O sal�o principal segue com o funcionamento da cafeteria e da livraria. As mesas cumprem o distanciamento adequado e o limite de quatro cadeiras
�s 14h45 desta quinta-feira (05/08), o p�blico come�ou a chegar. A diversidade chamou a aten��o. Jovens, crian�as, idosos, homens e mulheres n�o escondiam a emo��o ao adentrar novamente o Belas Artes. Por tr�s das m�scaras, adivinhava-se o sorriso. Eles conversavam na fila, tomavam caf�, tiravam fotos e reencontram os conhecidos. Nem parecia que estavam h� 17 meses sem entrar naquele espa�o da Rua Gon�alves Dias.
Tariq Quint�o, de 19 anos, lia na cafeteria enquanto aguardava a sess�o de “Doutor Gama”, a cinebiografia do escritor e jornalista Luiz Gama (1830-1882), um dos principais nomes do movimento abolicionista no Brasil. “Eu gosto muito dos personagens imperiais do Brasil, a gente tem uma hist�ria muito grande que merece ser contada. Um filme assim que representa nossa hist�ria de forma moderna � importante para a gente lembrar do passado e dos �cones que formaram nosso pa�s”, diz.
"� quase um �xtase, uma nostalgia. Voltar aqui � uma experi�ncia muito boa, satisfat�ria. Voc� pega o bilhete na m�o, senta no lugar, se prepara para o filme durante o trailer, toda essa movimenta��o � o que atrai no cinema"
Tariq Quint�o, espectador
Frequentador ass�duo do Belas Artes, Tariq descreve a emo��o do retorno: “� quase um �xtase, uma nostalgia. Voltar aqui � uma experi�ncia muito boa, satisfat�ria. Voc� pega o bilhete na m�o, senta no lugar, se prepara para o filme durante o trailer, toda essa movimenta��o � o que atrai no cinema”.
Enquanto a fila crescia na bilheteria, Leila Lima de Souza, que trabalha como pipoqueira na frente do cinema h� mais de 20 anos, fez sua primeira venda em 17 meses. Ela conta que chegou a rezar pelo Belas Artes durante a paralisa��o. “Eu estou tremendo, � muita emo��o, porque isso aqui � um sonho da gente, � tudo de bom, o meu sustento � daqui. � uma felicidade sem precedentes."
"Eu estou tremendo, � muita emo��o, porque isso aqui � um sonho da gente, � tudo de bom, o meu sustento � daqui. � uma felicidade sem precedentes"
Leila Lima de Souza, pipoqueira
Patr�cia Kamei, de 46 anos, chegou para assistir a “Doutor Gama” exibindo a camisa do SOS Belas Artes - uma das contrapartidas para os colaboradores da campanha de financiamento coletivo que ajudou o cinema a resistir ao per�odo sem receitas imposto pela pandemia. “Nunca fiquei tanto tempo sem ir ao cinema. Nesse per�odo, eu fiquei com muito medo de o Belas Artes fechar”, confessa.
"Na semana passada houve um inc�ndio na Cinemateca Brasileira (em S�o Paulo). Ent�o essa reabertura, por mais que seja um momento em que ainda esteja morrendo gente (de COVID-19), que ainda haja muita gente que n�o se vacinou, frequentar o cinema, vir ao cinema, n�o deixar o cinema acabar, n�o deixar o cinema fechar � um ato de resist�ncia"
Patr�cia Kamei, espectadora
Pelo fato de ser o �nico cinema de rua de BH e com filmes do circuito alternativo, Patr�cia conta que foi uma das colaboradoras mais atuantes da campanha de financiamento. Ela mantinha uma m�dia de 90 filmes assistidos por ano em salas de cinema e destaca a import�ncia deste reencontro.
“Na semana passada houve um inc�ndio na Cinemateca Brasileira (em S�o Paulo). Ent�o essa reabertura, por mais que seja um momento em que ainda esteja morrendo gente (de COVID-19), que ainda haja muita gente que n�o se vacinou, frequentar o cinema, vir ao cinema, n�o deixar o cinema acabar, n�o deixar o cinema fechar � um ato de resist�ncia”, afirma.
O propriet�rio e diretor de programa��o do Cine Belas Artes, Adhemar Oliveira, conta como foi o planejamento para a abertura. “Tem tanto filme parado pedindo para entrar que foi uma coisa de organiza��o temporal mesmo. N�s privilegiamos o cinema brasileiro e o cinema independente. Os filmes do Oscar em cartaz n�o deixam de ser independentes. Estamos a� para continuar a briga, com uma programa��o diferenciada que d� valor � diversidade. N�o estamos aqui para ser mais um.”
