Clarisse Souza e Valquiria Lopes

As manifesta��es que tomam conta das ruas de todo o pa�s e repercutem mundo afora s�o tamb�m o principal assunto discutido nas escolas de Belo Horizonte. O interesse em tentar entender o que est� acontecendo no Brasil parte dos pr�prios estudantes, que abordam o tema durante as aulas e promovem um debate sobre mobiliza��o social, democracia e pol�tica. Surpresos com o interesse dos alunos, professores do ensino m�dio deixaram de lado por alguns dias o conte�do previsto na grade curricular e abordaram amplamente a onda de protestos em v�rios estados. A principal preocupa��o dos educadores � promover uma reflex�o sobre o momento, que j� � considerado hist�rico.
Na turma do 2º ano do ensino m�dio do Col�gio Marista Dom Silv�rio, no Bairro S�o Pedro, Regi�o Centro-Sul de BH, at� mesmo professores de qu�mica e matem�tica acabaram entrando no debate sobre as reivindica��es dos �ltimos dias. Ao perceberem que o movimento iniciado em S�o Paulo pela redu��o da tarifa de �nibus chegava a Belo Horizonte e ganhava o restante do pa�s, muitos adolescentes n�o se contentaram em assistir ao que estava acontecendo: quiseram discutir e at� mesmo participar de forma ativa das manifesta��es.
“Vi que a causa era interessante. N�o se trata de R$ 0,20, mas de uma insatisfa��o geral da sociedade pela corrup��o e falta de investimentos em sa�de, educa��o e outros servi�os”, defende H�lcio Valentin, de 16 anos, que participou de protestos na Pra�a Sete e na Avenida Ant�nio Carlos. Como ele, outros estudantes da turma foram �s ruas e levaram para a sala de aula conte�do que fomentou uma discuss�o sobre um novo posicionamento da juventude em rela��o � pol�tica nacional. Ainda sem entender o que fez com que, de repente, tantas pessoas decidissem ocupar o espa�o p�blico para cobrar a��es, os adolescentes se dizem orgulhosos do sentimento patriota que tomou conta do pa�s nesta semana. “Durante mais de 20 anos sofremos com a in�rcia do brasileiro. Mas agora o jovem percebeu que tem um Estado caro e ineficiente e foi para as ruas contra isso porque descobriu que tem voz e pode ser ouvido”, acredita a estudante Lu�za Moscoso, de 16.
Agora, eles se preocupam com o rumo das discuss�es entre os movimentos sociais e o governo. “A maioria das reivindica��es � importante, mas falta uma unidade, uma pauta definida para debater com os governantes. Pedir melhoria na sa�de e educa��o � f�cil, mas � preciso propostas mais s�lidas”, observa o aluno do 3º ano do ensino m�dio do Col�gio Santa Maria Daniel Belo Nunes, de 17. Para Laysa Souza, de 17, n�o estabelecer um planejamento nos pr�ximos dias pode enfraquecer o movimento nacional. “A falta de uma pauta vai acabar servindo de desculpa para os pol�ticos n�o resolverem nada. V�o dizer que � s� uma bagun�a e que n�o conseguiram descobrir o que os manifestantes querem”, teme.
Entre os professores, a preocupa��o � ajudar os alunos a entender o que est� acontecendo nas ruas do pa�s. “A pol�tica est� invadindo a vida deles muito r�pido e o que estamos tentando � esclarecer quais s�o os interesses que est�o em conflito e o que est� sendo discutido, para que eles n�o se sintam despreparados e para que a discuss�o n�o perca o foco da democracia”, explica o professor de hist�ria do Col�gio Santa Maria Thiago Peixoto Gon�alves.
FORMA��O No Col�gio Marista, o professor de sociologia Jonas Jos� Santana tamb�m ressalta a import�ncia do momento para a forma��o dos jovens. “Tem uma novidade e uma certa inquietude da juventude em rela��o � condu��o da pol�tica e o papel da escola � refletir sobre os ganhos que movimentos como esse podem trazer para o pa�s.” Segundo Santana, al�m de debater o que est� sendo reivindicado, � importante questionar os m�todos. “� preciso discutir o planejamento. O movimento � expressivo, mas quem � a voz? Estamos trabalhando em sala de aula a import�ncia de formar bons l�deres, al�m de mostrar que ir para a rua � o �ltimo passo, quando n�o h� mais condi��es de dialogar”, ressalta.
