(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas M�SICA

�pera de Jorge Antunes destaca a relev�ncia da imperatriz Leopoldina

Compositor e maestro encerra 2021 mergulhado no trabalho. Al�m do CD "Cordas dedilhadas", finaliza obra para celebrar os 200 anos da Independ�ncia do Brasil


30/12/2021 04:00 - atualizado 30/12/2021 03:02

 

Maestro e compositor Jorge Antunes
Jorge Antunes diz que o brasileiro ignora a import�ncia hist�rica de dona Leopoldina (foto: Anthony Kunze/Divulga��o)
 

 

Aos 79 anos, o compositor e maestro Jorge Antunes est� em plena atividade de cria��o. Ele acaba de lan�ar o CD duplo “Cordas dedilhadas” (Sesc), que re�ne obras escritas para viola caipira, viol�o, harpa e ala�de barroco. Nas pe�as, Antunes promove uma desconcertante fus�o de instrumentos tradicionais com elementos da m�sica experimental e eletr�nica. Ele convidou para participar do �lbum os instrumentistas Marcus Ferrer (viola caipira), Roberto Corr�a (viola caipira) e Alvaro Henrique (viol�o).

 

Em outra frente, Antunes finaliza a �pera “Leopoldina”, concebida especialmente para celebrar o bicenten�rio da Independ�ncia do Brasil. O compositor ganhou o Pr�mio Icatu, que lhe permitiu passar um ano e meio na Fran�a para escrever as composi��es. O libreto � assinado pelo poeta Gerson Valle. Nesta entrevista, Jorge Antunes fala sobre o experimentalismo das cordas dedilhadas e sobre a relev�ncia da imperatriz Leopoldina, a mulher que assinou o decreto que tornou o Brasil independente de Portugal em 1822.

 

"Durante 19 meses de intenso trabalho em Paris, conclu� a composi��o musical (da �pera 'Leopoldina'). A obra tinha e tem como motiva��o a possibilidade de o Brasil celebrar majestosamente o bicenten�rio da Independ�ncia em 2022"

Jorge Antunes, maestro e compositor

 

 

De que maneira se deu a sua inicia��o � m�sica e sua evolu��o como compositor?

Meus primeiros passos nas artes aconteceram nas artes pl�sticas, influenciado por meu pai que era pintor. Comecei a estudar m�sica um pouco tarde: aos 14 anos. Desde os 6 ou 7 anos, eu queria estudar violino. Meus pais n�o eram m�sicos. Carlos Antunes, meu pai, era pintor acad�mico e tinha uma rica cole��o de discos 78 de m�sica cl�ssica. Fui criado nesse ambiente. Minha fam�lia era pobre. Mor�vamos no bairro prolet�rio de Santo Cristo, no Rio de Janeiro. Meu pai, al�m de pintor e mel�mano, era antiqu�rio. S� quando fiz 14 anos � que ele conseguiu trocar um lampi�o antigo por um violino. Foi quando comecei a estudar o instrumento.

 

E de onde vem o gosto pelo di�logo com outras linguagens e a intera��o com as circunst�ncias sociais e pol�ticas?

O meu trabalho de jun��o da m�sica com outras linguagens resulta dessa minha forma��o. No in�cio dos anos 1960, participei de sal�es em que tamb�m debutavam Rubens Gerchman, Antonio Dias, Cacipor� Torres, Roberto Magalh�es e outros. Em 1963, bem antes das experi�ncias semelhantes do H�lio Oiticica, eu constru�a "ambientes" multim�dia. Em 1964, expus no MAM o “Ambiente I”, um cubo com 4 metros de aresta em que o p�blico entrava descal�o e usava os cinco sentidos: l� dentro estavam m�sica eletr�nica, odores, comest�veis e objetos e relevos a serem tocados e manuseados. Quando estudante secundarista do Col�gio Pedro II, j� atuava na pol�tica estudantil, abra�ando lutas sociais. Esse ativismo teve continuidade quando ingressei na Faculdade Nacional de Filosofia, para o bacharelado em f�sica. Depois, como presidente do Diret�rio Acad�mico da Escola de M�sica da Universidade do Brasil, atual UFRJ, a luta pol�tica passou a ser mais efetiva. Com o AI-5, em dezembro de 1968, fui demitido do Instituto Villa-Lobos, onde era professor e tive que me exilar no exterior. Nesse per�odo fiz cursos p�s-graduados e mestrado na Argentina, Holanda, It�lia e Fran�a. O doutorado vim a concluir na Universit� de Paris VIII, s� no final dos anos 1970, quando j� era professor na UnB.

 

Que lugar o senhor atribui a figura do compositor?

A composi��o musical � um santo of�cio. O compositor n�o � um cidad�o comum. Ele �, em geral, um intelectual privilegiado cuja voz, que sai de sua obra e de sua boca, alcan�a ouvidos v�rios, numerosos e long�nquos. � bem verdade que a internet, hoje, d� voz a todos. Mas a voz do compositor reverbera de modo especial. Assim, defendo o engajamento pol�tico do compositor. Quando domina os recursos da ret�rica musical, ele pode formar ou mudar mentalidades porque sabe injetar em sua obra o poder do convencimento, da eloqu�ncia, da sedu��o, da persuas�o. Entendo que o compositor tem que se comover com as injusti�as, reagir musicalmente e ent�o sair da torre de marfim para cumprir plenamente sua fun��o social.

 

Como situa essa s�rie de pe�as para cordas gravada em CD na sua produ��o como compositor?

