sica vislumbra a possibilidade de um futuro melhor, exerc�cio cada vez mais dif�cil no Brasil de hoje.

Com letra de f�cil associa��o, Marisa Monte faz o resgate de uma vis�o otimista da vida. "Eu n�o tenho medo do escuro/ Sei que logo vem a alvorada/ Deixa a luz do sol bater na estrada/ Ilumina o asfalto negro", diz um dos versos da can��o.

A m�sica � fruto da parceria com Chico Brown, filho de Carlinhos Brown e neto de Chico Buarque. Aos 24 anos, ele aparece como compositor em cinco faixas do registro: "Calma", "D�j� vu", "Medo do perigo", "Em qualquer tom" e "Fazendo cena".

Com os irm�os Lucas e Lucio Silva, Marisa comp�s "Totalmente seu". Lucio, ali�s, � o cantor Silva, que j� lan�ou um disco inteiro com m�sicas da cantora – "Silva canta Marisa", de 2016 –, al�m de ter escrito com ela "Noturna (Nada de novo na noite)".

Parceiro in�dito no repert�rio de Marisa, Marcelo Camelo, integrante da banda Los Hermanos, assina com ela as faixas "Sal" e "Voc� n�o liga". E � somente dele “Espa�onaves", que ela interpreta. Pretinho da Serrinha � o parceiro da cantora em "Elegante amanhecer" e "Quanto tempo", essa �ltima tamb�m assinada por Pedro Baby.

Colega de longa data de Marisa, Arnaldo Antunes divide com ela a composi��o de "Portas" e "A l�ngua dos animais" – m�sicas que tamb�m contaram com a colabora��o de Dadi –, al�m de "Vagalumes". Nando Reis escreveu com ela "Praia Vermelha", e Seu Jorge e sua filha, Flor, aparecem em "Pra melhorar".

Ciente da majorit�ria presen�a masculina em sua lista de colaboradores, Marisa Monte convidou a artista pl�stica Marcela Cantu�ria para produzir a capa do disco. As duas trabalharam uma troca de refer�ncias e a artista criou uma s�rie de pinturas dedicadas ao �lbum. Elas ilustram tamb�m o encarte do registro.

Nas 16 faixas distribu�das ao longo de quase 49 minutos, "Portas" mant�m um estranho tom esperan�oso, que n�o est� descolado dos problemas e tristezas que resumem o Brasil de hoje. Sem deixar a peteca cair, como diz o ditado, Marisa Monte segue sua miss�o de escrever cr�nicas de amor sobre o cotidiano, com letras viciantes e vocais certeiros.

Bastante longo, como os discos de artistas costumam ser, o �lbum pode ser resumido musicalmente em algumas faixas. "Calma" � uma delas, assim como a m�sica-t�tulo, respons�vel por abrir – sem trocadilho – o trabalho. Com instrumental org�nico, � forte na m�sica a presen�a de cordas e percuss�o, ainda que tamb�m haja espa�o para distor��es e sons eletr�nicos.

J� em "Medo do perigo", m�sica que poderia pertencer ao repert�rio dos Tribalistas, a voz de Marisa Monte entoa uma dessas can��es de amor t�picas de sua carreira. � interessante como a m�sica cresce e ganha elementos inesperados, como um shaker de madeira, tocado por Carlinhos Brown.

A faixa seguinte, "A l�ngua dos animais", traz um �timo arranjo de metais assinado pelo baterista e trombonista Antonio Neves, que embala uma esp�cie de soul jazz psicod�lico.

"Em qualquer tom", cuja letra parece se dirigir �queles que exercem o of�cio da composi��o musical, tem sonoridade delicada marcada por guitarra, viol�es e piano.

E quando Marisa Monte parece estar perdendo o f�lego, as quatro m�sicas finais restabelecem a energia do disco. "Vagalumes" soa como um fado portugu�s com sua cad�ncia melanc�lica e sensual, precedendo "Elegante amanhecer", �nico samba do repert�rio.

 

"Voc� n�o liga" flerta com o pop rock e traz um arranjo de cordas assinado por Marcelo Camelo. J� a derradeira "Pra melhorar", arranjada por Arthur Verocai, retoma a ideia de acreditar no futuro. "Quando voc� pensa que est� tudo errado e negativo/ E que ainda vai piorar, piorar/ Pra todo mundo a vida � dif�cil todos fazem seu sacrif�cio pra melhorar, melhorar", dizem os versos da m�sica. Talvez n�o exista maneira melhor de finalizar um disco em 2021.

N�o � sem motivo que o trabalho se chama "Portas". Ele estabelece um portal para o otimismo, funciona como um convite ao recome�o.

Artista consolidada, � injusto descrever Marisa como eremita s� porque ela escolheu n�o expor a vida no mundo virtual. Nos 10 anos que separam "O que voc� quer saber de verdade" (2011) e "Portas", ela fez turn�s, lan�ou a colet�nea "Cole��o" (2016) e desenvolveu o projeto "Cinephonia" para disponibilizar raridades de sua carreira nas plataformas de streaming.

Em 2017, ao lado de Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, bancou o t�o esperado retorno dos Tribalistas. O trio formado 15 anos antes lan�ou um disco de in�ditas, saiu em turn� pela primeira vez, lotou est�dios em capitais do pa�s e foi a pol�mica atra��o principal de uma das noites do Lollapalooza Brasil, evento que costuma dar destaque para artistas e bandas internacionais.

Com "Portas", ela se mostra atenta �s novidades em termos de divulga��o musical. Desde que anunciou o lan�amento do trabalho, intensificou sua presen�a nas redes sociais e tem compartilhado informa��es e novidades relacionadas � carreira.

As 16 faixas do disco ganharam v�deos que mostram os bastidores das grava��es, isto �, Marisa no est�dio ao lado dos colaboradores que a ajudaram a construir o trabalho – presencial e remotamente. As can��es tamb�m ganharam cada uma um lyric video que exp�e as cifras para quem quer aprender a toc�-las.

Neste domingo (4/07), ela lan�a o clipe da m�sica-t�tulo no programa "Fant�stico", da TV Globo. O v�deo tem dire��o assinada por Giovanni Bianco, tamb�m diretor do clipe de "Girl from Rio", de Anitta.

E os planos dela n�o param por a�. A can��o"Vento sardo", parceria com o cantor e compositor uruguaio Jorge Drexler, gravada para o repert�rio de "Portas", ficou de fora da vers�o final e deve ser lan�ada como single avulso nos pr�ximos meses. "Decidimos lan�ar a posteriori, como um single, quando pudermos nos encontrar ao vivo", diz ela no encarte do disco.

Oportunidades parecem n�o faltar no portal que Marisa Monte estabelece com seu novo disco.

.De Marisa Monte

.16 faixas

.Sony Music Brasil

.Dispon�vel nas plataformas digitais