o escritor Matthias Lehmann

Matthias Lehmann � filho de brasileira que emigrou e de franc�s

Isabelle Franciosa/Divulga��o

Um acontecimento pol�tico crucial no pa�s divide uma fam�lia mineira. Os irm�os Ramires e Severino se colocam em lados opostos quanto ao papel que as For�as Armadas devem ter na vida brasileira, e um deles entra em rota de colis�o com o pai, Oswaldo Wallace, um homem alinhado ao pensamento (e � a��o) de direita.

Soa como uma hist�ria recent�ssima. Mas o cerne de “Chumbo”, HQ que o franco-brasileiro Matthias Lehmann acaba de publicar na Fran�a, remonta aos acontecimentos de 60 anos atr�s, quando o golpe de 1964 levou os militares ao poder.

Ambientada na capital mineira, a hist�ria come�a com um recuo � d�cada de 1930 e segue at� os anos 2000, mostrando as mudan�as que ocorreram na cidade e na sociedade, principalmente a partir da instala��o da ditadura militar.
 
Imagem de Belo Horizonte na HQ 'Chumbo'

Imagem de Belo Horizonte ganha destaque em 'Chumbo'

Editora Casterman/Divulga��o
 

Integralista, golpista e comunista

O patriarca Oswaldo Wallace � um ex-integralista. Ramires torna-se entusiasta do golpe militar, enquanto Severino, um jornalista comunista, se op�e ferozmente ao regime.

A ascens�o da extrema direita no Brasil e em diversos outros pa�ses foi o que motivou Lehmann a acelerar a publica��o de seu livro, cuja edi��o brasileira est� em negocia��o.

Ao longo da hist�ria, Ramires acaba se tornando parte do sistema, convivendo com pol�ticos, militares e torturadores. J� Severino adere � guerrilha, � capturado e torturado nos por�es da ditadura.
 
Filho de uma brasileira e um franc�s, e sobrinho do jornalista e escritor Roberto Drummond (1933-2002), o quadrinista se inspirou no tio para criar a obra. “Na minha fam�lia havia divis�es pol�ticas, mas, na verdade, nem precisava da pol�tica para come�arem as brigas”, diz Lehmann, entre risadas. 

“� verdade que dois tios meus serviram de modelo para os personagens principais (Drummond � um deles), mas meu livro �, principalmente, de fic��o. Apenas me inspirei nas situa��es e personalidades deles”, afirma.

Conforme o t�tulo sugere, “Chumbo” se concentra nos chamados anos de chumbo, �poca mais dura do regime militar, quando o Congresso foi fechado, parlamentares presos e cassados e a tortura foi largamente utilizada contra os opositores do regime. 
 

'Essa situa��o de polariza��o, que tamb�m ocorre dentro das fam�lias, n�o � nem tanto algo que se repete, e sim algo que nunca para. O problema � que, quando aparecem pol�ticos que querem criar mais divis�es, como Bolsonaro ou Trump, a situa��o piora em todas as camadas da sociedade, come�ando pelo n�cleo familiar'

Matthias Lehmann, quadrinista

 

O paralelo com o presente, no entanto, n�o � descartado. “Acho que essa situa��o de polariza��o, que tamb�m ocorre dentro das fam�lias, n�o � nem tanto algo que se repete, e sim algo que nunca para. O problema � que, quando aparecem pol�ticos que querem criar mais divis�es, como Bolsonaro ou Trump, a situa��o piora em todas as camadas da sociedade, come�ando pelo n�cleo familiar”, diz o quadrinista.
 
Imagem de Belo Horizonte na revista em quadrinhos 'Chumbo'

Fam�lia mineira protagoniza hist�ria em quadrinhos que se passa em Belo Horizonte

Editora Casterman/Divulga��o
 

Pesquisa hist�rica

Para escrever “Chumbo”, Matthias Lehmann, de 45 anos, mergulhou em livros e textos sobre o per�odo da ditadura militar brasileira, tanto de cr�ticos do regime quanto de defensores.
 
Ao longo das 360 p�ginas da HQ, h� refer�ncias � historiadora mineira Heloisa Starling, professora da Universidade Federal de Minas Gerais, ao jornalista Elio Gaspari, autor de cinco volumes sobre a ditadura militar brasileira, ao general Olympio Mour�o Filho, que iniciou a movimenta��o de tropas de Juiz de Fora para o Rio de Janeiro no dia do golpe, em 1964; e ao torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra.
 
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O quadrinista reproduz em seu livro obra de Alberto da Veiga Guignard (1896-1962)

Editora Casterman/Divulga��o
 

Para a parte gr�fica, Lehmann se inspirou em artistas pl�sticos como Tarsila do Amaral, Alberto da Veiga Guignard e C�ndido Portinari.

“Minha rela��o com o Brasil � principalmente com Belo Horizonte. Minha m�e � brasileira, mineira, e foi morar na Fran�a h� 50 anos, mas com bastante saudade de sua fam�lia e de seu pa�s. Ent�o ela me transmitiu esse amor pelo pa�s, pela l�ngua e pela cultura”, diz o quadrinista.
 

F� confesso dos quadrinhos dos franco-belgas Andr� Franquin, F'murr e Fred, autor da HQ "Philemon", e, posteriormente, admirador das HQs underground da editora francesa L'association e dos artistas canadenses Julie Doucet e Henriette Valium, Lehmann faz uma obra de estilo semelhante e que tem a caracter�stica de apresentar o Brasil aos estrangeiros.

“Os franceses que descobriram ‘Chumbo’ me contam que aprenderam muito sobre o Brasil. E, de fato, com toda a pesquisa que fiz para escrever este livro, tamb�m aprendi muito sobre o pa�s”, comenta.