Guilherme Paranaiba

“Minha esperan�a � encontrar alguma das minhas 5 mil fotos ou ent�o o DVD dos 15 anos da minha filha. Nosso passado foi apagado ali, por isso ainda penso que � poss�vel achar algo bem guardado.” O desabafo � do representante comercial Helv�cio Jos� Tib�es, de 51 anos, um dos oito propriet�rios dos apartamentos que viraram escombros em 2 de janeiro de 2012, quando o Edif�cio do Carmo, com dois blocos, na Rua Passa Quatro, 525, no Bairro Cai�ara, na Regi�o Noroeste de BH, desabou e matou o corretor de im�veis Jan�lson Aparecido de Moraes, de 40.
Al�m dos processos de indeniza��o, ainda sem solu��o judicial, at� hoje, dois anos e meio depois da trag�dia, a burocracia impede a retirada dos entulhos do local e a rua permanece interditada para o tr�nsito de ve�culos. A Prefeitura de Belo Horizonte alega que a presen�a dos peda�os de concreto e os restos de constru��o “atenuam significativamente” o risco de novo deslizamento at� que seja feita uma conten��o definitiva, mas, mesmo com a licita��o conclu�da, a obra n�o come�a. A reportagem apurou com moradores e com a empresa que venceu o certame que a falta de uma licen�a ambiental est� travando o procedimento, que tem 240 dias de prazo a partir do momento em que for assinada a ordem de servi�o.
Helv�cio Tib�es diz que � muito apegado �s recorda��es que ficaram no apartamento 102 do Bloco A. “Eu tinha meu �lbum de casamento e v�rias filmagens em fita cassete. Muita coisa que relembra a hist�ria da minha fam�lia”, conta o representante comercial, que morava no local com a mulher e uma filha. Hoje, os tr�s ocupam uma parte da casa da m�e de Helv�cio, tamb�m no Cai�ara. O que ainda o deixa com esperan�a � a experi�ncia de um vizinho. “Trinta dias depois que tudo caiu, um dos moradores conseguiu recuperar intactas algumas pe�as de porcelana. N�o creio que seja dif�cil achar algum objeto que tenha sido bem embalado ou guardado”, afirma.
A remo��o dos escombros tamb�m poderia auxiliar outra demanda de Helv�cio. Em dezembro de 2011, dias antes da queda do pr�dio, ele comprou uma Parati usada, que acabou destru�da com o desabamento. Desde o dia do desastre, os impostos do ve�culo n�o foram mais pagos e o carro n�o chegou nem a ser transferido para o nome dele. “Foi para a d�vida ativa e n�o consigo nem dar baixa no Detran, pois eles pedem alguma parte do carro que identifique o chassi”, afirma. Outros tr�s carros e uma moto de outros moradores ficaram sob os escombros, segundo o representante comercial.
O agente penitenci�rio Glauco Peixoto, de 33, morou 15 anos no apartamento 101 do Bloco B, onde colecionava miniaturas de carros. A cole��o tinha cerca de 200 pe�as quando tudo se perdeu no desabamento. “Ainda tenho esperan�a de encontrar alguma coisa que n�o esteja quebrada ou enferrujada. Guardava muitos objetos dentro de pl�sticos ou mochilas”, afirma.
Glauco lembra que a retirada dos entulhos tamb�m � muito importante para dar andamento � per�cia judicial, documento importante para definir responsabilidades da trag�dia. “A gente est� ‘cozinhando’ em um sofrimento que n�o acaba nunca, dois anos e meio e nada de per�cia at� agora”, reclama Glauco.
O professor de matem�tica J�nio L�cio Talini, de 52, gostaria muito de recuperar livros que o auxiliavam no exerc�cio da profiss�o, mas acredita que os dois anos e meio que j� se passaram dificultam muito o trabalho de encontrar pertences intactos em meio aos escombros do apartamento em que ele morava com o irm�o: “Acho que � muito importante tirar os entulhos para resolver a situa��o dos moradores no que diz respeito ao patrim�nio que perdemos. Poder�amos at� vender o terreno para amenizar o preju�zo”.
ORDEM DE SERVI�O SEM ASSINATURA
No site da prefeitura, a licita��o 63/2013, para obras de estabiliza��o da encosta da Rua Passa Quatro, consta como finalizada e homologada em 17 de maio. A empresa vencedora � a Conata Engenharia Ltda. e, segundo funcion�rios da construtora, a planilha de servi�os indica que o entulho ser� retirado durante a obra de recupera��o da rua.
A informa��o � de que a ordem de servi�o ainda n�o foi assinada pela falta de uma licen�a ambiental. Em nota, a Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura informa apenas que vai retirar o entulho para executar uma obra chamada de “cortina atirantada com base em estaca tipo raiz em toda a extens�o do desabamento at� a constru��o vizinha, inclusive com cortinas laterais”, sem explicar as raz�es do atraso. A reportagem tamb�m fez contato com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente , que n�o retornou as liga��es para esclarecer as d�vidas.
No F�rum Lafayette, existe um laudo pericial conclu�do mesmo sem a remo��o dos entulhos, que aponta falhas na conten��o do terreno onde foi constru�do o pr�dio. As partes envolvidas ainda ser�o intimadas por essa decis�o. Um dos r�us no processo estaria doente, o que motivaria a necessidade de marca��o de um exame de sanidade mental.