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Estado de Minas LIVROS

Guitarrista Pete Townshend, da lend�ria The Who, lan�a 'A era da ansiedade'

Romance de estreia do m�sico explora os temores da vida moderna, incluindo os do pr�prio escritor


16/08/2021 04:00 - atualizado 16/08/2021 07:04

Conhecido como músico e compositor da banda The Who, Pete Townshend não teme virar ''personagem'' de seu próprio livro: ''Tenho que aceitar que um leitor vai querer me colocar na história ou me descobrir nela''(foto: SUZANNE CORDEIRO/AFP)
Conhecido como m�sico e compositor da banda The Who, Pete Townshend n�o teme virar ''personagem'' de seu pr�prio livro: ''Tenho que aceitar que um leitor vai querer me colocar na hist�ria ou me descobrir nela'' (foto: SUZANNE CORDEIRO/AFP)

Em 2015, o guitarrista e compositor ingl�s Pete Townshend, um dos l�deres da m�tica banda The Who, confidenciou que tocava um projeto, fazia ent�o sete anos, chamado “A era da ansiedade”. "Estou muito contente com o trabalho", disse ele. "No fim das contas, ser� um concerto, uma exposi��o de arte ou, quem sabe, um livro. Talvez as tr�s coisas." Acabou resultando em um livro, lan�ado agora pela editora Rocco.

Concebido como �pera-rock, trata-se do romance de estreia do m�sico de 76 anos, que explora a ansiedade da vida moderna. A trama acompanha duas gera��es de uma fam�lia londrina, com destaque para quatro personagens, cujas rotinas se cruzam em uma espiral fora de controle: um cultuado e decadente astro do rock, que se torna um pintor ermit�o; um negociante de arte que, sob efeito de drogas pesadas, tem vis�es de rostos demon�acos gritando; uma jovem irlandesa, que ainda crian�a esfaqueou o pai para salvar a irm� de abusos recorrentes; e um jovem compositor ingl�s em ascens�o que tem alucina��es auditivas durante seus shows, acreditando ouvir as manifesta��es de medo e ansiedade de seu p�blico. Medos que refletem os pr�prios temores de Townshend, como revela na entrevista a seguir, realizada por e-mail.

''N�o descarto a possibilidade de anjos, assim como n�o descarto a possibilidade da consci�ncia universal refletir a partir da presen�a do que muitos de n�s gostamos de chamar de 'Deus'''

Pete Townshend, m�sico e compositor da banda The Who



Na m�sica, n�o � comum uma letra ter reviravoltas ou lances inesperados, isso � algo essencialmente liter�rio. Como foi a experi�ncia nesse romance?
Isso mesmo. Sinto que, na m�sica, o ouvinte decide como a narrativa se encaixa em sua pr�pria vida e permite que tire suas conclus�es. Isso vai soar muito pretensioso, mas dessa forma os conceitos do rock est�o mais pr�ximos do trabalho cinematogr�fico de algu�m como Andrei Tarkovsky do que de George Lucas. No caso do meu livro, eu esperava me aproximar do Lucas, mas acho que fiquei entre os dois. Como encontrei a enredo? � relativamente f�cil contar uma hist�ria com v�rias mudan�as na hist�ria. Foi dif�cil acompanhar a cronologia, a maneira como os personagens envelheciam e mudavam fisicamente.

Gradualmente, o leitor descobre que n�o pode confiar no narrador. Por qu�?
Ele � um viciado em hero�na de longa data, o que �s vezes � chamado de "viciado funcional". Ele dirige seu neg�cio de arte, consegue criar a filha e o afilhado muito bem, mas o casamento acaba. Com isso, alucina e perde longos per�odos da vida. Ele n�o � digno de confian�a porque foi acusado de um crime sexual relacionado �s drogas e n�o tem certeza se � realmente culpado. Esta � a raz�o pela qual conta sua hist�ria. Ele quer se redimir. Se for considerado culpado, est� pronto para ser julgado, mas precisa ter certeza. Se n�o for culpado, deseja que o leitor saiba quem � o respons�vel por acus�-lo. De fato, n�o � confi�vel, mas, conforme eu escrevia a hist�ria, comecei a gostar muito dele. Ele � como muitos viciados que conheci, especialmente no trabalho que fiz entre 1973 e 1985 com cl�nicas de reabilita��o: falho, mas ador�vel.

� proposital o paralelo entre o livro “A era da ansiedade” e “Tommy”, a �pera-rock do The Who?
H� um eco deliberado de “Tommy” na cena de abertura, onde um velho astro do rock que perdeu a cabe�a voa sobre um lago em uma asa-delta. Isso evoca a cena final do filme “Tommy”, de Ken Russell. Em outros n�veis, o romance n�o se conecta a “Tommy” de forma alguma, ou n�o era para isso. “Tommy” era sobre um menino que passa por um aprisionamento psicol�gico depois de um evento traum�tico e, por isso, parece ser autista. J� o romance � sobre um jovem astro do rock que ouve a ansiedade de seu p�blico e daqueles que vivem ao seu redor, no oeste de Londres, uma �rea rica. Eles s�o pr�speros, mas temem pelo futuro de seus filhos.

