S�rie sobre Neymar exp�e a tensa rela��o entre o craque e seu pai

Neymar foi do c�u ao inferno rapidamente. “Ele foi embora para ser protagonista. E se arrependeu rapidamente. Ningu�m vai embora do Barcelona”, aponta Juca Kfouri. O ano de 2019 � uma grande ressaca para aquele que chegou ao Paris Saint-Germain em 2017 como o mais caro jogador de todos os tempos. Les�es o tiraram de campo, uma tentativa fracassada de retornar ao time espanhol, hostilidade da torcida do PSG. Os gritos de “hijo de p...” entoado no Parque dos Pr�ncipes, em setembro de 2019, ainda ecoavam. Alguma coisa tinha que acontecer.

Com estreia nesta ter�a-feira (25/1) na Netflix, a miniss�rie em tr�s epis�dios “Neymar: O caos perfeito” nasceu como um projeto sobre a temporada 2019/2020 do atleta. Foi muito al�m, fazendo uma radiografia do craque. Passado, presente e futuro por meio de um olhar muito pr�ximo, �ntimo, dos dois Neymar e do mundo que os cerca.

“O sonho de todo documentarista � capturar a transforma��o de seu personagem central”, afirma o diretor do projeto, David Charles Rodrigues. Do “Juninho”, que d� t�tulo ao primeiro epis�dio, passando por “Neymar do Brasil” at� chegar ao momento “O pai t� on”, bord�o que o jogador passou a utilizar nas vit�rias do PSG na Liga dos Campe�es, a trajet�ria de Neymar � vista sem sensacionalismo e tampouco panos quentes. N�o houve, segundo o diretor, nenhuma interven��o da fam�lia.

“O caos perfeito” (t�tulo sugerido pelo pr�prio Neymar) � fruto de parceria da Uninterruped, produtora de LeBron James, outra estrela da NBA, com a Netflix.

Nascido em Boston, filho de m�e americana e pai brasileiro, o diretor David Charles, de 41 anos, viveu em Belo Horizonte dos 8 aos 24. Por influ�ncia do pai, Paulo Ant�nio Santos Rodrigues, que continua em BH, � torcedor do Cruzeiro. Saiu da capital mineira para voltar a viver nos EUA – primeiramente em S�o Francisco e, desde 2010, em Los Angeles.

Como documentarista realizou “Gay chorus deep south” (2019), filme que acompanha a excurs�o de dois corais gays de S�o Francisco pelo Mississippi, Alabama, Tennesse e Carolinas do Norte e do Sul, estados americanos com o maior n�mero de leis discriminat�rias contra a comunidade LGBTQIA+.

“Meu objetivo � poder mostrar o lado humano das pessoas, misturando entretenimento com uma hist�ria de impacto. No caso dos corais gays, era m�sica com ativismo. No do Neymar, o que havia por baixo da hist�ria do jogador e da celebridade”, comenta David Charles. Foram dois anos imersos na trajet�ria da fam�lia Silva Santos – meia d�zia de viagens a Paris, outras duas incurs�es ao Brasil.

David entrevistou o c�rculo �ntimo de Neymar – a m�e, Nadine, os amigos (os famigerados par�as), outras estrelas do futebol (Messi e Su�rez, que compuseram com o brasileiro a tr�ade de ouro do Barcelona, mais David Beckham, Mbapp�, Daniel Alves e Thiago Silva). E tamb�m funcion�rios da NR Sports, empresa criada para cuidar da imagem do atleta, bem como pessoas que conviveram com ele no in�cio da carreira, tanto antes e tamb�m j� como estrela do Santos. H� tamb�m cr�ticos, o maior deles o j� citado Juca Kfouri. A trilha sonora � assinada por Tejo Damasceno, do Instituto.

Entrar na intimidade da fam�lia de Neymar foi um desafio, diz David. “Confian�a � um processo, como em qualquer document�rio. Fiquei bem surpreso porque foi mais r�pido do que esperava. � dif�cil contar a hist�ria de algu�m que est� no jornal e no Instagram do tempo inteiro”, diz. Conseguiu at� filmar no quarto do jogador, lugar sagrado, diz David. S� ali ele fica realmente sozinho.

