
Era uma manh� de s�bado do m�s de julho. Havia um movimento diferente na Rua Esp�rito Santo, Bairro Lourdes. O burburinho s� aumentava com o passar das horas. Tinha gente negociando filtro antigo, querendo trocar poltrona assinada. Gente saindo com moldura de quadro nas costas. Aquelas pessoas participavam da primeira experi�ncia de trocas, vendas, garimpos e desapegos em frente � loja do.edu. O encontro, que pode ser chamado de “garage sale” ou “mercado das pulgas”, movimentou muito mais p�blico do que se imaginava.
O dono da ideia � Eduardo Mendes, fundador da loja de casa e decora��o que apoia e divulga o trabalho de pequenos produtores mineiros. Ideias n�o faltam a esse publicit�rio de forma��o, que se descobriu empreendedor ao longo do caminho. Eduardo foi o primeiro homem a falar sobre decora��o na internet, lan�ou o primeiro clube de assinaturas de “fa�a voc� mesmo”, abriu a primeira loja de decora��o no Mercado Central e por a� vai. � uma hist�ria marcada por muita criatividade e pioneirismo. “Tenho necessidade de tirar uma ideia da cabe�a e colocar no mundo”, confessa o empreendedor, que j� anuncia um novo projeto. Em setembro, vai inaugurar uma filial da do.edu no Grande Hotel Ronaldo Fraga, com quem vai desenvolver produtos exclusivos.
Como voc� se envolveu com o universo da decora��o?
Sou formado em publicidade e trabalhei em ag�ncia por alguns anos. Al�m disso, faz 10 anos que produzo conte�do de casa e decora��o na internet e sempre tive neg�cios que envolvessem o meu conte�do. Comecei com blog, na �poca nem existia YouTube, e ele cresceu r�pido demais. Tinha me mudado para uma casa maior para ter mais espa�o para os meus cachorros e comecei a pesquisar ideias na internet, mas nada combinava com o meu estilo. Eu, muito publicit�rio, pensei: se estou procurando e n�o acho, deve ter mais gente na mesma situa��o. Montei um blog para mostrar a reforma. Trabalhava em ag�ncia durante a semana e no fim de semana mexia na casa. Um belo dia, o blog ficou fora do ar porque tinha sido eleito um dos 10 mais legais de “fa�a voc� mesmo” do Brasil. Com um ano e meio, sa� da ag�ncia para cuidar s� da produ��o de conte�do. Em paralelo, tinha loja on-line, loja f�sica e cheguei a montar um clube de assinaturas de “fa�a voc� mesmo”. O nome era Caixote. Mandava um caixote de madeira para a casa das pessoas e l� dentro tinha todo o material bruto para fazer lumin�ria, porta-chaves etc. A pessoa apontava o celular para um QR code e assistia a um v�deo em que eu mostrava o passo a passo. Fizemos 40 edi��es. Chegamos ao ponto de mandar 300 caixas para o Brasil inteiro, at� para o Acre. Foi o primeiro clube de assinatura de casa e decora��o.
Como surgiu a ideia de montar a loja no Mercado Central?
O meu marido, que � meu s�cio, j� tinha dado a ideia de abrir uma loja f�sica em BH. Mas achei que ele estava louco. Um belo dia, estava andando pelo Mercado Central, tinha acabado de fazer a feira de casa e decora��o Benquisto, e falei com ele: quer saber, aqui abriria uma loja. Se queremos dar visibilidade ao trabalho de pequenos produtores, n�o existe vitrine maior. Abrimos a loja em janeiro de 2018, dentro do mercado, super conceitual, com cheiro, todo mundo que passava ficava surpreso, recebia muitos turistas e deu certo. Mas sempre fui muito apegado � experi�ncia e queria melhorar isso. A loja de l� tinha 15 metros quadrados. Se colocasse 10 pessoas, j� ficava lotada. Em 2019, antes de come�ar a pandemia, resolvi mudar e achei a casa no Lourdes. Come�amos a reforma achando que a pandemia ia durar uns tr�s meses, mas s� abrimos a loja em dezembro de 2020. Na verdade, considero que inaugurei a loja agora. Agora que consegui fazer o que queria, que � ter uma loja com cara e aconchego de casa, que n�o fosse parecida com show room. A loja tem o cheiro dela, a m�sica dela, tem um caf� e na semana que vem vamos inaugurar um espa�o multiuso. Ser� um espa�o de experi�ncias. Fizemos o movimento contr�rio. Enquanto as lojas estavam saindo do f�sico e indo para o on-line, n�s, que temos uma presen�a on-line grande, viemos para o f�sico para proporcionar experi�ncias.
