
Belo Horizonte quer estar na vanguarda de combate ao tabagismo. Pelo menos � que o pretendem os vereadores que defendem, em dois projetos em tramita��o na C�mara, a proibi��o de fumar em pra�as e parques. A proposta segue o rigor j� adotado em outras cidades, como Nova York (EUA) e T�quio (Jap�o), onde h� restri��o aos cigarros, cigarretes ou charutos nas �reas verdes e at� em vias p�blicas. Mas em Belo Horizonte, a poss�vel proibi��o divide opini�es. H� quem n�o s� defenda o fim do direito de fumar em pra�as e parques, como tamb�m sustente argumentos para o fim dos fum�dromos, ainda permitidos em BH pela Lei Estadual nº 18.552, de 2009. Por outro lado, especialistas que criticam a proposta a classificam como restritiva ao direito individual e antidemocr�tica.
Na capital, 17% das pessoas com mais de 18 anos eram fumantes em 2010, segundo o Minist�rio da Sa�de. A taxa � superior � registrada em 2009, quando a pesquisa de vigil�ncia de fatores de risco de preven��o a doen�as cr�nicas por inqu�rito telef�nico indicou 15,4%. BH est� na contram�o do pa�s, que apresentou �ndice de 15,1% em 2010. Uma das tentativas dos autores dos projetos � justamente diminuir o n�mero de fumantes. “Recebemos muitas reclama��es de frequentadores de pra�as sobre a presen�a de fumantes nesses espa�os, onde h� sempre muitas crian�as e jovens. N�o queremos que eles tenham esse exemplo e possam se tornar fumantes no futuro. Al�m disso, h� a quest�o do fumante passivo, que pode ter as mesmas doen�as de quem fuma, e a sujeira pelos restos de cigarro”, afirma o vereador Joel Moreira (PTC), autor do PL 2073/12. A multa prevista para quem descumprir a lei ser� de R$ 100 e, em caso de reincid�ncia, mais 50% desse valor.
Na mesma perspectiva, o vereador Edinho Ribeiro (PTdoB) defende em seu projeto 1602/2011 a proibi��o de cigarros em parques municipais. Nesse caso, as puni��es dever�o ser regulamentadas pelo Executivo e cumpridas pela Guarda Municipal, Secretaria de Meio Ambiente e Funda��o Municipal de Parques e Jardins. Para o presidente da Casa, vereador L�o Burgu�s, o projeto tem chance de passar no plen�rio. “Acho o texto muito positivo. Uma lei nesse sentido poder� coibir o tabagismo entre a popula��o de BH”, diz.
�nico fumante entre os 41 vereadores, o vice-presidente da C�mara, Alexandre Gomes (PSB), critica a proposta. “O projeto tem apelo popular importante em �poca em que se fala muito em ‘gera��o sa�de’, mas n�o acredito que fazendo pequenas restri��es, uma aqui e outra ali, vamos resolver o problema do tabagismo. O importante � dar informa��es e condi��es para as pessoas pararem de fumar, o que n�o � f�cil”, diz. No entanto, ele entende que a prefeitura ter� dificuldades em fiscalizar. “Se for sancionada, a lei dever� ter regulamenta��o muito clara para ser cumprida”, acredita Gomes.
A estudante de biblioteconomia na UFMG Isis Rocha, de 22, tamb�m faz cr�ticas. “Sou a favor da proibi��o apenas nos espa�os fechados, porque muitas vezes as pessoas n�o t�m a op��o de evit�-los. Mas nas �reas livres � um direito do cidad�o”, defende. Com o livro Demian, de Hermann Hesse, nas m�os – cuja hist�ria retrata os conflitos de um jovem que se v� diante da fragilidade da moral, da fam�lia e do Estado –, Isis tem se esfor�ado para deixar o v�cio. N�o pela for�a do poder p�blico, mas por vontade pr�pria, pela consci�ncia do mal provocado pelo fumo.
J� para quem trabalha na �rea da sa�de, os projetos s�o um avan�o. De acordo com a presidente da Comiss�o de Controle do Tabagismo da Associa��o M�dica de Minas Gerais, Maria das Gra�as Rodrigues, o a proibi��o poder� diminuir a incid�ncia de doen�as decorrentes do uso do cigarro.
Ponto cr�tico: voc� � a favor dos projetos contra o fumo?
