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Estado de Minas

Pessoas mais velhas sofrem mais os efeitos do crack no cer�bro

Efeito da droga � ainda mais devastador nos c�rebros das pessoas maduras. Depend�ncia � mais r�pida e contribui para acelerar o quadro de deterioriza��o da sa�de do usu�rio


postado em 18/03/2012 07:25 / atualizado em 18/03/2012 07:31

Em tratamento em uma clínica de reabilitação, Caio luta para superar o vício, adquirido com amigos(foto: Belo MAgalhães /EM/ DA Press )
Em tratamento em uma cl�nica de reabilita��o, Caio luta para superar o v�cio, adquirido com amigos (foto: Belo MAgalh�es /EM/ DA Press )


Nas mentes mais maduras, nem sempre a viagem do crack tem volta. Os primeiros sinais do envelhecimento dos usu�rios da droga servem como alerta para as autoridades, devido � r�pida depend�ncia provocada por ela e ao alto grau de dem�ncia em fun��o da destrui��o irrevers�vel dos neur�nios. Em outras palavras, o uso do crack “frita o c�rebro”, no jarg�o dos viciados na pedra. “O progn�stico das pessoas com mais idade piora muito, porque elas j� tendem a uma perda de neur�nios com o processo natural do envelhecimento. Nesses casos, o efeito do crack � mais delet�rio”, compara o psiquiatra e homeopata Alo�sio Andrade, presidente do Conselho Estadual sobre Drogas.

“O enfrentamento do crack na terceira idade � uma quest�o de sa�de p�blica”, defende a geront�loga Viviane Caf� Mar�al. Ela lembra que se uma pessoa com mais de 50, 60 anos cair e fraturar um bra�o durante o desequil�brio da paranoia do crack, isso ter� consequ�ncias mais graves do que na inf�ncia, em que na maior parte das vezes basta enfaixar o bra�o. “Bem, os gastos somam R$ 8 mil em m�dia para sete dias de interna��o de um idoso que sofreu uma queda leve”, compara. O aumento do uso do crack por pessoas mais velhas poder� obrigar � cria��o de uma comunidade terap�utica voltada para a perman�ncia de idosos que queiram se livrar da depend�ncia qu�mica em drogas. “� um recurso caro, que pressup�e outro tipo de profissional de sa�de, corrim�o, piso diferente e a presen�a de um geriatra capaz de fazer a combina��o de medicamentos”, compara.

Diferentemente da maconha, usada nos anos 1970 para ampliar a consci�ncia e aumentar a percep��o, o crack atua no sentido oposto. Sua mistura serve para entorpecer os sentidos, anestesiar. “Se usam a maconha para sentir, o crack � para n�o sentir nada”, afirma Alo�sio Andrade. “Como o idoso j� passou da fase de criar fam�lia e fazer carreira profissional, aumentam o tempo livre e a sensa��o de vazio existencial”, diz o psiquiatra, explicando porque os dependentes buscam a droga para se desligar da tomada.

N�o existe f�rmula pronta para dar sentido � vida, mas Alo�sio Andrade recomenda criar v�nculos de amizade ou de interesse. Como se diz por a�, inventar boas modas, aprender a tocar um instrumento ou usar o computador, fazer esporte ou cultivar orqu�deas, inscrever-se em um servi�o volunt�rio ou reativar a associa��o do bairro ou da rua. “O problema do Brasil � que envelhecemos muito r�pido, em 40 anos, enquanto a Fran�a levou 150 anos para realizar o mesmo processo. No Jap�o, os cidad�os j� sabem que ser�o longevos e planejam desde cedo a renda futura, o hobby e sua terceira ou quarta profiss�o”, exemplifica Viviane Mar�al.

Problema reconhecido

“Reconhecemos que o problema existe e que o uso de drogas na terceira idade cresceu na �ltima d�cada no pa�s”, diz Cloves Benevides, subsecret�rio de Pol�ticas sobre Drogas de Minas, vinculado � Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds). Ele se mostra especialmente preocupado com o crescimento da presen�a de pessoas mais velhas nas cenas urbanas associadas ao uso do crack. Nas cracol�ndias o n�vel de degrada��o, sujeira e viol�ncia � alto. “Os idosos j� s�o mais vulner�veis, e com o uso da droga tornam-se mais pass�veis de sofrer agress�es. A situa��o � grave”, diz.


Identificada a raiz do problema, a subsecretaria prepara a��es de preven��o para enfrentar o drama do envolvimento dos idosos com o crack. Para o segundo semestre, Benevides anuncia jornadas de capacita��o de profissionais que atuam nos servi�os de assist�ncia social para lidar com o novo perfil dos usu�rios. “Se o paciente mais velho j� tem um quadro de alcoolismo, � preciso uma aten��o especial para ele n�o saltar mais um degrau”, alerta o subsecret�rio, que pretende estender o programa aos policiais do Grupamento Especializado em Policiamento de �reas de Risco (Gepar), respons�veis pela ronda nas cracol�ndias.