"Tem tanto filme parado pedindo para entrar que foi uma coisa de organiza��o temporal mesmo. N�s privilegiamos o cinema brasileiro e o cinema independente. Os filmes do Oscar em cartaz n�o deixam de ser independentes. Estamos a� para continuar a briga, com uma programa��o diferenciada que d� valor � diversidade. N�o estamos aqui para ser mais um"
Adhemar Oliveira, propriet�rio e diretor de programa��o do Belas Artes
“Piedade”, de Cl�udio Assis, � um dos seis t�tulos em cartaz. Esse � o primeiro longa-metragem na carreira da mineira Mariana Ruggiero, que com seu papel venceu o pr�mio de melhor atriz coadjuvante no Los Angeles Brazil Festival. Ela decidiu ver com os pr�prios olhos a estreia do filme em Belo Horizonte.
“� uma sensa��o gostosa, de alegria mesmo, porque foi bastante tempo de espera, neste momento em que o acesso � arte, � cultura est� mais delicado, com toda essa quest�o da pandemia. � como se fosse um alento, um foguinho de esperan�a para a gente continuar trablhando”, diz.
A trama de “Piedade”, na vis�o da atriz, tem tudo a ver com o atual momento brasileiro. “O filme fala sobre resist�ncia e a gente est� num ano de resist�ncia, est� numa luta para continuar vivo. Acho que os personagens de ‘Piedade’ est�o justamente nessa miss�o, est� todo mundo ali lutando pela sobreviv�ncia. Tamb�m � um filme sobre o amor e eu acho que estamos precisando falar um pouquinho sobre isso”, afirma Mariana.
"� uma sensa��o gostosa, de alegria mesmo, porque foi bastante tempo de espera, neste momento em que o acesso � arte, � cultura est� mais delicado, com toda essa quest�o da pandemia. � como se fosse um alento, um foguinho de esperan�a para a gente continuar trabalhando"
Mariana Ruggiero, atriz de 'Piedade'
“Estrear em BH, onde eu me formei como atriz, no cinema onde eu assisti meus primeiros filmes nacionais � mais emocionante do que estar em qualquer outro lugar do mundo”, comenta.
Reforma e novos protocolos
A primeira sess�o foi do vencedor do Oscar “Nomadland”, de Chloe Zhao, �s 15h30. O porteiro Luciano Guimar�es, de 62 anos, estava na entrada da sala 2 para colher os ingressos. Ele � um dos velhos conhecidos dos cin�filos.
“A maioria dos espectadores me conhece, � s� gente muito boa, educada. Quando eu estou de folga, as pessoas se preocupam, sentem minha falta”, conta. Apaixonado por cinema, ele trabalha no ramo desde a d�cada de 1970 e relata a experi�ncia do retorno. “A emo��o � demais. Eu voltei hoje e as mesmas pessoas que vinham aqui antes est�o vindo agora, � o mesmo pessoal. Eu tenho muito carinho por todo mundo aqui.”
Com uma reforma garantida pelo patroc�nio do Grupo Anima, o Cine Belas Artes est� com salas mais modernas, com novas poltronas, carpete e telas. Francisco Reis, de 72 anos, foi um dos primeiros a chegar.
"A maioria dos espectadores me conhece, � s� gente muito boa, educada. Quando eu estou de folga, as pessoas se preocupam, sentem minha falta"
Luciano Guimar�es, porteiro
“A cultura est� muito judiada nesses �ltimos anos e veio a pandemia para piorar ainda mais essa situa��o. Ent�o eu acho �timo ver as coisas voltando ao normal. � uma certa emo��o, sim”. Sobre sua escolha por “Nomadland”, comentou: “A expectativa � boa, eu li bastante a respeito, parece que � um filme muito bom. Ent�o vamos conferir, como a gente sempre faz. Voltar � sempre bom.”
A sess�o, no entanto, n�o estava cheia. Respeitando o limite de 60% da capacidade, havia apenas cinco pessoas na sala 2. As luzes se apagaram, todos ficaram em sil�ncio e, por alguns segundos, parecia que tudo havia voltado ao normal. As lembran�as daquele tempo anterior � pandemia floresceram. Nada como uma sala de cinema para nos ajudar a amenizar a realidade.
*Estagi�rio sob a supervis�o da editora Silvana Arantes