
Uma das mais festejadas e premiadas companhias de teatro do pa�s, a Luna Lunera est� completando duas d�cadas de trajet�ria neste ano. Para marcar a data, apresenta, a partir deste s�bado (7/8), uma diversificada programa��o on-line, que se estende at� outubro.
Com a “Mostra Luna Lunera 20 anos”, a trupe vai trazer de volta ao p�blico, no ambiente digital, alguns de seus espet�culos e tamb�m apresentar algumas novidades: a leitura dram�tica da pe�a “Aqueles dois”, um curta-metragem in�dito – criado a partir de “Nesta data querida” – e o lan�amento de um livro com a dramaturgia do espet�culo “Urgente”.
Neste s�bado e no pr�ximo (14/07), ser�o feitas lives com artistas importantes na trajet�ria do coletivo, como Adolfo Mazzarini, �ngela Mour�o, Cida Falabella, Chico Pel�cio, Guilherme Marques, Jane Schoninger, Marcelo Bones, Pablo Bertola e Tuca Pinheiro. Toda a programa��o, que � gratuita, pode ser acompanhada pelo canal da Luna Lunera no YouTube.
Integrante da companhia e coordenador da mostra, Marcelo Souza e Silva diz que o desejo era realizar as comemora��es pelos 20 anos do grupo com a presen�a do p�blico, o que se tornou invi�vel diante da pandemia.
“Tentamos entender quais obras seriam melhor adaptadas ao virtual e que a��es poderiam substituir o encontro presencial. Por exemplo, a gente tem o ‘Nesta data querida’, espet�culo de 2003, que, portanto, tem quase 20 anos, mas � muito atual, lida com temas contempor�neos, tem um car�ter de universalidade, ent�o a gente entendeu que, por ser uma montagem mais intimista, s� com tr�s atores em cena e a a��o se passando num �nico local, essa seria a melhor pe�a para ser adaptada. Pensamos numa coisa como um curta-metragem, pegamos uma equipe reduzida e partimos para essa produ��o. � um espet�culo que permitia essa transposi��o”, conta.
O curta, que teve dire��o da premiada cineasta Juliana Antunes, de “Baronesa”, ser� lan�ado no dia 23 de setembro. Outro espet�culo que marcou a hist�ria, “Aqueles dois” – que projetou nacionalmente a trupe mineira –, tamb�m chega ao ambiente digital com outra cara.
Leitura
No pr�ximo dia 19, o p�blico poder� assistir � leitura dram�tica de “Aqueles dois”, que vai reunir os nove atores que integraram o elenco do espet�culo, em diferentes momentos, desde a estreia, em 2007. “� um espet�culo que tem uma din�mica muito pr�pria, a gente entendeu que uma adapta��o seria complexa”, diz Marcelo.“S� que ele guarda uma particularidade: � encenado por quatro atores, mas oito j� passaram pelo elenco, uns substituindo outros que sa�ram por necessidades distintas. Ent�o, com esses oito atores no hist�rico do espet�culo – e um nono, que chegou como codiretor –, vimos a possibilidade de criar uma adapta��o, uma releitura que conseguisse abrigar esses nove atores, que, na verdade, nunca estiveram juntos em cena. A gente gerou uma leitura dram�tica, que foi gravada previamente, com os nove. Al�m do texto, do roteiro, a gente vai inserindo elementos sonoros e visuais do espet�culo, o que se soma � din�mica de intera��o entre os atores”, descreve.
Ele salienta que na programa��o da “Mostra Luna Lunera 20 anos” h� alguns espet�culos que n�o foram adaptados e que chegar�o ao p�blico, pelo canal do YouTube, como foram ao palco, mas seguidos de um bate-papo sobre seus processos de cria��o e desenvolvimento. � o caso de “Prazer”, grande sucesso da companhia.
“A dramaturgia est� muito atrelada ao cen�rio, que � mais imponente, ent�o tem uma dificuldade a� de transpor, por causa da complexidade que o cen�rio prop�e. Nesses casos, optamos por exibir a grava��o e, na sequ�ncia, a conversa com a equipe”, aponta.
O espet�culo “Urgente”, que estreou em 2016, tamb�m integra a mostra com um elemento a mais. “A gente traz como novidade, al�m da exibi��o da grava��o, o lan�amento do texto publicado, que sai em outubro, o ‘Livro Urgente’. A gente nunca tinha publicado nenhuma das nossas dramaturgias. Pelas quest�es que esse espet�culo carrega, pela contemporaneidade dele, entendemos que era o melhor para ser publicado”, diz.
