
Enquanto os olhos se voltam para outros males, a leishmaniose visceral, na lista das doen�as negligenciadas no mundo, se alastra silenciosamente e tem em Minas um de seus focos. Levantamento do Minist�rio da Sa�de mostra que o estado � onde a doen�a transmitida pelo mosquito fleb�tomo, conhecido tamb�m como mosquito palha, provocou o maior n�mero de mortes no Brasil, entre 2000 e 2011. Nesse per�odo, 445 pessoas morreram com o diagn�stico em Minas, n�mero que garantiu ao estado o primeiro lugar disparado nesse ranking, seguido pelo Maranh�o (334) e pela Bahia (280).
Apesar de a dengue estar debaixo dos holofotes do poder p�blico, a leishmaniose matou mais do que o v�rus disseminado pela picada do Aedes aegypti. Nesse mesmo intervalo, a dengue causou 177 mortes em Minas, pouco mais de um ter�o dos �bitos provocados pela leishmaniose. O alerta m�ximo est� em Belo Horizonte, onde o mal � considerado end�mico. Na capital, se concentram 42% dos �bitos, com 187 mortes constatadas entre 2000 e 2011, mais que os estados do Piau� e de Tocantins. Para se ter uma ideia da gravidade, sozinha, BH poderia ocupar o sexto lugar no ranking dos estados com mais mortes pela doen�a.
De acordo com a Secretaria de Estado de Sa�de (SES), desde 2007, mais de 2,7 mil pessoas foram infectadas pelo protozo�rio do g�nero Leishmania. Um quarto delas (672) estavam em Belo Horizonte, onde a empregada dom�stica Regina L�cia Miguel, de 52 anos, contraiu a doen�a. Os primeiros sinais de algo n�o ia bem foi o emagrecimento repentino e a fraqueza. Perdi quase 20 quilos, tive febres de 40 graus e muita dor, principalmente na perna”, conta Regina, que ficou curada depois de tratamento que inclui inje��es. A forma como contraiu a doen�a, em 2001, � at� uma inc�gnita.
“N�o sei se o cachorro da minha casa tinha leishmaniose. Na �poca, n�o fizeram o diagn�stico. Mas, at� hoje, evito muito ficar perto de c�es e tenho horror a mosquito”, diz. O receio em rela��o ao c�o � porque o animal ocupa posto importante no ciclo da doen�a: uma vez picado pelo vetor, apesar de n�o contaminar diretamente o homem, torna-se um dos principais reservat�rios do protozo�rio. No homem, o parasita atinge as c�lulas de defesa do organismo e provoca sintomas como febre, emagrecimento, palidez, aumento do f�gado e do ba�o.
EXAMES
O secret�rio municipal adjunto de Sa�de, Fabiano Pimenta, afirma que a Grande BH, ao contr�rio de outras regi�es metropolitanas, tem ambiente mais favor�vel para o desenvolvimento do mosquito palha – �reas verdes e com concentra��o de mat�ria org�nica. Estudo dos casos mostra tamb�m que a maioria das mortes s�o de pacientes que trazem quadro de alguma outra doen�a. “Cerca de 70% das mortes foram de pessoas com doen�as imunossupressoras associadas, como a Aids. Mas os �ndices est�o em queda. Houve um pico em 2009 e agora estamos conseguindo reduzir o n�mero de casos”, afirma.
Seguro de que a leishmaniose n�o � uma doen�a negligenciada em Minas, Pimenta ressalta que v�rias medidas t�m sido tomadas na capital para conter o avan�o do mal. “Fazemos exames de c�es e aplicamos inseticidas nas �reas de risco, temos trabalhado com a educa��o da popula��o. Tamb�m fazemos a castra��o gratuita de animais, j� que a incid�ncia em c�es de rua � quase cinco vezes maior”, afirma Pimenta, ressaltando que a conduta em BH, seguindo orienta��o do minist�rio, � o sacrif�cio de c�es contaminados e que donos de animais com leishmaniose est�o sujeitos inclusive � multa.
A infectologista Regina Lunardi, professora do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), ressalta que a letalidade da leishmaniose est� muito associada � falta de um diagn�stico precoce. “Quando h� febre insistente por mais de sete dias, � preciso come�ar a pensar em leishmaniose. Ooutra quest�o importante � a educa��o da popula��o, que deve manter o quintal sempre limpo, com animais sadios”, alerta a m�dica, que queixa da escassez de estudos e do desenvolvimento de novos medicamentos para tratar a doen�a.
Resist�ncia ao sacrif�cio de c�es
Indicada pelo Minist�rio da Sa�de e adotada pela Prefeitura de Belo Horizonte, a eutan�sia de c�es diagnosticados com a leishmaniose � contestada por defensores de animais e veterin�rios. O ambientalista Franklin Oliveira, de 44 anos, levou o assunto � Justi�a e aguarda liminar a mandado de seguran�a para impedir o sacrif�cio de suas quatro cadelas, que h� tr�s meses est�o no Centro de Controle de Zoonoses da Secretaria Municipal de Sa�de (SMS). Um dos pontos questionados � a efici�ncia do exame sorol�gico. “J� fiz a contraprova com exames de linfonodos e todos confirmaram a negatividade da leishmania”, afirma.
O veterin�rio M�rcio Brasil, da diretoria da Associa��o Nacional de Cl�nicos Veterin�rios de Pequenos Animais (Anclivepa-MG), afirma que estudos cient�ficos mostram que h� formas de controle da doen�a, sem a necessidade de sacrificar os c�es. “S� o Brasil tem a postura de sacrificar animais. Existem coleiras repelentes e tratamento que reduz a carga parasit�ria do c�o. A classe veterin�ria � a favor do tratamento. Temos recursos mais avan�ados desde o diagn�stico, h� tamb�m vacinas para prevenir o cont�gio”, afirma.
O secret�rio municipal adjunto de Sa�de, Fabiano Pimenta, rebate e afirma que um dos grandes desafios a serem enfrentados em BH � a resist�ncia em sacrificar os animais. “N�o indicamos o tratamento de c�es. A leishmaniose � uma doen�a grave e n�o podemos pagar para ver”, diz. Como medidas de preven��o, a Secretaria de Estado de Sa�de (SES) recomenda limpar bem quintais, lotes, abrigos de animais, fazer o destino correto do lixo e at� mesmo usar repelentes e mosquiteiros. Outra dica � manter �rvores podadas, aumentando a insola��o e evitando condi��es favor�veis ao desenvolvimento da larva.