Me viciei da primeira vez

“Nunca tinha experimentado droga, mas o efeito do crack foi devastador. Me viciei da primeira vez. Tenho boa forma��o. Estudei em col�gio interno e cursei filosofia, mas estava sentindo minha vida vazia. Conheci a pedra em 2008, por influ�ncia de colegas. Minha mulher estava viajando para Diamantina. Duas colegas do servi�o me introduziram no crack. A droga desliga a pessoa da realidade. Cheguei a roubar objetos da casa da minha irm� para trocar pela pedra. Ela sabe que eu estava louco, que eu normalmente n�o faria isso. Tenho vergonha do dia em que meu filho foi l� na (Favela da) Ventosa me mostrar o carro zero que ele havia comprado e n�o dei valor. Estava fora de mim. Minha fam�lia est� rezando por mim e me manda cartas. Na semana que vem faz cinco meses que me internei aqui (na comunidade terap�utica Fazenda de Can�) e j� fui autorizado a fazer minha primeira visita externa. Estou inseguro.”


Ant�nio, de 54 anos, vendedor aut�nomo


Estou andando na luz

“O crack n�o discrimina ningu�m. At� pessoas milion�rias est�o mexendo com isso. Elas est�o saindo do p� e entrando na pedra. Eu fiquei no meio das pedras e acabei escorregando nelas. Quase ca� na sarjeta. Perdi esposa, minha oficina mec�nica, os dentes e a dignidade. A primeira pedra custa barato. O problema � que seu efeito dura meia hora e dali a uma hora o cara quer outra. Ele est� na fissura e faz qualquer coisa pelo crack. Cheguei a trocar uma TV por cinco pedras, que valiam R$ 50. S� n�o virei mendigo porque tenho dois filhos. Um dia fui chamar a aten��o do meu mais velho, de 17 anos, e ele disse que eu n�o tinha mais moral para falar como pai. Uma semana depois, parei com tudo. Sobrou s� o cigarro. Fa�o quest�o de dar esse depoimento porque n�o quero que nenhum ser humano passe pelo que eu enfrentei. A sociedade apaga quem mexe com crack. Eu sa� das trevas e estou andando na luz.”

Ant�nio Henrique, de 54, ex-dono de oficina mec�nica e m�sico


Vou deixar essa vida

“Comecei a usar maconha h� 19 anos porque tinha uma �lcera brava e n�o conseguia comer. Disseram que fumar baseado dava muita fome. Nunca mais parei com as drogas e experimentei de tudo. Conheci o crack com um amigo, que mostrou que a pedra ajuda a tirar o cheiro da maconha. Com isso, conseguia esconder da minha m�e. Sou filho �nico e moro com ela. Ela � pedagoga, tem livros escritos e devo a ela sair desse embalo. Minha vida virou um inferno. Eu vendia sa�de. Era faixa preta de jud� e campe�o de motocross. S� consegui sair do fundo do po�o depois de um sonho. Desde que meus filhos eram pequenos, tenho costume de cham�-los de “bro” (diminutivo de brother, irm�o em ingl�s). Pois ent�o, no sonho vinha descendo um �nibus de viagem e que quebrou no caminho de uma pra�a, onde havia um mendigo, que era eu. Meus dois filhos desceram , passaram por mim e n�o me reconheceram at� o momento em que gritei: “bro!” Eles ent�o me abra�aram e sa� daquela vida. � o que pretendo fazer.”

Caio, de 55, dono de pousada


Entrevista

Karla Giacomin
Presidente do Conselho Nacional
dos Direitos do Idoso

`O Brasil n�o
valoriza o velho`


Presidente do Conselho Nacional dos Direitos do Idoso (CNDI), a geriatra mineira Karla Giacomin alerta que o Brasil ainda n�o acordou para as necessidades dos velhos que, em 30 anos, ser�o um em cada quatro brasileiros. “N�o se deve permitir que o velho busque o crack como sa�da, como fuga do preconceito”, alerta.

Pode-se dizer que o crack chegou � terceira idade?

Os velhos, como qualquer outro grupo et�rio, n�o est�o livres do crack. No entanto, o uso dessa droga n�o � queixa priorit�ria no Conselho Nacional dos Direitos do Idoso. Ainda temos velhos que nunca ouviram falar de crack no seu dia a dia.

Qual � o risco do crack para os idosos?

O problema do crack � que ele n�o tem volta. A droga tem alta taxa de letalidade e causa grave processo de dem�ncia, com perda social definitiva. Portanto, o maior trabalho � preventivo. N�o se deve permitir que o velho busque o crack como sa�da, como fuga.

Como fuga de qu�?
O Brasil ainda n�o se preocupa com as necessidades da pessoa envelhecida, sendo que, daqui a 30 anos, um em cada quatro brasileiros ser� idoso. Voc� sabe que o que a gente reprime e recalca a gente n�o enfrenta.

Como assim?
O Brasil n�o valoriza o velho como indiv�duo, o quanto ele pode colaborar e participar da sociedade. Para se ter uma id�ia, o Plano Nacional de Educa��o n�o prev� cursos de gradua��o ou p�s-gradua��o para o idoso. H� muito o que se pensar sobre a incorpora��o desses saberes na p�s-carreira. Atualmente, ao se aposentar � como se a pessoa perdesse a capacidade financeira e o valor social.


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