
Rubelita – Assim como todo o Norte de Minas, na semana passada Rubelita teve a volta da chuva, ap�s sete meses de estiagem. Como sempre ocorre nesta �poca, os moradores do munic�pio – de 7,7 mil habitantes, a 670 quil�metros de Belo Horizonte e que tem a agricultura como atividade econ�mica – deveriam estar contentes pela possibilidade do plantio das lavouras, pela volta da �gua aos c�rregos e rios e esperan�a de dias melhores. Mas, desta vez, a popula��o n�o teve como comemorar a “b�n��o dos c�us”. A chuva chegou no momento em que a cidade est� abalada devido � trag�dia com o micro-�nibus do Cons�rcio Intermunicipal do Alto Rio Pardo (Cidarp), que na manh� do dia 25 levava, al�m do motorista, 25 pessoas para tratamento m�dico em Montes Claros, com seus acompanhantes, e se chocou com uma carreta descontrolada em uma curva, no km 362 da perigosa BR-251, no munic�pio de Padre Carvalho, na mesma regi�o. Morreram 14 pessoas e 13 ficaram feridas.
No domingo, os mortos no acidente foram lembrados na missa de s�timo dia celebrada na Matriz de Santo Ant�nio, �nico templo cat�lico da cidade. Os moradores tentam reconstruir suas vidas, mas sabem que ser� dif�cil curar feridas do desastre, que, al�m das perdas de parentes e amigos, deixou outras consequ�ncias. Como Rubelita tem estrutura de sa�de muito limitada – um pequeno centro de sa�de com dois m�dicos da aten��o b�sica e visitas peri�dicas de alguns especialistas –, seus habitantes v�o continuar precisando se deslocar at� Montes Claros para realizar exames e consultas especializadas.
Mas pelo menos por enquanto esse deslocamento por conta do poder p�blico est� interrompido, pois o micro-�nibus envolvido no acidente era o �nico veiculo dispon�vel para isso. Devido � falta do transporte, quem tinha viagem marcada para o dia 30 se viu obrigado a suspender exames e consultas. O desastre aumentou tamb�m o medo dos moradores do que pode ocorrer na BR-251.
O tr�gico acidente trouxe mudan�as profundas (e ruins) para a produ��o no campo, principal atividade econ�mica do munic�pio. O trabalhador rural Joaquim Ramalho dos Santos, de 60 anos, estava no ve�culo acidentado – viajava para acompanhar o tratamento da mulher, Vilma Ramalho, internada em hospital em Montes Claros. Mesmo tendo ficado gravemente ferido, ele comemora o fato de ser sobrevivido. No entanto, Joaquim vive um sofrimento enorme pelo fato de ter chegado o per�odo chuvoso e ele estar impedido de plantar sua rocinha, pois ainda est� em recupera��o. “Plantei milho, mas veio o sol e nada vingou. Agora que a chuva chegou para valer – que era hora de fazer o replantio –, n�o posso plantar nada”, lamenta Joaquim, que n�o segurou as l�grimas ao falar do assunto. A pequena lavoura � a subsist�ncia dele, que conta ainda com a ajuda dos quatro filhos. No acidente, ele fraturou a t�bia direita e teve o f�mur direito a bacia lesionados. Ainda ter� que passar uma por cirurgia e ficar pelo menos tr�s meses sem andar. Joaquim conta que no momento do acidente estava sonolento e desmaiou com a batida. “Quando acordei, vi que tinha uma pessoa morta debaixo de mim. Eu viajava no meio do micro-�nibus. Dali para frente, todos morreram”, lembra.
