Minas mant�m tradi��o das folias de reis

 
“Do Oriente, uma estrela apareceu anunciando a toda gente que o menino Jesus Cristo nasceu.” A hist�ria conhecida em todo o mundo � o marco do calend�rio e entre as montanhas das Gerais ganhou sotaque e ritmo da mineiridade. Em todo o estado, os festejos que relembram a natividade fazem parte da cultura, identidade e religiosidade do povo. De 24 de dezembro at� amanh�, Dia de Reis, podendo se estender at� o dia 20, a tradi��o repassada pelo exemplo ganha lugar nas casas e nas pra�as onde h� um pres�pio. � a folia de reis, que relembra, por encena��es e cantos, o feito de Baltazar, Gaspar e Belchior. A folia existe no Brasil todo, de norte a sul, mas em Minas teve um crescimento porque nos s�culos 18 e 19 o estado abrigava as principais cidades do pa�s.

A tradi��o ganha espa�o nobre em Belo Horizonte. O grupo Folia dos Santos Reis do Bairro Paulo VI, na Regi�o Nordeste, se apresenta amanh� no terreno onde ser� constru�da a Catedral Cristo Rei, no Bairro Juliana, na Regi�o Norte. No Norte de Minas e no Tri�ngulo Mineiro, as folias s�o manifesta��es importantes da cultura local, mas a forma popular de relembrar o nascimento de Jesus pode ser encontrada em todo o estado. Os festejos incluem o auto de Natal, as pastorinhas e uma infinidade de maneiras de reverenciar o menino Deus.

Os festejos ca�ram no gosto popular e resultam da intera��o entre negros e brancos, que reinventavam pr�ticas religiosas da Europa, trazidas ao Brasil por portugueses, principalmente no per�odo do imp�rio. As comemora��es em homenagem ao menino Jesus s�o conhecidas como reisado. Na B�blia, a viagem dos magos � apresentada de forma ligeira no cap�tulo 2 do Evangelho de S�o Mateus: “E, tendo nascido Jesus em Bel�m de Judeia, no tempo do rei Herodes, eis que uns magos vieram do Oriente a Jerusal�m”.

Como o relato n�o � t�o preciso, a inventividade ganha lugar para recriar a viagem dos aventureiros que foram guiados por umas estrela at� chegarem ao local exato do nascimento de Jesus. Muitos acreditam que os magos eram na verdade astr�nomos, que estudavam os corpos celestes. Na B�blia n�o h� refer�ncia aos nomes dos magos, que passaram a ser chamados de Gaspar, Baltazar e Belchior pela tradi��o oral.

Cigana

H� cinco anos, Eva Domingos, de 55, aguarda as apresenta��es. Ela come�ou como cigana, um dos personagens das comemora��es, e atualmente tem um posto de mais responsabilidade e destaque. � ela que, � frente dos reis magos, leva a bandeira de Nossa Senhora do Ros�rio. Para a tarefa, uma saia rodada e ornamentos dourados na cabe�a. Todos os anos, ela vem com um grupo de Santa Luzia e com a Ordem dos Templ�rios da Cruz de Santo Ant�nio de P�dua para se apresentarem no Auto de Natal, na Pra�a da Liberdade.

A festa tamb�m acontece em Pedro Leopoldo, onde um dos grupos mais conhecidos � a Folia de Nossa Senhora da Concei��o de Fidalgo. Todos os anos, a folia vai �s casas onde h� um pres�pio montado para venerar o menino Jesus. “A tradi��o � de 320 anos. � repassada de gera��o a gera��o”, garante Danilo da Fonseca Martins, de 24, que participa da folia desde os 5 anos. Atualmente, como vice-diretor do grupo, teve aumentada a responsabilidade. “Quando chegamos, apresentamos o canto de entrada. Se a pessoa gosta, ent�o mostramos as dan�as.”

Em S�o Francisco, no Norte de Minas, Liosdino Francisco de Almeida, de 69, carrega a bandeira. Os cantos entoados pela folia de reis falam da estrela guia. Violas, sanfonas e rabeca acompanham as ladainhas. H� tanto tempo que Liosdino faz parte da folia que nem se lembra mais. “Desde crian�a. Meu pai era foli�o”, conta. O amor pela folia foi repassado por Le�ncio Mendes de Almeida. Para que a tradi��o permane�a � o exemplo que faz com que a meninada, em tempos de internet, se interesse pela folia. “� dif�cil colocar um menino novo junto, mas a gente p�e no meio e pede para ele tocar um pandeiro. Os meninos gostam da festa, dos biscoitos”, diz. Pelo afeto, a tradi��o � repassada e os meninos s�o cativados.

