
A morte do engenheiro mineiro M�rio Augusto Soares Bittencourt e do ge�logo paulista M�rio Gramani Guedes completa um ano amanh� e o mist�rio sobre o que aconteceu na floresta amaz�nica peruana ainda est� longe de chegar ao fim. A pedido das fam�lias e com apoio da Embaixada do Brasil em Lima, o prazo de encerramento do inqu�rito foi ampliado por mais 180 dias, per�odo que vence no final de agosto. Se n�o fosse assim, o caso teria sido arquivado por falta de provas em fevereiro. Dois camponeses da regi�o foram indiciados, mas o irm�o de M�rio, Carlos Gramani Guedes, suspeita do envolvimento dos dois peruanos que acompanhavam os brasileiros na trilha � beira o Rio Mara�on, na cidade de Pi�n – Jos� Antonio Suazo Bellacci e Fausto Edurino Li�an Turriate. Os quatro faziam levantamento na �rea para a constru��o de uma usina hidrel�trica.
“Houve pouco avan�o. Acordo e durmo pensando nisso. N�o temos paz. Eu quero saber o que aconteceu com meu marido. Fico revoltada com a incompet�ncia e a irresponsabilidade da empresa. A Leme diz que est� fazendo, mas n�o mostra resultado. Meu marido n�o queria ir. Tinha estado no Peru uma semana antes e comentou que o clima estava ruim. Minha sogra ouviu uma conversa dele, dizendo que n�o havia necessidade daquela viagem, que estava indo obrigado. Demore o tempo que for, vou correr atr�s de uma resposta”, promete a vi�va F�tima Bittencourt, esposa de M�rio Augusto.
Liliana, mulher de M�rio Guedes, viajou ontem para os Estados Unidos para passar a data longe de casa. “Faz um ano que a gente vive nessa luta. � um absurdo tratar a morte de dois brasileiros que viajaram a trabalho dessa forma”, desabafa.
Telefonemas
Segundo Carlos Gramani, o advogado indicado pela Embaixada que representa as fam�lias e acompanha as investiga��es solicitou � Justi�a a quebra do sigilo telef�nico dos brasileiros e dos funcion�rios da empresa local SZ Engenharia. Guedes diz que os dois prestaram depoimentos inveross�meis para justificar o fato de terem abandonado os brasileiros na mata. H� alguns anos, a regi�o vinha sendo palco de manifesta��es contr�rias � instala��o da usina, inclusive com a morte de policiais e camponeses, produtores de arroz, durante confronto. Ge�logo da empresa peruana, Li�an foi obrigado a deixar o lugar sob pedradas um ano antes. Apesar disso, por�m, os funcion�rios da SZ Engenharia dispensaram um guia para acompanh�-los nos trabalhos.
“Existe a� uma omiss�o dolosa. As pessoas sabiam do risco e eles foram sem prote��o nenhuma. Como dispensaram o guia, os peruanos eram os respons�veis pelas vidas do engenheiro Bittencourt e do meu irm�o. Houve uma omiss�o com inten��o. O inqu�rito est� sendo direcionado para os dois camponeses, mas eles t�m um �libi muito forte. O fato � que os dois brasileiros foram enviados ao Peru de maneira negligente, sem um plano de trabalho, e foram deixados a pr�pria sorte”, afirma o irm�o do ge�logo paulista. “Dizer que eles tiveram morte natural ou golpe de calor � um absurdo, um insulto.”
Carlos diz que os depoimentos dos funcion�rios peruanos n�o fazem sentido. � pol�cia, Suazo e Li�an contaram que Bittencourt sentiu dores no joelho com cinco quil�metros de caminhada e decidiu se sentar na estrada. Os dois peruanos e Guedes teriam continuado o trajeto e, no retorno, j� n�o teriam mais encontrado o engenheiro brasileiro. Neste momento, Guedes tamb�m teria decidido ficar sozinho, � espera dos peruanos que desceram at� a beira do rio para fotografar. Na vers�o dos funcion�rios da SZ Engenharia, quando voltaram, Guedes tamb�m havia desaparecido.
