Autora do romance 'O conto da aia', que virou miniss�rie de sucesso, Margaret Atwood lan�a livro de poemas
Angela Weiss / AFP
Margaret Atwood tem enorme clareza a respeito dos problemas do mundo. Ela observa com a mesma lucidez as mazelas do patriarcado, o encanto dos p�ssaros, as dif�ceis rela��es de amor e de amizade e o desespero silencioso da velhice.
Essa lucidez faz dela a romancista bem-sucedida que �. Mas poesia � uma criatura que se alimenta de coisas diferentes - perplexidade, estranhamento, perigo e incerteza. Em "Poemas tardios", Atwood faz muitas perguntas. Literalmente. Os poemas s�o recheados de pontos de interroga��o.
A profus�o s� n�o � t�o irritante quanto o esfor�o de responder boa parte delas ou, o que d� no mesmo, deixar claro que s�o perguntas sem respostas. "As coisas eram boas, ent�o?/ Sim, eram boas", ela escreve na abertura de "Sal". E continua: "Voc� sabia que eram boas?/ Naquele momento? Na sua �poca?".
Lemos essa estrofe e j� sabemos do que ela est� falando. O poema n�o prop�e nenhum susto ou inc�modo al�m do que diz textualmente - neste caso, as armadilhas da mem�ria, da velhice e da nostalgia.
� esse o tipo de pergunta que predomina nos "Poemas tardios" de Atwood. Como olhar para tr�s, como lidar com a perda e a perspectiva da morte, como se relacionar com um futuro coletivo que n�o ser� compartilhado?
S�o boas quest�es, e a autora sabe compartilhar suas dores e tocar o leitor. � comovente ler, em meio a um poema bobo dedicado a ab�boras esculpidas para o Halloween, a s�plica "afastem a escurid�o,/ digam � Morte: n�o se apresse".
Mas tamb�m nos questionamos se isso n�o ficaria melhor em uma cr�nica ou um ensaio. Fica a impress�o de que Atwood caiu na balela de que escrever um poema � colocar emo��es em um texto e quebrar as linhas desse texto aleatoriamente, formando versos.
N�o h� nenhuma retor��o da sintaxe, nenhuma imagem intrigante, nada que transmita na forma o que o conte�do explicita. Deixa a desejar mesmo quanto ao ritmo, embora isso possa ser um problema inerente � tradu��o.
Pode soar arrogante dizer que o que move a poesia, como g�nero, � o espanto diante da vida e das palavras. No entanto, essas s�o as �nicas propriedades que cabem a ela com exclusividade. Um poema deve aceitar o risco da incomunicabilidade intr�nseco � linguagem.
Nove vers�es para desembarque de aliens
Em Atwood, a tenta��o de entender e explicar � grande demais. Em um dos raros bons poemas, "Chegam os Aliens", lemos nove vers�es, de inspira��o cinematogr�fica, da nossa rea��o � chegada de seres de outros planetas.
As oito primeiras partes s�o espertas e divertidas. "Eles ouviram falar do sexo humano,/ mas n�o acreditaram", diz uma delas. "Ah, antropologia!/ O horror! A surpresa!"
Ao cabo, no entanto, ela n�o resiste a apresentar sua conclus�o, em forma de pergunta respondida: "N�s gostamos da parte em que somos salvos/ N�s gostamos da parte em que somos destru�dos/ Por que as duas coisas parecem t�o semelhantes?/ De qualquer jeito � um fim".
"Poemas tardios" n�o � uma obra horr�vel. � apenas desnecess�ria. � o tipo de livro com que presenteamos, sem passar vergonha, uma colega de trabalho sens�vel ou uma tia que precise de algu�m com quem conversar sobre a ang�stia de envelhecer.
� um livro dolorido, mas inofensivo. Mesmo se ignorarmos o fato de que n�o se trata de poesia, isto �, mesmo se abrirmos as p�ginas em busca apenas de reflex�es, n�o encontraremos nenhuma perspectiva nova sobre os assuntos tratados.
A n�o ser, talvez, que algu�m ache interessante refletir a respeito da mensagem que os cogumelos enviam para o solo ou a respeito da vida aqui em cima. Atwood responde, e a mensagem �: "Cuidado".
Capa do livro Poemas tardios traz ilustra��o de mulher e de p�ssaros sob fundo azul
Reprodu��o
POEMAS TARDIOS
. De Margaret Atwood . Rocco . 173 p�gs. . R$ 24,90 . R$ 49,90 . R$ 29,90 (e-book)
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