
Como reagir quando o filho adolescente vai com amigos para balada? Dormir tranquilamente ou n�o desgrudar os olhos do celular e encher o telefone de mensagens e liga��es? Pais de jovens conhecem de perto essa preocupa��o, bem como o quanto � irritante ligar insistentemente e n�o ouvir um al� do outro lado da linha. Mas qual deve ser a dose de liberdade que os filhos devem receber? No Texas (EUA), uma m�e, cansada de ter as chamadas ignoradas pelo filho, resolveu p�r fim ao problema: criou um aplicativo de smartphone que o obriga a atender ou retornar a liga��o. Em entrevista � rede de TV CBS New York, a norte-americana Sharon Standifird contou que se n�o houver resposta, o aparelho fica bloqueado, sem acesso � internet, Facebook ou Whats App ou a liga��es, at� que o jovem fa�a contato com os pais, �nico tipo de chamada permitida. Ainda n�o dispon�vel no Brasil, o aplicativo j� gera discuss�es por aqui sobre qual � o limite entre a preocupa��o e o exagero, e como essa rela��o pode ser saud�vel ou n�o.
A funcion�ria p�blica C�tia Souza Gomes, de 46 anos, n�o tem vergonha de assumir: “Ligo mesmo! N�o me intimido com o hor�rio ou com quem ele esteja. Tenho uma preocupa��o de m�e, que est� relacionada a todos os perigos e � viol�ncia a que estamos sujeitos.” Mas nem sempre ela tem sucesso nas tentativas de manter contato com o filho. “�s vezes, ele atende. �s vezes, n�o. E, �s vezes, n�o retorna. Uma afli��o.” C�tia admite que quando o filho Igor Souza, hoje com 21 anos, era menor de idade ela chegou a sair para procur�-lo na casa de uma ex-namorada, j� que o jovem n�o atendia o telefone. Em outra ocasi�o, ele foi assaltado e os bandidos levaram o celular. “Fiquei ligando insistentemente e ele n�o atendia. At� que o Igor chegou em casa numa viatura policial. N�o gosto nem de lembrar do susto.”
C�tia reconhece que se Igor n�o atende o celular durante o dia � porque pode estar ocupado no trabalho e, nesse caso, ela espera a liga��o de volta. “Mas durante a noite � diferente. Ele sai de carro e tenho medo de assalto, acidente, sequestro rel�mpago ou qualquer outro tipo de viol�ncia. E se ele n�o chega, eu e o meu marido ligamos para saber onde est�. Ela explica como funciona a rela��o em casa e conta que se Igor diz que vai chegar tarde, ela fica sossegada. Mas se fala que � uma saidinha r�pida, que vai voltar cedo e n�o aparece, a� come�am as mensagens e liga��es. “N�o quero monitorar meu filho, mas saber por onde ele anda e a que horas vai chegar me deixa tranquila.”
Do outro lado, Igor se explica sobre as chamadas perdidas em seu celular. “S� n�o atendo quando realmente n�o vejo ou estou com uma garota. A� n�o tem clima, n�?”, diz, em meio a risadas. Apesar de muitas vezes achar inc�modo ser chamado pela m�e no meio da madrugada, o jovem reconhece ser v�lida a preocupa��o. Mas sobre o aplicativo americano � radical. “Pode funcionar enquanto o adolescente for vulner�vel, com 13 ou 14 anos. Mas com uma pessoa j� mais velha, como na minha idade, � rid�culo e invasivo.”
MADRUGADA A psic�loga F�tima Rodrigues, de 43 anos, tamb�m tenta fugir da afli��o de procurar o filho, Ricardo Oliveira, de 20 anos, durante a madrugada. De modo geral, o combinado entre eles d� certo. Funciona assim: Ricardo informa para onde vai e o hor�rio em que vai chegar. Da rua, costuma manda mensagens e diz que tudo est� tranquilo. Mas, em alguns casos os torpedos ou liga��es n�o chegam e o desespero bate � porta de F�tima. A psic�loga lembra o dia em que amanheceu acordada � espera do filho, que, depois de uma balada em uma boate, saiu com os amigos para lanchar e n�o mais atendeu o telefone. “Olhava o �ltimo hor�rio em que ele teve acessado o Wats App e via que estava desconectado. Foi um desespero, at� que ele chegou e disse que o celular ficou sem bateria”, diz F�tima, admitindo que seria uma das adeptas do novo aplicativo, caso estivesse dispon�vel no Brasil.