“Eles eram muito experientes e jamais se deixa ningu�m para tr�s, assim, na mata. Enquanto eles estavam desaparecidos, segundo a pol�cia, algu�m usou o telefone do meu irm�o e fez liga��es para os camponeses suspeitos e para os funcion�rios peruanos. Mas o pr�prio Suazo disse em depoimento que os telefones ficaram na caminhonete, no in�cio da estrada. Ele entregou os aparelhos para a pol�cia dias depois. N�o acreditamos que isso tenha acontecido. Eles n�o deixariam os telefones no carro sabendo que ali tinha sinal”, acredita. “O GPS poderia indicar a localiza��o, mas a Justi�a negou”, lamenta Carlos. � pol�cia, os peruanos disseram suspeitar de dois camponeses da regi�o: Juan Zorrilla Bravo e J�sus S�nchez.
Encontros
A Embaixada do Brasil em Lima diz que o caso � acompanhado por gest�es de alto n�vel e que o embaixador j� esteve com os ministros peruanos da Justi�a e do Interior, respons�vel pela pol�cia. O ministro da Justi�a do Brasil, Jos� Eduardo Cardozo, esteve h� dois meses naquele pa�s e tamb�m refor�ou aos ministros locais que a sociedade brasileira espera uma resposta. A amplia��o do prazo do inqu�rito � avaliado por diplomatas como uma vit�ria, mas a esposa de Bittencourt v� lentid�o e falta de interesse em concluir as investiga��es. O caso foi assumido pela Fiscal�a Provincial, autoridade m�xima de investiga��o que se assemelha ao Minist�rio P�blico.
Advogado recorreu � presidente
Durante um ano de muitas d�vidas e poucas respostas, a �nica certeza das fam�lias � de que M�rio Augusto e M�rio Guedes foram assassinados. Ainda assim, um funcion�rio da Embaixada do Brasil em Lima que acompanha o caso e pediu para n�o ser identificado diz que ainda n�o h� provas contundentes disso. Segundo o irm�o de M�rio Guedes, Carlos Gramani, o corpo de Bittencourt foi encontrado longe dos �culos que ele usava, o que, para ele, causa estranheza. A m�quina fotogr�fica do engenheiro mineiro registra o in�cio da caminhada, mas teve a pen�ltima foto apagada. Nos pedidos encaminhados � Justi�a pelo advogado peruano que representa as fam�lias, apenas a per�cia no equipamento foi determinada. Ele j� recorreu � presidente Dilma Rousseff por carta, sem retorno. “Conto com a sensibilidade dela porque dois trabalhadores brasileiros foram mortos a servi�o no Peru, quando ela estava l�, inclusive”.
Carlos Guedes pede ajuda � Leme Engenharia e quer que a empresa, com filial no Peru, use sua estrutura para solicitar novamente a quebra dos sigilo telef�nicos - uma vez que os n�meros estavam registrados em seu nome - e digital, mostrando a troca de e-mails entre os brasileiros e pessoas envolvidas com o projeto de constru��o de uma usina hidrel�trica na selva peruana. “Sozinho fica muito dif�cil. As investiga��es correm a passos de c�gados e a impress�o que d�, depois da m� vontade do perito peruano, � de que eles querem deixar rolar at� a gente desistir, o que n�o vai acontecer. Quero saber quem matou meu irm�o”.
Por nota, a Leme Engenharia informou que o presidente da empresa, Fl�vio Campos, esteve na Embaixada do Brasil em Lima no dia 11 de julho para cobrar “efetividade, agilidade e m�ximo empenho nas investiga��es”. A empresa ressalta que n�o tem como intervir diretamente na apura��o porque apenas os suspeitos e as fam�lias das v�timas s�o tidas partes e, assim, t�m acesso ao processo. No entanto, a nota afirma que a empresa acompanha o caso e que est� analisando os celulares, m�quinas fotogr�ficas e roupas usadas pelos brasileiros. A Leme disse ainda que forneceu � Fiscal�a o mapa da regi�o com anota��es em GPS dos principais pontos mencionados nos depoimentos.
