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Estado de Minas

Mitos da escravid�o em Minas s�o derrubados por pesquisador

Estudioso derruba imagem de que os negros eram sempre os humilhados e revela: em Minas, mais de 30% deles tinham posses, eram propriet�rios de terras e at� de outros escravos


postado em 12/05/2012 06:00 / atualizado em 12/05/2012 07:59

(foto: Aquarela de Carlos Julião)
(foto: Aquarela de Carlos Juli�o)
Nas novelas de tv, ambientadas nos tempos da escravid�o, os negros t�m destino certo: quando n�o ficam amarrados no tronco apanhando feito cachorro, est�o presos aos grilh�es nas senzalas ou preparando quitutes na cozinha da fazenda. J� na literatura do s�culo 19, comem o p�o que o diabo amassou – se � que havia p�o! – no por�o das embarca��es, encarando “tanto horror perante os c�us” – como escreveu o baiano Castro Alves (1847-1871) no poema Navio Negreiro. Ganhou for�a, ent�o, no imagin�rio popular, a imagem de homens e mulheres humilhados, v�timas de olhos baixos e impotentes para levantar a voz contra o seu senhor. Mas novos estudos mostram que a trajet�ria dos escravos africanos no Brasil tem muitos mitos e que eles foram, sim, agentes da hist�ria e nem sempre submissos.

Estudioso de tema t�o pol�mico h� mais de 20 anos e autor de v�rios livros, o professor de hist�ria da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Eduardo Fran�a Paiva conta que os escravos desenvolveram autonomia e at� ajuizaram a��es contra os seus propriet�rios, quando se sentiam lesados. Muitas vezes levaram a melhor no tribunal, ao defender, por exemplo, que j� haviam pago todas as parcelas de compra de sua liberdade, algo que o senhor contestava. “O equ�voco maior � pensar que os cativos foram v�timas o tempo todo. O 13 de maio de 1888, lembrado amanh�, data em que a Princesa Isabel (1847-1871) assinou a Lei �urea e extinguiu a escravid�o no Brasil, serve para discutir o assunto e corrigir uma s�rie de distor��es, muitas delas constru�das pelos abolicionistas”, diz o professor, que segue na pr�xima semana para Sevilha, Espanha, onde far� o segundo p�s-doutorado, desta vez sobre as Am�ricas portuguesa e espanhola.

Nas suas pesquisas, o professor Eduardo, que atua nas �reas da hist�ria da escravid�o e das mesti�agens, vem fazendo descobertas surpreendentes. Uma das mais importantes se refere aos senhores de escravos que, ao contr�rio do que se aprende na escola e nos livros did�ticos, nem sempre eram brancos. Em Minas, do in�cio do s�culo 18 a meados do 19, mais de 30% desses propriet�rios eram ex-escravos ou descendentes de escravos. Em 1776, conforme as estimativas, havia na capitania de Minas, ent�o a mais rica e populosa da col�nia, com um com�rcio conectado com o mundo e efervesc�ncia social e cultural, cerca de 300 mil habitantes, sendo 130 mil forros (ex-escravos), 110 mil escravos e 60 mil brancos.

“Havia em Minas mais ex-escravos do que escravos, a maior parte mulheres”, afirma o professor, explicando que somente a partir da segunda metade do s�culo 19, a escravid�o passou a ser condenada. “At� ent�o, era legal e leg�tima, e os cativos prezavam dois valores fundamentais: queriam ser livres e propriet�rios de escravos. Os castigos f�sicos eram comuns nesses tempos de patriarcado, em que os pais batiam muito nos filhos”, diz o autor de v�rios livros, entre eles Escravid�o e universo cultural na col�nia, editado pela UFMG, e Escravos e libertos nas Minas Gerais do s�culo 18, da cole��o Olhares/UFMG/Annablume.

Fortuna

Entre as personagens mais importantes encontradas nas pesquisas est� B�rbara Aleluia –negra filha de africanos, nascida no Brasil –, uma pernambucana que viveu em Sabar�. “Ela foi uma das mulheres mais ricas da �poca, acumulou fortuna com o com�rcio e outras atividades”, revela. Pinturas ainda desconhecidas da maioria dos brasileiros mostram negras cobertas de joias e usando trajes t�picos, a exemplo das mulheres africanas, ou andando pelas ruas com seu s�quito. Num livro, Eduardo mostra o retrato de uma baiana, uma negra enriquecida, que posa em est�dio com seus colares de ouro.
Em Minas, com uma sociedade mais urbana, a situa��o era bem diferente da encontrada ao Norte da Am�rica Portuguesa. “Aqui havia muitos senhores de poucos escravos, em m�dia cinco para cada um, bem diferente de Pernambuco e Bahia, com 30 por um. Outro diferencial mineiro � que nem todos os propriet�rios eram ricos”, diz o professor, explicando que, por volta de 1730, a minera��o de ouro j� estava em decad�ncia, embora a economia se mantivesse forte e din�mica, com um com�rcio influente e produ��o agr�cola em ascens�o. Esse quadro favorecia a compra da liberdade.

