
Depois da tempestade, uma quase calmaria. A reportagem do Estado de Minas subiu ontem em um �nibus da linha 9250 (Nova Cintra-Caetano Furquim), um dia depois que o motorista de um dos ve�culos que fazem o itiner�rio abandonou o coletivo lotado na Avenida Professor M�rio Werneck, no Bairro Estoril, Regi�o Oeste de Belo Horizonte. O homem de 60 anos se desentendeu com uma passageira e foi embora a p�. Em agosto do ano passado, decis�o id�ntica foi tomada por um colega que percorre o mesmo trajeto, dessa vez ap�s ter sua passagem impedida por uma caminhonete estacionada em local proibido. E a rotina estressante dos condutores pode fazer com que a atitude extrema volte a se repetir.
Em uma at�pica manh� de quinta-feira, v�spera de feriado, h� menos passageiros esperando nos pontos de �nibus e o n�mero de carros nas ruas tamb�m diminui. Com as m�os no volante de um dos ve�culos da linha 9250, Jos� Ant�nio Amaro, de 52 anos, permite-se cantarolar. As m�sicas se sucedem no r�dio de pilha que ganhou de anivers�rio e p�s ao lado de seu banco. Cordial, ele cumprimenta passageiros que entram e saem. Com alguns, conversa e at� graceja. Por�m, logo desfaz a impress�o de que tudo vai bem. “Tem passageiro que tem carinho conosco, mas tem gente que pega carona comigo h� anos e n�o d� um bom-dia”, diz Amaro, motorista de �nibus h� 31 anos e h� sete respons�vel por guiar um dos ve�culos que unem os bairros Caetano Furquim, na Regi�o Leste, e Nova Cintra, na Oeste.
Conflitos com passageiros ocorrem diariamente, relatam Amaro e o cobrador Ronaldo Pereira, de 27. Segundo a dupla, os usu�rios costumam se queixar dos atrasos e do fato de o ve�culo estar frequentemente lotado. �s vezes, o coletivo sai abarrotado do terminal e, por isso, n�o atende ao chamado de passageiros nos pontos de embarque. H� menos de um m�s, um rapaz mal subiu no carro, na Avenida Get�lio Vargas, no Funcion�rios, e j� anunciou que n�o pagaria a passagem. “Ele disse que o �nibus estava muito atrasado, que o motorista fica fazendo hora, andando devagar”, lembra Ronaldo. O motorista retrucou: s� continuaria a viagem se o outro pagasse o devido. “Falei que ele aprenderia a me respeitar”, conta Amaro. O cobrador teve que intervir quando o passageiro amea�ou partir para cima do colega. A discuss�o continuou at� uma mulher se erguer e decidir bancar a passagem do brig�o. “O cara se sentou l� tr�s e continuou xingando”, acrescenta Ronaldo.
Surto
Amaro se surpreendeu com a atitude do colega que abandonou um �nibus na quarta-feira e deixou 50 passageiros para tr�s. “Ele � sossegado, mas, para extravasar a raiva, tomou uma decis�o prejudicial a ele e aos usu�rios”, avalia. Por�m, o pr�prio Amaro, de apar�ncia tranquila, j� pensou em fazer o mesmo. “Muitas vezes senti vontade de largar o carro, pegar minhas coisas e ir para casa”, relata. Em entrevista ao EM publicada na edi��o de ontem, motorista identificado apenas como A.P.S. contou ter “surtado” depois de ser chamado de “mentiroso” por uma passageira, que n�o acreditou quando ele, pedindo para algumas pessoas aguardarem a chegada de ve�culos menos cheios, disse que dois vinham logo atr�s. Amaro tamb�m j� sofreu esse insulto ao fazer a mesma recomenda��o. “O usu�rio tem raz�o em reclamar, mas somos trabalhadores. A culpa � do sistema, da BHTrans”, diz.
Os 40 �nibus da linha 9250 transportam uma m�dia de 19,3 mil passageiros em dias �teis, segundo dados da BHTrans. Eles perfazem, somados os trechos de ida e volta, um total de 56,6 quil�metros e param em 197 pontos de embarque, um dos itiner�rios mais longos entre os coletivos da capital. A dist�ncia percorrida � uma das raz�es para o cansa�o sentido por motoristas e cobradores. “Sem d�vida, � uma das linhas mais estressantes”, confirma Amaro. Ele e Ronaldo fazem duas ou tr�s viagens por dia, que, segundo eles, devem ser cumpridas em cerca de tr�s horas. “Mas tem vez que a gente s� consegue fazer em tr�s horas e 40 minutos, quatro horas. Depende do tr�nsito”, explica o motorista. A preocupa��o em n�o ultrapassar o prazo e os inevit�veis engarrafamentos contribuem para exaltar os �nimos. “� comum a gente andar mais de seis horas quase sem parar, para n�o atrasar ainda mais”, conta Ronaldo.
Passageiros
Os problemas persistem e os passageiros sofrem com a desditosa 9250. “Essa � a pior linha que existe. Sempre est� lotada”, reclamou uma mulher, que n�o quis se identificar, mas disse que mora no Bairro Buritis, Regi�o Oeste. A diarista Alessandra Mariano, de 29, concorda. “� dif�cil demais esse �nibus. Chegam a passar dois ou tr�s sem parar no ponto de t�o cheios. Fico 40 minutos, uma hora esperando um mais vazio. E chego atrasada ao servi�o por causa disso, mas a patroa n�o acredita”, queixa-se ela, que trabalha em casas no Buritis e no Gutierrez, bairro na mesma regi�o. Embora sofra com os mesmos aborrecimentos, a enfermeira Celeste de Oliveira, de 61, defende os motoristas: “Eles deviam andar menos. Alguns precisam correr para fazer o hor�rio. Quando param no terminal, mal t�m tempo para comer ou ir ao banheiro. � por isso que eles se estressam tanto”.
O futuro do motorista A.P.S. continua incerto na Via��o Anchieta, em que trabalha. A empresa informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que o funcion�rio ainda n�o se reapresentou para se manifestar sobre o ocorrido. Ele teria dito apenas que procuraria atendimento m�dico particular.