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Estado de Minas

Conhe�a Wilquer da Silva, que n�o consegue largar o crack mesmo ap�s duas tentativas

Ex-porteiro j� passou por interna��es desde que experimentou a droga, h� cinco anos. Nunca completou os tratamentos


postado em 12/08/2013 06:00 / atualizado em 24/08/2015 07:47

Transformação: Wilquer pediu para se internar em fevereiro e em menos de 20 dias já tinha aparência completamente diferente; à direita, sua foto mais recente, depois de abandonar o tratamento(foto: Túlio Santos / EM / DA PRESS)
Transforma��o: Wilquer pediu para se internar em fevereiro e em menos de 20 dias j� tinha apar�ncia completamente diferente; � direita, sua foto mais recente, depois de abandonar o tratamento (foto: T�lio Santos / EM / DA PRESS)
“Vou comprar uma pedra. Quando quiser eu paro.” Foi o que pensou Wilquer antes de experimentar crack. “Nunca mais parei”, admite. Os efeitos de cinco anos de consumo da droga s�o evidentes. A fisionomia � de permanente cansa�o. Olhos fundos, corpo magro, barbas e cabelos por fazer. O trabalho e a fam�lia ficaram para tr�s desde aquele dia em que ele fumou a pedra, faz j� cinco anos. Wilquer tem quatro filhos, foi casado tr�s vezes e teve empregos como porteiro. Chegou a ganhar R$ 1,8 mil por m�s. A rotina, hoje, � perambular por ruas dos bairros Lagoinha e Floresta.

Wilquer, chamado de Kika pelos familiares, � o terceiro de nove irm�os. Casou-se pela primeira vez aos 20 anos, em uma cerim�nia na Igreja de S�o Jos�, no Centro de Belo Horizonte. Da primeira uni�o teve duas filhas, com quem n�o tem mais contato. A irm� dele, Cl�udia, conta que eles se separaram tr�s anos depois. Para ela, foi o primeiro dos baques que mais adiante levaram Wilquer para o caminho das drogas. O ex-porteiro casou-se uma segunda vez. Teve mais dois filhos, de quem tampouco tem not�cias.


Antes de experimentar crack, Wilquer tinha dois v�cios: jogos e bebida. Cl�udia conta que parte do dinheiro que o irm�o ganhava em at� dois empregos como porteiro era gasto com �lcool e bingo. O contato com a pedra ocorreu depois de se separar de uma terceira companheira, que segundo ele era ex-mulher de traficante. “Quando ela me largou, resolvi fumar a primeira pedra”, conta. O processo de degrada��o foi r�pido. Primeiro, as faltas ao servi�o se tornaram frequentes. Depois, encontrar algu�m que o empregasse ficou imposs�vel. Foi parar nas ruas.

O ex-porteiro compra pedras no Bairro da Lagoinha, perto da Pedreira Prado Lopes, um dos maiores pontos de tr�fico de crack de Belo Horizonte. Ele conta que vale tudo para conseguir o dinheiro: uma cesta b�sica que recebia uma vez por m�s por meio de programa assistencial era vendida por R$ 20, o suficiente para comprar duas pedras de crack. A revenda de coisas que ele encontra nas ruas garante um pouco mais de dinheiro. Cigarros tamb�m s�o moeda de troca para conseguir droga. “Cada cigarro picado eu troco por um trago na pedra”, diz.

O primeiro encontro da reportagem do EM com Wilquer ocorreu justamente no Bairro da Lagoinha, em fevereiro. O ex-porteiro se aproximou de um grupo de usu�rios que ouvia palavras do pastor Wellington Vieira, idealizador do Centro de Recupera��o de Dependentes Qu�micos (Credeq). O pastor tentava convencer um morador de rua a aceitar uma vaga para tratamento. Surpreendentemente, � Wilquer quem se interessa. “Eu quero ir”, ele diz.