Para conseguir o seu objetivo, o cativo tinha que ser, antes de mais nada, um bom negociador, o que significava um acordo com o seu dono sobre a forma de pagamento. Quem n�o ganhava a alforria em testamento ou na pia batismal, podia pag�-la parceladamente, num per�odo de quatro a cinco anos, em presta��es semestrais, num sistema denominado coarta��o –nesse tempo, o chamado coartado ficava longe do dom�nio cotidiano de seu propriet�rio. Outra forma de ficar livre era pagando � vista. “O dinheiro para saldar o d�bito era obtido de diversas formas. As mulheres dominavam o pequeno com�rcio, vendendo, nas ruas, doces, sucos, carnes e outros produtos. Eram muito comuns, nessa �poca, as ‘negras de tabuleiro’, que, como mostram tamb�m gravuras antigas, sa�am pelas vilas e arraiais vendendo comidas. A prostitui��o era outro caminho para alcan�ar a liberdade”, conta. O artista italiano Carlos Juli�o (1740-1811) pintou aquarelas retratando a vida dos rec�m-chegados da �frica – e chamados de bo�ais por n�o saberem falar a l�ngua portuguesa – e dos enriquecidos.

Um dos objetivos do professor � tirar dos escravos e forros o perfil exclusivo de v�timas e dar-lhes a dignidade de quem construiu sua liberdade e ajudou na edifica��o do pa�s. “No Brasil, o cen�rio de escravos amarrados ao tronco, sendo chicoteados, � fortemente panflet�rio, embora o castigo f�sico tenha existido em toda a col�nia. Enquanto os escravos foram efetivamente agentes da hist�ria, a historiografia brasileira contempor�nea continua repetindo discursos abolicionistas, o que significa exagerar no grau de viol�ncia praticado pelos senhores”, diz o professor, convicto da necessidade de maior aprofundamento das pesquisas.

Primeiras leis

Para quem pensa que todo negro na col�nia era escravo, o professor esclarece que nem todo escravo era negro”. Mulatos, pardos e cabras (descendentes de negros e �ndios tamb�m eram escravos. E por que essa diferen�a? Eduardo conta que, no s�culo 18, os “negros de corte”, a exemplo de alguns nobres do reino do Congo, iam estudar em Lisboa, Portugal, ou Salvador, na Bahia. Igualmente livres eram tamb�m alguns africanos que trabalhavam nos chamados navios negreiros que cruzavam o Oceano Atl�ntico. Em 1830, surgem as primeiras leis que proibiam o tr�fico de negros determinando que todo africano que pusesse os p�s no territ�rio brasileiro deveria ser considerado livre.


“O equ�voco maior � pensar que os cativos foram v�timas o tempo todo. O 13 de maio serve para discutir o assunto e corrigir uma s�rie de distor��es, muitas delas constru�das pelos abolicionistas” Eduardo Fran�a Paiva, professor de hist�ria da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

 

 

Linha do tempo
S�culo 16 – Come�a a escravid�o no Brasil e os �ndios s�o os primeiros a trabalhar nesse sistema. Os negros africanos chegam � col�nia na segunda metade do s�culo
S�culo 18 – O sistema come�a em Minas, sendo escravos os negros, mulatos, pardos e cabras (filhos de negros com �ndios)
1830 – Entram em vigor as primeiras leis proibindo o tr�fico atl�ntico de escravos. Todo africano que chegasse ao territ�rio brasileiro deveria ser considerado livre
1850 – Em 4 de setembro, � aprovada a Lei Eus�bio de Queir�s, que p�e fim ao tr�fico negreiro
1871 – Em 28 de setembro, � promulgada a Lei do Ventre Livre, que considerava livres todos os filhos de escravas nascidos a partir daquela data
1885 – Em 28 de setembro, � promulgada a Lei dos Sexagen�rios ou Lei Saraiva-Cotegipe, que garantia liberdade aos escravos com mais de 60 anos
1882 e 1885 – Em Minas, s�o criadas a Sociedade Abolicionista de Ouro Preto e a Beneficente Associa��o Marianense Redentora dos Cativos, que promoviam a emancipa��o dos escravos _
1888 – Em 13 de maio, a Princesa Isabel sanciona a Lei �urea, que extingue a escravid�o no Brasil

(foto: Júnia Garrido/Divulgação - 4/2/2011)
(foto: J�nia Garrido/Divulga��o - 4/2/2011)


Arturos em festa

A tradicional comunidade dos Arturos, de Contagem, na Grande BH, celebra neste fim de semana a Festa da Aboli��o. Hoje, �s 18h, tem concentra��o das guardas de Congo e Mo�ambique, na Rua da Capelinha, 50, no Bairro Jardim Vera Cruz. �s 18h30, haver� cortejo das guardas em dire��o � Matriz de Nossa Senhora do Ros�rio, no Bairro Alvorada, seguindo-se celebra��o eucar�stica (19h30) e levantamento de mastros na Casa da Cultura/Museu Hist�rico, na matriz e na comunidade (20h30). Amanh�, a programa��o come�a �s 4h, com a Festa da Matina ou Dan�a que chama o sol , na Rua Capelinha, 50, e segue at� as 22h com desfiles, missas, encena��es e celebra��es. A comunidade negra Arturos descende de Camilo Silv�rio da Silva, que, em meados do s�culo 19, chegou ao Brasil num navio negreiro vindo de Angola. Em Minas, trabalhou num povoado na Mata do Macuco, antigo munic�pio de Santa Quit�ria, hoje Esmeraldas.
 

 


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