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Estado de Minas LITERATURA ENEM

Modernismo brasileiro: renova��o vanguardista e tradi��o popular

Conhe�a um dos temas mais cobrados em literatura no Enem.


postado em 21/05/2020 15:21 / atualizado em 21/05/2020 16:57

Existe uma ideia geral de que a boa arte � aquela que melhor representa a realidade, com o menor n�mero poss�vel de falhas em rela��o ao objeto, imitado. O artista, ent�o, � aquele que tem maior t�cnica para realizar esse retrato e deve estar comprometido com essa concep��o, j� pr�-definida, de Arte. Na contram�o desse pensamento, a transi��o do s�culo XIX para o s�culo XX foi acompanhada, nas artes, por um intenso processo de mudan�a nas formas de representa��o, fazendo explodir os chamados movimentos de vanguarda. 

A distor��o da arte 


Os conhecidos ismos – o Expressionismo, o Futurismo, o Cubismo e outros movimentos – s�o t�o frequentes nas quest�es da prova de Linguagens do Enem que � prov�vel que voc� tenha de responder a uma quest�o sobre eles na pr�xima edi��o do exame. Isso porque trouxeram uma nova ideia: a obra de arte poderia distorcer a realidade, e ser fiel a ela n�o era mais par�metro para boa qualidade da obra. � desse momento hist�rico o famoso grito que o homem do quadro de Munch projeta em dire��o ao espectador, quando tamb�m toda a paisagem da pintura parece derreter, simultaneamente, ao pavor que essa figura sente.  No fundo do quadro, o c�u se confunde com o lago e com a terra, de forma que todo o cen�rio, desfigurado, parece participar da ang�stia do homem.
O grito, Edvard Munch, 1893.(foto: Google Art Project)
O grito, Edvard Munch, 1893. (foto: Google Art Project)

As distor��es que Munch provoca no quadro, se o afastam da ideia realista de “boa arte”, aproximam-no a algo mais comum do que podemos pensar � primeira vista: afinal de contas, quando tomamos um susto, n�o parece que o mundo ao redor fica um pouco emba�ado e o tempo congela? Da� a dificuldade que tantas v�timas de crimes violentos enfrentam para detalhar os rostos de seus agressores e as circunst�ncias do que se passou. Al�m disso, quem nunca visitou o mesmo local mais de uma vez e viu aquela paisagem de forma diferente, dependendo de estar alegre ou triste? � esse o princ�pio fundamental do expressionismo: mudar a apar�ncias das coisas, para dar for�a � express�o de um sentimento humano.

Perceber os efeitos de uma obra ajuda a compreender porque os artistas trabalham de determinada maneira. E o contexto pode iluminar ainda mais essas inten��es; da� a necessidade de sempre, na hora do vestibular, checar a fonte da obra citada na prova: nome do artista, data e t�tulo do poema ou da pintura podem contribuir para leitura de determinado texto. Como � caracter�stica da prova, o Enem se volta, especialmente, � cultura brasileira e aos per�odos moderno e contempor�neo – o que � tend�ncia tamb�m nos outros vestibulares -, sendo essencial entender n�o s� as transforma��es promovidas pelas vanguardas europeias, mas ir al�m: chegar � sua participa��o na forma��o do modernismo brasileiro.

Semana de Arte Moderna de 1922


No Brasil, as agita��es modernistas tomam conta do in�cio do s�culo XX, e, se a Semana de Arte Moderna de 1922 ficou como o grande marco dessa gera��o, alguns passos atr�s podem ser importantes para compreender os anos iniciais do modernismo no Brasil.
Mario de Andrade, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira, Villa Lobos, Tarsila Amaral e Anita Malfatti: a vanguarda modernista brasileira.
Mario de Andrade, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira, Villa Lobos, Tarsila Amaral e Anita Malfatti: a vanguarda modernista brasileira.

Quando fazemos esse movimento, nos deparamos com Anita Malfatti, uma artista que teve grande parte de sua forma��o feita na Alemanha, onde visitou as exposi��es expressionistas e certamente conheceu O grito de Munch. Sua primeira mostra individual acontece em S�o Paulo, em 1914, mas se torna famosa ap�s organizar uma exposi��o em 1917, quando exp�e quadros como O homem amarelo, que j� propaga a pincelada grossa e a cor vibrante. A fama, como � comum nos movimentos de vanguarda, se deve sobretudo � cr�tica. Monteiro Lobato, ent�o intelectual respeitad�ssimo, leva a p�blico Paranoia ou Mistifica��o?, t�tulo – nada amig�vel – do artigo de jornal que acusa Malfatti de rebelar-se contra a “arte pura” e de ver “anormalmente a natureza”, uma refer�ncia �s suas distor��es expressionistas. Lobato, assim, mostra como o espectador reage diante de uma obra que usa recursos pouco comuns ou mesmo desconhecidos. Est� a� uma grande for�a que define a vanguarda: a de colocar em crise o conceito de arte de determinado tempo, fazendo surgir uma nova atitude est�tica.
O homem amarelo, Anita Malfatti, 1915-1916.(foto: Itaú Cultural)
O homem amarelo, Anita Malfatti, 1915-1916. (foto: Ita� Cultural)