Outro que tenta retomar a vida � o tratorista Jos� Antenor dos Santos, de 57. Ele perdeu na trag�dia a filha, Maria Aparecida Silva, de 24, e o neto, Lucas, de 5 anos. “Temos que cobrar dos pol�ticos a reforma da estrada”, afirma o morador, demonstrando revolta com a situa��o da BR-251. Antenor salienta que por causa da necessidade de percorrer a rodovia para tratamento, ao mesmo tempo em que foi al�vio para p�r fim ao drama da seca, a chegada da chuva trouxe apreens�o para os moradores de Rubelita. “A gente fica feliz com a chuva por causa do plantio das ro�as, mas ficamos preocupados porque, com a pista molhada na estrada, o perigo aumenta”, ressalta o tratorista. A mulher dele, Ana Ferreira Silva, de 58, conta que, com a chegada chuva, pensou em replantar uma pequena ro�a (meio hectare) de milho, mas ficou t�o chocada com as mortes da filha e do neto que n�o conseguiu aproveitar o tempo favor�vel. “Fiquei triste demais. Ainda n�o tive �nimo para plantar nada”, diz Ana Ferreira. Entre os moradores da cidade, um dos mais abalados pelas mortes na BR-251 � o caminhoneiro Eliezer Miranda, de 32, que perdeu a mulher, Maria Aparecida, e o filho (�nico), Lucas. “N�o sei o que vou fazer da minha vida. Somente pe�o a Deus para nos confortar numa hora desta”, diz Eliezer, aos prantos.
PERFIL
Popula��o: 7,7 mil habitantes (70% na zona rural)
Dist�ncia de BH: 670km
Economia: agricultura e pecu�ria
Renda circulante: baseada nas aposentadorias rurais (cerca de R$ 1 mil) e cadastrados no programa Bolsa-Fam�lia (R$ 1,2 mil)
Fonte: Prefeitura de Rubelita
A falta do micro-�nibus
Os moradores de Rubelita que s�o obrigados a viajar para o tratamento m�dico ou para acompanhar parentes que est�o se tratando j� viviam amedrontados com os acidentes constantes na BR 251, que segundo revelou reportagem do Estado de Minas, domingo passado, � uma das estradas que mais matam em Minas. De janeiro a outubro, foram 48 mortos, em 347 acidentes no trecho rodovi�rio, com um aumento de 45% em rela��o ao mesmo per�odo de 2012, quando morreram 33 pessoas, em 348 acidentes.
S�o 210 quil�metros entre Salinas e Montes Claros, passando pela serra de Francisco S�, um dos trechos mais perigosos da rodovia. “Toda vez que tenho que pegar essa estrada, n�o durmo na noite anterior. Agora, com essa trag�dia, o medo da gente aumentou”, confessa a dona de casa Maria Isabel Miranda Lima. Ela conta que h� cerca de tr�s anos constantemente � obrigada a deixar Rubelita para acompanhar o tratamento do pai, o aposentado Jo�o Nouro Lima, de 83 anos, que luta contra um c�ncer de pulm�o. Ele viajou para Montes Claros, para uma revis�o, dia 30, mas, por falta do transporte p�blico, precisou pagar R$ 280 ao dono de um ve�culo particular.
Por sua vez, Jovenita Alves Miranda, de 58, percorre a estrada h� dois anos, para tratar de um c�ncer no �tero. Ela viaja em companhia do marido, o agricultor Jo�o Loiola Miranda. Com a perda do micro-�nibus no, na sexta-feira passada, o casal viajou a Montes Claros em outro carro da prefeitura. O medo dos acidentes na BR-251 � tanto que h� pessoas que est�o retardando tratamento m�dico, como � o caso da professora Edna Mara Moraes Santos.
O auxiliar de servi�os gerais Saturnino Mendes, o Cuca, de 48 anos, depois de sentir forte dor nos rins, marcou exames em Montes Claros para o dia 25 de novembro. Contudo, tr�s horas antes da sa�da, como n�o sentia nada, desistiu da viagem. Foi sua salva��o: �s 6h, depois de rodar 90 quil�metros, o micro-�nibus dirigido pelo motorista Willian Vieira Rabelo, de 32, bateu numa carreta carregada de motores a geradores, matando 14 pessoas. Dia 29, Saturnino viajou a Montes Claros por conta pr�pria. Hospedado na casa de uma irm�, somente conseguiu vaga para se submeter aos exames hoje.
LAUDO PERICIAL
As causas da batida entre o micro-�nibus e a carreta na BR-251 que resultou em 14 mortes, dia 25, est�o sendo investigadas pela Pol�cia Civil. O laudo pericial da trag�dia dever� ser divulgado amanh�. O prazo de conclus�o do inqu�rito � de 30 dias. O motorista da carreta envolvida na trag�dia, que seguia de Contagem para o Recife, Jos� Carlos Vieira, de 37 anos, foi ouvido no dia do acidente e liberado. O tac�grafo marca que a carreta estava a 84 km/h, acima da velocidade m�xima permitida no local (60km/h).