Por que voc� decidiu trabalhar com pequenos produtores?
Quando comecei a fazer feiras, l� atr�s, n�o sabia que existia tanta gente talentosa fazendo produtos legais em BH. Queria dar visibilidade a essas pessoas. Muitas mantinham o artesanato como hobby e hoje v�rias vivem disso. Isso � muito gratificante, fazer girar a economia criativa local. Hoje temos 40 marcas diferentes de pequenos produtores locais. Todos s�o de Minas, a maioria de BH. O nosso mix contempla casa, decora��o e aromaterapia. Temos almofadas, quadros, lumin�rias, objetos decorativos, velas, tapetes, cer�micas, utilit�rios, espelhos e pequenos m�veis.
Conte a hist�ria de algum produto que voc� tenha orgulho de ter garimpado.
As esculturas de cora��es anat�micos. Esse cara � farmac�utico e, como era muito encantado com anatomia, come�ou a fazer esculturas com cer�mica fria. Descobrimos o trabalho dele quando organizamos a feira. Hoje ele exp�e em Inhotim, no Pal�cio das Artes, e isso � muito legal. Tem tamb�m uma professora de escola p�blica e o marido dela que fazem cer�mica com um processo muito interessante. Eles n�o usam pigmentos artificiais. Usam folhas do fundo de casa, ent�o chegam a cores extremamente diferentes. Outro dia ela chegou � loja e disse que tinha tingido uma pe�a com folhas do ip� de casa. Era um hobby, mas eles se profissionalizaram, est�o se aposentando e v�o viver de cer�mica. Recentemente, criamos juntos uma linha de utilit�rios, como pratos, canecas, cumbucas e moringas. A nossa ideia � ser bem colaborativo, n�o s� vender o que as pessoas j� fazem.

Como voc� se sente quando v� a vida dessas pessoas transformada?
Isso � o que nos move. A gente entende que loja f�sica tem v�rios desafios, bem maiores que os da loja on-line, mas na loja f�sica voc� consegue contar a hist�ria das pessoas. Os vendedores s�o treinados para isso. Quando o fornecedor v� sua hist�ria sendo contada, v� seu trabalho bem exposto, sendo valorizado e reconhecido, � incr�vel. Isso � o que faz a loja existir, de verdade. O nosso prazer � colocar essas pessoas em evid�ncia.
Qual mudan�a voc� percebeu ao sair do Mercado Central e se mudar para o Lourdes?
Sa�mos de uma loja de fluxo para sermos uma loja de destino. Aqui na Rua Esp�rito Santo n�o tem tanto pedestre, passa mais gente de carro. Ent�o, estamos construindo uma rela��o com a vizinhan�a. O caf� tem gerado um movimento de pessoas que se sentam para comer e trabalhar.
O que voc�s j� conseguiram fazer de diferente na nova loja?
Fizemos uma esp�cie de “mercado das pulgas” na porta da loja. As pessoas levaram seus desapegos e puderam vender e trocar. Nunca tinha visto isso em BH. Via muito l� fora e queria trazer para c�. Foi incr�vel, tinha gente saindo com moldura nas costas. Tinha poltrona assinada, filtro antigo cor de rosa, jogo de talher, tapete, muita coisa. Eu mesmo troquei um m�vel por uma cadeira. Fizemos uma edi��o muito piloto, quer�amos s� fazer um barulho, mas muita gente ao redor da loja desceu para participar. Est�vamos esperando umas 100 pessoas e foram 300. Realmente surpreendeu. Agora em agosto, no dia 13, vamos fazer uma vers�o maior. J� at� temos autoriza��o da prefeitura para ocupar uma parte da rua. �s vezes, uma coisa parada na sua casa, que n�o faz mais sentido para voc�, vai ser �til para outra pessoa. Esse � um evento que gostaria de ter ido se n�o tivesse organizado. O mercado de BH � muito dif�cil, muito fechado, mas aos poucos estamos conseguindo trazer novas ideias. Tanto eu quanto o meu s�cio acreditamos muito na economia colaborativa. Todo mundo faz e todo mundo ganha.