Neste CD duplo publicado pelo Selo Sesc, compilei minhas principais obras escritas para instrumentos de cordas dedilhadas: viola caipira, viol�o, harpa e ala�de barroco. Todas ocupam lugar de destaque em minha produ��o, porque as obras tratam de criar mundos sonoros e novas linguagens para esses instrumentos tradicionais. A viola caipira, por exemplo, ganha nova paleta sonora. O ala�de, acostumado ao modalismo barroco, passa a falar linguagem atual. A “S�rie Bras�lia 50”, para viol�o e sons eletr�nicos e vozes pr�-gravadas, � uma encomenda do violonista Alvaro Henrique. A obra ocupa lugar especial em minha produ��o porque � uma obra de f�lego que ainda est� sendo escrita, e cuja execu��o integral durar� cerca de oito horas. Ela � formada de mais 50 pe�as, cada uma inspirada em um importante evento pol�tico-cultural a partir de 1960. Por enquanto, compus apenas 20 pe�as. S�o as que est�o inclu�das nas 20 faixas do segundo disco do CD duplo.

 

Como concebe a mixagem do som do viol�o com elementos da m�sica experimental?

Uso o viol�o com novos modos de execu��o, muitas vezes fazendo com que o som do instrumento ganhe timbres novos, se integrando ao universo sonoro eletroac�stico. S� para exemplificar e o p�blico leitor entender, lembro que existe um modo de tocar em que o violinista fricciona um copo de vidro nas cordas. Isso d� lugar a uma sequ�ncia bel�ssima de sons harm�nicos. Por vezes, o ouvinte n�o saber� distinguir o que � viol�o e o que � eletr�nico. Mas a coexist�ncia pac�fica das duas fontes sonoras distintas s�o muitas vezes real�adas de forma dial�gica. Isso acontece para bem comentar o evento pol�tico em foco em cada uma das pe�as.

 

"A arte panflet�ria revela a deser��o est�tica que leva ao imobilismo e � mediocridade. O panflet�rio presta grande desservi�o � m�sica e �s pr�prias causas sociais"

Jorge Antunes, maestro e compositor

 

 

A pol�tica perpassa, de maneira dram�tica, o CD 2, com a “S�rie Bras�lia 50”. Como � conciliar o interesse pol�tico e o experimentalismo de sua m�sica? Como ser pol�tico e n�o derrapar no meramente panflet�rio?

Na medida em que a profiss�o de m�sico e a atividade de compositor devem ser consideradas trincheiras bastante dignas, entendo que o panflet�rio deve ser evitado e condenado. A arte panflet�ria revela a deser��o est�tica que leva ao imobilismo e � mediocridade. O panflet�rio presta grande desservi�o � m�sica e �s pr�prias causas sociais.A mediocriza��o da m�sica pode levar novas gera��es, �vidas de gurus e novos modelos, a serem enganadas e desviadas do bom rumo. A falta de originalidade e a exalta��o da mediocridade ser�o sempre atitudes deseducadoras. Ent�o, a arte politicamente engajada n�o pode se abaixar fazendo concess�es, diminuindo seu grau de complexidade. � essa a atitude que eu adoto.


Qual o seu interesse pela �pera como um g�nero que pode incorporar as linguagens contempor�neas e experimentais?

Respondendo a uma de suas perguntas anteriores, eu falei de meu “Ambiente I”, de 1964, obra em que mesclei sons eletr�nicos, imagens, objetos, odores, cores e elementos t�teis. Foi quando eu comecei a teorizar sobre o que chamei de "arte integral". Meu interesse pelo g�nero �pera se origina dessa minha vontade de jun��o de todas as vertentes art�sticas. A �pera permite isso e vai mais al�m porque incorpora um novo elemento: o drama.


Como foi o processo de cria��o da �pera “Leopoldina” e qual a relev�ncia de apresentar essa �pera neste momento da hist�ria brasileira?

A �pera Leopoldina foi escrita com apoio do Holding Icatu, que me concedeu o Pr�mio Icatu de Artes 2020. O pr�mio consistiu em uma bolsa financeira de um ano e meio e, com o apoio do Minist�rio da Cultura da Fran�a, uma resid�ncia art�stica na Cit� Internationale des Arts, em Paris, com o fim espec�fico de compor a �pera. Pedi ao poeta Gerson Valle, que foi o libretista de minha �pera “Olga”, para escrever o libreto de “Leopoldina”. Durante 19 meses de intenso trabalho em Paris, conclu� a composi��o musical. A obra tinha e tem como motiva��o a possibilidade de o Brasil celebrar majestosamente o bicenten�rio da Independ�ncia em 2022. Poucos sabem que foi a imperatriz Leopoldina que, em 2 de setembro de 1822, incentivada por Jos� Bonif�cio, assinou o decreto que tornou o Brasil independente de Portugal. Dom Pedro estava em S�o Paulo. Cinco dias depois, ele recebeu a carta de Leopoldina relatando o fato e faturou o ato hist�rico. O que ficou registrado na hist�ria oficial foi o grito que Pedro ecoou �s margens do Rio Ipiranga cinco dias depois.


Quando a �pera ser� apresentada no Brasil?

Infelizmente, a pandemia atrapalhou bastante os planos, fazendo com que todos os teatros de �pera brasileiros tivessem suas programa��es suspensas e represadas. Assim, as �peras programadas para 2022 em S�o Paulo, Manaus, Rio de Janeiro e Bel�m s�o aquelas que deveriam ter sido apresentadas em 2020 e 2021. Atualmente, a minha �nica esperan�a de ver programada a estreia de “Leopoldina” em 2022, est� depositada em Bras�lia. Para tanto, precisamos de um milagre: que seja iniciada urgentemente a reforma do Teatro Nacional e que a Sala Villa-Lobos possa ser reinaugurada em setembro ou outubro de 2022. 


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)