Todas essas a��es e extens�es pensadas para trazer de volta ao p�blico, no ambiente virtual, momentos marcantes da trajet�ria da Luna Lunera foram fruto de reflex�es postas a partir do desafio de se pensar num teatro n�o presencial – o que contraria a pr�pria ess�ncia das artes c�nicas.
“Acho que cada uma dessas a��es guarda sua complexidade, porque todas s�o carregadas desse desejo pelo presencial, ent�o a gente teve que pensar de forma muito cuidadosa como fazer esses espet�culos chegarem da melhor forma ao espectador. Teatro gravado tem suas limita��es, n�o tem o fator de catarse do ao vivo. Essa foi a grande dificuldade, entender como a gente pode ser aproximar o m�ximo poss�vel do espectador.”
Um olhar no retrovisor
Fazendo um retrospecto dos 20 anos de trajet�ria da Luna Lunera, Marcelo Souza e Silva considera que os momentos mais marcantes foram aqueles definidores de rumos. Ele cita, por exemplo, o "Nesta data querida", que foi gestado no Galp�o Cine Horto e investigou o processo colaborativo de cria��o, que horizontaliza as din�micas de realiza��o.A partir daquele momento, todos os outros espet�culos foram criados com essa perspectiva, com tudo sendo compartilhado com toda a equipe. “Isso virou uma marca do grupo”. Marcelo destaca que o "N�o desperdice sua vida" tamb�m � muito marcante, porque consolida esse processo colaborativo e instaura nas cria��es da trupe uma rela��o com a pr�pria biografia de seus integrantes. “A partir dali a gente sempre guarda nos espet�culos alguma rela��o com nossas hist�rias, as quest�es que nos afligem em determinados momentos”, diz.
“Aqueles dois” e “Prazer” s�o, em sua opini�o, os espet�culos mais autorais do repert�rio da Luna Lunera. “� um dos grandes marcos, porque ele nasce de uma crise, de um questionamento de continuidade ou n�o do grupo, com uma crise financeira instaurada, ent�o foi o momento em que surgiram muitas d�vidas: a gente continua? E se continua, como? Com as experi�ncias que cada um viveu, no grupo e fora, o que cada um tem a oferecer? Isso gerou o espet�culo de maior repercuss�o do grupo, que viajou muito e projetou a companhia nacionalmente.”

Parceiro de toda hora
Figura essencial na trajet�ria da Luna Lunera, que sempre esteve muito pr�xima, o ator Chico Pel�cio, do Grupo Galp�o, recorda do impacto que sentiu ao assistir � primeira encena��o da companhia – “Perdoa-me por me tra�res”, de Nelson Rodrigues, em 2001 – e de como, a partir dali – e por causa do sucesso que a pe�a fez – orientou alguns caminhos que a trupe passaria a seguir.
“Eles sempre me procuraram para saber por onde ir, como se estruturar. Tem um carma que normalmente recai em cima do grupo que faz muito sucesso com uma pe�a, que � o n�o saber como continuar. Essa experi�ncia eu j� tinha visto em v�rios outros grupos, e eu percebi que o Luna, com o sucesso do Nelson Rodrigues, precisava de um novo espet�culo, para sair desse lugar, onde existe uma cobran�a grande”, diz.
Pel�cio conta que provocou a trupe a entrar num projeto do Galp�o Cine Horto, batizado “3 x 4”, que propunha processos colaborativos. Eram quatro grupos que passariam um ano no Cine Horto, com supervis�o de Ant�nio Ara�jo, de Luiz Alberto Abreu e de Francisco Medeiros.
“Fiz essa provoca��o para que eles sa�ssem de uma certa in�rcia que o sucesso provoca. Por meio desse projeto, montaram o ‘Nesta data querida’, que deslanchou o processo de cria��o deles, e a gente ficou muito pr�ximo”, ressalta.
Marcelo Souza e Silva considera o Grupo Galp�o uma das principais refer�ncias para a Luna Lunera. Chico Pel�cio enxerga os reflexos do que o Galp�o faz no trabalho da trupe? Identifica pontos de contato entre as duas companhias? “Eu acho que os contatos se d�o mais pelo ponto de vista �tico, pela postura de se colocar dentro da sociedade fazendo teatro. Artisticamente, o Luna foi para outro caminho, felizmente, com uma linguagem pr�pria, que se ancora na hist�ria dos pr�prios atores, do coletivo. Foram muito s�bios e pertinentes em se inspirarem na hist�ria deles. Mas vejo semelhan�as nesse aspecto, no compromisso de ter o teatro como uma a��o cidad�, levar adiante sem neglig�ncia, sem facilidades”, opina.