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Estado de Minas AUDIOVISUAL

Com Rodrigo Santoro e Christian Malheiros, '7 prisioneiros' chega � Netflix

Os caminhos de um garoto que almeja uma vida melhor e de um dono de ferro-velho que submete trabalhadores a condi��es an�logas � escravid�o se cruzam no filme


11/11/2021 04:00 - atualizado 11/11/2021 07:37

Christian Malheiros de pé numa fábrica de roupas
O papel do migrante Mateus foi escrito para Christian Malheiros, que havia sido escolhido em teste para protagonizar 'S�crates', longa de estreia do diretor Alexandre Moratto (foto: Fotos: Aline Arruda/Divulga��o )
O ano era 2002 e o cineasta Fernando Meirelles enfrentava a maratona de lan�amento de “Cidade de Deus”. Isso incluiu uma palestra na escola da filha, Cac�, em S�o Paulo. O col�gio compareceu em peso, e o diretor passou tr�s horas conversando com os adolescentes. 

J� se preparando para ir embora, o diretor foi abordado pelo aluno Alexandre Moratto, de 14 anos. Este se apresentou e disse que, no futuro, seria cineasta. Meirelles sorriu, conversou com o garoto durante alguns minutos, deu-lhe alguns conselhos.

Hoje, aos 65, Meirelles ri do epis�dio e afirma ter “at� medo de pensar” nos conselhos que deu. Moratto, de 33, se recorda claramente de tudo. Mas n�o foi a conversa de quase 20 anos atr�s (da qual Meirelles, obviamente, n�o se lembra) que o levou a trabalhar com o brasileiro-estadunidense Moratto. Ao assistir ao seu longa de estreia, “S�crates” (2018), Meirelles se impressionou com “a sensibilidade que ele tem de colocar a gente dentro da cabe�a do personagem”.

“7 prisioneiros”, que estreia nesta quinta-feira (11/11) na Netflix, � o segundo longa de Moratto – o filme � produzido pela O2 Filmes, que tem Meirelles como um dos fundadores. A hist�ria, com roteiro de Moratto e Thayn� Montesso (tamb�m sua colaboradora no filme de estreia), acompanha dois personagens.

Mateus (Christian Malheiros) � um jovem pobre, que mora na regi�o rural do estado de S�o Paulo com a m�e e as irm�s. Com outros garotos, ele � levado por um motorista de van para a capital paulista, com a promessa de um emprego. Ao chegar ao destino, um ferro-velho comandado por Luca (Rodrigo Santoro), o grupo tem os documentos recolhidos. 

PUNI��ES 

Os meninos n�o demoram a descobrir que n�o � trabalho o que t�m ali – s�o praticamente escravizados por Luca. Qualquer possibilidade de fuga ou den�ncia � pass�vel de severas puni��es – tanto para eles quanto para suas fam�lias, que acreditam que eles est�o bem.

Mateus logo se destaca do grupo por sua intelig�ncia e acaba se aproximando de Luca. No momento inicial, promete aos colegas que a aproxima��o � para ajudar todos. Mas a rela��o se intensifica, assim como as animosidades entre os meninos, e Mateus ter� que fazer uma escolha.

Moratto, que vive entre o Brasil e os Estados Unidos, testou cerca de mil garotos at� encontrar Malheiros para protagonizar “S�crates”, interpretando um menino pobre, negro e gay criado pela m�e. Com a morte dela, ele tenta sobreviver em S�o Paulo. No caso de “7 prisioneiros”, ele escreveu o papel de Mateus j� pensando no ator.

Ainda que o destino do protagonista estivesse definido no in�cio do projeto, Moratto conta que havia cinco ou seis maneiras poss�veis para encerrar a hist�ria. “Na real, o fim mesmo foi algo que a gente decidiu no dia, no set. Queria um final mais realista e, de certa forma, este filme me lembra muito ‘Cidade de Deus’, pois ele trata de uma quest�o c�clica. O trabalho an�logo � escravid�o vai se perpetuando”, diz o diretor.

Meirelles emenda: “Em S�o Paulo, a gente ouve hist�rias desde sempre. Nos anos 1970, foram os coreanos que entraram na ind�stria t�xtil e depois ascenderam. Veio ent�o o ciclo dos bolivianos, que vai at� hoje. Agora deve haver tamb�m muitos haitianos e venezuelanos”.

Um dos personagens colocados � for�a para trabalhar no ferro-velho, em dado momento da trama, � um boliviano. Esse homem, quando chegou ao Brasil, teve o passaporte retido e ficou trancado por seis meses, trabalhando, quase sem descanso, em uma f�brica de roupas. “(A presen�a dele) Lembrava a gente todo dia da import�ncia do assunto. Fiz quest�o de que ele conversasse com todo o elenco”, comenta Moratto.  

Rodrigo Santoro com semblante de raiva
Rodrigo Santoro diz que procurou ter uma interpreta��o 'neutra' do vil�o e aponta a desigualdade social como tema do filme, que chega hoje � Netflix

CLAUSURA 

O ferro-velho, que concentra 70% da hist�ria, foi criado para o longa. “Tivemos enorme dificuldade de encontrar, pois todos est�o ‘vivos’ e n�o tinha como fechar um neg�cio (para filmar). Tudo o que se v� l� veio da produ��o, o que consumiu grande parte do or�amento, e trabalhamos para criar a sensa��o de se estar enclausurado”, conta Moratto. 