Com o Neymar pai foi mais dif�cil. “Acho a hist�ria dele uma das maiores sobre um brasileiro. O cara foi de jogador de v�rzea para pedreiro em 10 anos. E de pedreiro ele fechou o maior contrato da hist�ria do futebol. Voc� n�o consegue fazer isso sem ter personalidade forte. Ao longo do tempo, fui o entendendo, e n�o o julguei. Acho que ele � muito julgado”, continua David.

Neymar pai fala para a c�mera, mais de uma vez, que est� preparando o caminho para Neymar Jr. quando ele se aposentar dos campos – o que, espera, ocorra em 10 anos, no m�ximo. Nas reuni�es, cita os n�meros de Neymar nas redes sociais – “200 milh�es de espectadores” –, mas fica latente que a rela��o pai e filho vai se tornando mais distante. Neymar revela que atualmente o v� menos como pai do que como empres�rio.

Trabalhando com equipe m�nima – diretor de fotografia, assistente e o profissional para captar o som –, o documentarista capturou momentos de alta tens�o. Estava na casa de Paris gravando outra sequ�ncia quando, na sala, o tom come�ou a subir. Os dois Neymar n�o se entendiam.

“A coisa mais importante que conquistamos foi a estrutura��o da sua imagem”, afirma o mais velho. O filho diz que ele � agressivo com todos que o cercam. “N�o gosto de ter essas conversas porque a gente j� come�a... Por isso que acato tudo, para n�o criar conflito.” No meio da discuss�o h� men��o � acusa��o de estupro, outra sombra para Neymar no fat�dico 2019.

'Confian�a � um processo, como em qualquer document�rio. Fiquei bem surpreso porque foi mais r�pido do que esperava. � dif�cil contar a hist�ria de algu�m que est� no jornal e no Instagram do tempo inteiro'

David Charles Rodrigues, diretor

Mas h� momentos fofos, principalmente da rela��o do jogador com o filho, Davi Lucca. Sequ�ncias de festas, muitas delas familiares. N�o h� men��o alguma a namorada ou affair do jogador. “Minha inten��o era usar momentos do presente para refletir o passado. No momento em que filmei, ele n�o estava namorando. Ent�o seria gratuito falar disso”, alega David.

As passagens mais relevantes de Neymar no Santos, Barcelona, Sele��o Brasileira e PSG s�o reconstru�dos por meio de muita edi��o. Somando o que filmou e o material de arquivo, David acredita ter trabalhado com mil horas de grava��o.

Da parte brasileira, diz que a falta de acesso ao material da Globo foi um problema. H� imagens antigas de v�rias emissoras. “Todo mundo cresceu vendo futebol pela Globo, e como eles n�o cederam as imagens, isso criou uma dificuldade no processo de edi��o”, comenta.

A produ��o consegue criar climas de suspense e tens�o em partidas transmitidas e noticiadas nos quatro cantos do mundo. Em 11 de mar�o de 2020, exatamente o dia em que a Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) declarou a pandemia da COVID-19, o PSG tentava uma vaga nas quartas de final da Liga dos Campe�es, o que n�o ocorria com o time desde 2016.

Na partida no Parque dos Pr�ncipes contra o Borussia Dortmund, Neymar abriu o placar com um gol de cabe�a. Ningu�m viu, pois o est�dio estava sem p�blico. Do lado de dentro, porque l� fora centenas de torcedores apoiavam o time. Veio o segundo gol, de Bernat, e o PSG conseguiu chegar �s quartas com o resultado de 2 a 0.

Com a multid�o comemorando, os atletas foram at� o alto do est�dio para encontrar a torcida. Neymar, um dos mais empolgados. Era ali ainda um menino. Mas n�o o mesmo que havia chegado ao time tr�s anos antes.

A miniss�rie documental, em tr�s epis�dios, estreia nesta ter�a-feira (25/1), na Netflix