Ali�s, em “Tommy”, voc� falava de si mesmo, de sua pr�pria inf�ncia. Ent�o, seu jovem her�i, Walter, � semelhante a Tommy?
Eu estava revelando minha inf�ncia sim, mas estava inconsciente! S� recentemente percebi o que tinha feito. Walter ouve "m�sica", como eu quando jovem. Mas Walter ouve essa m�sica como um som desorganizado, abstrato e perturbador. O que ouvi quando crian�a era muito bonito. Nunca ouvi a ansiedade do meu p�blico.

No romance, h� personagens que conversam com anjos, o que mostra a import�ncia da espiritualidade para voc�, certo?
Isso � algo malicioso da minha parte. Quando estava pesquisando sobre minhas personagens femininas, conversei com algumas amigas e duas delas afirmaram ter vis�es e conex�es angelicais. Ocasionalmente, tenho a sensa��o de que minha vida � guiada por alguma for�a externa benigna. N�o descarto a possibilidade de anjos, assim como n�o descarto a possibilidade da consci�ncia universal refletir a partir da presen�a do que muitos de n�s gostamos de chamar de "Deus". Mas tudo isso � minha posi��o pessoal, que muda o tempo todo.

No processo de escrita, qual foi a maior limita��o a ser superada e a maior recompensa que voc� teve?
Escrever can��es n�o � como escrever poesia. H� uma estrutura muito limitada que voc� tem que trabalhar de forma l�rica. De certa forma, o compositor est� tentando criar uma atmosfera – apoiada pela m�sica – que desperta imagens e sentimentos para o ouvinte. � uma arte bastante obscura, penso eu. Pode acontecer em minutos, ou em menos de uma tarde. Escrever uma hist�ria fict�cia requer menos disciplina, mas muito mais tempo e concentra��o. Escrever uma can��o e escrever um romance s�o semelhantes em um aspecto: voc� precisa ter uma �nica ideia poderosa que lhe permita explicar seu processo �queles que est�o interessados de forma muito breve e sucinta em uma �nica frase, mas tamb�m dar a si mesmo algo forte para se agarrar. Com “Quadrophenia”, por exemplo, a pequena hist�ria na capa do �lbum poderia ter sido baseada na mesma premissa que a can��o “My generation”. Um jovem, drogado, tenta escapar de seus dem�nios e acaba perdido, em uma esp�cie de ora��o de ang�stia adolescente. Para o livro, a �nica ideia era que um jovem m�sico se distrai e fica mentalmente doente e deficiente musicalmente, por ser excessivamente receptivo �s ansiedades de seu p�blico.

Suas preocupa��es filos�ficas ou de escrita se mantiveram durante o processo de escrita do livro?
Meu principal objetivo era fornecer a mim mesmo uma hist�ria s�lida o suficiente para sustentar um libreto de �pera que eu tinha que escrever. Em 2008, quando comecei a pesquisar, conversando com amigos, percebi que o medo e a ansiedade estavam aumentando ao meu redor muito rapidamente. Na verdade, durante o processo de escrita, o ch�o se moveu sob mim, de modo que, quando o romance foi publicado, j� est�vamos profundamente ansiosos com o aquecimento global e a pandemia, que se seguiu alguns meses depois. Ent�o, percebi que tinha que tomar uma posi��o sobre muitos assuntos que antes n�o havia considerado especialmente importantes para mim. Perguntaram-me o que eu pensava, quais eram minhas ideias pol�ticas, qual era a minha posi��o moral em rela��o a muitas quest�es. Foi ent�o, em 2019, que tomei consci�ncia da incr�vel velocidade com que a sociedade vinha evoluindo enquanto escrevia meu romance. Meras opini�es est�o sendo rejeitadas. H� muito melodrama, quando deveria haver aten��o ao real drama que nos amea�a. Desperdi�amos 75 anos tentando encontrar algu�m a quem culpar pelo que agora � visto como neglig�ncia por parte dos l�deres pol�ticos. E, ainda assim agora est� claro que n�o podemos esperar que os pol�ticos fa�am algo de �til sem uma postura revolucion�ria e ativista que todos devemos assumir.

Romancistas t�m uma obriga��o moral para com seus personagens e leitores?
N�o, mas figuras p�blicas t�m. Se eu fosse apenas um romancista, revelaria inteiramente para o leitor uma postura moral sobre meus personagens. Mas sou conhecido como m�sico e compositor. Tenho que aceitar que um leitor vai querer me colocar na hist�ria em algum lugar ou me descobrir nela. Para facilitar e, espero, distrair menos, escrevo sobre m�sica e suas fontes; criatividade e seus gatilhos; e adultos que �s vezes se comportam como bobos infantis (assim como estrelas de rock!). Acima de tudo, sinto um dever para com meus leitores. Ainda sou um astro  do rock e senti isso muito fortemente quando The Who se apresentou no Brasil, em S�o Paulo, em 2017: muitos na plateia eram t�o jovens e, no entanto, t�o bem informados sobre nossa m�sica. Isso me fez sentir mais jovem e perceber que tudo o que digo e fa�o, � medida que fico muito velho, lan�a far�is portentosos para que nosso p�blico possa observar e reagir. (Estad�o Conte�do)
(foto: Editora Rocco/divulgação)
(foto: Editora Rocco/divulga��o)

A ERA DA ANSIEDADE
• De Pete Townshend
• Tradu��o de Maira Parula
• Editora Rocco
• 304 p�ginas
• Pre�o: R$ 69,90 e R$ 34,90 (e-book)




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