
Ao celebrar
50
anos de trajet�ria art�stica,
Guilherme Arantes
, precursor do
pop rom�ntico
no Brasil, mant�m-se em plena atividade. Radicado na Europa, o cantor e compositor paulistano acaba de lan�ar “
A desordem dos templ�rios
”, o 25º t�tulo de sua obra fonogr�fica.
Quando, em 2019, deixou o litoral baiano, onde criou a ONG Planeta �gua, e se instalou em �vila, na Espanha, o intuito era estudar m�sica barroca. Cercado de castelos medievais, viu surgir a inspira��o para criar as 10 can��es, gravadas remotamente com a participa��o de m�sicos no Brasil e registradas no novo
�lbum
, que saiu em formato f�sico e est� dispon�vel nas plataformas digitais.
Destacam-se, tamb�m, esbo�os de rock progressivo, g�nero que marcou o in�cio da carreira do jovem m�sico, como l�der da banda Moto Perp�tuo, representado por “El rastro” e “Nenhum sinal de sol” e, claro, “A desordem dos templ�rios”. Chama a aten��o, ainda, “Estrela m�e”, que Arantes comp�s para a m�e, a quem tinha como refer�ncia, morta recentemente.
Na entrevista a seguir, Guilherme Arantes se deteve, de forma reflexiva, em aspectos e momentos de sua carreira. Ao criticar os respons�veis pela crise h�drica que se espalha pelo pa�s, lembrou que, quando comp�s “Planeta �gua”, outro dos seus cl�ssicos, cantava a abund�ncia, e n�o a car�ncia.
Do in�cio com a banda Moto Perp�tuo ao rec�m-lan�ado �lbum “A desordem dos templ�rios”, que avalia��o faz de sua trajet�ria art�stica?
Sou um privilegiado por ter atravessado tantas d�cadas t�o heterog�neas e din�micas, construindo v�rios tipos de valores agregados... N�o � apenas falar de “sucesso” porque essa palavra em si � vazia, � enganadora, � uma constru��o alg�brica de aquisi��o de meras quantidades e, obviamente, o meu caso, como de v�rios da nossa gera��o, � muito mais de durabilidade no significado. Isso � imensur�vel, tem um valor muito mais complexo para se avaliar.
Celebrar 50 anos de carreira que representatividade tem para voc�?
Ent�o, � essa completude, essa abrang�ncia que faz a trajet�ria da gente ser uma vis�o bela: olhar em retrospecto e enxergar virtude do amor pelo que se faz na vida, neste mundo, o legado que se constr�i ano a ano. � muito mais do que o circunstancial. � uma coer�ncia deliciosa de se saborear.
A d�cada de 1980 pode ser vista como a de maior relev�ncia do seu trabalho?
Relev�ncia comercial, sim, porque a ind�stria cultural estabelece como auge o per�odo de fertilidade biol�gica, o conceito de “juventude”, mas isso � enganoso. Relev�ncia mesmo, geralmente, � conquistada bem mais tarde, j� na maturidade ou at� na terceira idade. Quando se � jovem, o mundo nos d� a fama e a popularidade do desejo, da atra��o f�sica, que � o n�vel imag�tico sexual do carisma na sociedade. H� exce��es nisso, h� jovens que j� “v�m de f�brica” com um carisma amadurecido: Cazuza, Chico, Renato Russo, Chor�o, C�ssia Eller s�o alguns exemplos disso... No meu caso, essa “relev�ncia” foi mesmo muito trabalhosa.
Entre os muitos hits que voc� emplacou, h� os que s�o mais apreciados? Por qu�?
Existiram �pocas muito mais generosas na constru��o disso que chamamos de hits... Os anos 1950, 1960, 1970, 1980... eram mais abrangentes, n�o eram t�o segmentados. Com o desenvolvimento massivo das tecnologias, as d�cadas vieram sucessivamente dilapidando, demolindo essa capacidade de cont�gio, e os hits foram se tornando corriqueiros na ind�stria cultural, esse � um problema mundial. � como se nada mais fosse grande novidade no mundo.
