Teuda Bara e Cida Moreira sentadas à mesa, lado a lado, durante ensaio na sede do Grupo Galpão, em BH

Teuda Bara e Cida Moreira durante ensaio na sede do Galp�o, em Belo Horizonte. Nesta segunda (27/2), elas e a trupe participam de experimento c�nico, com ingressos esgotados

Marcos Vieira/EM/D.A Press
 

'Cantar com a Teuda � pegar na m�o de Deus'

Cida Moreira, cantora e compositora

 

“Tem que sangrar/ Pessoas precisam comer/ Gordos precisam engordar/ Crian�as precisam crescer/ Tem que sangrar/ Para que os comerciantes/ Encham o bolso enquanto antes/ Vendam fil�, sangue ou barbante”. O horror carregado de ironia nos versos de “Tango dos a�ougueiros felizes” vai ganhar mais contund�ncia nesta noite, quando for interpretado, em duo, por Cida Moreira e Teuda Bara.


A can��o foi uma das portas de entrada do Grupo Galp�o no universo da cantora, pianista e atriz paulistana, voz contundente e visceral da m�sica brasileira. Sua trajet�ria, que se desdobra em 12 �lbuns, tem liga��o estreita com o teatro. A vers�o de Let�cia Coura para “Les joyeux bouchers”, escrita mais de 60 anos atr�s pelo franc�s Boris Vian (1920-1959), m�ltiplo artista ligado ao surrealismo, foi lan�ada por Cida em “Soledade solo” (2017).

Quando o Galp�o come�ou a conversar sobre as diretrizes de seu novo espet�culo – o primeiro desde “Outros” (2018) –, a ideia foi de uma grande festa de retomada depois da pandemia e dos sombrios tempos vividos recentemente, explica J�lio Maciel, integrante do grupo e diretor da nova montagem.


Um cabar�, por que n�o? Brecht, can��o brasileira, poesia e algumas hist�rias levariam o espet�culo para fora do palco italiano. “A ideia � levar para espa�os mais abertos, galp�es, sede de grupos, um sonho antigo nosso”, continua Maciel.

 

Esta hist�ria est� em desenvolvimento na pr�pria sede do Galp�o, na Sagrada Fam�lia, que recebe, nesta segunda-feira (27/2) � noite, a terceira edi��o do projeto Experimentos c�nicos, para duas sess�es com ingressos esgotados.


Cida est� em Belo Horizonte desde a quarta-feira de cinzas. Trabalhou at� ontem com o grupo para as apresenta��es de hoje. Al�m de Teuda Bara, estar�o em cena In�s Peixoto, Eduardo Moreira, Paulo Andr�, Simone Ordones, Ant�nio Edson e Lydia Del Picchia. Convidado para o projeto, Luiz Rocha, tamb�m no palco, assina dire��o musical e arranjos da nova montagem.

 

Lydia Del Picchia toca teclado, tendo a seu lado Simone Ordones e Babaya.  Inês Peixoto está em pé, em frente ao microfone, durante ensaio na sede do Grupo Galpão

As atrizes Lydia Del Picchia, Simone Ordones e In�s Peixoto (em p�) ensaiam com a preparadora vocal Babaya

Marcos Vieira/EM/D.A Press
 

 

No s�bado passado, quando a reportagem visitou o Galp�o, o encontro come�ou com um aquecimento vocal. “Mas � a Babaya (que chegou pouco depois) que tem essa titularidade”, disse Cida, que at� ent�o conhecia o grupo como espectadora.

 

“Eles s�o maravilhosos, porque aqui todo mundo tem muita experi�ncia e maturidade. Ent�o, � uma troca mesmo. As ideias s�o colocadas, eles v�o fazendo e o que resulta melhor, fica.”

 

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Cida inspirou roteiro

A partir do repert�rio de Cida Moreira, foi criado o roteiro para o experimento. “Tem muito Brecht (que ela canta desde a adolesc�ncia e em quem se especializou nos seus 46 anos de carreira) e m�sica brasileira tamb�m. Estou atendendo � demanda de cada momento do espet�culo, tanto quando eles est�o sozinhos, quanto em grupo, dando uma linguagem comum.”


Um cabar�, de acordo com ela, traz algumas quest�es espec�ficas: “M�sica, cr�tica social, pol�tica e muita liberdade, onde cada um faz o que quer.”


