
Tais obras s�o o desdobramento de um trabalho iniciado em 2016, com o desenvolvimento de atividades art�stico-pedag�gicas dentro de um complexo penitenci�rio feminino em Belo Horizonte. Realizada no �mbito do projeto “A arte como possibilidade de liberdade”, essa a��o resultou no espet�culo “Banho de sol”, grande sucesso da companhia, levado aos palcos em 2019 e que circulou por diversos espa�os de Belo Horizonte.
A live que ser� realizada na pr�xima quinta-feira, no canal do YouTube da Zula Cia. de Teatro, �s 20h, ter� exibi��o de trechos do document�rio e dos podcasts, junto com uma contextualiza��o de toda a trajet�ria do projeto.
Em 2018, ap�s um ano ministrando aulas de inicia��o teatral para mulheres no complexo penitenci�rio, a companhia iniciou o processo de cria��o do espet�culo “Banho de sol” como forma de levar para um p�blico mais amplo a cena curta hom�nima apresentada pelas alunas no encerramento do curso.
Ao longo de todo o ano, foram realizados ensaios fechados com toda a equipe art�stica do projeto e tamb�m ensaios abertos para mulheres egressas do sistema prisional e para adolescentes que cumpriam medida no Centro Socioeducativo S�o Jer�nimo.
ENSAIO ABERTO
“No nosso primeiro ensaio aberto, fizemos contato com a terapeuta ocupacional do Centro Socioeducativo S�o Jer�nimo que nos foi indicada e ela levou as meninas para a apresenta��o. Foi uma experi�ncia incr�vel, e elas passaram a assistir a todos os ensaios abertos. Um dia, uma das meninas deu a ideia de a gente levar esse projeto para o S�o Jer�nimo, da� todas as outras fizeram coro, ficaram muito empolgadas”, conta a atriz Talita Braga, uma das fundadoras da Zula Cia. de Teatro.
Ela diz que a trupe, ent�o, inscreveu e teve aprovado o projeto no Fundo Municipal de Cultura, e conseguiu autoriza��o do juiz respons�vel pelas adolescentes para que elas pudessem circular por quatro teatros com o espet�culo que seria montado ao longo do curso.
Como havia acontecido com as mulheres do complexo penitenci�rio, foi formada uma equipe de arte-educadoras que iria lidar diretamente com as adolescentes do centro socioeducativo, todas com idades entre 14 e 18 anos.
Essa equipe reuniu, al�m de Talita Braga, Andr�ia Quaresma e Andr� Veloso, tamb�m integrantes da Zula, os colaboradores Gl�ucia Vandeveld, Kelly Crifer, Mariana Maioline, J�lia Tizumba, Luciana Campos e Alexandre Tavera. Os trabalhos no S�o Jer�nimo tiveram in�cio, segundo Talita, em 5 de mar�o do ano passado, com uma apresenta��o de “Banho de sol” para as garotas, no p�tio.
“Na semana seguinte, a gente chegou a dar uma aula presencial, e logo em seguida a pandemia chegou. Paramos uma semana, conversamos com a diretora do centro, �rika Vinhal, e ela topou dar continuidade ao projeto remotamente”, conta Talita.
“Come�amos a pensar em como seria a metodologia, j� que l� n�o tinha internet, e chegamos � ideia de usar pen drive. A gente gravava as aulas, o Andr� Veloso editava e um motorista levava at� o S�o Jer�nimo. As meninas ouviam o material, gravavam l� v�deos e �udios como resposta e nos enviavam. A partir da� a gente pensava a pr�xima aula”, conta a atriz.
O document�rio e os podcasts foram constru�dos a partir desse conte�do. Luciana Campos, que ficou respons�vel pelos roteiros tanto do document�rio quanto da s�rie em podcast, ressalta a franqueza nos depoimentos das adolescentes, que falam abertamente sobre seus sonhos, o que gostam e o que n�o gostam.
Ela diz que o processo de conquistar a confian�a das meninas se deu pela troca. “Durante as primeiras aulas, elas tamb�m quiseram saber da gente o que quer�amos com esse projeto, o que esper�vamos alcan�ar, o que foi a chave, um momento de virada”, afirma.
“Elas nos enviavam as perguntas, que propunham como um desafio, e a gente respondia. Outro momento importante nesse processo de aproxima��o foi quando a gente come�ou a apresentar uma s�rie de slams, competi��es de poesia falada. Isso chegou de uma forma muito potente para elas. Tivemos a alegria de contar com a Nivea Sabino no document�rio”, diz, citado a slammer criadora do projeto RodaBH de Poesia, que figura como uma das convidadas do projeto.
ROTEIRO
A poesia falada, assim como a m�sica, surge como elemento marcante tanto no document�rio quanto no podcast. O roteiro tamb�m inclui elementos pr�prios do teatro no desenvolvimento da hist�ria. Talita destaca que n�o se trata, portanto, apenas de um registro jornal�stico do que foi realizado dentro do Centro Socioeducativo S�o Jer�nimo ao longo de um ano. “Document�rio e podcast s�os duas obras art�sticas. Tem a m�sica da J�lia Tizumba, do Maur�cio Tizumba e do S�rgio Perer�, tem a poesia falada, tem representa��o, e o roteiro vai costurando tudo isso com os relatos para falar dessa dura realidade das adolescentes em priva��o de liberdade. � uma dramaturgia muito bonita”, avalia.
Com a impossibilidade de levar adiante a ideia inicial de realizar uma montagem com as alunas, que circularia por teatros, Luciana diz que come�ou a pensar em formatos que poderiam abarcar os registros audiovisuais de que o grupo dispunha.
