Arlete Dias segura o rosto de Fabricio Boliveira em cena do filme 'Mugunza', de Glenda Nicácio e Ary Rosa

Arlete Dias e Fabricio Boliveira em cena do longa "Mugunz�", de Glenda Nic�cio e Ary Rosa, que abre a programa��o do festival, no qual a dupla de diretores ser� homenageada

Rosza Filmes/Divulga��o

Dar um basta na condi��o de oprimido � uma tarefa �rdua, sobretudo quando a v�tima � mulher e o algoz � homem. A situa��o piora se a mulher for negra. 

� isso que enfrenta Arlete, personagem que leva o mesmo nome da atriz baiana Arlete Dias, no longa “Mugunz�”, de Ary Rosa e Glenda Nic�cio.

Depois de passar anos em um casamento infeliz, ela compreende que sua vida n�o deve ser guiada por ningu�m, sen�o por si mesma, e decide mudar os rumos de sua exist�ncia, at� ent�o melanc�lica e inexpressiva. 

A resposta do opressor a tal liberta��o, contudo, � violenta, vil e s�rdida, e se faz presente nos cinco personagens interpretados por Fabr�cio Boliveira (“Eduardo e M�nica”, “Simonal”) – um �nico ator para interpretar todos os homens visa mostrar ao espectador que o machismo tem a mesma face.

Ainda sem data definida para entrar no circuito comercial, “Mugunz�” ser� exibido na abertura da 26ª Mostra de Cinema de Tiradentes, nesta sexta-feira (20/1). Neste ano, o evento volta a ser realizado presencialmente e segue com programa��o extensa de exibi��es, semin�rios e oficinas, at� o pr�ximo dia 28. Alguns filmes poder�o ser assistidos pelo site do festival.

Po�tica particular 

Os homenageados desta edi��o s�o precisamente a dupla de diretores de “Mugunz�”, Ary Rosa e Glenda Nic�cio. Mineiros radicados em Cachoeira, no Rec�ncavo Baiano – Ary � de Pouso Alegre e Glenda � de Po�os de Caldas –, os dois foram escolhidos pela equipe curatorial da mostra em raz�o da po�tica particular de suas obras (j� dividiam a dire��o em seis longas, desde 2011) e da solu��o que encontraram para produzir filmes em um contexto de poucos incentivos e recursos. 

O trabalho mais recente e que deixa evidente essas caracter�sticas da dupla � “Mugunz�”. Concebido em forma de musical – com 13 can��es compostas exclusivamente para o filme pelo m�sico baiano Moreira –, o longa traz elementos regionais da Bahia no intuito de abordar um tema universal.

“� um filme que vem falar sobre liberdades”, resume Glenda. “Ele conta a hist�ria de uma mulher que vive numa comunidade extremamente opressora, na qual todos os homens e as inst�ncias que eles representam tentam sufoc�-la de alguma forma e diminuir o tamanho que ela tem.” 

A protagonista, no entanto, se nega a abaixar a cabe�a, conforme aponta a diretora. “Arlete � uma mulher negra, l�sbica, nordestina e que se nega a apenas sobreviver. Ela quer ser livre e sonhar. Por ser musical, acho que as can��es atuam muito nessa narrativa, nesse lugar da liberta��o”, afirma.

Rodado em uma �nica loca��o, no Cine Teatro Cachoeirano, e com apenas dois atores no elenco, “Mugunz�” trabalha com a perspectiva da linguagem do cinema a partir da m�sica, do teatro e das performances corporais. Dos elementos regionais, o roteiro busca apoio nas festas da Ajuda, Yemanj�, s�o-jo�o e da Boa Morte, tradicionais na regi�o e fundamentais para a constru��o da personagem principal.

“� interessante esse filme ser exibido neste momento, porque ele contrasta bastante com ‘Na r�dea curta’, que tamb�m tem dire��o minha e da Glenda, mas que segue uma linha totalmente diferente por ser uma com�dia com tem�tica completamente distinta”, destaca Ary, citando o filme lan�ado no final do ano passado e que tamb�m integra a programa��o da Mostra de Cinema de Tiradentes. 

“Esses dois filmes (‘Mugunz�’ e ‘Na r�dea curta’) seguem caminhos diferentes porque a Glenda e eu temos muita vontade de experimentar as linguagens do audiovisual e suas possibilidades. Achamos que n�o h� uma f�rmula. Ir experimentando faz parte da nossa caracter�stica”, emenda o diretor.

Ao longo dos oito dias do festival, ser�o exibidos 134 filmes de 19 estados brasileiros. S�o 38 longas, tr�s m�dias e 93 curtas-metragens que estar�o dispostos em 14 mostras tem�ticas, que contemplam desde a produ��o autoral experimental a filmes infantis.