A preocupa��o de F�tima � parecida com a de C�tia Souza. “N�o tenho receio sobre o comportamento dele e dos amigos mais pr�ximos, porque s�o bons meninos. Mas eles saem de carro, podem estacionar em locais desertos, sujeitos a a��es de bandidos.” Ricardo, estudante universit�rio, diz que o zelo � normal, mas que muitas vezes se irrita com tanta preocupa��o. “� um processo progressivo. Ela manda mensagem e depois come�a a ligar. Meu pai tamb�m passa a ligar e a mandar mensagens. O que enche o saco n�o � a preocupa��o, � a insist�ncia.”

SAIBA MAIS
Ignore o more
O aplicativo Ignore no more desenvolvido pela norte-americana Sharon Standifird funciona em smartphones com sistema Android e tem vers�o em desenvolvimento para Iphone. O custo para instala��o do app � de U$ 1,99, o equivalente a R$ 4,50. Diante de liga��o n�o atendida, o celular para de funcionar e s� � desbloqueado quando a liga��o � atendida ou retornada. Para voltar a usar o Facebook, WhatsApp e outros aplicativos, � necess�rio um c�digo de quatro d�gitos que s� pode ser fornecido pelos pais, quando o filho retorna a liga��o. Uma vez instalado o aplicativo, a desativa��o s� � feita com a autoriza��o do administrador.
Boa rela��o substitui vigil�ncia exagerada
A crescente onda de viol�ncia no pa�s e o aumento do consumo de drogas e das ocorr�ncias de crimes contra o patrim�nio s�o fatores apontados por especialistas como raz�es para a afli��o de pais quando os filhos saem de casa. Presidente do Conselho de Psicologia de Minas Gerais, Roberto Chateaubriand explica que ao mesmo tempo em que cresceu o risco de algu�m se tornar v�tima de um crime, a preocupa��o em ver o filho sair sozinho foi potencializada. “Esse comportamento � algo leg�timo”, diz. Ele alerta, no entanto, que � preciso haver pondera��o para que a “vigil�ncia” n�o se torne algo prejudicial. Para o especialista, o que as fam�lias precisam � de estabelecer uma rela��o de confian�a e transpar�ncia no cotidiano.
“Quando mais se tentar proteger, h� uma tend�ncia de que o filho desenvolva um mecanismos de fuga e passe a ignorar a liga��o dos pais. E o que poderia ser um h�bito natural vira problema”, afirma Chateaubriand. Segundo o psic�logo, a fam�lia precisa, de forma saud�vel, respeitar o momento do jovem, que, nessa fase da vida busca identidade pr�pria fora do ambiente familiar. O especialista � contr�rio ao uso de aplicativos que possam estabelecer controle sobre os filhos, a exemplo do norte-americano Ignore no more. “O que pais e filhos menos precisam � de aplicativos ou ferramentas tecnol�gicas para saber uns dos outros. N�o que eles precisem ser amigos �ntimos, falar de situa��es em que o filho n�o se sinta � vontade, mas os pais podem ser vistos como um porto seguro.”
Ele faz ainda o alerta de que se o filho constantemente ignora a liga��o dos pais, a rela��o familiar deve ser analisada. “Dar sempre ‘o perdido’ � algo sintom�tico e os pais precisam conversar com seus filhos para entender o que est� acontecendo”. Ele acrescenta que nenhum comportamento diante dessas situa��es deve ser hist�rico ou descontrolado, a ponto de exigir san��es como as impostas pelo aplicativo, que bloqueia o celular diante de uma liga��o n�o atendida.
Com uma s�lida rela��o constru�da com os filhos Cristiane, de 20, e Leonardo, de 17, a empres�ria Ivanise Maria Costa Carvalho Neira, de 53, garante n�o ter problema para manter contato com eles. “Desde adolescentes avisam onde est�o, se v�o mudar de local, com quem est�o e a que horas v�o chegar em casa. J� est�o acostumados porque foram educados assim.” Segundo ela, os filhos sempre entenderam o motivo do cuidado. “N�o encaram como monitoramento, mas como regra de seguran�a.” (VL)