“A gente queria que tivesse uma narrativa que desse espa�o para a voz delas. Pensamos nessa quest�o da palavra, em como dar destaque a isso. Tentei escrever um roteiro utilizando esses elementos, a poesia, o texto em prosa, a m�sica, a quest�o da voz, a forma como as meninas se expressavam, e o que era poss�vel fazer juntando tudo isso.”
Teatro document�rio
A Zula Cia. de Teatro sempre teve, desde sua origem, em 2010, as pesquisas em torno do teatro document�rio como cerne. O projeto “A arte como possibilidade de liberdade” e, principalmente, a chegada da pandemia levaram a um aprofundamento dessa proposta, com um maior foco na rela��o entre a arte teatral e o document�rio – algo que permeia todos os espet�culos do grupo – e as conex�es entre teatralidade e produ��o audiovisual.
“Foi um processo que a gente foi descobrindo aos poucos, tomando consci�ncia � medida que as atividades art�stico-pedag�gicas estavam se desenrolando”, aponta a confundadora da companhia, Talita Braga.
Ela diz que a equipe seguiu com o projeto de forma remota ao longo de 2020, ainda acreditando que ele resultaria num espet�culo “de formatura” com as adolescentes. “S� no fim do ano � que caiu a ficha de que n�o ia acontecer, a pandemia n�o ia permitir. A gente tinha um contato enorme com as meninas, que se deu s� por meio audiovisual. O que criar com isso? T�nhamos muito material de �udio, por WhatsApp e de v�deo, que � como vinham as respostas delas”, conta.
IMAGEM
Ela destaca que o principal objetivo desse projeto era fazer com que as vozes e os corpos das adolescentes contassem suas pr�prias hist�rias. “N�o podia ter imagem delas, para preservar mesmo, porque est�o cumprindo medidas socioeducativas. Da� veio a ideia da s�rie em podcast. Por outro lado, t�nhamos n�o mais um teatro document�rio, mas um document�rio sobre o teatro, sobre o nosso processo, que, no entanto, engloba uma dimens�o art�stica, n�o se at�m apenas ao registro”, explica.
Desenvolver essa ideia sem a possibilidade do encontro foi um desafio para a equipe, que teve que se organizar e se desdobrar em fun��es diversas. “Em momento algum ningu�m pensou em desistir, est�vamos dispostas a encontrar um caminho poss�vel. Cada um da equipe contribuiu com seu conhecimento, mas as fun��es mudaram, todo mundo participou de tudo. Todo mundo estava fazendo as aulas filmadas, ent�o toda a equipe gravou cenas, cada um de n�s dan�ava, virava personagem, at� a Luciana, que, portanto, n�o ficou s� com a incumb�ncia do texto. Foi um processo muito bonito”, afirma.
MUDAN�A
Andreia Quaresma, tamb�m uma das fundadoras da Zula, considera que o projeto “A arte como possibilidade de liberdade/Trajet�ria Centro Socioeducativo S�o Jer�nimo” cumpriu com seus objetivos, na medida em que impactou as adolescentes envolvidas. Ela afirma que foi muito percept�vel, durante todo o processo, uma grande mudan�a de comportamento delas.
“As pr�prias funcion�rias do Centro comentavam que as meninas estavam mais tranquilas, engajadas em responder �s aulas, ensaiando nos corredores. Uma das adolescentes, com quem tive contato depois, me disse que descobriu o amor pelo teatro, que vai querer fazer, se tiver essa oportunidade”, diz.
Ela acredita que a a��o serviu para que as adolescentes pudessem se conhecer melhor, se sentir mais felizes, capazes de criar e de fazer coisas que, at� ent�o, elas n�o sabiam que podiam. “Foi uma coisa que iluminou a vida das meninas nesse per�odo, isso foi muito percept�vel. Estar em priva��o de liberdade � algo que causa muitos problemas emocionais, elas ficam muito nervosas, comem com ansiedade, e, de repente, o foco mudou, elas foram para o lugar do l�dico, da cria��o, da arte. Foi muito bonito de ver, mesmo dentro de uma rotatividade grande”, diz, aludindo ao fato de que, durante o processo, muitas alunas deixaram o Centro Socioeducativo S�o Jer�nimo e outras tantas chegaram.
Andreia salienta que o lan�amento do document�rio e da s�rie em podcast encerra o projeto, mas que permanece o desejo de retomar o contato com as adolescentes que participaram da a��o e, futuramente, levar a cabo a ideia da montagem de um espet�culo que possa circular por teatros da cidade. “Mas a� teria que ser outro projeto, com uma nova forma de chegar at� as meninas e executar isso. Vamos tentar.”
PR�XIMOS CAP�TULOS
Confira a agenda de epis�dios do podcast*
Epis�dio 2
•“A voz � minha for�a inteira”
(9 de setembro)
Epis�dio 3
•“Palavras espalhadas pelo mundo inteiro” (16 de setembro)
Epis�dio 4
•“Cantar � liberdade”
(23 de setembro)
Epis�dio 5
•“Cartas para o amanh�”
(30 de setembro)
*Dispon�vel no Spotify e Deezer da Zula Cia. de Teatro, al�m do YouTube da companhia
•“A arte como possibilidade de liberdade/Trajet�ria Centro Socioeducativo S�o Jer�nimo”
Live de estreia do document�rio e do epis�dio 1 da s�rie em podcast “Vozes al�m dos muros”, intitulado “Cartas do agora”. Nesta quinta-feira (2/09), �s 20h, no
YouTube da Zula Cia. de Teatro