Cinema mutir�o 

O tema desta edi��o � Cinema Mutir�o. “Esse tema remete a uma ideia de coletividade. O mutir�o sempre se d� numa situa��o materialmente adversa, mas muito rica no sentido de organiza��o coletiva”, diz o coordenador-curatorial da mostra, Francis Vogner dos Reis.

Em quatro meses, ele assistiu a centenas de filmes, no intuito de escolher os que integram a programa��o. Para a sele��o, entretanto, contou com a ajuda de equipe formada por Lila Foster, Camila Vieira, Tatiana Carvalho Costa, Pedro Maciel Guimar�es e Mariana QueenNwabasili.

Muitos dos filmes foram realizados de maneira independente, sem contar com nenhum tipo de lei de incentivo ou emergencial. Exatamente por isso, grande parte dos t�tulos traz, por meio de met�foras e alegorias – “n�o muito �bvias”, como Francis faz quest�o de ressaltar –, cr�ticas que se fazem respostas diante das dificuldades enfrentadas pelos realizadores na produ��o dos filmes.

“Em duas mostras tem�ticas (Aurora e Olhos Livres), todos os filmes s�o muito expressivos e tratam das experi�ncias que acumulamos nos �ltimos anos, seja do ponto de vista de um olhar sobre as viol�ncias e o arb�trio dos poderes, como tamb�m do desejo e da valoriza��o da for�a de grupos que eram diretamente atingidos pelo antigo governo e que s�o historicamente marginalizados”, ressalta o curador.

“Muitos desses filmes se fizeram resistindo a uma pol�tica sistem�tica de demoli��o do campo cultural. E eu acho que os realizadores encontraram modos de fazer cinema coletivamente e num tempo em que, muitas vezes, n�o � convencional”, comenta.

Pessoa cruza braço em frente ao corpo, tendo cigarro na mão, em cena de Nas linhas da minha mão

"As linhas da minha m�o", de Jo�o Dumans, concorre ao trof�u Barroco, da Mostra Aurora

Universo Produ��es/Divulga��o

Debates e oficinas 

Al�m das exibi��es de filmes, a Mostra de Cinema de Tiradentes contar� com semin�rios, debates, oficinas, encontros e rodas de conversa. Cerca de 150 profissionais participar�o dessas atividades, entre cr�ticos, diretores, produtores, atores, acad�micos, pesquisadores e jornalistas.

Uma das presen�as confirmadas � a da ministra da Cultura, Margareth Menezes. Ela participar� do F�rum de Tiradentes, iniciativa que pretende revisitar, discutir e propor recomenda��es do setor audiovisual para o novo governo. 

Tamb�m estar�o presentes a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) C�rmen L�cia; o senador Humberto Costa (PT-PE); a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ); entre outros representantes do poder p�blico.

Ao longo da mostra, haver� nove oficinas voltadas para a produ��o audiovisual, um laborat�rio de longa document�rio e tr�s masterclasses ministradas, respectivamente, por Alda Gon�alves, gerente de arte nos Est�dios Globo e filha do ator Milton Gon�alves; Rosane Svartman; e Pedro Riguetti.

A programa��o da mostra contar� ainda com performances musicais, exposi��es tem�ticas, lan�amentos de livros, teatro de rua e cortejo musical.

“Para al�m das exibi��es de filmes, a mostra sempre se importou em promover encontros e conviv�ncia. E todos os envolvidos est�o muito entusiasmados com a expectativa desse reencontro depois de dois anos separados devido � pandemia”, diz Francis.

26ª MOSTRA DE CINEMA de TIRADENTES

Desta sexta-feira (20/1) a 28/1, em Tiradentes. Programa��o gratuita, dispon�vel no site do festival


Pessoa cruza braço em frente ao corpo, tendo cigarro na mão, em cena de Nas linhas da minha mão

"As linhas da minha m�o", de Jo�o Dumans, concorre ao trof�u Barroco, da Mostra Aurora

Universo Produ��es/Divulga��o

PRODU��O MINEIRA

Quase 30 filmes da 26ª Mostra de Cinema de Tiradentes s�o de Minas Gerais. O estado emplacou oito longas, um m�dia e 20 curtas-metragens na programa��o do festival.

Os filmes ser�o exibidos nas diferentes mostras tem�ticas. A �nica produ��o que concorre ao trof�u Barroco, no entanto, � “As linhas da minha m�o”, de Jo�o Dumans.

Numa linha temporal de sete anos, o filme experimental mostra a vida da atriz e performer Viviane de Cassia Ferreira e sua rela��o com os trabalhos art�sticos que desempenha.

Outros longas que ser�o exibidos no evento s�o "O cangaceiro da moviola", de Lu�s Rocha Melo; "Can��o ao longe", de Clarissa Campolina; "Chef Jack", de Guilherme Fi�za; "Corpo presente", de Leonardo Barcelos; "Tudo o que voc� podia ser", de Ricardo Alves Jr.; "Amanh�", de Marcos Pimentel; e "Down Quixote", de Leonardo Cortez. (LLR)