A rela��o entre Meirelles e Moratto, ou seja, o veterano e o novato, encontra outros paralelos em “7 prisioneiros”. O filme � estrelado por Santoro, que foi revelado pelas novelas antes de se tornar um dos principais int�rpretes do cinema nacional, a partir de 2000. J� Malheiros, ainda que tenha estreado em “S�crates” (uma produ��o independente pouco vista no Brasil), se consagrou na s�rie “Sintonia”, da Netflix, na qual vive Nando, jovem de uma favela de S�o Paulo que entra para o tr�fico.

Produ��o da Netflix, “7 prisioneiros” teve sua premi�re no Festival de Veneza e foi exibido em um circuito restrito de salas no Brasil. No papel de produtor do longa, Meirelles comenta que o mercado nacional “est� aquecido gra�as �s plataformas”. 

“(O streaming) Est� salvando a �rea. Bolsonaro teve muito sucesso em desmontar o audiovisual. Est� tudo parado. O que a Ag�ncia Nacional do Cinema (Ancine) faz hoje � tentar rever projetos aprovados 10 anos atr�s e question�-los.”

Meirelles afirma que, apesar da crise institucional no setor cinematogr�fico, n�o se acha hoje facilmente no pa�s profissionais de cinema dispon�veis. “A Netflix come�ou a fazer filmes, a HBO est� com o projeto de 15 longas, a Warner de 19. Fora as s�ries, com Disney, Amazon, Apple, Star, o mercado explodiu”, cita. 

“Hoje, se voc� quiser encontrar um montador para o seu filme, um fot�grafo, n�o acha. Roteirista ent�o, tem que pegar senha e esperar no acostamento. Esse aquecimento fez surgir uma gera��o de gente muito talentosa, como o Alex (Moratto). Se um ano e meio atr�s eu achava que o streaming iria mudar, hoje estou vendo a mudan�a. Dinossauros como eu v�o ser enterrados, porque o mercado est� bombando de gente nova”, diz. 

“7 PRISIONEIROS”
(Brasil, 2021, 93min, de Alexandre Moratto, com Christian Malheiros e Rodrigo Santoro) – Estreia nesta quinta (11/11), na Netflix

"(O streaming) Est� salvando a �rea. Bolsonaro teve muito sucesso em desmontar o audiovisual. Est� tudo parado. O que a Ancine (Ag�ncia Nacional do Cinema) faz hoje � tentar rever projetos aprovados 10 anos atr�s e question�-los"

Fernando Meirelles, cineasta e produtor de "7 prisioneiros"

tr�s perguntas para...

Christian Malheiros e Rodrigo Santoro
atores de “7 prisioneiros”

Christian, assim como “S�crates”, em que voc� tamb�m foi dirigido por Moratto, Mateus � um menino negro, pobre, que vai para a capital paulista em busca de uma vida melhor por causa da m�e. Que rela��es voc� enxerga entre os dois personagens?

Todos os personagens que j� fiz ou vou fazer partem do princ�pio de que sou um ator negro de periferia. A minha cor e a minha viv�ncia nunca v�o deixar de fazer parte do personagem que eu for interpretar. S�crates e Mateus est�o na busca pela sobreviv�ncia e em se manter vivos. O Mateus est� trabalhando no sonho dele, a partir da realidade em que sua fam�lia vive. � vil�o? Mocinho? O que o leva a fazer isso? Como ser humano, tento me colocar na realidade do trabalho an�logo � escravid�o, em que todo mundo fica rendido. Mas, como int�rprete, tenho que me distanciar disso. A partir disso, vou tentar humanizar o personagem, tentando entender o jogo dele. Qual � o certo e o errado? Acho que o p�blico tamb�m vai entrar neste dilema. 

Rodrigo, como voc� se preparou para interpretar o Luca?

N�o queria localizar (as pessoas) para n�o exp�-las, mas fiz bastante pesquisa no Rio e em S�o Paulo. N�o � a primeira vez que me aproximo de pessoas que vivem em situa��o de vulnerabilidade, est�o pr�ximas da criminalidade, da mis�ria. Mas n�o queria justificar e colocar o personagem como v�tima, ainda que ele n�o deixe de ser um produto do sistema. Meu processo de laborat�rio tamb�m teve uma grande pesquisa sobre o tema. Desde o princ�pio, sabia que estava falando de um produto de desigualdade. � diferente debater e se aproximar dele (do tema). Tentei ser o mais neutro poss�vel, fazendo com que se possa compreender, mas n�o julgar.

Acreditam que o filme possa levantar um debate?

Malheiros – No Brasil, o cinema cumpre seu papel no entretenimento, mas tamb�m tem um lado social, pois usa seu espa�o para expor feridas que n�o conseguimos sanar. Isso � um reflexo do Brasil colonial, nada � novo, e o filme talvez n�o ache uma resposta, mas abre um caminho para a reflex�o. Esse papel social o cinema cumpre, seja como uma grande com�dia ou com um filme como “7 prisioneiros”.

Santoro – O filme traz � tona um tema real, indigesto. Na verdade, a gente est� falando de outra coisa que � a nossa maior ferida: a desigualdade social. Os personagens s�o produtos de um sistema excludente, e a reflex�o transcende a hist�ria do ferro-velho. No final, o espectador � deixado com um dilema moral, e � a� que acho que o debate se levanta.


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