
Para o m�dico S�rgio Augusto Triginelli, com p�s-doutorado em ginecologia oncol�gica, o momento � de alerta e de desmistifica��o. “O jovem est� transando mais. Est� bebendo mais, se drogando mais. Isso provoca uma liberalidade quase inocente, j� que, alterado, o sujeito n�o � mais dono de seu controle”, considera. At� h� bem pouco tempo, c�ncer de boca e garganta era comum na popula��o com mais de 50 anos, com hist�rico de alcoolismo e tabagismo. “Hoje, assim como o fumo est� para o pulm�o, o HPV est� para os casos de c�ncer de colo do �tero e oral”, alerta o especialista.
O fato � que, segundo Triginelli, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), h� um aumento significativo de c�ncer provocado pela vida sexual dos jovens, “com poucos ou nenhum cuidado”. Para ele, a participa��o dos pais, com orienta��o respons�vel, e do governo, com pol�ticas p�blicas de esclarecimento, � o caminho emergencial para combater o quadro.
No Brasil, levantamentos anteriores indicavam preval�ncia de infec��o pelo HPV menor que 2% nos pacientes com c�ncer de cabe�a e pesco�o. “Um estudo nosso publicado em 2012 mostra que em pacientes jovens com tumores de boca a preval�ncia � de 32%, o que � muito alto”, diz Luiz Paulo Kowalski, diretor do N�cleo de Cabe�a e Pesco�o e Otorrinolaringologia do Hospital do C�ncer de S�o Paulo, conhecido como Hospital A.C. Camargo. O estudo, publicado em peri�dicos m�dicos internacionais, comparou 47 amostras de tumores de pacientes com menos de 40 anos e 67 amostras de pacientes com mais de 50 anos. Entre os mais velhos, o �ndice de infec��o pelo HPV foi de 8%.
Segundo Kowalski, nos dois grupos, o est�gio da doen�a era parecido, a localiza��o do tumor era semelhante e, ainda assim, os pacientes jovens HPV positivos tinham taxa de sobrevida melhor que os demais. De acordo com o especialista, os dados da pesquisa refor�am os de estudos anteriores, que apontam um melhor progn�stico para pacientes HPV positivo. “Parece ser um tumor diferente, com comportamento mais localizado e menos agressivo. Em geral, os pacientes respondem melhor ao tratamento”, diz.
“Provavelmente essa diferen�a se deve ao fato de que na capital as pessoas aderiram mais �s campanhas antifumo e hoje bebem menos do que antigamente. J� no interior, os h�bitos mudaram menos. Al�m disso, o comportamento sexual na capital est� diferente e isso � um dos fatores a que se atribui o aumento da ocorr�ncia dos casos de c�ncer associados ao HPV”, explica Kowalski.
H� 20 anos, o panorama para um jovem com c�ncer de cabe�a e pesco�o era muito ruim. Em geral, eram pessoas que come�aram a fumar e beber muito cedo. Tinham m�s condi��es nutricionais, estado f�sico muito comprometido e tumores muito agressivos. Os estudos que envolvem o HPV est�o bastante avan�ados na Europa e nos Estados Unidos. Kowalski acredita que, com as �ltimas observa��es, os tratamentos ser�o diferenciados e ainda mais eficazes.
Para o m�dico do A.C. Camargo – hospital respons�vel por 61% da produ��o cient�fica da �rea no pa�s e formador de um em cada tr�s oncologistas em atividade no Brasil – essa mudan�a de paradigma requer a revis�o dos programas de preven��o e detec��o precoce da doen�a, at� agora centrados em cuidados com a boca e em pacientes que fumam e bebem. Os que est�o fora desse grupo tamb�m podem estar em risco.
Existem mais de 200 varia��es do v�rus HPV. A maioria dos casos de c�ncer de orofaringe est� associada aos tipos 16 e 18, contra os quais j� existe vacina. Para Luiz Kowalski, o grande desafio � fazer com que essas vacinas sejam disponibilizadas na rede p�blica de sa�de. “S�o tr�s doses que devem ser aplicadas antes de a vida sexual ser iniciada”, explica. Est� em discuss�o se vale a pena incluir a vacina, de alto custo, no Programa Nacional de Imuniza��o, j� que alguns cientistas ainda questionam a abrang�ncia de sua efici�ncia.
