Ator mineiro da novela das nove abra�ou carreira depois de grave acidente
Felipe Ol�d�l�, o Gentil jovem de "Terra e paix�o", trabalhava com inform�tica e tinha dois empregos; aos 22, reviu seus objetivos, ap�s um desastre de carro
Hoje com 35 anos, Felipe Ol�d�l� tem extenso curr�culo no teatro e faz sua primeira novela, na qual divide o personagem com Fl�vio Bauraqui
Mia Shimon/Divulga��o
Quem v� as duas vers�es (jovem e experiente) de Gentil na novela das nove da TV Globo, “Terra e paix�o”, n�o imagina que os atores Felipe Ol�d�l� e Fl�vio Bauraqui compartilham algo a mais que o personagem: o perfume.
� isso mesmo. Sempre que entram em cena, eles passam o mesmo perfume, feito em Nova Lima, por uma amiga de Ol�d�l�. “Foi uma ideia do Fl�vio ter alguma coisa que nos conectasse com o Gentil, talvez um cheiro ou alguma coisa assim”, conta Ol�d�l�, que � natural de Belo Horizonte.
Ele diz que, ao ouvir a proposta do colega, recorreu � amiga mineira para que fizesse uma col�nia personalizada que tivesse a ver com uma pessoa amorosa e, ao mesmo tempo, uma rela��o com a terra e a ancestralidade, tal qual o personagem do folhetim. Assim foi feito.
Gentil � amigo de Aline (Barbara Reis), dona das terras que o mau-car�ter Ant�nio La Selva (Tony Ramos) quer tomar para si. Personagem-chave desse n�cleo da novela, � ele quem traz � tona segredos comprometedores de La Selva, revelados por meio de flashbacks nos quais Ol�d�l� interpreta Gentil.
Os Gentis: Flavio Bauraqui e Felipe Ol�d�l�
Instagram/reprodu��o
Do teatro de rua � novela
� a primeira vez que o mineiro faz uma novela. Aos 35 anos, ele fez carreira no teatro, passando por diferentes linguagens c�nicas. Experimentou o teatro de rua, a palha�aria, o teatro de bonecos, o teatro f�sico e contempor�neo, at� se encontrar no teatro negro.
Com a pe�a “Ch�o de pequenos” (2013), concebida em parceria com Ramon Brant, rodou o pa�s e fez sua primeira temporada internacional, apresentando-se em outros pa�ses da Am�rica do Sul e tamb�m na Europa. Na sequ�ncia, ingressou em uma resid�ncia art�stica de um ano com o Bando de Teatro Olodum, em Salvador, e, ao retornar para a capital mineira, fundou a Cia. Negra de Teatro.
O grupo foi o primeiro composto por alunos negros do Centro de Forma��o Art�stica e Tecnol�gica da Funda��o Cl�vis Salgado (Cefart-FCS) a se apresentar no Grande Teatro do Pal�cio das Artes, durante a mostra Cefart Concerto, em 2013.
Passados cinco anos, Ol�d�l� foi convidado a integrar o elenco do espet�culo “Preto”, da Cia. Brasileira de Teatro. Contracenou com Renata Sorrah e Grace Pass�, atrizes que ele j� admirava. O sucesso da pe�a de Marcio Abreu – o espet�culo foi indicado aos pr�mios APCA, Shell, Veja e Estad�o – garantiu ao grupo um tour na Europa.
No mesmo ano, Ol�d�l� fez outra resid�ncia art�stica na Alemanha. Em seguida, foi para Cabo Verde, no intuito de pesquisar o teatro e a dan�a locais. Como resultado desses estudos, estreou no final de 2020 seu primeiro espet�culo solo, “Travessia”, no Grande Teatro do Sesc Palladium.
Na TV, participou do especial “Comadres”, da Globo; e das s�ries “Rota 66”, do Globoplay, e “A Hist�ria delas”, do Star+, protagonizada por Let�cia Spiller. J� no cinema, rodou "A torre" (2019), de S�rgio Borges; e “Velho Oeste”, de Thiago Taves Sobreiro, ainda sem previs�o de estreia.
Dedicado ao teatro e � pesquisa dos diferentes elementos que cercam e comp�em as artes c�nicas, � natural pensar que a atua��o seja uma atividade que sempre esteve presente na vida de Ol�d�l�. A verdade, no entanto, � que o teatro s� chegou na vida dele em 2009, quando ele tinha 22 anos.
