
Justi�a, ainda que tardia. Oito anos depois da morte de um casal em Montes Claros, Norte de Minas, provocada por um acidente decorrente de um pega, os dois motoristas respons�veis foram ontem condenados por j�ri popular a penas que somadas superam 29 anos. O julgamento ocorreu na cidade do Norte de Minas e durou 22 horas. Na manh� de ontem, Daniel Luiz Cordeiro Leite e Rodrigo Fernando Aguiar foram sentenciados a penas individuais de 14 anos e oito meses de pris�o em regime fechado pelas mortes do casal Milton Librelon, ent�o com 70 anos, e Vanita Librelon, de 69, ocorridas em dezembro de 2004 . A decis�o, a terceira do tipo em Minas, refor�a a press�o pelo fim da impunidade para os crimes de tr�nsito, mas ainda n�o significa que a dupla v� para pris�o, pois a defesa anunciou que vai recorrer e os acusados aguardar�o em liberdade.

Quem tamb�m comemorou a decis�o foi o advogado Carlos Cateb, especializado em direito de tr�nsito e ex-secret�rio geral da Ordem dos Advogados do Brasil se��o Minas Gerais (OAB-MG). “Achei �tima a posi��o do juiz da primeira inst�ncia a acredito que ela deva ser mantida pelo Tribunal de Justi�a, tendo em vista as circunst�ncias em que o crime ocorreu”, afirmou. Para ele, a condena��o � oportuna em um momento em que a sociedade est� mais atenta para a necessidade de punir crimes de tr�nsito com rigor. Entretanto, o jurista n�o esconde o temor de que a decis�o seja mudada nos tribunais em Bras�lia.

“As jurisprud�ncias do Rio Grande do Sul, do Paran� e de S�o Paulo, por exemplo, s�o mais rigorosas e admitem facilmente o dolo eventual. Em casos de pega entre ve�culos e de embriaguez ao volante, eles sempre condenam dessa forma. O mesmo n�o ocorre em Minas”, afirma. Segundo o advogado, cerca de 85% dos processos por mortes no tr�nsito s�o classificados como homic�dios culposos. “Esse percentual deveria ser menor, tendo em vista a grande quantidade de acidentes que ocorrem em alta velocidade, na contram�o e com pessoas embriagadas ao volante”, diz. E acrescenta que a morosidade da Justi�a provocada pelo d�ficit de magistrados resulta na prescri��o de cerca de 90% dos crimes de tr�nsito.
Para Santiago, existem sim fatalidades no tr�nsito que se encaixam na qualifica��o culposa, como um atropelamento em que o pedestre se joga na frente do carro ou um acidente provocado por condi��es da pista. “No entanto, dirigir embriagado, muito acima da velocidade permitida ou na contram�o s�o comportamentos evidentes de que o condutor assume o risco de provocar um acidente. E isso precisa ser visto com mais rigor em Minas j� que nosso tribunal ainda � muito conservador”, disse.
Uma esperan�a para que os crimes de tr�nsito sejam julgados com mais rigor no Brasil est� em pauta em Bras�lia. Uma comiss�o especial de juristas criada pelo Senado est� encarregada de elaborar uma anteprojeto com revis�es no C�digo Penal Brasileiro. O novo texto, que ser� posteriormente analisado pelo Congresso, pretende incluir crimes de tr�nsito, inclusive com aumento de pena.
Poucas condena��es para muitos crimes
A Justi�a de Minas registra apenas duas condena��es de motoristas envolvidos em trag�dias de tr�nsito classificadas como dolo eventual. Em uma delas, ocorrida em Bicas, na Zona da Mata Mineira, o m�dico Ademar Pessoa Cardoso e o empres�rio Ismael Keller Loth receberam senten�as de 12 anos e nove meses e 12 anos e tr�s meses, respectivamente, por terem provocado a morte de cinco pessoas em um acidente de tr�nsito em abril de 1996.
Eles disputavam um racha na MG-126, entre Mar de Espanha e Bicas, na Zona da Mata, quando atingiram um ve�culo onde viajavam as v�timas. A trag�dia que marcaria a vida da fam�lia come�ou a ser desenhada em Mar de Espanha, quando os dois motoristas condenados fizeram uma aposta de R$ 2 mil, em p�blico, em que o vencedor seria o primeiro a chegar na vizinha cidade de Bicas.