Maria das Gra�as R. de Oliveira, pneumologista da Associa��o M�dica de Minas Gerais
sim
A aprova��o do projeto de lei seria uma grande contribui��o para a sa�de. Estudos mostram que, em pa�ses que imp�em restri��es ao cigarro, o n�mero de infartos do mioc�rdio e de doen�as respirat�rias diminui. Al�m disso, proibindo o fumo em espa�os p�blicos, as pessoas que n�o fumam, mas s�o fumantes passivos, n�o ficar�o sujeitas � fuma�a e �s mesmas doen�as que afetam quem fuma, como AVC, enfisema pulmonar, bronquite cr�nica e, al�m da piora de todas as doen�as al�rgicas e respirat�rias. O projeto � realmente bom, um avan�o. No entanto, devemos ir al�m e banir qualquer tipo de local fechado onde ainda se permite fumar, como fum�dromos. Uma das sa�das ser� a regulamenta��o da lei federal sancionada pela presidente Dilma Rousseff no fim do ano passado que pro�be cigarro em espa�os p�blicos e veta a publicidade do fumo.
Juracy Costa Amaral,
professor do Departamento de Ci�ncias Sociais da PUC Minas
n�o
N�o vejo esses projetos de lei como solu��o saud�vel e inteligente para a quest�o do tabagismo no Brasil. Vejo sim como exagero, como uma c�pia norte-americana que deixa constatado que o Brasil mais uma vez repete modelos de outros pa�ses. A cada dia, criam-se mais proibi��es para as pessoas e, consequentemente, aumenta-se a quantidade de infratores, de crimes e de puni��es. Isso n�o � uma forma civilizada de vida e de uso do espa�o p�blico. As pessoas devem construir ambientes adequados para viver, devem ser tolerantes com o outro, com o direito do outro. N�o os vejo como positivos, j� que uma sociedade represssiva, restritiva, punitiva e sem projetos de conviv�ncia instiga o �dio e a desobedi�ncia. Apesar de vivermos em um estado teoricamente democr�tico, o que se percebe � que cada vez mais a democracia tem estado na m�o de quem controla, ela n�o serve a todos. E isso n�o deveria ser assim. A democracia deve ser ampla.
Proibi��o recebe apoio
Na Pra�a da Liberdade, �s escondidas, duas mo�as fumam longe da fam�lia. Ao fundo, um grupo de estudantes canta Fogo e paix�o, de Wando, acompanhado por viol�o. “� s� um cigarrinho. Por prazer. N�o pretendo levar isso por muito tempo”, diz uma delas. A outra, sorridente, completa: “A gente viajou para a praia e come�ou de bobeira. S� para distrair”. Ambas concordam com o projeto de lei que pro�be o cigarro em parques e pra�as de Belo Horizonte. Para elas, pelo bem de todos, “estava demorando”. Muito sorridentes, amigas, “flagradas” pitando em paz, n�o se envergonham da a��o em segredo. Fazem gra�a at�: “� uma brincadeira. N�o � s�rio”. Contudo, os pais “n�o podem nem sonhar” o h�bito.
Enquanto isso, o artista pl�stico Sylberto Sette Silva, de 51 anos, caminha feliz da vida com o cigarrinho entre os dedos. E opina: “Dura lex, sed lex. Se vai ser lei, vai ter que ser cumprida. Sou fumante, mas sou a favor da proibi��o. N�o posso incomodar os outros”, diz, perto de banco da pra�a onde est� Ism�lia Fontoura, de 25 anos, rela��es p�blicas, que revela ter verdadeiro pavor de cigarro. “Desculpe-me, mo�a”, afasta-se. Sylberto, educado, divertido, nascido em Caratinga, diz que fuma h� tanto tempo que se pesquisadores o descobrirem v�o “querer estud�-lo”. “Estou feliz de estar na pra�a, livre com o meu cigarro. Mas se vier a lei, vou seguir feliz sem o cigarro tamb�m”, diz.
O aut�nomo Ramon Rezende, de 47, n�o se diz surpreso com o projeto de lei. Para o comerciante, Belo Horizonte � a “cidade da proibi��o”. Fumante desde os tempos de rapaz, em Tim�teo, no Vale do A�o, Ramon se diz acostumado com a “persegui��o”. Afirma que agora talvez at� pare de fumar. “Vai ter que ser a for�a, n�!? J� tentei v�rias vezes e n�o dou conta. Volta e meia digo que n�o fumo mais. A�, basta um aborrecimento para voltar a comprar picado e, quando assusto, o ma�o j� est� no bolso de novo”, conta. Com m�dia de um ma�o por dia, diz que j� est� sem lugar para fumar. Em casa, a mulher e os tr�s filhos adolescentes t�m verdadeiro pavor de cigarro. O celular toca. Aborrecimento. Desliga o aparelho e acende um cigarro pr�ximo ao coreto. “J� est� bom? � que vou ter de resolver uma pendenga”, despede-se.