
Lucas Lanna Resende
Em 1939, M�rio de Andrade desembarcou em Belo Horizonte para fazer a palestra “Sequestro da Dona Ausente”, em que abordava as consequ�ncias da aus�ncia de mulheres entre os portugueses que chegaram ao Brasil, em 1500. Na plateia, havia uma mo�a atenta a cada palavra do modernista.
Encantada com a palestra de M�rio, ela decidiu ir at� ele. Chegou timidamente, estendeu a m�o e se apresentou: “Meu nome � Henriqueta Lisboa”.
Ali come�ou a amizade que durou at� o fim da vida do escritor, morto aos 51 anos, de infarto, em 1945. Os dois mantiveram intensa correspond�ncia, escrevendo sobre a paix�o m�tua pela literatura, poesia e tamb�m sobre amenidades da vida.
O consagrado M�rio de Andrade dava toda a aten��o a jovens literatos, correspondia-se com futuros autores. E assumiu o papel de mentor da mineira Henriqueta.
Nas cartas, guardadas no Acervo dos Escritores Mineiros da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), � poss�vel encontrar poemas que M�rio devolvia a Henriqueta, sugerindo altera��es. O contato com o modernista tornou a mineira mais madura enquanto poeta. Guiada por M�rio, Henriqueta Lisboa (1901-1985) se tornou um dos nomes mais importantes da literatura brasileira.
Simbolismo e modernidade
A escritora ser� homenageada no projeto Letra em Cena – Como ler…, nesta ter�a-feira (18/10), �s 18h, no Caf� do Centro Cultural Unimed-BH Minas. Os convidados s�o Wander Melo Miranda, professor em�rito da Faculdade de Letras da UFMG, e a sobrinha dela Maria Lisboa, que ler� versos da tia.
“Henriqueta � uma das maiores poetas da l�ngua portuguesa do s�culo 20”, afirma Miranda. “Ela tinha personalidade pr�pria para escrever. Seus textos eram refinados. Sem contar que, em seus poemas, h� caracter�sticas do simbolismo, mas abordadas de maneira moderna”, explica.
Wander Melo Miranda e Reinaldo Marques organizaram o livro “Henriqueta Lisboa – Obra completa”, lan�ado no ano passado pela Editora Peir�polis em comemora��o aos 120 anos de nascimento da autora. O volume traz poemas, prosa e tradu��es feitas por ela.

Nascida em Lambari, no Sul de Minas, Henriqueta se formou normalista e fez carreira na �rea de educa��o. Trabalhou como inspetora federal do ensino secund�rio, professora de literatura hispano-americana e de literatura brasileira na Faculdade de Filosofia, Ci�ncias e Letras Santa Maria (atual PUC Minas) e professora de hist�ria da literatura na Escola de Biblioteconomia da UFMG.
Foi a primeira mulher a ingressar na Academia Mineira de Letras (AML), ocupando a cadeira 26, substituindo M�rio Casasanta.
“Ela era feminista. Ocupava os lugares que a mulher deveria ocupar, mas n�o ocupava (devido ao machismo). Por ser uma pessoa com caracter�sticas muito mineiras, mais retra�da e recatada, esse discurso feminista n�o era muito propagandeado por ela. Estava mais nas a��es do que em entrevistas e discursos”, observa Miranda. “Embora parecesse fr�gil, era mulher muito forte”, garante.
Ensa�sta e tradutora
Henriqueta come�ou a escrever cedo. Aos 24 anos, em 1925, j� havia lan�ado “Fogo-f�tuo”, livro de poesia com fortes caracter�sticas simbolistas. Subjetividade, elementos m�sticos e a musicalidade eram caracter�sticas de sua obra. Ela tamb�m escreveu ensaios liter�rios e artigos para diversas revistas e jornais, como O Malho, Revista da Semana, A Manh�, O Jornal, Kosmos e Festa.
A escritora mineira traduziu poemas de v�rios autores, al�m de organizar antologias de importantes nomes da poesia brasileira e estrangeira.
“Al�m de ser uma das maiores poetas da l�ngua portuguesa, Henriqueta foi uma de nossas grandes tradutoras de poesia”, ressalta Miranda. “Ela tinha muito conhecimento das literaturas italiana, hispano-americana e brasileira”.
Henriqueta Lisboa traduziu Dante Alighieri (1265-1321) e Gabriela Mistral (1887-1957), chilena agraciada com o Nobel de Literatura em 1945.
"Henriqueta � uma das maiores poetas da l�ngua portuguesa do s�culo 20. Ela tinha personalidade pr�pria para escrever. Seus textos eram refinados. Sem contar que, em seus poemas, h� caracter�sticas do simbolismo, mas abordadas de maneira moderna"
Wander Melo Miranda, professor de literatura
Esta noite, Miranda vai abordar o simbolismo presente na obra da escritora e a liga��o dela com a natureza. “� poss�vel pensar em uma ecologia po�tica lendo os poemas dela”, afirma o professor.
“Henriqueta tem uma comunh�o com a natureza que � muito importante abordar hoje, principalmente com o aumento do debate sobre quest�es ambientais”, diz.
Miranda recomenda a quem nunca leu Henriqueta come�ar por “O menino poeta”. Logo em seguida, emenda: “‘O menino poeta' � um bom livro’, mas acho que o leitor deve ir lendo ao acaso os poemas dela, at� ser fisgado por aquele que o emocionar mais. Porque poesia � assim, igual pescaria. A diferen�a � que o leitor n�o pesca o poema, e, sim, o poema pesca o leitor”, conclui.
“LETRA EM CENA – COMO LER HENRIQUETA LISBOA”
Com Wander Melo Miranda. Leitura de textos por Maria Lisboa. Nesta ter�a-feira (18/10), �s 19h, no Caf� do Centro Cultural Unimed-BH Minas. Rua da Bahia, 2.244, Lourdes. Entrada franca, mediante retirada de ingressos pelo site Sympla. Informa��es: (31) 3516-1360