 

Cantos, catiras e rezas no pres�pio

Para que a festa ocorra � preciso a bandeira, conduzida com todo o respeito e devo��o por um foli�o. Aos violeiros cabe entoar os cantos, as rezas e catiras. Eles s�o acompanhados pelos caixeiros, que, por meio do som da caixa, chamam os foli�es para a festa. O l�der � o guia da folia, quem � respons�vel pela alvorada, giro e entrega da folia. “� o guia que determina quem dever� fazer as obriga��es. � uma pessoa de rever�ncia, de respeito, de dignidade que aprendeu a guiar a folia com gera��o passada e ensina a gera��o imatura”, afirma Crispim Lopes. Nessa tarefa, ele � ajudado pelo contraguia.

Os reis magos vestem roupas coloridas e com muito brilho. Podem estar mascarados ou n�o. Quando se fantasiam de palha�os, ficam mais livres e conduzem os foli�es para brincadeiras e diversas coreografias. Quando apenas mascarados, cantam para o menino Jesus. Na folia, n�o pode faltar a figura de Herodes, o imperador da Judeia, que mandou matar todas as crian�as com medo do Messias, que seria o rei dos judeus. “Ele usa a m�scara na parte de tr�s da cabe�a para n�o ser reconhecido. Quem vem atr�s pensa que ele est� indo na dire��o dele”, explica Manoel Fonseca dos Reis, da Federa��o dos Congados do Estado de Minas Gerais. “As folias visitam as casas que t�m pres�pio. Chegam � porta e perguntam”, diz.

Na cultura popular, os tr�s reis assumem as fei��es de um negro, um branco e um oriental. Outro personagem que n�o pode faltar � o palha�o, que, muitas vezes, � o pr�prio Herodes, uma refer�ncia ao fato de ele ter sido enganado pelos magos, que nunca voltaram a Jerusal�m para falar o local de nascimento do Messias.

Segundo o Instituto Estadual do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico de Minas Gerais (Iepha-MG), os reis s�o festejados em centenas de munic�pios mineiros. Em oito deles – Alterosa, Belmiro Braga, Betim, Casa Grande, Jo�o Pinheiro, Matias Barbosa, Nova Resende e Patos de Minas – as folias foram reconhecidas como Patrim�nio Cultural Imaterial dos munic�pios. Muitas outras cidades tamb�m est�o em processo de elabora��o de um invent�rio da manifesta��o.

 

 ATOS DE DEVO��O
 
PRES�PIO

O primeiro pres�pio em argila foi montado, em 1223, por S�o Francisco de Assis (1182 –1226). Nesse ano, em vez de festejar a noite de Natal na igreja, como era seu h�bito, o santo comemorou na floresta de Greccio. L� colocou uma manjedoura, um boi e um burro, para melhor explicar o Natal durante a liturgia �s pessoas que n�o conseguiam entender a hist�ria do nascimento de Jesus.
 
AUTO DE NATAL

“O Auto dos Reis Magos” � uma pe�a de autoria de Gil Vicente, escrita em 1503 e publicada em 1510, a pedido da rainha dona Leonor, para o Dia de Reis.
 
REISADO

O Reisado, tem a mesma origem portuguesa e instalou-se em Sergipe no per�odo colonial. Atualmente, � dan�ado em qualquer �poca do ano e os temas de seu enredo variam de acordo com o local e a �poca em que s�o encenados. Podem ser: amor, guerra e religi�o entre outros.
 
FOLIA DE REIS

No Brasil, a visita��o das casas � feita por grupos motivados por prop�sitos devocionais, sociais e filantr�picos. Cada grupo � chamado em alguns lugares de Folia de Reis, em outros de Terno de Santos Reis ou ainda de Caravana de S�o Francisco de Assis (em alus�o ao criador do pres�pio). Os grupos s�o compostos por cantores e m�sicos com instrumentos, em sua maioria de confec��o caseira e artesanal.