Que outras ideias est�o na sua cabe�a?
Estamos terminando a reforma do espa�o multiuso e queremos oferecer experi�ncias diferentes. Abrir para artistas fazerem pequenos lan�amentos de cole��es e exposi��es. Queremos tamb�m oferecer oficinas e workshops que envolvam o morar, como aulas de massa fresca, bordado, terr�rio e aromaterapia. Vamos fazer eventos de arquitetura, design e decora��o. Queremos muito que esse espa�o seja bem plural para alcan�ar o m�ximo de pessoas. Acho que o design tem que ser o mais universal poss�vel. As pessoas me perguntam: por que abrir uma loja de artesanato no Lourdes? Gosto desse constante, acho que chama mais aten��o. Trazer o pequeno produtor para um lugar supertradicional de BH � um questionamento v�lido. Quando falo em artesanato, muita gente tende a desvalorizar, mas explico que isso envolve o feito a m�o, a produ��o em pequena escala, que n�o tem aquele tanto de unidades id�nticas. Voc� nunca vai achar um cora��o anat�mico igual ao outro e a cer�mica artesanal nunca vai ter a mesma cor. Queremos valorizar o feito a m�o.

O lambe-lambe � um dos grandes sucessos da marca. Como voc� chegou a esse produto?
Criei um para a minha casa h� uns cinco anos e os seguidores come�aram a pedir. Ent�o, criamos o kit de lambe-lambe com 10 cartazes enormes e hoje temos 17 modelos diferentes. Todos s�o tem�ticos. Temos uma estampa mais urbana, outra floral que faz muito sucesso, uma de cactos que tem um efeito bordado incr�vel, uma de colagens de revistas, lan�amos uma focada em viagens com pontos tur�sticos. Sempre lan�amos um por m�s e � um fen�meno. Trouxemos o lambe-lambe da rua para casa. Ensino no v�deo como aplicar. � s� diluir cola branca na �gua em por��es iguais e aplicar com pincel ou rolinho. Exatamente igual ao que se faz na rua. Falo que � como se fosse um papel de parede descompromissado, porque fica enrugado. Agora na pandemia, com o pessoal dentro de casa, foi uma loucura. J� vi o nosso lambe-lambe em barraca de a�a� em Jericoacoara e o mesmo em um sal�o chiqu�rrimo em S�o Paulo. As pessoas aplicam na parede, no teto, na porta. � um produto que conversa muito com o que a gente prop�e, do “fa�a voc� mesmo”. Fizemos um trabalho de formiguinha para explicar que o lambe-lambe � uma arte de rua do in�cio do s�culo passado usada principalmente para divulga��o de circo, por que ele enruga, mas � uma del�cia. Agora mesmo estamos criando com o Ronaldo Fraga uma edi��o limitada.
Como voc� enxerga a cultura do “fa�a voc� mesmo” no Brasil?
L� fora, esse movimento � muito gigante. O americano nem tem garagem, usa o espa�o para colocar ferramentas, muito pela falta de m�o de obra. Principalmente com a pandemia, as pessoas se voltaram para dentro de casa e aquela rachadura que n�o estava incomodando ou aquela parede toda branca come�ou a ser vista o tempo inteiro. Ent�o, teve uma busca muito grande pelo “fa�a voc� mesmo”, de colocar a m�o na massa e se envolver com a casa. N�o por uma quest�o de economizar, mas de encontrar um hobby e um exerc�cio de criatividade. Se podemos tirar algo de bom da pandemia, acho que foi o movimento de redescobrir o morar e o jeito de enxergar a casa. Nos vimos obrigados a melhorar o dia a dia em casa. As pessoas procuraram muito passo a passo para fazer home office.