A empresa tamb�m contratou um perito norte-americano para analisar amostras de tecidos em um laborat�rio dos Estados Unidos e o relat�rio est� em fase de conclus�o. A fam�lia do engenheiro M�rio Bittencourt n�o autorizou a an�lise por considerar que n�o haveria resultado diferente do que j� foi divulgado por per�cias no Brasil tanto tempo depois.
Entenda o caso
• 23/7: O engenheiro mineiro M�rio Augusto Soares Bittencourt, de 61 anos, e o ge�logo paulista M�rio Gramani Guedes, de 57, chegam no Peru para fazer estudos de viabilidade para constru��o de uma usina hidrel�trica na amaz�nia peruana.
• 25/7: A dupla acompanhada de um ge�logo e um engenheiro peruanos – Jos� Antonio Suazo Bellaci e Fausto Li�an Turriata – come�am os trabalhos. Bittencourt sente dores no joelho e os colegas seguem em busca de ajuda. Na volta, meia hora depois, o engenheiro mineiro n�o estava mais l�. Guedes ficou no mesmo local e os peruanos seguiram na tentativa de chegar ao Rio Mara�on. Quando retornaram, ap�s uma hora, Guedes tamb�m havia desaparecido.
• 27/7: A pol�cia peruana encontra os corpos dos dois brasileiros �s 8h a 100 metros da estrada principal. Nada foi roubado e n�o havia marcas de viol�ncia. Dois camponeses s�o investigados: Juan Zorrilla Bravo, l�der comunit�rio que participou das manifesta��es contra usinas hidrel�tricas, e J�sus Sanch�z, que teria oferecido �gua aos brasileiros no in�cio da caminhada. Eles negaram envolvimento.
• 31/8: O Instituto M�dico Legal (IML) de Bras�lia divulgou que os exames patol�gicos e toxicol�gicos n�o detectaram nenhum tipo de veneno para os padr�es e dosagens pesquisados. Os testes foram feitos com pelo menos 10 tipos de veneno mais frequentes em casos de assassinato.
• 1º/9: O IML de Belo Horizonte confirmou que o engenheiro mineiro n�o morreu de causas naturais. Peritos analisam 816 subst�ncias e n�o encontram elementos comuns em envenenamentos, como medicamentos, estricnina, cianureto ou ars�nico. Segundo o IML, duas hip�teses n�o puderam ser descartadas: a de envenenamento por subst�ncias org�nicas e sufocamento.
• 16/9: Os testes laboratoriais feitos em Lima tiveram resultado inconclusivo. Um advogado contratado pela Leme Engenharia enviou as roupas das v�timas para per�cia particular, que apontou sangue e v�mito, ind�cios de envenenamento.
• 4/12: Data de conclus�o do inqu�rito � prorrogada para 12 de janeiro
• 12/1: Conclus�o do inqu�rito � prorrogado mais uma vez, para 18 de fevereiro.
• 2/2: Familiares pedem quebra do sigilo telef�nico dos pesquisadores peruanos que acompanharam os brasileiros na caminhada. Os dois trabalham na SZ, empresa peruana contratada pela Leme Engenharia para dar suporte a Guedes e Bittencourt.
• 6/2: Familiares de M�rio Guedes t�m acesso a contas do celular corporativo e constatam oito liga��es um dia depois de ele e o engenheiro M�rio Bittencourt serem encontrados mortos, aumentando a suspeita de emboscada
• 18/2: Fim do inqu�rito � prorrogado pela terceira vez
• 5/5: Promotoria de Cumba, no Peru, concede prazo extra de oito meses para conclus�o do inqu�rito alegando complexidade no caso.