Burrinho de 'Eo' suporta a estupidez humana no filme de Jerzy Skolimowski
Longa do cineasta polon�s, que levou o pr�mio do j�ri no Festival de Cannes em 2022, entra em cartaz no Una Cine Belas Artes nesta quinta-feira (1/6)
Sandra Drzymalska interpreta a domadora do burrinho Eo no filme de Jerzy Skolimowski
Skopia Film/divulga��o
Jerzy Skolimowski ressurge entre n�s com “Eo”, o filme que lhe deu o pr�mio do j�ri no Festival de Cannes do ano passado. � bom avisar: o cineasta polon�s continua sem fazer concess�es; talvez por isso tenha ficado quase 20 anos sem filmar.
“Eo” remete, de maneira direta, ao Robert Bresson de “A grande testemunha”, em que o mestre franc�s narra as aventuras de um burrico levado ao acaso de um lado para outro, conforme determinado pelos humanos, cujas mis�rias acompanha.
Bresson n�o era um otimista em rela��o � nossa esp�cie; ainda assim, sua preocupa��o essencial era com o homem. Skolimowski parece se incomodar mais com esse animal praticamente an�nimo que frequenta seu filme.
Seu nome � Eo. � assim que o chama Kasandra, a bela domadora do circo em que ele vive, mas o pr�prio nome j� designa sua impessoalidade: trata-se da onomatopeia que remete ao som emitido por esse animal.
Desde as primeiras imagens o cineasta chama a aten��o para o olhar do burrinho. Um olhar que pouco nos diz, na medida em que parece aceitar tudo o que lhe � imposto.
Boas inten��es desinformadas
Logo no in�cio, Eo, enquanto puxa uma carro�a, tem o azar de atravessar uma manifesta��o de pessoas de boa vontade que reivindicam liberdade para os animais. Eo � libertado por eles, ou seja: sequestrado do circo e jogado no mundo sem qualquer prote��o.
O filme n�o economiza ironia em rela��o �s boas inten��es desinformadas dos humanos, mas tamb�m lan�a uma indaga��o sobre o que � realmente a liberdade. Talvez em muitas situa��es ser livre signifique apenas estar submetido a alguma tirania.
A tirania dos homens, no caso de Eo. Ele ser� levado de c� para l� sem que seu olhar se altere. Sempre neutro, ele est� disposto a absorver sem queixas o que der e vier: de ser golpeado a ser afagado, passando pela perspectiva de servir de carne para salame.
A circula��o de Eo pelo mundo remete n�o raro � natureza, como no momento em que passa diante de grandes p�s de capta��o de vento para produ��o de energia e�lica. De modo bem eloquente, Skolimowski parece nos lembrar que homens, animais e natureza formam um conjunto.
� claro, no entanto, que tudo isso s�o conjecturas prec�rias, sugeridas por um filme em que os sentidos se acumulam e se transformam a cada novo olhar de Eo. Assim, as cenas em que Kasandra demonstra sua afei��o pelo burrinho entram como se o pr�prio Eo estivesse se lembrando desse momento feliz, pleno de afeto. Nota��o que seria um pouco sentimental, n�o fosse a secura com que o diretor conduz a trajet�ria de seus personagens, entre humanos e n�o humanos.
Skolimowski faz parte do tempo em que um filme n�o se confundia obrigatoriamente com uma hist�ria – algo que cineastas orientais ainda cultivam; os ocidentais, muito raramente –, nem com prato pronto, � maneira de s�ries de streaming.
Sua forma aceita o mist�rio e a opacidade, nos coloca diante do sentimento de estranheza que se desprende das imagens. � preciso encarar esse radicalismo para gostar deste filme.
Quem fizer um esfor�o se ver� diante de um espet�culo que impressiona n�o apenas pela beleza das imagens, mas pela diversidade dos sentidos que o autor v� na aventura da Terra, o que inclui homens e animais, mas tamb�m ventos, �guas, paisagens, alimenta��o, a viol�ncia – tudo que passa pelo amplo quadro de significa��es contidas nas imagens.
Quanto � viol�ncia, ela � exercida de maneira quase absoluta pelos humanos neste filme t�o belo e t�o enigm�tico.
“EO”
• Pol�nia/It�lia, 2022
• Dire��o de Jerzy Skolimowski
• Com Sandra Drzymalska, Lorenzo Zurzolo e Isabelle Huppert
• Em cartaz na Sala 1 do UNA Cine Belas Artes, �s 14h, 15h40, 17h20 e 19h
*Para comentar, fa�a seu login ou assine