Cida d� aulas individuais para todo o tipo de profissional que tem a voz como instrumento: “Ator, professor, cantor, locutor”. O melhor de trabalhar em grupo, diz ela, � a confian�a entre a equipe. “Voc� sente que est� todo o mundo colocado no lugar, por inteiro.”

 

'N�o somos m�sicos, mas somos ousados. Precisa de acordeom? Um ator pega e aprende. Vamos aprendendo muito de acordo com a necessidade da m�sica'

J�lio Maciel, ator e diretor

 


A sede do Galp�o ser� transformada para receber a plateia. Luzinhas, abajures. “A gente tenta criar a ambienta��o de um sal�o de festas”, conta Maciel. O que vai acontecer hoje � desdobramento das edi��es anteriores dos experimentos c�nicos ocorridos ao longo de 2022 – o primeiro, dirigido por Ernani Maletta, foi realizado em agosto; o segundo, em novembro, teve Maciel como diretor.

 

Abrir para o p�blico o processo criativo para a constru��o de um espet�culo n�o � novidade para o Galp�o. “Como somos um grupo que trabalha com muitos diretores de fora de Belo Horizonte – e � muito dif�cil que um deles fique aqui o tempo todo –, criamos uma forma de workshops internos em que produzimos muito material sozinhos”, diz Maciel.


Algumas vezes, os processos s�o abertos ao p�blico. “Desta vez, convocamos ainda mais at� por ser um cabar�. Quer�amos ter o p�blico pr�ximo para sentir como est� funcionando.”


No in�cio do processo, depois de extensa pesquisa musical, cada ator recebeu a miss�o de criar seu pr�prio n�mero. “Eles apresentaram para a gente (ele e Luiz Rocha) e da� criamos um roteiro, que tem evolu�do desde ent�o”, continua Maciel.

 

Cida Moreira sentada em frente a mesa, ao lado de Teuda Bara, e ladeada por artistas do Grupo Galpão

Cida Moreira com a trupe mineira, que promete levar nova pe�a do Galp�o para fora do palco italiano

Marcos Vieira/EM/D.A Press
 

Sarau emblem�tico

Cantar em cena n�o � novidade para o grupo – n�o d� para pensar em “Romeu e Julieta” (lan�ada em 1992, teve outras duas vers�es e chegou a 2013 com tr�s centenas de apresenta��es) sem a can��o “Flor, minha flor”. Mas foi em 2014, com “De tempos somos”, que o Galp�o, por meio de um sarau, uniu m�sica e poesia.

 

Relembre momentos emblem�ticos de 'Romeu e Julieta':

 

 


No novo espet�culo, tudo ser� executado pelos atores. “N�o somos m�sicos, mas somos ousados. Precisa de acordeom? Um ator pega e aprende. Vamos aprendendo muito de acordo com a necessidade da m�sica”, diz Maciel.


A nova montagem n�o tem nome nem data de estreia – talvez entre o final de maio e in�cio de junho. “Sabendo da liga��o da Cida com Brecht, achei maravilhoso traz�-la para perto da gente. Tem momentos em que sentamos ao redor dela, na mesa, e ela come�a a contar hist�rias de Brecht, fala de dramaturgia, depois passa para o piano”, conta Maciel.


Cida Moreira fica em Belo Horizonte at� amanh�. Antes de retornar para S�o Paulo, participa da �ltima reuni�o com o grupo. “Convidamos tamb�m o Vinicius de Souza para coordenar a dramaturgia do novo espet�culo, criando o fio da hist�ria por tr�s dos n�meros”, acrescenta Maciel.

Cida canta S�rgio em SP

A cantora se lembra bem da primeira vez que se apresentou em BH – em 1985, ao lado de Wagner Tiso, no saudoso Projeto Pixinguinha. Ela n�o faz show na cidade desde 2019. Com o fim da pandemia, retomou a agenda e est�, inclusive, com um novo show, dedicado � obra de S�rgio Sampaio (1947-1994).


“Leros & boleros” ganha nova sess�o nesta quinta-feira (2/3), na Casa de Francisca, em S�o Paulo. Mas antes de chegar l�, Cida Moreira faz esta participa��o com o Galp�o. “Cantar com a Teuda � pegar na m�o de Deus”, finaliza.

EXPERIMENTOS C�NICOS

Com Grupo Galp�o. Dire��o de Cida Moreira. Nesta segunda-feira (27/2), �s 19h e �s 21h, na Rua Pitangui, 3.413, Sagrada Fam�lia. Ingressos esgotados.