NOS EUA Relat�rio Anual � Na��o sobre a Situa��o do C�ncer, que abrange o per�odo de 1975 a 2009, nos Estados Unidos, aponta que a incid�ncia de tumores de boca, garganta e �nus tem aumentado. Foi observado tamb�m que, entre 2008 e 2010, a vacina��o contra o v�rus do HPV manteve-se abaixo do esperado entre as adolescentes – o que, segundo os pesquisadores, contribui com o avan�o da doen�a. N�meros do Centro Nacional de Estat�sticas da Sa�de dos EUA revelaram que, em 2005, 55% dos garotos e 54% das garotas entre 15 e 19 anos j� haviam praticado sexo oral. O que pode explicar a maior presen�a do HPV – mais comum em c�ncer no p�nis, �nus e colo do �tero – nos tumores na boca.
Segundo estudiosos, a maioria das pessoas ser� infectada pelo HPV em algum momento da vida. E, em geral, o v�rus desaparece sem maiores consequ�ncias. As pesquisas sobre a rela��o entre HPV e c�ncer na boca n�o est�o consolidadas e os mecanismos de infec��o ainda n�o s�o totalmente conhecidos. Um outro estudo americano, de avalia��o da sa�de e nutri��o, reuniu 5,5 mil pessoas entre 2009 e 2010 para enx�gue bucal em centro m�vel de exames. O estudo descobriu que o HPV oral � mais frequente entre pessoas idosas, em parceiros sexuais recentes e entre fumantes, pessoas que bebem muito �lcool e entre usu�rios, atuais ou antigos, de maconha.
Os pesquisadores observaram um aumento de 225% nos casos de c�ncer oral nos Estados Unidos de 1974 a 2007, principalmente entre homens brancos. O HPV est� ligado a quase 13 mil casos de c�ncer de colo do �tero por ano em mulheres americanas, das quais 4, 3 mil morrem. Estudiosos calculam que, at� 2020, o n�mero de casos de c�ncer oral vai superar o n�mero de casos de c�ncer de colo de �tero.
O HPV
Estudos em diversos centros de pesquisa no mundo comprovam que entre 50% e 80% das mulheres sexualmente ativas ser�o infectadas por um ou mais tipos de HPV em algum momento da vida. Por�m, a maioria das infec��es � transit�ria, sendo combatida espontaneamente pelo sistema imunol�gico, principalmente entre as mais jovens. Qualquer pessoa infectada com HPV desenvolve anticorpos (que poder�o ser detectados no organismo), mas nem sempre estes s�o suficientemente competentes para eliminar o v�rus.
A transmiss�o � por contato direto com a pele infectada. Os HPVs genitais s�o transmitidos por meio das rela��es sexuais, podendo causar les�es na vagina, colo do �tero, p�nis e �nus. Tamb�m existem estudos que demonstram a presen�a rara dos v�rus na pele, na laringe (cordas vocais) e no es�fago. J� as infec��es subcl�nicas s�o encontradas no colo do �tero. O desenvolvimento de qualquer tipo de les�o cl�nica ou subcl�nica em outras regi�es do corpo � bastante raro. O uso de preservativo (camisinha) diminui a possibilidade de transmiss�o na rela��o sexual (apesar de n�o evit�-la totalmente). Por isso, seu uso � recomendado em qualquer tipo de rela��o sexual, mesmo naquela entre casais est�veis. No caso dos homens, o n�mero de infectados pelo HPV chega a 50% da popula��o masculina mundial, segundo dados do Instituto Nacional do C�ncer (Inca) no Brasil.
Vacina��o
Existem duas vacinas contra o HPV: a gardasil - quadrivalente, contra os tipos 6, 11, 16 e 18; e a cervarix - bivalente, contra os tipos 16 e 18. Cada dose custa entre R$ 250 e R$ 400. S�o tr�s doses, a cada cinco anos, apenas para mulheres entre 9 e 26 anos.