Como o autor da can��o “Planeta �gua”, de tem�tica ecol�gica, v� a crise h�drica que os brasileiros est�o enfrentando?
Pois �, e pensar que eu cantava a abund�ncia, e n�o a car�ncia... H� fatores clim�ticos sazonais em grande escala tamb�m: n�o � exclusivamente responsabilidade humana nesse fen�meno. O Brasil tem na �gua o seu elemento-chave, at� espiritual. Espero que o pa�s ainda consiga construir uma estrutura melhor, mais robusta, de engenharia h�drica, n�o apenas no imediatismo do mero extrativismo da irriga��o ou gera��o energ�tica, mas algo muito maior, de planifica��o geopol�tica: a �gua � um recurso estrat�gico em todo o mundo, sempre foi, e sempre ser�.
A ONG Planeta �gua, no litoral baiano, continua em funcionamento, mesmo com a sua aus�ncia, j� que est� radicado na Espanha?
No momento, estamos parados. H� quest�es sociopol�ticas muito graves envolvendo aquela regi�o da foz do sistema Jacu�pe/Capivara Grande. Na minha volta, para o ano, vamos ver o que d� para se fazer. Por ora, estamos todos, ali�s, como tudo no Brasil, em compasso de emerg�ncia, esse � o termo mais adequado que eu encontro para o momento…
O seu novo disco traz can��es na linha pop rom�ntico – sua marca registrada – , mas tamb�m esbo�o de rock progressivo. Foi uma volta ao come�o?
Sim, foi uma retomada deliciosa para mim, em forma de del�rios de um “coroa” repleto de reminisc�ncias... Uma viagem muito pessoal... E que me deixa muito feliz ao realiz�-la…
Vivenciou qual sentimento ao compor “Estrela m�e”, uma das faixas do CD, em que reverencia a pessoa mais importante da sua vida?
Ah... foi um privil�gio enorme conseguir dar forma a essa gratid�o, em versos de pura entrega, e ainda ter sido ouvido por ela. Eu tentei me esmerar ao m�ximo na beleza dessa entrega, essa declara��o de amor incondicional, bem coisa de filho querendo retribuir � m�e... Eu ia compondo, e ia chorando, isso foi fundamental nessa m�sica.
Que expectativa tem em rela��o ao mercado quando lan�a um disco?
O olhar n�o fica mais t�o voltado para coisas que j� ficaram relativizadas com o tempo, tais como vendas, quantidades de views, n�mero de seguidores, listas de mais tocadas... A gente fica muito mais de olho na qualidade dos sentimentos que as m�sicas s�o capazes de provocar na vida das pessoas.
Sou um privilegiado por ter atravessado tantas d�cadas t�o heterog�neas e din�micas, construindo v�rios tipos de valores agregados... N�o � apenas falar de ‘sucesso’, porque essa palavra em si � vazia”
“Quando se � jovem, o mundo nos d� a fama e a popularidade do desejo, da atra��o f�sica, que � o n�vel imag�tico sexual do carisma na sociedade”
“H� exce��es.... h� jovens que j� ‘v�m de f�brica’ com um carisma amadurecido: Cazuza, Chico, Renato Russo, Chor�o, C�ssia Eller s�o alguns exemplos disso...”
“Pois �, e pensar que eu cantava a abund�ncia, e n�o a car�ncia (em ‘Planeta �gua’)... Espero que o pa�s ainda consiga construir uma estrutura melhor, mais robusta, de engenharia h�drica”
“(Sobre a expectativa do mercado) o olhar n�o fica mais t�o voltado para coisas que j� ficaram relativizadas com o tempo, tais como vendas, quantidades de views, n�mero de seguidores, listas de mais tocadas...”
Guilherme Arantes,
cantor e compositor