Apesar dos protestos de usu�rios de crack que estavam por perto, ele aceita a sugest�o do pastor de queimar os cigarros que tinha como s�mbolo do fim de um per�odo. Ser� a segunda vez que ele tentar� se tratar. A primeira foi em Divin�polis, no Centro-Oeste mineiro. Wilquer topa ir � cl�nica no mesmo dia. Ao chegar � fazenda, em Lagoa Santa, na Grande BH, se diz aliviado. “� uma alegria descansar com a cabe�a em um travesseiro. Na rua n�s n�o dormimos.” Antes de se deitar, permite que lhe cortem os cabelos e aparem a barba.

Menos de 20 dias depois da interna��o, a reportagem do EM foi at� a fazenda em Lagoa Santa para visitar o projeto do Credeq. De repente, um homem se apresenta. “Beleza?”, pergunta. � Wilquer. Est� irreconhec�vel. Com cabelos cortados, barba aparada e cinco quilos a mais, ele parece um d�cada mais novo. Ainda h� dificuldade de racioc�nio. O ex-porteiro demora a encontrar palavras para se expressar. Mas aparenta estar firme. “N�o vim aqui tratar das drogas, vim tratar de mim”, diz. Ele acredita que pode voltar a ser o que era antes de se viciar em crack. “Jesus est� me transformando.”

Wilquer seguiu o tratamento � risca at� abril. Naquele m�s, come�ou a enfrentar problemas. Segundo funcion�rios do Credeq em Lagoa Santa, o ex-porteiro n�o voltou para a interna��o depois de uma consulta. Disse que daria um telefonema. Perdido, entrou em contato com o s�tio e foi resgatado. Pouco depois, teve um ataque de f�ria e rasgou os pap�is de seu prontu�rio. Foi mais uma vez convencido a continuar em tratamento. Acabou transferido para a unidade de Ravena.

“Quando chegou l�, virou as costas e disse que usaria drogas mesmo, que n�o queria saber de nada daquilo. Voltou para as ruas”, relatou um dos funcion�rios do Credeq. Wilquer voltou para a regi�o da Lagoinha. Ele chegou a ligar para a irm�, pediu que um almo�o fosse marcado na casa da m�e, mas at� hoje a fam�lia n�o o viu. “Para se levantar, ele tem que entender que sozinho n�o vai dar conta, precisa admitir que s� quando aceitar que � doente vai sair dessa”, lamenta a irm�.

Em 30 de julho, a reportagem localizou Wilquer pela �ltima vez. Estava perto do Conjunto IAPI, na Avenida Ant�nio Carlos. Era o mesmo do primeiro encontro, em fevereiro. Barba por fazer, cabelos desgrenhados, fisionomia cansada, saco de lixo escorado nos ombros com todos os pertences. Por que abandonou o tratamento? “Crack, crack, crack. Bateu uma fissura e tive que sair para fumar.”

Onde se tratar

Al�m de comunidades terap�uticas da Grande BH, como a procurada pelo ex-porteiro Wilquer da Silva, a estrutura da capital para tratar dependentes de crack inclui quatro unidades de atendimento: o Centro Mineiro de Toxicomania e os Centros de Refer�ncia em Sa�de Mental �lcool e Drogas (Cersam AD) Pampulha, Barreiro e Nordeste. H� ainda o Centro de Refer�ncia Estadual em �lcool e Outras Drogas de Minas Gerais, que tem conv�nio com comunidades terap�uticas.

Desafio

“O �ndice de recupera��o dos usu�rios de crack n�o ultrapassa 20%. Para atingir entre 40% e 50%, � preciso acompanhamento psicol�gico, psiqui�trico e pedag�gico.”
Amadeu Rosseli Cruz, professor aposentado da UFMG e estudioso de depend�ncia qu�mica h� 40 anos

Casa de apoio

A Casa Dia de Apoio ao Drogado e ao Alco�latra de Uberaba, que recebeu a diarista Vanessa dos Santos, funciona h� 16 anos. Subsidiada pelo Estado, tem espa�o para 15 mulheres. Cobra da fam�lia interesse pela recupera��o, passagens e um dep�sito de R$ 100 para despesas pessoais. “A fam�lia tem de ter uma contrapartida m�nima. Quando a pessoa chega aqui, a passagem e a caixinha s�o trancadas em um cofre para ser usadas quando necess�rio”, diz a psic�loga Val�ria Guimar�es.

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Sombras: o sofrido caminho da recupera��o


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