J� em Lavras, no Sul de Minas, Ricardo Kennedy, de 21 anos, foi condenado em 2008 a sete anos de pris�o, em regime semi-aberto, pelo atropelamento de duas pessoas e a morte de Cristiane Aparecida de Carvalho, de 22 anos.
Puni��o para a minoria
85%
das mortes no tr�nsito s�o julgadas como n�o intencionais
11
processos por crime de tr�nsito prescreveram este ano em Minas
Imprud�ncia na rua e manobras na Justi�a
O casal Milton e Vanita Librelon morreu quando retornava de uma festa de anivers�rio em Montes Claros, na noite de 19 de dezembro de 2004. Ao passar pelo cruzamento das avenidas Jos� Correa Machado e Jo�o Chaves, entre os bairros S�o Luiz e Ibituruna, o carro em que se o casal se encontrava, um Santana, foi atingido violentamente por um Passat e um Renault, que eram dirigidos, respectivamente, Daniel Luiz Cordeiro e Rodrigo Aguiar. Eles dirigiam em alta velocidade e as investiga��es conclu�ram que disputavam um “racha” na avenida Correa Machado.
No Santana estavam ainda dois netos do casal, Fredy Librelon e Andrey Librelon, al�m de Thais Figueiredo Costa Librelon, mulher de Andrey, que foram lan�ados para fora do carro, mas escaparam. Os envolvidos no pega fugiram sem prestar socorro �s vitimas. De acordo com uma testemunha, o motorista do Passat, na tentativa de fuga, engatou a marcha r� e passou em cima do corpo de Milton Librelon, que estava no ch�o.
Ap�s o desastre, familiares do casal Librelon iniciam uma mobiliza��o contra a impunidade, clamando por justi�a. Apesar da press�o, o caso demorou a ir j�ri, por causa de manobras dos advogados dos acusados. Uma das alega��es da defesa dos r�us foi que o Santana estaria sendo conduzido por Fredy Librelon, que era inabilitado. Por�m, laudo da per�cia comprovou que o carro era realmente guiado por Milton, que trabalhou como motorista de caminh�o durante 30 anos.
Ontem, imeditamente ap�s o anuncio da senten�a, parentes do casal Librelon se abra�aram e fizeram uma ora��o dentro do sal�o do j�ri, comemorando a senten�a. “A sociedade estava � espera de uma resposta em rela��o a viol�ncia no tr�nsito no Brasil e essa resposta foi dada. Temos que agradeceu a Deus e � Justi�a”, afirmou o jornalista Andrey Librelon. “O sentimento de perda pelas mortes dos meus av�s � irreper�vel, mas foi dado um exemplo para acabar com a impunidade no tr�nsito. Nossa fam�lia foi representada pelos jurados”, acrescentou.
“Fiquei aliviada com a condena��o por homic�dio doloso, pois o tempo todo a defesa tentou descaracterizar que se tratava de um racha”, disse Andr�a Thais, mulher de Andrey. Para o promotor Henry Wagner Vasconcelos, a decis�o foi emblem�tica, por envolver um crime de tr�nsito em um pega.
Do rigor � impunidade
O m�s de junho em Minas foi marcado por extremos quando o assunto � a puni��o de motoristas que agiram com imprud�ncia e provocaram trag�dias no tr�nsito. Na quinta-feira, a Pol�cia Civil demonstrou rigor e agilidade ao anunciar o indiciamento por triplo homic�dio, com dolo eventual, do condutor da carreta que provocou tr�s mortes e ferimentos em duas pessoas ao perder o controle do ve�culo de carga na Avenida Nossa Senhora do Carmo, Zona Sul de BH, no in�cio do m�s (foto). A decis�o se baseou no fato de o caminhoneiro trafegar em �rea proibida, em alta velocidade, com pneus em mau estado e carga excessiva. Uma semana antes, por�m, a vit�ria foi da impunidade. “Triste pa�s. �s v�timas (...) resta-me pedir perd�o, porque sou pe�a de um Judici�rio moroso e que n�o se sensibiliza com trag�dias como a descrita nos presentes autos”, escreveu o desembargador que constatou a prescri��o do crime cometido pelo franc�s Olivier Rebellato, que em 17 de abril de 2009 bateu em um carro com cinco amigos na Savassi, causando ferimentos em todos eles e deixando uma jovem em estado vegetativo. Ent�o com 20 anos, o estrangeiro fugiu para seu pa�s assim que decis�o da Justi�a lhe devolveu o passaporte.