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Estado de Minas ARTES VISUAIS

Brasil est� de volta � Art Basel Miami, com apostas de Minas Gerais

Lorenzato e Maria Lira Marques s�o alguns artistas do estado que t�m obras na badalada e milion�ria feira de arte americana


01/12/2022 04:00 - atualizado 01/12/2022 08:33

A mineira Maria Lira Marques ergue máscara de cerâmica e sorri para a câmera
A mineira Maria Lira Marques leva o barro do Vale do Jequitinhonha e o Brasil profundo para a feira realizada na Fl�rida (foto: Lori Figueiredo/divulga��o)

Miami – O mar dos vizinhos do norte parece mais azul nesta �poca em que Miami ferve. Todo fim de ano, galerias de arte do mundo todo buscam escapar do vermelho nas contas com a pasmaceira das festas e se concentram no balne�rio americano no frenesi de uma Black Friday para bilion�rios.

No rastro do maior leil�o de arte j� realizado na hist�ria, a cole��o de um dos fundadores da Microsoft liquidada em Nova York h� poucas semanas por US$ 1,5 bilh�o, ou estonteantes R$ 8 bilh�es, a feira Art Basel Miami Beach, a maior em territ�rio americano e a mais importante para a Am�rica Latina, chega � 20ª edi��o embalada por furor inaudito.

Foram duas d�cadas de transforma��o. O que era um para�so sonolento de aposentados ou s� uma cidade decadente apavorada pelo crime com ra�zes � beira-mar se tornou uma das metr�poles centrais do fluxo financeiro e de influ�ncia do mercado de arte e, com isso, da especula��o imobili�ria, da moda, do design – tudo aquilo imune aos tremores banc�rios que costumam assustar a classe m�dia.
 
Amadeo Lorenzato está de costas, pintando um quadro
Lorenzato (1900-1995), que chama a aten��o em Miami, � um dos nomes mais importantes das artes pl�sticas de Minas Gerais (foto: Arquivo EM )
 
Marchands v�m a Miami preparados para fechar neg�cio. Nem mesmo a troca no alto comando da feira – sai Marc Spiegler e entra Noah Horowitz, ex-Sotheby's e ex-chefe de uma por��o de feiras de peso, como a nova-iorquina Armory Show – parece abalar a confian�a dos que vivem de vender obras de arte na casa dos milh�es de d�lares, um dos mercados mais impenetr�veis de toda a ind�stria do luxo.

Um trabalho � venda sintetiza bem essa ideia. Waltercio Caldas, representado na feira pela galeria paulistana Raquel Arnaud, tem � mostra aqui uma pequena caixa de a�o.

L� dentro, uma l�mpada el�trica est� acesa, mas vemos s� uns poucos raios de luz que vazam pelas frestas e pelo buraco de uma fechadura.

O artista, um dos nomes centrais da arte contempor�nea brasileira, pensou nos famosos desenhos da caverna de Lascaux, no Sul da Fran�a, ao criar a obra. O dado de que n�o havia rastros de fuligem dentro da gruta sustenta a hip�tese de que os desenhos foram feitos mesmo no escuro, tentativa de trazer o vasto mundo do lado de fora para o interior cego do abrigo.

� dif�cil mensurar, da mesma forma, quantas obras valendo quanto dinheiro v�o trocar de m�os at� o fim da feira, mas a expectativa do mercado corresponde ao fulgor daqueles raios fugazes.
 
Obra criada pelo artista Waltercio Caldas tem caixa preta com orifício da qual sai um raio de luz
Caixa de Waltercio Caldas se inspirou na caverna francesa de Lascaux (foto: Reprodu��o)
 

Fatores do mundo externo � caixa-preta da arte, ali�s, fazem sombra (ou jogam luz) sobre as expectativas para a atual temporada de compras.

Nos Estados Unidos, a amea�a de tsunami conservador varrendo as duas casas do Congresso nas elei��es de meio de mandato de um Joe Biden que vem patinando se provou s� uma marolinha, acalmando os nervos dos colecionadores.

Lula

No Brasil, a elei��o de Lula, trepidante para a Bolsa de Valores com declara��es sobre a quebra do teto de gastos, agora traz lembran�as felizes � mente do jet-set.

Quando o grupo su��o que controla a matriz Art Basel, em Basileia, primeiro pensou na ideia de fincar ra�zes em Miami Beach, o Brasil-pot�ncia de Lula da era das commodities em flor foi fator decisivo. Uma base de colecionadores impulsionados pela pujan�a do mais belo dos Brics a poucas horas de voo e com sangue latino pulsando em sintonia com a cidade americana serviu de garantia para uma opera��o que, no decorrer das d�cadas, se provou mais do que certeira.

“Miami tem algo muito especial”, afirma M�rcio Botner, brasileiro que integra o comit� de sele��o da feira e um dos s�cios da galeria A Gentil Carioca, uma das casas mais respeitadas e influentes do pa�s, com sedes em S�o Paulo e no Rio de Janeiro.

“A Gentil tinha um ano e meio quando come�ou a levar os artistas brasileiros para fora do pa�s, e Miami foi a primeira chegada deles”, ele lembra.