Se h� males que v�m para o bem, esse ataque, prejudicial � carreira de Malfatti, parece, no entanto, servir para unir ainda mais artistas que compartilhavam a ideia de que a arte no Brasil precisava deixar os velhos moldes tradicionais para tr�s. M�rio de Andrade, Oswald de Andrade, Menotti Del Picchia e Tarsila do Amaral – esta inicialmente por correspond�ncia – chegam mais perto de Anita. Juntos, ficam conhecidos como Grupo dos Cinco e v�o organizar a Semana de Arte Moderna. De 11 a 18 de fevereiro de 1922, acontecem mostras de pintura, declama��es de poemas e apresenta��es de m�sica com v�rios artistas no Theatro Municipal de S�o Paulo.

A Semana de Arte Moderna � resultado dessa articula��o de pintores, como Tarsila e Anita, e de poetas, como M�rio, Oswald e Menotti, que, impulsionados pelas agita��es modernistas europeias, far�o render ainda mais frutos. Dois anos mais tarde, em 1924, Tarsila do Amaral, Oswald e M�rio de Andrade decidiram embarcar, junto a mais alguns amigos, em uma viagem para Minas Gerais. A ideia era ver as festividades da Semana Santa e apresentar o pa�s ao poeta Blaise Cendrars, um franc�s que visitava o Brasil e tinha import�ncia l� no modernismo europeu. O que esse grupo n�o imaginava, no entanto, foi que quem parecia n�o conhecer o Brasil eram eles pr�prios!

Uma arte verdadeiramente brasileira


Essa verdadeira caravana modernista, com partida em S�o Paulo, passou por Ouro Preto, Mariana, S�o Jo�o Del Rei, Congonhas e descobriu, no interior de Minas, um tipo de arte valios�ssima: o barroco mineiro. As obras de Aleijadinho e Ata�de encantaram os modernistas por um motivo especial: elas j� apresentavam uma caracter�stica local, por serem muito diferentes do que foi feito no Barroco europeu. Ata�de, por exemplo, representou negros e mesti�os, o que era pr�prio da realidade colonial.

Essa incurs�o – para dentro do Brasil – ensinou muito ao grupo: mais do que renovar a arte brasileira com os experimentos das vanguardas europeias, era preciso conhecer a cultura local e mergulhar no pa�s natal, trazendo a cultura popular para a poesia e a pintura modernas. Isso sim faria diferen�a na arte!

As telas de Tarsila do Amaral nunca mais seriam as mesmas: se seu olhar j� estava voltado � cultura popular, o contato com as cores fortes e alegres do artesanato mineiro faz o azul, o rosa, o amarelo e o verde serem a base de suas telas, que tamb�m v�o representar altares de santos e cidades do interior.

Cr�tica, par�dia e autenticidade


� tamb�m dessa �poca o famoso Manifesto da Poesia Pau-Brasil, t�o presente nos vestibulares. Nesse texto, de 1924, Oswald de Andrade ir� mostrar como a poesia tradicionalmente feita no Brasil, em especial o Parnasianismo, tenderia a imitar a poesia tradicional e europeia, importando a cultura estrangeira de forma pouco cr�tica. A solu��o proposta pelo poeta seria, ent�o, a produ��o de uma poesia pr�pria, que, como o pau-brasil no per�odo colonial, representasse uma riqueza nacional e pudesse, assim, ser exportada, acrescentando uma nova forma de arte � cultura moderna universal.

Nessa mesma trilha, Oswald publica, em 1925, seu livro de poemas Pau-Brasil – o que pode fazer voc� pensar em como alguns poetas parecem seguir verdadeiros planos, projetos que t�m mais de pensamento que inspira��o. A poesia desse livro � uma tentativa de romper de vez com os la�os que nos ligavam � Velha Europa, porque se voltam inteiramente ao Brasil: s�o poemas que retomam o momento da coloniza��o, recriam os textos dos primeiros portugueses que aqui chegaram e fazem refer�ncias desde as cidades do interior de Minas � urbana S�o Paulo.

Um p� na ro�a e outro na cidade


Nesse roteiro pelo Brasil, fica claro como o pa�s que se moderniza nos anos 20 ainda t�m ra�zes coloniais, porque sua economia ainda � agr�ria e sua estrutura, ainda desigual. Com um p� na ro�a e outro na cidade, Oswald recupera, criativamente, o impacto de sua viagem a Minas Gerais e incorpora o verso curto e a linguagem popular � poesia. A renova��o cultural dos primeiros anos do modernismo talvez encontre a� grande valor: se ela mostra as limita��es da “boa arte”, prop�e tamb�m conhecer o Brasil profundo, esse que se revela mais m�ltiplo do que a caricatura de subdesenvolvimento pode representar. Est� aberto o caminho de uma densa transforma��o cultural, que, na virada dos anos 20 para a d�cada de 1930, conhecer� artistas que forjar�o um modernismo ainda mais amadurecido.

Sara Begname � mestranda em Literatura Brasileira pela Universidade Federal de Minas Gerais, onde estuda o Modernismo mineiro, e professora de Literatura do Determinante Pr�-Vestibular.

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