Miguel Falabella e Danielle Winits estão abraçados e sorriem um para o outro em cena da peça A mentira

Paulo (Miguel Falabella) e Alice (Danielle Winits) discutem se mentira � "trai��o" ou "piedade"

Caio Gallucci/divulga��o

Lucas Lanna Resende

Imagine a seguinte situa��o: casal est� pronto para receber os melhores amigos para um jantar especial em casa, quando flagra o convidado traindo a esposa. O que fazer? Contar tudo para a mulher tra�da, correndo o risco de arruinar a amizade? Ou, por “delicadeza”, agir naturalmente, fingindo que nada aconteceu?

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Esse � o dilema da pe�a “A mentira”, do dramaturgo franc�s Florian Zeller, em cartaz neste s�bado (8/10) e domingo (9/10), no Cine Theatro Brasil Vallourec. Zeller tamb�m assinou “Meu pai”, cuja adapta��o para o cinema � estrelada por Anthony Hopkins.

Miguel Falabella e Danielle Winits interpretam Paulo e Alice, o casal anfitri�o que discute se a infidelidade conjugal deve ser exposta. O papel do cafajeste cabe a Fred Reuter, enquanto Alessandra Verney interpreta a mulher tra�da.

Consigo ver muito bem na sociedade brasileira as hipocrisias entre os franceses que Zeller mostra. Conhe�o bem esse tipo de homem da classe m�dia, que fica cagando regra, trai a esposa e tudo mais

Miguel Falabella, ator e diretor


Teatro de boulevard

“A mentira” segue a linha do teatro de boulevard, caracterizado pelo bom humor e personagens comuns, de f�cil compreens�o. “Mas ‘A mentira’ n�o � um boulevard como qualquer outro”, garante Miguel Falabella, que assina tradu��o, adapta��o e dire��o do espet�culo.

Florian Zeller parte de situa��o, de certo modo, banal – em s�ntese, casal discutindo se deve ou n�o falar a verdade para a amiga – com o intuito de aprofundar um questionamento pertinente: afinal de contas, a mentira � trai��o ou piedade?.

Paulo, personagem de Falabella, acredita que esconder a infidelidade do amigo � um gesto de piedade porque preserva a esposa tra�da do sofrimento, fazendo valer o ditado “em briga de marido e mulher, n�o se mete a colher”. Por isso, ele tenta, a todo momento, convencer Alice a silenciar sobre o caso extraconjugal.

Mas Alice discorda. Na opini�o da personagem de Danielle Winits, � trai��o esconder fato t�o grave que diz respeito � vida da amiga. Ela se recusa a ser conivente com a infidelidade. Pior: se Paulo defende a mentira, quem garante que o pr�prio marido n�o a esteja traindo?.

“Fa�o coro com Alice”, afirma Danielle Winits. “A pe�a joga luz nos comportamentos masculino e feminino. Acredito mais at� no masculino, no costume de 'passar pano' e normalizar o que n�o � digno de ser normalizado.”

A cr�tica mordaz do texto de Florian Zeller, entretanto, � encenada com bom humor. “A pe�a tem um ritmo espec�fico, que demanda boa afinidade entre os atores para que o resultado seja satisfat�rio tanto para o p�blico quanto para n�s do elenco”, explica Miguel Falabella.

“Costumo brincar que � como se estiv�ssemos jogando uma pelada. O time tem de estar em sintonia, sen�o desanda e d� tudo errado”, observa.

Plateia interage com o elenco

A rea��o da plateia vem mostrando que a aposta deu certo. Falabella conta que o p�blico tem “entrado” na trama de tal forma que, no meio do espet�culo, passa a interagir com os atores, na tentativa de revelar a trai��o para a personagem de Alessandra Verney.

Esse comportamento se tornou t�o comum que, ao final do espet�culo, quando j� “saiu” do personagem, Falabella diz ao p�blico, na tentativa de acalmar os �nimos: “Calma, gente, � s� teatro”.

O ator e diretor credita o envolvimento da plateia � capacidade de Zeller de captar rapidamente o interesse do p�blico. “Ele � t�o bom autor que em cinco minutos de pe�a j� conseguiu conquistar as pessoas. Pude ver isso em todas as montagens que fizemos de ‘A mentira’”, destaca Falabella.

A primeira vers�o estreou em 2018. Zez� Polessa e Karin Hils interpretavam as personagens de Winits e Verney, respectivamente. O diretor comenta que n�o houve muito o que mudar no texto do dramaturgo franc�s.

“Consigo ver muito bem na sociedade brasileira as hipocrisias entre os franceses que Zeller mostra. Conhe�o bem esse tipo de homem da classe m�dia, que fica cagando regra, trai a esposa e tudo mais”, comenta. “Na hora de adaptar o texto, foi s� colocar embocadura diferente, trazendo o portugu�s que a gente fala”, explica.

Novo elenco

“A mentira” fez turn� por v�rias cidades do Brasil, mas saiu de cartaz quando a pandemia chegou. Com a reabertura dos teatros, Zez� Polessa e Karin Hils n�o puderam retomar os pap�is. Falabella, ent�o, recorreu a artistas com quem havia trabalhado em diversas ocasi�es.

“S� com o Miguel j� fiz teatro, cinema e televis�o. Fizemos muitas coisas juntos e nossa rela��o transcende o profissional”, afirma Danielle Winits. “Em cena, conseguimos nos entender e saber o que o outro est� querendo somente por meio do olhar.”

De acordo com ela, o fato de Miguel Falabella estar no palco d� seguran�a aos colegas para que  consigam entregar ao p�blico um espet�culo s�lido. “O Miguel � um monstro do teatro, n�? Ent�o, poder voltar a contracenar com ele � uma honra muito grande. Em certos momentos, eu me pegava, em cena, assistindo � interpreta��o dele.”

Um homem levou a amante para assistir � pe�a com ele. Quando menos se esperava, a esposa chegou l�. Os tr�s sa�ram e foram resolver l� fora. Nem sei no que deu

Danielle Winits, atriz

 
“A mentira” � uma esp�cie de continua��o de “A verdade”, pe�a de Florian Zeller montada por Diogo Vilela em 2019. O texto aborda a falta de confian�a conjugal por meio do casal que vai descobrindo verdades um do outro por meio de pequenas mentiras e omiss�es de ambos.

Os dois textos remetem � mentira em fam�lia. Zeller exp�e hipocrisias da burguesia francesa – ao que parece, n�o muito diferentes da brasileira. “Em uma de nossas apresenta��es, um homem levou a amante para assistir � pe�a com ele. Quando menos se esperava, a esposa chegou l�. Os tr�s sa�ram e foram resolver l� fora. Nem sei no que deu”, comenta Danielle Winits.

“A MENTIRA”

De Florian Zeller. Tradu��o, adapta��o e dire��o: Miguel Falabella. Com Miguel Falabella, Danielle Winits, Fred Reuter e Alessandra Verney. Neste s�bado (8/10), �s 21h, e domingo (9/10), �s 18h. Cine Theatro Brasil Vallourec, Pra�a Sete, Centro. (31) 3201-5211. Inteira: R$ 180 (plateia 1) e R$ 160 (plateia 2). Meia-entrada na forma da lei. Ingressos � venda na bilheteria do teatro e no site Eventim