Quando voc� come�ou o blog, isso era muito fora da realidade das pessoas?
Primeiro que n�o existia um homem falando de decora��o na internet. Fui o primeiro. O nosso blog se chamava “Homens em casa” e era justamente para tirar sarro disso. Mostrar que um homem estava decorando a casa, e n�o trocando o chuveiro. Postava at� o que dava errado, e isso aproximou as pessoas. Se n�o der certo, voc� vai ter uma hist�ria �tima para contar. Tiramos a decora��o daquele lugar da perfei��o. O lambe-lambe veio para refor�ar isso, nunca vai ficar perfeito, vai enrugar. Quando voc� n�o tem esse compromisso com o perfeito, fica gostoso. � como se brincasse de casinha, mas sendo adulto. N�o tem que ficar “neurado”. Coisa pl�stica demais n�o � vida real.
Quando se fala em decora��o, o que mais gera interesse e curiosidade?
As pessoas t�m muita dificuldade de combinar cores. Tanto que tem um estudo que fala que quase 70% das casas s�o brancas. Inclusive, vamos ter tanto na loja f�sica quanto na on-line um designer de interiores para consultoria. Voc� agenda um hor�rio, mostra foto do ambiente e ele d� sugest�es. Descobri nas minhas oficinas que as pessoas t�m medo de cores e um medo absurdo de ferramentas, num n�vel de n�o ter coragem de bater um prego na parede. O meu p�blico eram mais mulheres, de 18 a 70, e eu tinha que ensinar como usar a parafusadeira. Acho que, quando existe o pensamento de que tem que contratar algu�m para fazer tudo, d� medo. N�o � que esses profissionais n�o tenham que existir. O “fa�a voc� mesmo” n�o tira o servi�o de ningu�m, � mais para voc� aprender a se virar.
A que voc� atribui essa sua trajet�ria marcada por tanto pioneirismo?
Diria que sou um aquariano da gema, mas n�o � s� isso. Sou o mais novo de 10 filhos. Desde pequeno, sou muito t�mido e acho que a minha express�o veio da parte visual e de pensar diferente. Tenho notas e notas no celular com ideias e queria conseguir executar tudo o que penso. Sou muito inquieto e tem madrugada em que, enquanto n�o acordo, levanto e anoto tudo, n�o consigo dormir. Sou muito movido por coisa nova. Estou sempre pensando l� na frente. Acho que � da minha personalidade. O que sou de introspectivo no social extrapolo nas ideias. Tenho necessidade de tirar uma ideia da cabe�a e colocar no mundo. Sempre fui muito da execu��o. Nem sonhava em trabalhar com decora��o e j� pintei a casa com a minha m�e, aprendi com ela a bordar. Adorava montar �rvore de Natal, embalar presentes. Sempre fui muito ligado no visual das coisas.
Voc� descobriu ao longo do tempo o seu lado empreendedor?
Achei que ia morrer velho numa ag�ncia, porque amo trabalhar em ag�ncia. Mas a� minha vida virou do avesso. Eu me vi empreendedor de uma hora para outra.
O que � mais dif�cil: criar ou empreender?
Empreender � a coisa mais dif�cil que j� fiz na minha vida toda. Criar � o que mais gosto de fazer, ent�o para mim � maravilhoso. Mas essa parte de economia, markup, impostos � dific�lima. At� tirar a minha carteira de motorista achei mais f�cil.
Antes, voc� se enxergava envelhecendo numa ag�ncia. E hoje, como imagina o seu futuro?
N�o me vejo fazendo a mesma coisa por muito tempo. Trabalho com decora��o h� 10 anos, mas sempre invento uma coisa diferente. Imagino que estarei um pouco menos acelerado, mas experimentando muitas coisas novas. Gosto disso. Sei bordar, sei pintar, aprendi a customizar bonecas. Agora quero aprender a mexer com cer�mica e estou fazendo aulas de piano. Preciso sempre me alimentar de coisas novas. Acho que no futuro continuarei fazendo o que estou fazendo hoje, mas de um jeito diferente, com coisas e pessoas diferentes.
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