“Minha praia era outra. Eu queria ser skatista”, revela o ator. “Disputei campeonatos e criei um projeto social em Vespasiano chamado Skate Vivo, que at� hoje existe e ganhou dimens�o muito grande pelo programa estadual Fica Vivo. O skate era um meio para falar sobre arte, educa��o e empregabilidade para jovens em situa��o de vulnerabilidade social”, conta.
Ele ressalta que, gra�as ao projeto, que ainda existe, mas n�o � mais coordenado por ele, muitas crian�as e jovens n�o foram para o tr�fico de drogas e nem para a criminalidade.
No entanto, por mais que se dedicasse ao skate, Ol�d�l� n�o via retorno financeiro naquele esporte. Por isso, aos 16 anos come�ou a trabalhar com inform�tica. Em um momento da vida, chegou a ter dois empregos, come�ando a trabalhar �s 8h e terminando a 0h.
N�o satisfeito, decidiu entrar para a Pol�cia Militar (PM) por dois motivos: queria estabilidade no emprego e, silenciosamente, alimentava o desejo de ser uma esp�cie de garantidor da justi�a. Assim, quando n�o estava trabalhando, estudava para a prova da PM.
Com o dinheiro que juntou, comprou um carro para facilitar a locomo��o entre os dois empregos e ainda ganhar tempo para estudar. O ve�culo, no entanto, acabou sendo crucial para faz�-lo abandonar tudo e se dedicar ao teatro.
“Sofri um acidente grave que me fez repensar a vida”, lembra o ator. “Ali, percebi que os amigos que eu tinha nesse per�odo s� estavam ao meu lado por interesse. Eu era um jovem da periferia, que tinha dois empregos e um carro. Eu me afirmava mostrando meu poder aquisitivo. Quando me acidentei, perdi meu carro e me afastei do emprego; quase todos os meus amigos foram embora. Foi um processo de abandono”, relembra.
Nesse per�odo, um dos poucos amigos que restaram convidou Ol�d�l� para ir ao Festival de Inverno de Milho Verde. Embora n�o soubesse do que se tratava, ele foi e adorou.
“Conheci um monte de artistas da m�sica, da dan�a e do teatro. E, pelo que eu me lembro, vi a primeira pe�a de teatro l�. Tr�s palha�os tentavam tocar uma m�sica. O que me deixou mais chocado foi a rea��o das pessoas. Aquilo, t�o simples, encantava a todos. E me encantou tamb�m. A� vi que era aquilo que eu queria fazer na minha vida”, diz ele.
Ol�d�l� come�ou, ent�o, a estudar teatro. Mas, paralelamente, continuava trabalhando no setor de inform�tica. Somente com a aprova��o na resid�ncia art�stica do Bando de Teatro Olodum ele decidiu viver apenas de arte.
No per�odo em que morou na capital baiana, ganhou confian�a para montar a pr�pria companhia e passou a ter um pensamento mais cr�tico a respeito do of�cio do ator.
Felipe Ol�d�l� (ao centro) com o elenco da pe�a 'Chega de saudade'
Instagram/reprodu��o
Bossa nova
Hoje, al�m de integrar o elenco de “Terra e paix�o”, Ol�d�l� est� em cartaz no Rio de Janeiro com a pe�a “Chega de saudade”, na qual interpreta Ronaldo B�scoli. A pe�a, montada somente com atores negros, pretende mostrar outra perspectiva da Bossa Nova, contextualizando-a de acordo com o momento pol�tico em que surgiu, de pr�-ditadura militar (1964-1985).
Ol�d�l� tamb�m se aventura na m�sica. Em 2021, lan�ou o rap-manifesto "Chamado para aquilombar", gravado em parceria com Abra�o Kimberley. No single, ele exp�e os diferentes tipos de viol�ncia a que o povo preto est� sujeito, desde o racismo expl�cito at� a sexualiza��o de seus corpos, sobretudo o das mulheres.
Para este ano, pretende lan�ar outro single – ainda sem t�tulo definido – e montar a pe�a “A Terra desce”, com Aquela Cia.
J� para os pr�ximos anos, o que est� na mira de Ol�d�l� s�o montagens de obras de Shakespeare. “Nunca tinha me imaginado montando pe�as dele. Era um universo t�o distante para mim, pelo menos aparentemente, porque, na verdade, Shakespeare trabalha quest�es muito humanas”, afirma.
A carreira na Pol�cia Militar? Ele descarta. Mas ainda alimenta o desejo de fazer justi�a, que vem se concretizando com as constantes revela��es de seu personagem Gentil.
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