Orgulhoso ao perceber o interesse espont�neo dos alunos, o professor Thiago deixou de lado o conte�do que vinha sendo trabalhado em sala de aula para se dedicar aos protestos no Brasil. “N�o tem como ignorar, porque � um momento hist�rico.” O estudante Daniel defende a atitude de sua gera��o, mas teme que a como��o nacional n�o dure at� as elei��es de 2014. “Est�o todos falando de mudan�a de mentalidade agora. Mas o Brasil disse isso no impeachment do Collor e depois todo mundo se esqueceu do que aconteceu. Se for para esse movimento ficar s� nos livros de hist�ria, n�o adianta.”
Mudan�a no curr�culo
As aulas previstas nos livros e na grade curricular v�o sendo substitu�das e os alunos, al�m de discutir, est�o indo �s ruas. O que seria uma explana��o sobre a democracia na Gr�cia mudou para uma aula sobre o atual momento social e pol�tico brasileiro. Foi o que aconteceu no Col�gio Arnaldo, no Bairro Funcion�rios, Regi�o Centro-Sul de BH na aula do professor de filosofia Romildo Calixto Amaro J�nior para os alunos do 2º ano do ensino m�dio. Ele inseriu cl�ssicos de Plat�o e Arist�teles para debater conceitos como polis, justi�a e democracia.
Do grupo de 35 alunos presentes na aula de ontem, 11 est�o acompanhando as manifesta��es n�o s� pela televis�o e redes sociais. Eles est�o indo para as ruas protestar. Foram movidos por um desejo de mudan�a, de revolu��o, como dizem. E j� se preparam para os atos marcados para hoje e quarta-feira na capital. Um deles, Caio Augusto Macedo, de 16 anos, defende que chegou a hora de os brasileiros mostrarem para todo o mundo que n�o est�o satisfeitos com a atual situa��o do pa�s. “Muitas coisas est�o erradas. Os servi�os de sa�de, educa��o e transporte s�o mal administrados e prec�rios. E pode parecer clich�, mas n�o d� mais para aceitar tanta corrup��o”, afirma. O que ele espera � que os atos surtam efeito positivo. “Espero um Brasil diferente”, ressalta.
A colega de sala de Caio Andressa Silva, de 16, aprovou a ideia de debater os protestos em aula. Para ela, � importante que todas as gera��es se envolvam para cobrar dos governos o que est� sendo feito do dinheiro p�blico. “Foram gastos altos valores para as cidades brasileiras receberem os jogos da Copa, enquanto as pessoas est�o morrendo na fila dos hospitais por falta de atendimento. Por outro lado, os pol�ticos recebem altos sal�rios e a qualidade da educa��o � ruim”, reclama. A adolescente participou da manifesta��o de quarta-feira na Pra�a Sete e j� � presen�a confirmada no ato de hoje. A aprova��o para protestar vem de casa, onde os pais s�o a favor dos manifestos. “Assim como eu, s� n�o aprovam o vandalismo e a viol�ncia”, diz.
Na ponta da l�ngua
No col�gio Magnum, no Bairro Silveira, Regi�o Nordeste de Belo Horizonte, as portas tamb�m se abriram para as manifesta��es. Com o assunto na ponta da l�ngua, os alunos est�o tendo aulas de democracia e cidadania para aprofundarem no entendimento dos protestos. De acordo com o coordenador do 2º ano do ensino m�dio, Herberton Sabino, a preocupa��o da escola � que a legitimidade dos atos seja mantida. “Explicamos aos alunos que as propostas devem respeitar as diferen�as e se opor a qualquer estrutura excludente, como as situa��es de mis�ria e m� presta��o dos servi�os p�blicos”, afirma.
A abertura de espa�o para a discuss�o do tema em sala de aula agradou aos colegas de classe Yuri Maia, Let�cia Caldeira e Bruno Santos, todos com 16 anos. Apesar da pouca idade, eles est�o cientes do movimento que tomou conta das ruas do pa�s. “Esse � um fato hist�rico para o Brasil. H� muito tempo o povo n�o vai �s ruas para exigir seus direitos”, destacou Let�cia. Para Yuri, as manifesta��es s�o uma oportunidade para ter um pa�s mais justo. Apesar de aprovar a realiza��o dos atos, Bruno faz ressalvas. “O excesso de causas enfraquece o movimento. � preciso ser objetivo e estabelecer o que se espera em cada caso, assim como foi na redu��o do pre�o das passagens”, diz.