Nesta Art Basel Miami Beach, ali�s, a sele��o da Gentil se mostra alinhada ao choque s�smico das pautas identit�rias com o establishment.
 
Obra do artista plástico Denilson Baniwa tem onça-pintada e temas indígenas
Obra do artista ind�gena Denilson Baniwa � aposta da galeria A Gentil Carioca em Miami (foto: Reprodu��o)
 

Ind�genas, Maria Lira e Lina Bo Bardi

Os carros-chefe da representa��o s�o trabalhos do artista Arjan Martins, nome descoberto pelo mercado j� em idade madura que faz de suas pinturas alegorias da viol�ncia da era colonial, e Denilson Baniwa, artista e intelectual ind�gena que se tornou uma esp�cie de centro irradiador da arte dos povos origin�rios no cerne do circuito mais mainstream da arte feita no Brasil.

No meio do caminho entre o lan�amento de artistas esquecidos e a cren�a nos consagrados, a paulistana Gomide & Co junta for�as com a Luisa Strina, uma das galerias mais poderosas do pa�s, para apresentar os trabalhos de Maria Lira Marques ao lado de m�veis raros de Lina Bo Bardi.
 
Marques � outra artista rec�m-notada pelo mercado e  vem causando sensa��o com sua representa��o singela de bichos, algo como os desenhos de Lascaux. Bo Bardi, hoje superstar do mundo da arte, dispensa apresenta��es, mas talvez fosse ela mesma, se estivesse viva, uma entusiasta da obra de Marques, desenvolvida no Vale do Jequitinhonha mineiro.

O mobili�rio que a italiana arquiteta do Masp pensou para uma casa da zona oeste paulistana est� no centro da constela��o com obras de outros artistas, entre eles o pintor belo-horizontino Lorenzato, que tamb�m que habitam sua esfera de influ�ncia, entre o alto modernismo europeu e opera��es pl�sticas populares brasileiras, como o artesanato autodidata, os tais “outsiders” do circuito.

Enquanto a press�o para a inclus�o de nomes antes distantes do c�none s� aumenta, e n�o s� no Brasil, haja vista a explos�o recente de arte figurativa e panflet�ria em defesa de todas as causas e em detrimento muitas vezes de qualquer sofistica��o em museus e galerias do mundo todo, h� ainda um poder de fogo dos chamados artistas “blue chip”.

De olho no p�blico avesso a modinhas, algumas casas apostam no mais s�lido. A Raquel Arnaud, al�m de Waltercio Caldas, montou um elenco de medalh�es, com trabalhos cl�ssicos de Lygia Clark e S�rgio Camargo, dois gigantes do modernismo brasileiro.

Ela aparece com uma “Superf�cie modulada” e ele com alguns relevos de sua fase �urea, com toquinhos de madeira empilhados na tela num tom de branco hipnotizante.

Tamb�m de olho no colecionador latino-americano, a mesma galeria mostra pe�as cin�ticas dos venezuelanos Carlos Cruz-Diez e Jes�s Rafael Soto, mestres dessa vanguarda, e do brasileiro S�rvulo Esmeraldo, artista que se firmou na Paris da d�cada de 1960, onde pulsava o cora��o de todo esse movimento.

Na feira, estar� um de seus “Excitable”, esp�cie de quadro-escultura com pe�as met�licas que se agitam em atrito com o calor humano, uma obra que reage, de modo literal, ao toque da pele da gente.

Longe do minimalismo mec�nico, a Nara Roesler, galeria paulistana que se tornou um imp�rio com sedes tamb�m no Rio e em Nova York, aposta no sexo de verdade, levando � feira obras de Jonathas de Andrade e Rodolpho Parigi.
 
Pessoas na galeria observam obras do brasileiro Jonathas de Andrade, com imenso rosto masculino pendurado a partir do teto, e estruturas vermelhas que remetem ao coração, no chão
Jonathas de Andrade chamou a aten��o na Bienal de Veneza, em abril deste ano, com a obra 'Com o cora��o saindo pela boca' (foto: Vincenzo Pinto/AFP)
 

N�degas e sungas do Recife

�ltimo artista a representar o Brasil na Bienal de Veneza e agora com retrospectiva em cartaz na Pinacoteca, Jonathas de Andrade mostra uma s�rie de esculturas de barro de fartas n�degas de rapazes trajando sungas que ele garimpou em vesti�rios do Recife, onde vive. Antes algo latente em sua obra, aqui o homoerotismo vibra expl�cito.

Rodolpho Parigi, por sua vez, que acaba de realizar grande exposi��o no Instituto Tomie Ohtake, em S�o Paulo, tem � venda em Miami uma das maiores telas daquela mostra. “La danse” � uma explos�o de cores em que fragmentos do corpo, v�sceras, brinquedos er�ticos e l�tex se misturam numa orgia t�til.

Do rigor mais cerebral e contido dos modernistas do pa�s � mais esfuziante das alegorias, talvez a mensagem que as galerias brasileiras (14 delas agora na feira) querem enviar ao mundo seja algo na linha de “Brazil is back”, ou pelo menos assim espera o mercado.
 
* O rep�rter viajou a convite da Art Basel


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