
Em meio � crise ocasionada pela debandada de servidores e suspeitas de vazamento de provas do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais An�sio Teixeira (Inep), estudantes de todo o pa�s inscritos no Exame Nacional do Ensino M�dio (Enem) fazem o primeiro teste, neste domingo, com mais incertezas do que o normal. Nesta edi��o, cerca de 3,1 milh�es de estudantes se inscreveram, o menor n�mero de candidatos desde 2005.
O ambiente ficou tumultuado depois que, nas �ltimas semanas, 37 profissionais do Instituto pediram demiss�o. Servidores ouvidos pelo Correio sob condi��o de anonimato, declararam que, desde 2019, com o in�cio do governo Bolsonaro, viviam em uma rotina de ass�dio e persegui��es pol�ticas. A institui��o chegou a criar uma comiss�o para verificar se as quest�es do Enem t�m "pertin�ncia com a realidade social". Um dos servidores caracterizou a iniciativa como "esdr�xula", disse que o objetivo era monitorar e censurar quest�es do exame, e que foi perseguido por isso.
As suspeitas de interfer�ncia pol�tica cresceram depois que o presidente Jair Bolsonaro declarou que o Enem, agora, estava "com a cara do governo". E ganharam ainda mais for�a depois que H�lida Lan�a, professora de uma escola p�blica de S�o Paulo, denunciou, nas redes sociais, que duas professoras da unidade que costuma aplicar o certame todos os anos seriam substitu�dos por dois policiais federais. Houve relatos tamb�m de redu��o do n�mero de controladores e fiscais por sala.
Para profissionais da educa��o, � uma situa��o in�dita. "Eu considero lament�vel que isso esteja acontecendo, que coloquem em d�vida a seriedade de profissionais do Inep. Em seus 80 e poucos anos, nunca aconteceu desse grande n�mero de profissionais que coordenam �reas importantes do instituto tenham colocado seu cargo a disposi��o", comenta a educadora Malvina Tuttman, presidente do Conselho Estadual de Educa��o do Rio de Janeiro (CEE-RJ), que presidiu o instituto em 2011.
Malvina Tuttman explica que a prova � elaborada a partir de diretrizes curriculares estruturadas pelos Conselhos Estaduais de Educa��o. "� isso que deve ser seguido, e n�o as vontades, os desejos ou a ideologia de qualquer pessoa que ocupe qualquer cargo, por mais hier�rquico que seja. Nem o Presidente da Rep�blica, nem o ministro de Estado e nem o presidente do Inep t�m o direito de censurar qualquer tipo de assunto ou quest�o de qualquer exame", disse.
A especialista, no entanto, afirma considerar baixas as chances da crise no instituto causarem grandes problemas no dia da prova. "Como o exame j� havia sido elaborado e tudo j� deve ter sido organizado para que chegue a todos os lugares do Brasil, eu espero que n�o tenha nenhuma consequ�ncia. Mas, sem d�vida, isso traz uma instabilidade. Al�m disso, as quest�es apontadas pelos servidores e pela Assinep ser�o apuradas e devidamente resolvidas", pontua.
Baixa ades�o
A preocupa��o do atual governo com a inclina��o ideol�gica do exame se refletiu no perfil dos participantes. Um levantamento feito pelo Semesp (Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior de s�o Paulo) mostra que 11,7% dos inscritos para o Enem 2021 s�o pretos. � a menor propor��o desde 2009, quando eles representaram 6,3% dos inscritos. A redu��o tamb�m � observada entre os estudantes mais pobres. O n�mero de inscritos com isen��o da taxa por declara��o de car�ncia caiu 77% em rela��o � �ltima prova. Al�m disso, a edi��o deste ano recebeu o menor n�mero de inscri��es dos �ltimos 14 anos.
Para Soraya Smaili, professora da Universidade Federal de S�o Paulo (Unifesp) e coordenadora do Centro SoU Ci�ncia, a baixa ades�o dos estudantes encontra explica��o em diversos fatores. "O desemprego e o empobrecimento das fam�lias, intensificados durante a pandemia, trouxeram aos jovens a necessidade de trabalhar, o que limita o tempo de estudo ou mesmo as condi��es psicol�gicas. Neste momento, a sobreviv�ncia est� falando mais alto, mesmo que o ingressar numa universidade seja o sonho de muitos e o que poderia melhorar suas vidas ao terem uma profiss�o ou especializa��o."
Para Soraya, a instabilidade pol�tica tamb�m pode ter afastado um maior n�mero de inscritos. "As tentativas de desmonte na educa��o, as suspeitas de tentativas de interfer�ncias, entre outras a��es do governo federal causam uma turbul�ncia desnecess�ria. Tudo isso traz um ambiente ruim, que pode, sim, explicar a redu��o no n�mero de inscritos", diz.